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Capítulo III. Metodologias e Contextos de Investigação

3.1. Origens do Projecto de Investigação: razões de uma escolha

3.1.1. Comunidade de vizinhos: o caso do Beco do Petinguim

Francisco já estava no continente; os três filhos que estavam com a mãe vieram depois, sozinhos. António Maia e a sua mulher, Esperança Maia, acolheram os sobrinhos que com eles passaram a viver na sua casa, no Beco do Petinguim. O cunhado Francisco foi igualmente recebido em casa deles e sempre protegido por eles. Irene Maia fora para sempre abandonada. Nunca mais viu os filhos, e os filhos não falavam dela, mesmo entre si: nós não falávamos da nossa mãe, diziam-nos. Ninguém mais falou com Irene Maia ou a procurou. Como viveu? Onde viveu? Com quem viveu? Como foi a sua vida? Com quem se relacionava? Quando morreu e onde foi enterrada? Não obtivemos nenhumas respostas! Ninguém sabe, ninguém quer falar, ninguém fala. Na altura dos acontecimentos, Irene Maia tinha seis filhos: duas mulheres e quatro homens. As duas mulheres estão vivas e três dos quatro filhos, também. As suas idades situam-se entre os 62 e os 85 anos. Quando lhes falámos da mãe, todos choraram, afastando-se. Choram sempre! Perguntámos-lhes por que nunca falaram do que terá acontecido, e por que não falam da mãe. Um responde-nos que o que aconteceu é equiparável a uma pedra que se lança no alto mar, lá repousará eternamente. Em

silêncio aí repousará! Outro diz-nos que tudo o que sabe, soube-o em adulto, mas o que

sabe não verbaliza. Diz-nos, no entanto, que a única pessoa com quem consegue falar da mãe é connosco. Quando fala sem nada dizer, chora e repete: sinto um grande alívio quando choro, é doloroso, sofro mas fico aliviado. Este homem tem 68 anos.

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Irene Maia deixou seis filhos, perto de uma dezena de netos (nos quais nos incluímos nós) e alguns bisnetos. Morreu ignorando que foi sempre amada: por Francisco, seu marido, que para ela endereçou as últimas palavras antes de ter morrido; pelos seus filhos, pelos irmãos que a repudiaram e pelos netos que nunca a conheceram.

O que é o dito e não esclarecido; a não verbalização dos acontecimentos; as suspeitas

não esclarecidas, as perguntas feitas no silêncio, que não obtiveram resposta; a convicção ou opinião, a desconfiança ou a suposição contribuíram para que esta família nunca tenha feito a catarse do que lhes acontecera. O (acontecimento) passado serviu para reprimir o presente (a vida de todos aqueles que estiveram directa ou indirectamente a eles ligados). Os indivíduos não chegaram nunca a fazer o luto.

A tentativa hábil de eliminar as pessoas caídas em desgraça é-nos apresentada, por Tzvetan Todorov ([1995] 2000), num excelente texto apresentado ao congresso de

História e Memória dos Crimes e Genocídio Nazis, sob o título “Les Abus de la

Mémoire” , em Novembro de 1992, em Bruxelas. Neste texto, recorda-nos aquelas célebres fotografias de grupos políticos, nas quais uma das personagens caídas em desgraça é habilmente suprimida do grupo com o objectivo de eliminá-lo da história, após ter sido moralmente eliminado, em primeiro lugar, e depois, em muitos casos, fisicamente. A história dos povos está cheia destes exemplos.

