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Nesta categoria, procuramos evidenciar através de determinadas expressões, termos ou palavras utilizadas pelos licenciandos nas entrevistas, a relação destes com a teoria da PHC, pois consideramos que sirvam como marcadores de entendimento da teoria que está sendo investigada a partir deste discurso. Destaca-se que são termos geralmente abordados quanto à acepção desta teoria crítica, tais como: prática social, relação homem trabalho, materialismo histórico dialético, luta de classe, cinco passos, problematização, instrumentalização, transformação da sociedade, visão crítica, sistema capitalista, ente outros.

P1. [...] Quando penso hoje em PHC eu penso claro né! Na sua totalidade, mas sempre na problematização e na instrumentalização, onde acho que o fundamental na PHC é a instrumentalização, obviamente claro, com sua devida catarse e sua devida aprendizagem, na parte que toca o professor, na parte do planejamento, eu acho que está ali, é você pensar como o problema social que você está propondo para a turma, ele consegue ser explicado ou resolvido pelo químico, através da instrumentalização, No meu trabalho, trouxe essa função social do dinheiro, a força da mercadoria universal, trazer uma questão sobre a questão fundante do trabalho, o trabalho intelectual e o trabalho manual, resolvi dar um exemplo do engenheiro e do pedreiro, de quem trabalha mais, o pedreiro, mas por que o pedreiro não pode morar no prédio que ele próprio construiu?

Quando o licenciando traz para a sua atividade em sala de aula questões sociais relevantes, direcionadas ao entendimento do mundo diante da cotidianidade em que o aprendente se encontra, estabelecendo como prática social inicial os questionamentos sobre as diferenças de classes sociais, estabelece uma ligação direta com o conhecimento sincrético do qual o aluno está carregado em busca de que o mesmo procure entender que é parte de uma

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totalidade que possui uma história, funcionando assim como um chamamento para a reflexão da sociedade que temos para a sociedade que queremos.

Para a PHC a educação escolar deve promover nas novas gerações a superação do relacionamento dos seres humanos com o mundo que esteja condicionado pelo imediatismo e pelo pragmatismo da cotidianidade, pois o desenvolvimento sócio-hitórico da humanidade está alicerçada por meio das formas de organização social da produção dos bens, que foram desenvolvidas para satisfazer as necessidades essencialmente humanas (DUARTE, 2016). Desta forma, além da utilização de termos teóricos metodológicos trazidos pelo depoente como “problematização” e “instrumentalização”, temos como marcadores da compreensão da PHC as questões relacionadas às formas de trabalho desenvolvidas pela humanidade “intelectual e manual”, a sua relação deste trabalho com o capital, a divisão de classes sociais, fundamentos teóricos que embasaram o licenciando em sua práxis, onde buscou promover uma reflexão crítica na medida em que o homem se empenha em compreender a realidade, busca intervir nesta de maneira intencional de acordo, segundo Saviani (2004) “a passagem do senso comum à consciência filosófica é condição necessária para situar a educação num perspectiva revolucionária” (p.6). Segundo Saviani (2004)

preocupar-se com a educação significa preocupar-se com a elevação do nível cultural das massas; significa, em consequência, admitir que a defesa de privilégios (essência mesma da postura elitista) é uma atitude insustentável. Isto porque a educação é uma atividade que supõe a heterogeneidade (diferença) no ponto de partida e a homogeneidade (igualdade) no ponto de chegada. Diante disso, a forma pela qual a classe dominante, através de suas elites, impede a elevação do nível de consciência das massas é manifestando uma despreocupação, um descaso e até mesmo um desprezo pela educação (SAVIANI, 2004, p.06).

Percebe-se na fala do depoente a preocupação em transformar o processo educacional em um ato revolucionário, no sentido de buscar a superação do “aprender a aprender” 87

próprias das teorias pedagógicas vigentes na atualidade. Na fala do depoente, denotam questões que procuram trazer o conhecimento científico para mediar condições históricas que se estabeleceram de forma contraditória para diferentes profissões, considerando os aspectos políticos, econômicos e sociais, que se efetivaram enquanto condições naturalizadas para a manutenção deste ordenamento da sociedade vigente.

