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Modelo ecológico para compreender a violência

CAPÍTULO 5 A PESQUISA: ATORES ESCOLARES NA GESTÃO DE CONFLITOS E VIOLÊNCIA EM MEIO ESCOLAR

5.2.2. CONCEÇÃO DE CONFLITO E RELAÇÃO CONFLITO-VIOLÊNCIA

A cada um dos alunos que participaram da pesquisa (através de um questionário), foram apresentadas cinco alternativas sobre o significado de conflito: ausência de diálogo, manifestações destrutivas, manifestações construtivas, manifestações comuns às relações interpessoais e manifestações construtivas e destrutivas; seguidamente, foi-lhes solicitado que optassem por aquela que, na sua opinião, melhor correspondia ao significado de conflito em meio escolar.

Os resultados indicaram que 40% dos alunos da Escola A, 45% da Escola B e 52% da Escola C consideravam o conflito uma manifestação destrutiva, a que se seguiu a ausência de

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diálogo, como segunda escolha, por parte de 30% dos alunos da Escola A, 25% da Escola B e 32% da Escola C.

Perguntou-se, então, aos professores e gestores, qual a sua visão sobre o significado dos conflitos escolares e da relação existente entre conflito-violência. Os depoimentos dos professores das três escolas pesquisadas sugerem que a conceção prevalecente, em âmbito escolar, sobre o significado de conflito é a visão negativa de conflito, que percebe as divergências, incompatibilidades e desacordos como sintomas de mal-estar que devem, a todo o custo, ser superados.

“Conflitos são ideias, opiniões divergentes que podem atrapalhar o bom andamento do ambiente escolar” (P1- Escola Aloysio da Costa Chaves).

“Conflitos são confrontos de ideias e pensamentos nos vários segmentos na escola” (P2 – Escola Aloysio da Costa Chaves).

“Conflitos são desentendimentos entre alunos, entre alunos-professores, professores- gestores, gestores-agentes escolares” (P7 – Escola Aloysio da Costa Chaves). “São pequenos conflitos que acontecem e, que para mim, são problemas internos com professores, alunos, direção e pais de alunos” (P13 – Escola Aloysio da Costa Chaves).

“O conflito é na escola uma preocupação muito grande para a gestão e para todos os que estão envolvidos. Significa que a escola precisa saber de aonde vem e de como saná-lo” (P14 – Escola Aloysio da Costa Chaves).

“Conflitos são divergências de ideias e opiniões que geram discussões agressivas entre os membros da comunidade escolar” (P1 – Escola Acy de Jesus Barros). “Conflitos são situações atípicas que visam intervenções necessárias por parte dos gestores, coordenadores e outros, como mediadores das diversas situações” (P4 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Conflitos refere-se a um conjunto de circunstâncias que levam a situações de não harmonia entre pessoas, tais como pensamentos ou opiniões contrárias uma das outras. A escola propicia isso devido à grande concentração de pessoas” (P7 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Conflito é toda situação de divergência que acontece em decorrência da hostilidade, do preconceito, da falta de respeito e, principalmente, por atitudes e opiniões diferentes” (P16 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Conflito, em minha opinião, é tudo aquilo que causa afastamento do outro, quando não há nenhuma concórdia, seja de forma verbal, emocional e física” (P17 – Escola Acy de Jesus Barros).

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“Conflito na escola significa as crises e tensões que tornam o clima escolar insustentável e difícil de conviver” (P20 - Escola Acy de Jesus Barros).

“Conflito significa desentendimento entre os diversos segmentos escolares, um fator bastante preocupante, onde a família participa pouco e a escola não pode obter cem por cento de êxito, haja vista que devem caminhar juntas, principalmente no requisito ensino-aprendizagem” (P1 - Escola São Francisco Xavier).

“Conflito são todas as formas de desentendimento, seja entre aluno-aluno, professor- corpo técnico, professor-professor, professor-aluno. São todas as faltas de comunicação entre atores passivos ou ativos na escola” (P2 – Escola São Francisco Xavier).

“Conflitos são situações que por falta de entendimento entre os envolvidos se repetem ou se agravam cada vez mais” (P7 – Escola São Francisco Xavier).

“Conflito é tudo aquilo que foi trabalhado de forma insatisfatória, até tudo que gera desconforto na aprendizagem, na vida social e cultural do indivíduo que frequenta o espaço escolar.” (P12 – Escola São Francisco Xavier).

“Conflitos são casos de desentendimentos, violências e indisciplinas que ocorrem entre agentes escolares, alunos e família de alunos.” (P13 – Escola São Francisco Xavier).

“Conflitos são discussões e discórdias entre as pessoas da escola.” (P19 – Escola São Francisco Xavier).

A maioria dos gestores que participaram da pesquisa concordam com a visão de conflito numa perspetiva negativa.

“Conflito escolar significa o somatório de divergências e opiniões contrárias, que na maioria das vezes, dificultam a dinâmica escolar e o processo ensino-aprendizagem e provoca sensação de vazio e caos na escola” (G15 – Escola Aloysio da Costa Chaves).