A história de vida de Irene Maia tem algumas semelhanças com estes casos: também ela foi suprimida da foto de família. Irene Maia foi abandonada, silenciada e retirada da história da família. Foi negado, aos seus filhos, aos netos e à restante família, o direito de a recordar. Mas o arquivo, existente na memória dos indivíduos, resiste à manipulação da história, mesmo que esta história seja uma simples História de Vida e/ou a História de Família. Este arquivo, que é memória do passado, implica sempre uma participação emotiva com ele, acompanha os indivíduos desde a infância e morre apenas quando desaparecem os últimos que estavam em condições de as recordar. Por isso, a memória de Irene Maia aqui é invocada. A reconstituição, a evocação de Irene Maia, nestas páginas, não pretende ser, de modo nenhum, uma afronta à sua família; antes pelo contrário, pretende dar a conhecer aquilo que os indivíduos têm o direito de

saber; e, consequentemente, de conhecer e de dar a conhecer a sua própria história. Nada deve impedir a recuperação da memória: este é um princípio sagrado. Quando um acontecimento vivido por um indivíduo ou um grupo é de natureza excepcional ou trágica, tal direito converte-se num dever de o recordar, de o testemunhar. Irene Maia é um desses casos. A sua evocação não significa “explotar aquel pasado de sufrimientos como una fuente de poder y de privilegios” (Todorov, [1995] 2000, p. 28). É, antes, uma manifestação de indignação contra a supressão da memória; contra as tradições que a todos aprisionaram; contra os guardiões da memória que se arrogam o direito de controlar a selecção dos elementos da memória que devem ser conservados; contra o sofrimento que todos sentiram e (os vivos) continuam sentir. É pela recuperação da memória do passado: pela relação dialéctica entre a supressão e conservação, esta sim, remeterá para o esquecimento o que deve ser esquecido e conservará o que deve ser conservado; é pela defesa do direito à pluralidade e diversidade de formas e estilos de vida, mesmo quando não nos revemos neles; é pela preservação da liberdade de cada um a decidir e escolher o seu projecto de vida.

Não existe unicidade nem incomparabilidade no caso de Irene Maia. Para cada indivíduo, a sua experiência é, de facto, singular e a mais intensa de todas. Mas a experiência aqui narrada é comparável, semelhante e, simultaneamente, diferente de muitas outras. Logo, é para todos nós proveitosa pelo que ela poderá ter em comum com outras. Não nos interessa estabelecer um hit parade do sofrimento, nem nos propomos hierarquizá-lo; nem pretendemos, igualmente, que o caso de Irene Maia sirva para construir uma nova moralidade e com ela dar lições de moral, o que não seria uma prova de virtude; não se pretende, igualmente, torná-la uma vítima e construir, em torno dela, um monumento que se torne num culto da memória. Quisemos unicamente dar a conhecer e aproximarmo-nos, um pouco mais, da verdade sobre um passado que o

negacionismo, imposto pelo silêncio, a todos ainda atormenta.

Chamava-se Judite dos Santos, era casada com o tio Artur, operário de metalomecânica, tinham nove filhos entre outros tantos que tinham falecido. Todas as pessoas que a conheceram, quando era nova, são unânimes nas opiniões acerca desta mulher: era lindíssima. Casou com Artur, era ainda uma criança, amava-o e aos seus

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filhos. Artur, Judite e os seus filhos moravam no Beco do Petinguim, lugar onde viviam também António Maia, Esperança e os seus sobrinhos. A que viria a ser nossa mãe era irmã de Judite. A tia Saroca, irmã de ambas, estava casada com um cigano de quem tinha dois filhos, e também vivia no Beco do Petinguim. O marido da tia Saroca era, por sua vez, irmão da tia Carocha, a mais importante ajuntaora de então. O marido da tia

Carocha, o tio Mariano, era irmão de António Maia. Eram, por isso, todos vizinhos e

familiares directos ou por afinidade. A maioria dos habitantes do Beco do Petinguim não era de origem cigana. No entanto, todos tinham laços de parentesco. A identidade cultural do Beco do Petinguim não era homogénea: o status social era diverso e prevaleciam relações de dominação, de conflito e de interesses. O Beco do Petinguim não estava isolado da restante sociedade, pois tinha fortes ligações com o contexto social envolvente, que se processavam “através de um conjunto diversificado de dinâmicas estruturais, redes de relacionamento e práticas sociais” (Costa, 1999, p. 83).

