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Comunicação global e nichos culturais – causas e efeitos da sociedade de informação

Comunicação global e nichos culturais: uma abordagem à estética das mensagens

3) Comunicação global e nichos culturais – causas e efeitos da sociedade de informação

Temos então uma comunicação global para vários nichos cultu- rais que se identificam pelo tipo de produtos culturais que conso- mem. Trata-se, com efeito, de uma espécie de tribo consumidora que encontra um efeito semelhante de identificação/projecção em relação aos mesmos produtos. No entanto, não se trata de uma tribo convencional/tradicional ou de uma classe ou nicho fisica- mente unido. Não. Os seus membros não partilham nenhum lugar físico, a não ser, muito vagamente, alguns locais de trabalho, de lazer e de ocupação de tempos livres. Mas, na essência, são indi- víduos que apenas têm em comum elos de ligação cultural esta- belecida pelo tipo de consumo de informação. Daí que tentemos aqui esboçar uma abordagem analítica e formal sobre a orienta- ção estética e o estilo plástico com que a comunicação global se especializa, estrinça, esmifra para cobrir toda a malha da rede comunicacional – tapando, assim, todos os buracos, com a ajuda de uma comunicação «oficial/ oficiosa» (João Maria Mendes, 1999, pág. 214-215) que se esforça por homogeneizar os nichos. Esta é a garantia de cobrir todo o mercado da comunicação: especializan- do, estruturando em nichos, dando sempre uma aparente alterna- tiva à sua comunicação. Quanto mais redutora for a comunicação especializada, mais sedutora ela se tornará. Como se de um ecrã de computador conectado à Web se tratasse, teríamos uma página com um menu principal, para todos. Depois cada um selecciona o tema que mais lhe interessa, com um simples «clic». Se esta página não interessar... haverá muitas outras. Complementares e alterna- tivas. Mas, certamente, não terão conteúdos muito diferenciados. Terão, essencialmente, uma estética diferente.

O fim é comunicar, provar e demonstrar que o sistema funciona e não transmitir qualquer mensagem carregada de ideias/utopias/ argumentações, até porque, segundo o pensamento instituído, este tipo de conteúdos é «aborrecido e entediante» (Ignacio Ramo- net, 1999, pág. 133) para o utente da rede comunicacional, seja ele leitor, espectador, ouvinte, público, etc. (a ordem apresentada não é relevante). Temos então um cenário onde o Homem explora e é explorado pela comunicação global. Um momento de pensamento em que se toma a comunicação não como um meio para alcançar

algo, mas como um fim: a própria comunicação em si. Isto é um fru- to do próprio pensamento contemporâneo e da sociedade pós-mo- derna que é adepta da tensão, do caos e do acaso e que se assume contra todo e qualquer determinismo e a bem do hedonismo (Gilles Lipovetsky, 1989, pág. 79). Logo, a sociedade da informação não é nenhum contrato social a nível mundial – é apenas mais um meio, que se pode transformar rapidamente num empecilho burocrático comunicacional. Aliado a este fenómeno de rede comunicacional global, assistimos ao surgimento de uma nova esfera pública, à escala planetária. Trata-se de um não-espaço físico. É constituí- do pela opinião pública internacional, essa ditadura das maiorias que aprova ou reprova os produtos comercializados (sejam eles de ordem cultural, política, ética, etc.), normalizando-os, conforme a mensagem lhe for veiculada pela comunicação global, numa lógica de aceitação ou de reprovação desses mesmos produtos. Mas o que é isso de ser um espaço global? Pode, simplesmente, afirmar-se que o que é global é o que não é lugar nenhum. Isto é, basta recorrer a subterfúgios linguísticos tais como o jogo entre o «tudo» e o «nada». Aquilo que aspira a ser «tudo» não pode, de facto, ser «nada» e vice- -versa. Logo, o lugar global não é mais do que «nenhures». Não é lugar nenhum real mas pode sê-lo no virtual – entendamos aqui o virtual como uma espécie de consciência colectiva – e constitui-se como tal. Actualmente, a globalização é mais «uma atmosfera» do que uma realidade em si (Luís Moita, 1999, pág. 1), até pelo uso e abuso do próprio conceito que assim se aplica de uma forma dema- siadamente vaga a vagamente tudo. Mas a globalização não é glo- bal. Não chega a existir/intervir numa enorme franja da sociedade mundial que se encontra excluída por razões de ordem económica, política e educacional. Ora, por isso, não se pode considerar como um fenómeno globalmente real nem realmente global.

Levanta-se aqui a questão de que tipo de real se está a tratar. O do mundo natural em muitas situações já não o é, nomeadamente nas sociedades pós-modernas e capitalistas, onde os lugares do real são conservados de maneira a parecerem reais, mas são con- servados segundo normas globais de conservação – vejam-se as normas de conservação do património propostas/impostas pela UNESCO. Tal refúgio, resquício de paraíso natural, onde se afo- gam as memórias dos nossos antepassados e é permitido sonhar e reencontrar-se com alguma cultura particular e identitária.

Mas de que tipo de memórias se trata? De memórias quase ima- géticas de representação segunda de um mundo que também já não existe. De um mundo imaginado e sonhado que pode, mui- to facilmente, através das novas tecnologias, ser recriado e dar vida a essa realidade primeira, segundo as regras do virtual. É este efeito de «pescadinha de rabo na boca», este «curto-circuito mediático» (Ignacio Ramonet, 1999, pág. 12-13), que confunde e estagna, pela inércia e sensação de claustrofobia e impotência, uma boa parte das nossas pós-modernas sociedades capitalis- tas. Porque o real não o é, oficialmente: o real são as relações de comunicação (é um mundo virtual, de consenso/consumo). Este ciclo fechado, de quase eterno retorno, contribui para que estas sociedades da informação sejam também sociedades do risco, da incerteza, onde a rede é religião, no sentido de «re-ligar» as pessoas. A comunicação é uma proposta para tornar comum aquilo que não o é: é uma comunhão, um comunismo, uma comunicação de relações de simples consumo. E como é útil para o mercado a necessidade de consumir para se «re-encontrarem» identidades nacionais, tradicionais e até identitárias/individua- listas! Basta seccionar e tematizar formalmente conteúdos, para encontrar públicos.