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Modelo ecológico para compreender a violência

CAPÍTULO 5 A PESQUISA: ATORES ESCOLARES NA GESTÃO DE CONFLITOS E VIOLÊNCIA EM MEIO ESCOLAR

5.1.3. A HISTORICIDADE DE UM CONTEXTO LOCAL

O município de Barcarena é um antigo distrito de Belém elevado à categoria de município pelo Decreto-Lei estadual n 4505, de 30 de dezembro de 1943. Situa-se à latitude 01 30 21 sul r à longitude 48 37 33 oeste, a uma altitude de 15 metros em relação ao nível do mar, e conta com uma população estimada em 112.921 pessoas, em 2014.

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Figura 10 - Percurso fluvial de Belém a Barcarena. Fonte: Arquivo do autor.

Na década de 70 do século XX, em consonância com o tão propalado desenvolvimento económico nacional e regional, foi transformado num grande polo industrial, voltado para o beneficiamento e exportação de caulino, alumina e alumínio e, ainda, a produção de cabos para a transmissão de energia elétrica, sem que a população local tivesse dado o seu acordo.

A implantação desta indústria coube à companhia Vale do Rio Doce, que recorreu ao complexo industrial Albrás-Alunorte, para processar a bauxite e convertê-la em alumina, que posteriormente, a Vale do Rio Doce transformava em alumínio. Importa ressaltar que as ações do referido complexo têm gerado um impacto violento no meio ambiente e nas culturas locais, como acontece com o rio Murucupi, por várias vezes contaminado pelos resíduos da bauxite, provocando o envenenamento, morte e extinção de várias espécies de peixe e a destruição das relações nativas de trabalho dos pequenos pescadores e ribeirinhos.

O artigo da jornalista Magali Moser (2013) para a Agência Deutsche Welle, posteriormente publicado pelo Ecodebate, em 16 de setembro de 2013, com base num relatório do Instituto Evandro Chagas, ligado ao Ministério da Saúde, revela que a Albrás, a oitava maior fábrica de alumínio do mundo, e a Alunorte, a maior fábrica internacional de alumina, são responsáveis por danos à saúde dos moradores de Barcarena, no estado do Pará. O estudo comprova que as etapas de produção deixam marcas profundas na terra, na água e no ar, além de prejudicarem a pele, os olhos e pulmões dos trabalhadores e da população, na vizinhança das fábricas de alumínio.

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O estudo teve início na segunda metade de 2008, mas já desde 2001 chegavam à reconhecida instituição de pesquisa numerosas reclamações e denúncias dos impactos ambientais na área. Em 2007, o IEC passou a avaliar as denúncias de despejo de efluentes do processo de beneficiamento da bauxite nos igarapés e braços de rio da região. Ainda em julho do mesmo ano, uma das bacias de deposição de resíduos rompeu; nos anos seguintes, o problema piorou, nomeadamente com a descarga de efluentes alcalinos que, por várias vezes, afetaram o rio Mucurupi, tendo o mais grave ocorrido em 2009.

Segundo o sindicato dos metalúrgicos do município de Barcarena, através do seu presidente Josenildo Vilhena, dos 120 mil habitantes, apenas sete mil trabalham na Albrás – Alunorte. Estes trabalhadores sofrem grandes pressões relativamente à produtividade e cumprimento de metas, situação que se agravou a partir do momento em que a Albrás passou o centro de capital estrangeiro para a companhia estatal norueguesa, reduzindo, acentuadamente, o seu quadro de trabalhadores. O impacto ambiental foi muito forte porque, para se produzir cem milhões de toneladas de alumina, da natureza têm de ser retiradas 12 milhões de toneladas de bauxita, o que significa muita terra revirada, muitos lençóis freáticos agredidos e uma intensa agressão à natureza.

A Albrás – Alunorte questiona relatório, argumentando que emprega equipas especializadas, que trabalham em conjunto com as comunidades de Barcarena, e realizam investimentos sociais com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos habitantes.

A Superintendência Regional do Pará reconhece que a produção de alumínio é fruto de um processo agressivo, mas alega não dispor das infraestruturas necessárias para aumentar o nível de fiscalização do complexo. Hermínio Albuquerque de Castro, pesquisador do problema, na região, e hoje Diretor Nacional de Saúde Pública, alerta para o facto de que para além de uma depredação cruel do ambiente, se está a afetar diretamente a saúde pública, pois o alumínio é considerado, pelos órgãos internacionais, uma substância altamente cancerígena.

As denúncias apresentadas por Magali Moser (2013) situam-se na confluência do localismo globalizado e do globalismo localizado, perpetrados pelas grandes corporações transnacionais, protagonistas centrais do capital financeiro, demonstrando o que é bom para o capital norueguês tem um efeito extremamente devastador para a Amazónia, para a população nativa de Barcarena e para o meio ambiente.

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A eliminação do comércio de proximidade; criação de enclaves de comércio livre ou zonas francas; desflorestação e destruição maciça dos recursos naturais para pagamento da dívida externa; uso turístico de tesouros históricos, lugares ou cerimônias religiosas, artesanato e vida selvagem; dumping ecológico; conversão da agricultura de subsistência em agricultura para exportação como parte do ajustamento estrutural; etnicização do local de trabalho (desvalorização do salário pelo fato de os trabalhadores serem de um grupo étnico considerado inferior ou menos exigente) (Santos, 2011, p. 66).

Figura 11 - Porto de Vila do Conde, no município de Barcarena. Fonte: Arquivo de Ricardo Borges Gonçalves.

A somar aos danos ambientais, há um grande fluxo migratório de pessoas de outras regiões do país, que vieram para aqui trabalhar, na fase inicial do projeto, que aqui ficaram, e que hoje, na sua maioria, se encontram desempregados ou a recorrer ao subemprego, o que demonstra que, paredes meias com os grandes empreendimentos transnacionais, convivem a miséria e o crescimento acentuado da desigualdade social.

Vivendo da agricultura e da pesca, em alguns rios e braços de rio ainda não contaminados, a maioria da população nativa resiste a todo custo; vira-se para o artesanato, procurando nas matas ainda existentes as sementes, cipós, talas de gurumã, jupati, piaçaba, nó e bambu que constituem a matéria-prima com tecem a sua existência.