O tecido social local possuía origens geográficas e percursos sociais e socioprofissionais diversificados. Era um meio social bastante aberto. As fronteiras do

Beco do Petinguim não eram fixas, nem tão pouco intransponíveis, como veremos; a

maioria dos seus habitantes caracterizava-se pela sua heterogeneidade, pelos contrastes sociais, pela estrutura de classe e categorias sociais, pelas relações de interdependência e conflito, que continuadamente se estabeleciam entre eles. O Beco do Petinguim poderia ser considerado como uma comunidade de vizinhos, como propõe Appadurai, pois era, efectivamente, “uma comunidade situada de parentes, vizinhos, amigos e inimigos.” ( [1996] 2004, p. 239).

O conceito de comunidade pode, neste caso, ser utilizado no sentido

socioespacial por se reportar, como refere Costa, a “unidades sociais locais”, mas pode

igualmente assumir um sentido sociocultural, “referindo-se a sentimentos de pertença, isto é, a um dos componentes decisivos das identidades colectivas” (1999, p.33). As configurações relacionais das pessoas do Beco do Petinguim resultam, pois, do cruzamento de inúmeros fios sociais (Simmel citado por Cruz, 1995, p. 575) e do “entrecruzamento de círculos sociais, de que falava Simmel” (Costa, 1999, p. 90). Este sentimento de pertença assenta em laços múltiplos: em laços sociais de

interdependência entre vizinhos, com dimensões de cooperação e conflito, assim como

em laços familiares, (cf. Costa, 1999, p. 89).

Voltando ao tio Artur: embebedava-se frequentemente e provocava desordens, sempre por causa dos seus ciúmes. Um dia, os seus ciúmes atingiram um ponto máximo e sem retorno: queimou a cara de Judite com ácido sulfúrico. (Segundo Beauvoir, o tio Artur ajusta-se ao tipo “do homem que duvida da sua virilidade” e que, por isso, se torna mais “arrogante em relação às mulheres, mais agressivo ou desdenhoso” ([1949] 2008, p. 23).) No seu rosto, permaneceram, indeléveis e inesquecíveis, as marcas da agressão de que foi vítima. Artur foi preso! Em tribunal, Judite perdoou-lhe. Foi condenado a quatro anos de prisão. Esteve preso durante dois anos e, durante todo esse tempo, nos dias de visita, Judite fora sempre visitá-lo. Nunca o abandonou enquanto esteve preso. Quando saiu da prisão, voltou para junto da mulher e dos filhos.

Irene Maia era cigana, Judite não. Duas mulheres com destinos diferentes mas com estórias comuns de humilhação e de brutalidade. Essas histórias demonstram, cada uma à sua maneira, e com as suas especificidades, as singularidades que as distinguem. O sincretismo resultante da convivência entre a família cigana estudada e o restante meio social envolvente nada tem a ver com uma sociedade que vive à parte; apresentam, pelo contrário, semelhanças com os princípios reguladores da sociedade portuguesa em geral. Irene Maia e Judite têm em comum o facto de serem mulheres. O que aconteceu a uma poderia ter acontecido à outra, podendo, ou não, ser diferentes as respostas. Estas regularidades assentam em categorias de interacção, que podem ser, facilmente, consideradas “universais”, e em procedimentos, normas e costumes que são também facilmente generalizáveis. As similaridades e o sincretismo resultantes da convivência com o meio social envolvente não negam, nesta época, as particularidades desta família cigana que demonstra, com o caso de Irene Maia, que se rege por normas, costumes e interditos simbólicos que a singularizam contrastivamente com a restante sociedade portuguesa; que a sua ambiguidade relacional tanto pode dar a ideia de ser uma coisa, como, ao mesmo tempo, o seu oposto.