Isso também ocorreu com o pibidiano P3

P3. [...] quando fiz uma atividade no PIBID eu fui fazendo meio que seguindo mais eu não fiz todos os passos, fiz a questão da problematização e da questão social que foi a questão da alimentação, da questão do resíduo de alimentos, que muita gente coloca em excesso a questão de comida no prato e não come e em contrapartida tem outras pessoas que estão passando fome então eu levei isso para a sala de aula, por

87 Expressão trazida pelo filosofo educador Newton Duarte ao publicar sua obra “Vigotski e o “aprender a

aprender”: crítica às apropriações neoliberais e pós-modernas da teoria vigotskiana que representa as pedagogias que retiram da escola a tarefa de transmissão do conhecimento social objetivo.

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que tem tanta comida no Brasil mais tem muita gente passando fome? [...] então falei da química, mas ao mesmo tempo falei a eles dessa questão do sistema como o sistema é capitalista que é voltado para o lucro, também da questão do trabalho. Descreve-se nesta fala, alguns marcadores determinantes dos aspectos teóricos relacionados à PHC, a problematização, o uso de questões sociais, relação do homem na sociedade capitalista, as questões ligadas à função social do trabalho, a percepção da função social da escola como instrumento capaz de levar a uma transformação da sociedade em busca da superação da exploração do homem pelo homem. Em sua fala o depoente expressa à preocupação da práxis estar consubstanciada pelo uso do conhecimento cientifico, suportado pela materialidade histórica própria da humanidade, ressaltando a questão dialética existente em relação à alimentação.

Percebe-se que o pibidiano procurou exercer sua atividade educativa como processo revolucionário, em busca de superar pelo conhecimento escolar as limitações impostas pela sociedade movida pelo capital, o que consiste na proposta da teoria pedagógica PHC, expressamente ressaltada por Saviani (2008, p. 61) “o dominado não se liberta se ele não vier a dominar aquilo que os dominantes dominam. Então dominar o que os dominantes dominam é condição de libertação”.

Deste modo, evidencia-se que o licenciando compreende seu papel de educar para a transformação social, voltada para a superação da divisão de classes, para a socialização dos saberes que possibilitem esse estado de sociedade, que lhe é exterior, mas que está posta, porém, também passível de ser superada, cabendo ao educador propiciar junto com os conhecimentos científicos, as mediações necessárias para que o educando possa refletir sobre o seu papel, enquanto sujeito não alienado, dentro de diferentes complexos sociais, possibilitando ao aluno reconhecer a sua singularidade concreta, não se limite apenas ao ambiente escolar. Conforme expõe Duarte (2013)

Para que possa compreender o aluno em sua concretude, o professor precisa das mediações de abstrações, pois aquela não se apresenta como decorrência imediata do fato de ele estar em contato com o aluno. Além disso, conhecer a concretude do indivíduo-aluno não se limita, no caso da atividade educativa, ao conhecimento do que o indivíduo é, mas também ao conhecimento do que ele pode vir a ser. Esse conhecimento, por seu lado, implica um posicionamento em favor de algumas possibilidades desse vir a ser e, consequentemente, contra outras (DUARTE, 2013, p. 8, grifo nosso).

Para a pedagogia histórico crítica não existe uma proposição metodológica engessada ou pré-determinada para se alcançar os objetivos propostos em determinada aula ou atividade educacional. Entretanto para que haja um trabalho de apropriação devido do conhecimento científico necessário à obtenção de uma consciência em si e para si, é preciso que o educador, conheça a teoria que sustenta a sua prática, de modo a suscitar transformações na consciência

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dos educandos que possa chegar aos condicionantes sociais, tornando significativo o processo ensino-aprendizagem em função de uma educação transformadora, que procure superar os déficits educacionais e sociais atuais (GASPARIN, 2014).