“Conflito significa situações que envolvem várias problemáticas de agressão física, verbal, as quais geram desentendimentos e, consequentemente, violência no espaço escolar” (G8 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Conflito na escola é um fenômeno das relações interpessoais nos diversos grupos existentes no contexto escolar, sendo que esses grupos, quando não conseguem conviver com as diferenças se tornam divergentes, proporcionando violências.” (G2 – Escola São Francisco Xavier).

Juntamente com a visão negativa de conflito, constatou-se, nas escolas pesquisadas, que a maioria considera que existe uma relação entre conflitos e as manifestações de violência em meio escolar, confirmando a definição de Kriesberg (2007) de conflito negativo, segundo a qual

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o antagonismo entre os participantes origina danos, pelo menos a uma das partes envolvidas, e quanto mais coercivos e violentos os meios empregues, mais destrutivo tenderá a ser o cenário final. Os depoimentos de professores e gestores, que a seguir se transcreve, reforçam essa visão.

“Um professor estressado, impaciente, intolerante e como esse está sempre em contato com uma diversidade de alunos, certamente se depará com aqueles que já se encontram em situação de risco, logo haverá relação conflituosa que chegará a uma violência” (P4 – Escola Aloysio da Costa Chaves).

“Eles estão intimamente relacionados, por exemplo, os espaços inadequados para a prática de ensino, o que desencadeia numa série de situações de violência aos alunos e demais funcionários do espaço escolar” (P9 – Escola Aloysio da Costa Chaves). “Sempre os conflitos são percebidos através de conversas de grupos e podem levar a violência em sua continuidade” (P15 – Escola Aloysio da Costa Chaves).

“Com as discussões que acontecem nas salas de aula temos o conflito que sempre leva a violência” (P19 – Escola Aloysio da Costa Chaves).

“É uma relação direta onde o conflito gera a violência escolar” (P1 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Os dois se fundem, pois as formas de conflitos passam à violência física, podendo ser verbal” (P5 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Na maioria das vezes, todos querem ter razão naquilo que pensam e isso é conflito que, se não chegar a um acordo pode sim gerar violência verbal e física” (P7 – Escola Acy de Jesus Barros).

“É uma relação de causa e efeito, porque quando há conflito e as pessoas não sabem lidar com ele ou não tomam providências, isto acaba se transformando em violência” (P12 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Acredito que as diversas situações de conflitos não resolvidos na escola são as principais causas de nossas escolas serem violentas” (P19 – Escola Acy de Jesus Barros).

“A falta de diálogo nas relações pedagógicas leva aos conflitos e conflitos permanentes, não resolvidos, certamente levarão a violência” (P20 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Quando um conflito não é resolvido de forma eficaz, através do diálogo, acaba gerando confusões e brigas, ou seja, a violência” (P2 – Escola São Francisco Xavier).

“Entendo conflito como algo negativo que atinge a escola e que precisa de resolução, se não resolvido, gradativamente, levará as manifestações de violência” (P9 – Escola São Francisco Xavier).

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“Penso que ambos caminham juntos, pois se há discórdias, logo se tem violências e agressões” (P10 – Escola São Francisco Xavier).

“A relação é muito visível, pois na maioria das vezes o conflito causa a violência” (P13 – Escola São Francisco Xavier).

“Percebo uma linha tênue, pois a violência tem seu início sempre em um conflito” (P14 – Escola São Francisco Xavier).

“Vejo o conflito como situações repletas de muitas desavenças constantes que deparamos nos espaços escolares e, às vezes, difíceis de soluções que geralmente terminam em empurrões, tapas, brigas violentas e, em alguns casos, em ferimentos graves” (P17 – Escola São Francisco Xavier).

“A indiferença na escola leva aos conflitos entre as pessoas, principalmente os alunos, e quando mantida, a consequência lógica, acredito eu, seja a violência, que seria uma maneira de enfrentar a indiferença” (P20 – Escola São Francisco Xavier). “Ambas estão intrinsecamente ligadas, a primeira (conflito) abre precedentes para a segunda (violência)” (G2 – Escola São Francisco Xavier).

“Ambas estão inter-relacionadas, pois um conflito mal resolvido gera uma violência” (G6 – Escola Acy de Jesus Barros).

“Uma vez que os conflitos não sejam trabalhados adequadamente, a violência ganhará força no ambiente escolar” (G11 – Escola Aloysio da Costa Chaves). Os vários depoimentos atrás referidos remetem para a questão do porquê de, na maioria das vezes, nas representações coletivas dos atores escolares, o conflito e a violência se sobreporem. Na contemporaneidade, a violência, com toda a sua multiplicidade de facetas (Abramovay, 2002), é percebida como um fenómeno heterogéneo, cujas fronteiras dificilmente podem ser ordenadas e delimitadas (Charlot, 2002). Trata-se, efetivamente, de um fenómeno complexo, de caráter polissémico, logo, não indivisível (Debarbieux, 2007), que explode de fora para dentro da escola, mas, igualmente em sentido inverso, de dentro para fora (Loureiro, 1999), fazendo com que qualquer situação de incompatibilidade e divergência seja percebida através do seu valor negativo.