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Irene e Judite exibiram comportamentos que estão em conformidade com os valores da época: “a mulher determina-se e diferencia-se em relação ao homem e não este em relação a ela; a fêmea é o não essencial perante o essencial” (Beauvoir, [1949] 2008, p. 13). No primeiro caso, Irene conhece os interditos da lei cigana, no relacionamento entre homens e mulheres, que impõe a separação espacial entre a mulher cigana e os senhores, o que se manifesta contraditório, neste caso, atendendo a que o casal tem como empregado um senhor. Ora, conhecendo este interdito, “deveria” ter-se comportado de acordo com a tradição enquanto fonte de regulação simbólica, mas, segundo a opinião pública, tal procedimento não fora por si observado, logo,

manchou a honra do seu marido, dos seus filhos e dos restantes familiares. Como já

afirmámos, a mulher que perde a sua honra fica com o véu da vergonha que nunca desoculta as suas faces. Não existia, porisso, reabilitação para esta falta. De acordo com a observação destes princípios, Irene nada mais poderia fazer para além daquilo que foi feito: afastar-se de todos e, consequentemente, se alguma “dignidade lhe restava”, refugiar-se na sua solidão. Assim o fez!

No segundo caso, Judite procedeu igualmente em conformidade com os seus valores, os valores morais prevalecentes: mulher honrada deve perdoar as “fraquezas” do seu marido. Simone de Beauvoir admite que “o homem que constitui a mulher como um Outro encontrará nela profundas cumplicidades (Beauvoir, [1949] 2008, p. 18), como demonstra o caso da tia Judite. Neste caso, a opinião pública crítica o comportamento violento do homem, mas não o considera, em nenhuma circunstância, desonrado. No primeiro caso, o homem vive desonrado, mas, no segundo, a sua honra não foi afectada. Em ambos os casos “a mulher não tem existência para si; é considerada apenas uma função dentro do mundo masculino” (Beauvoir, [1949] 2008, p.23)

Voltemos à nossa avó Esperança que, até ao nosso nascimento, manifestou o seu descontentamento pelo facto do seu sobrinho casar com uma senhora (a nossa mãe). A avó Esperança nunca nos falou de Irene Maia. A ocultação e o silêncio também nos foram impostos. Com a separação dos pais, Manuel foi viver para o Beco do Petinguim com os seus tios, onde conheceu Açucena, com ela se casou, e no Beco do Petinguim

continuaram. Deste casamento, nascemos nós, e no Beco do Petinguim vivemos. Nascemos de uma série de (des)encontros, e, se um deles tivesse falhado, não teríamos nascido, nem estaríamos agora aqui a narrá-los.

Esperança não tinha somente habilidade e aptidão – desenvolvida através da experiência –, para compor e activar imagens mentais; não tinha apenas a capacidade de evocação; tinha igualmente a arte e o engenho de fazer da sua imaginação reprodutora uma fonte de onde brotavam acontecimentos passados como se estes fossem fruto de uma imaginação criadora, permanentemente renovada. A mesma estória, mil vezes contada, era ouvida como se fosse a primeira vez contada e escutada. É este o imaginário que se tornara a nossa “infância da consciência” (Durand, 1989).

As estórias que a avó Esperança nos contava eram verdadeiras. No Beco do

Petinguim, no seu regaço sentado, víamo-las, quase lhes tocávamos, de tão

verdadeiramente materiais que nos pareciam. Como é que não podem ser verdadeiras as imagens que nos habitam, que em nós existem? Como não podem ser as verdadeiras imagens que preenchem o nosso imaginário? Como não podem ser verdadeiras as imagens que, durante dezenas de anos, permaneceram acomodadas no sótão da nossa imaginação? Estas imagens são motivo, acção e razão de ser deste nosso estudo. São imagens que falam, monumentos imagéticos em acção. A cunhagem (imprinting) é, segundo Konrad Lorenz (citado por Sprinthal, 1994, p. 40-41), uma indestrutível marca adquirida na sequência de uma experiência precoce de desenvolvimento e que fixa algumas das particularidades dos indivíduos, e de tal forma isto sucede que, mais tarde, tenderá a orientar todas as suas respostas filiais, sexuais e sociais em função desta cunhagem. Não sabemos se isto se aplica ao nosso caso. Mas, seja como for, as nossas “percepções foram cunhadas antecipadamente” (Jurgen, 1990, p. 22 ) e, por isso, tomamos o passado como futuro.