A importância de realizar sua atividade prática bem fundamentada em uma teoria é reconhecido pelo licenciando P5, pois o mesmo sustenta que, para o professor usar a metodologia proposta pela PHC é preciso ter um conhecimento maior sobre a mesma

P5. [...] até agora, o último trabalho que eu fiz que considero como o melhorzinho, estava mais bem fundamentado na PHC, pois eu tive mais tempo de desenvolver, pois não dá para você fazer um trabalho com PHC e aplicar em uma única aula, porque você tem que fazer muitas discussões tem que aplicar o conteúdo, a instrumentalização, a discussão, a catarse, daí o retorno à prática social, e não da para aplicar tudo isso numa aula, vou aplicar um vídeo em uma única aula para você desenvolver seu trabalho, isso não existe. Isso já prova que o trabalho não está fundamentado na PHC ou que o professor, nem leu o trabalho não entende a pedagogia.

Destaca-se neste caso que os descritores característicos das bases filosóficas e metodológicos da PHC estão em evidência; A autocrítica sobre a apropriação da PHC a ponto de poder considerar o trabalho realizada na escola como “melhorzinho” realça uma preocupação em sua atividade prática, que não esteja efetivamente coadunando com o conhecimento que possui a respeito da teoria pedagógica em questão, assim a proposta estabelecida de um trabalho didático, voltado para uma apropriação de diferentes conteúdos escolares, de forma que estejam teórico metodologicamente organizado de acordo com os cinco momentos da PHC, conforme explicitado na seção 2.5 deste trabalho. Para João Gasparin (2014) estes momentos podem ser elaborados didaticamente buscando o uso da teoria PHC como embasamento de uma prática sistematizada da seguinte forma:

1º Passo - Prática Social Inicial: nível de desenvolvimento atual do educando: se expressa pela prática social inicial dos conteúdos, seu ponto de partida é o conhecimento prévio do professor e dos educandos;

2º passo- Problematização: consiste na explicação dos principais problemas postos pela prática social, relacionados ao conteúdo que será tratado, criando-se desse conhecimento uma questões ou perguntas problematizadoras;

3º passo Instrumentalização: Essa se expressa no trabalho do professor e dos educandos para a aprendizagem. O professor deve apresenta aos alunos o conhecimento científico adequado para responder a problematização;

4º passo Catarse: é a expressão elaborada de uma nova forma para entender a teoria e a prática social, que se concreta por meio da nova síntese mental a que o educando chegou.

5º passo Prática social final - novo nível de desenvolvimento atual do educando, consiste em assumir uma nova proposta de ação a partir do que foi aprendido (GASPARIN, 2014, p.09).

Na construção de sua obra, Demerval Saviani propõe cinco momentos que podem orientar o trabalho pedagógico numa perspectiva dialética entre teoria e prática, que servem para os alunos se apropriarem dos conteúdos científicos objetivados na atividade pedagógica e elevam tanto professor como alunos a status de maior conhecimento; torna-se importante

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ressaltar que estes momentos são dinâmicos e não sequências estanques, mas como momentos prioritários articulados com a totalidade social, que no campo pedagógico aparece como transposição do saber para o saber escolar (ANUNCIAÇÂO et. al. 2015). Entretanto, o uso da PHC como referencial teórico-metodológico e sua aplicação didática, tem chamado atenção de educadores que advogam pelas teorias críticas especialmente a PHC, estes alertam quanto ao uso desta sistematização, pois deve estar de acordo com o método marxista, conforme ressalta Tiago Lavoura e Ana Marsiglia (2015)

O método de ensino da pedagogia histórico-crítica busca, assim, conjugar a análise sincrônica do objeto de estudo (sua dinâmica, estrutura e função na forma mais desenvolvida) com a análise diacrônica (a gênese e o desenvolvimento do conteúdo estudado). Em consonância com o método de Marx; para a pedagogia histórico- crítica a forma mais complexa do conteúdo de ensino permite compreender as formas menos complexas de conteúdos escolares sem, entretanto, desconsiderar a necessidade de se conhecer a gênese histórica deste conteúdo mais desenvolvido (LAVOURA; MARSIGLIA, 2015, p. 367).