A nossa imaginação não é um puzzle estático, é algo de dinâmico e em constante movimento, é um compósito de imagens das coisas simples da vida, é um lugar onde se alojam as memórias que constituem o sentido comum da nossa vida, é uma agência de sentidos que nos liberta das imagens do passado, da evidência do presente e nos remete

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para a possibilidade de concretização de sonhos adormecidos. E o sonho é procurarmo- nos nos outros e com os outros.

Segundo Maffesoli, não existe uma verdade geral, todas as verdades são parciais e podem entrar num processo relacional umas com as outras (1997). Este autor convoca a nossa atenção para a necessidade de meditarmos nas características essenciais do racionalismo e do seu capricho que consiste em incluir tudo, dentro uma categoria explicativa e totalizadora, impedindo, desta forma, e através da “força bruta do conceito” (1997, p. 35), que se “tome a vida pelo que é” (1997, p. 60). Os grandes sistemas explicativos, iniciados no século XIX, estabeleceram um corte com o real, com o sentido comum, com os aspectos concretos da vida quotidiana. Mas, como afirma Maffesoli, o “sentido comum pode ser visto como uma forma de resistência que assegura, com a passagem do tempo, a perdurabilidade social” (1997, p. 234).

Mas este sentido comum também pode ser “tão totalizador como qualquer outro; nenhuma religião é mais dogmática, nenhuma ciência é mais ambiciosa, nenhuma filosofia mais geral. Suas matizes são distintas, como são os argumentos a que apelam, ainda que, como estes, – e como a arte e a ideologia –, pretenda passar da ilusão à verdade para, […], expressar as coisas tal como são” (Geertz, 1994, p. 106). Embora as nossas narrativas tomem todos estes pressupostos como orientação, não desejamos ficar prisioneiros deles, nem tão pouco, por causa deles, deixaremos de narrar o que pensamos dever ser narrado (cf. Bourdieu, 2005).

Em síntese: a nossa história experiencial não é alheia à nossa opção, e é-o de tal forma que desenvolvemos mecanismos de escuta de modo a libertar o pensamento

daquilo que ele pensa silenciosamente e permite pensar de um modo diferente.

Demonstrámos que a nossa identificação e relação identitária, com um passado histórico que investigámos, determinaram a nossa opção. A nossa relação com o Beco

do Petinguim é a continuidade das relações que com ele tiveram os nossos

antepassados. O Beco do Petinguim é uma encruzilhada de gentes que vivem numa

comunidade de vizinhos, não tem fronteiras fixas nem tão pouco intransponíveis, os

interdependência e conflito. Aqui aprendemos a ouvir as estórias dos nossos antepassados, através das narrativas da nossa avó Esperança.

Teremos conseguido responder às perguntas que fizemos no início deste capítulo?

Possivelmente, sim! Mas as respostas àquelas perguntas fizeram emergir outras: Que importância tem, para nós e para os que nos lêem, conhecer os nossos avós e bisavós? Por que não deixamos os mortos em paz? Tratemos antes da nossa vida!

É, de facto, importante deixarmos os mortos em paz. Mas não a sua memória, a que nos legaram, não só porque lembrá-los é uma forma de os eternizar, mas, sobretudo, porque é um modo iluminado de explicarmos quem somos, por que somos e o que queremos ser. (cf. Maalouf, 2004, p. 227). Assim, “Reduziu-se o sono / Cresceram os sonhos do sono / interrompido.” (Silva, 2007, p. 35).

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