Evidencia-se pelos trechos descritos e das análises realizadas, a compreensão de que estando o currículo bem fundamentado em uma concepção pedagógica crítica, no caso a PHC, proporciona o reconhecimento das relações sociais das quais estamos imersos, submetidos às formas de dominação do capital, que se consubstancia na manutenção do status da expropriação dos conhecimentos necessários para uma real transformação do escopo social escolar. Acreditamos que, através de novas dimensões concretas de apropriação dos conteúdos, estes possam fazer parte com primazia das necessidades da humanidade e da formação de caráter omnilateral, assim estabelecido por Saviani (2012)

um aluno que é preparado para o exercício da docência assimilando os conhecimentos elementares que integram o currículo escolar; estudando a forma como esses conhecimentos são dosados, sequenciados e coordenados ao longo do percurso das séries escolares; compreendendo o caráter do desenvolvimento da personalidade de cada aluno no processo de aprendizagem; e apreendendo o modo como as ações são planejadas e administradas, está sendo capacitado, ao mesmo tempo, para assumir a docência, para coordenar e supervisionar a prática pedagógica, orientar o desenvolvimento dos alunos e planejar e administrar a escola (2012, p.130).

As discursões a respeito de currículos na educação brasileira sejam para a formação de professores ou para a educação básica, já perfaz um longo caminho, de acordo com Alice Lopes e Elizabeth Macedo (2011) as pesquisas sobre este tema tiveram início dos anos 20 e se aprofundam nos anos 80, estas apontam para as características das transferências de instrumentalização e teorizações americanizadas, o que correspondia à assimilação de modelos quase sempre orientados por políticas de ajuda internacional, implicando em assimilações e apreensões de teorias que coadunassem com os novos modelos organizacionais da sociedade. As autoras chamam a atenção sobre os critérios de verdades estabelecidos quanto às validações de determinadas teorias, pois está em jogo à disputa entre saberes e

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significados teóricos e práticos relacionados ao que “consideramos como ciência, como acadêmico e como capacidade de atender a fins sociais” (LOPES; MACEDO, 2011, p.92).

Na perspectiva crítica, os currículos perfazem o caminho das ideologias dominantes e do poder exercido pelos divergentes atores que o compõem, quer sejam as disciplinas dominantes e por conseguintes seus respectivos preceptores, ou por conta das ideologias dominantes do modelo organizacional aos quais as instituições estão imbuídas e se condicionam a reproduzi-las indiscriminadamente, conforme explicitado por Silva et. al. (2007)

O encaminhamento desta questão passa por uma perspectiva crítica de currículo, isto é, o currículo como campo de poder. Poder no sentido de que os currículos procuram dizer o que deve ser quais conhecimentos devem fazer parte da formação do professor — selecionado de um universo mais amplo de conhecimentos. Poder no sentido de que conhecimento não é algo tranquilo e fácil de ser concebido, como pode parecer de imediato para uma consciência ingênua. Poder, pelo encobrimento ideológico, que faz com que a concepção e seleção do conhecimento sejam algo dado e natural, independente de ações humanas, ou, quando muito, fruto de ações humanas inevitáveis, inexoráveis. Poder no sentido de que num currículo identidades são forjadas (SILVA et. al., 2007, p.4).

Neste sentido é factível admitir que os licenciandos, ao serem questionados quanto a sua formação crítica, tenham associado especificamente às questões pertinentes às disciplinas cursadas na licenciatura que apresentam em suas propostas pedagógicas a anuência de uma percepção crítica da sociedade, de forma a imbuir em seus indivíduos tomada de decisões conscientes, que possam promover em sua práxis a possibilidade de emancipação humana, pois “o trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (SAVIANI, 2011, p. 13).