• Nenhum resultado encontrado

2.5 A Competitividade e suas abordagens

2.5.1 Conceitos e divergências

Após a breve incursão na linha do tempo sobre os tipos de vantagens econômicas na competição e suas abordagens teóricas (desde as absolutas abordadas por Smith ou comparativas introduzidas por Ricardo até os conceitos de região e território), o tema vantagem competitiva ou competitividade começa a despertar maior interesse teórico dos estudiosos a partir da década de 70. Isso ocorre “vis a vis” o esgotamento do poder explicativo das teorias de comércio internacional baseadas nas vantagens comparativas de Ricardo (custo de oportunidade) e suas derivações teóricas.

É importante destacar que com relação à questão das vantagens, existe uma alteração da linha teórica até então analisada. Enquanto as teorias de vantagens absolutas e vantagens comparativas estão centradas no campo das teorias de comércio internacional, tendo como pressupostos, dentre outros, a não mobilidade dos fatores, a concorrência perfeita nos mercados e custos constantes à escala; quando é abordado o tema das vantagens competitivas ou da competitividade, de uma forma geral, os conceitos estão mais relacionados ao campo das teorias ligadas ao campo da economia industrial ou da empresa.

Dessa forma, muito se tem discutido sobre o tema sendo várias definições elaboradas por diversas correntes teóricas sem que se chegasse a uma definição única e acabada. Entretanto, o termo extrapola sua ambiência teórica e começa a ser utilizado de forma generalizada e indiscriminada tanto dentro quanto fora dos meios acadêmicos. Essa popularização do termo em nada auxiliou a construção de conceitos e postulados que pudessem compor um corpo teórico. Vale ressaltar também a complexidade do assunto, em termos teóricos, e uma questão particular que ainda recai sobre o termo que é a sua utilização pelas teorias econômicas e pelas teorias organizacionais a partir do final da década de 70 e início da de 80.

Em termos de teoria econômica, a análise dos elementos macroeconômicos e microeconômicos apresentava-se, até então, insuficiente para explicar a maior parte dos comportamentos das variáveis ambientais. O foco de análise adotado levava a

uma compreensão parcial dos fenômenos econômicos a partir da ótica ortodoxa das escolas clássicas e neoclássicas.

Dessa forma, a teoria econômica buscou encontrar novas concepções / formulações que auxiliassem o entendimento do comportamento das organizações, indústrias / segmentos e regiões ou mesmo países, surgindo então, dentre outros conceitos, o de competitividade ou de vantagens competitivas. Segundo Vasconcelos30 (2000) “a partir dos anos 70, diversas correntes do pensamento econômico abordaram a questão da vantagem competitiva utilizando abordagens conceituais diferentes”. Apesar de inúmeros estudos e tentativas de definições, os economistas não conseguiram consenso com relação a uma definição única sobre competitividade.

No entanto, dentre as abordagens sobre o tema, cabe destacar o trabalho de Chudnovsky31 (1990) que tenta sistematizar varias definições de competitividade (conforme quadro a seguir), propondo a existência de enfoques macroeconômicos e microeconômicos nos conceitos de competitividade.

Kupfer32 (1992) analisa os enfoques propostos por Chudnovsky ressaltando que no enfoque microeconômico as definições de competitividade estão centradas na firma (quadro 01), mesmo que para alguns teóricos, as definições possam ser generalizadas, por extensão, para regiões ou países. Já no enfoque macroeconômico as definições de competitividade aparecem invariavelmente como capacidades de economias nacionais apresentarem resultados econômicos satisfatórios (quadro 02),

30

Vasconcelos , F.C. Vantagem Competitiva: Os modelos teóricos atuais e a convergência entre estratégia e teoria organizacional. RAE – Revista de Administração de Empresas. Out./dez. 2000. São Paulo, v.40. n. 4. p.20-37.

31

Chudnovsky, D. La Competitividad Intenacional: Principales Cuestiones Conceptuales y Metodológicas. *Documento revisado del estudio preparado para el Centro de Estudios e Investigación de Postgrado CEIPOS), Universidad de la República, Uruguay en enero de 1990.

32

ou ainda, de forma mais abrangente, apresentar esses resultados econômicos simultaneamente à melhoria no nível de vida da população (quadro 03).

Chudnovsky identifica que a passagem do nível microeconômico para o macro sustenta algumas dificuldades. O primeiro ponto salienta a dificuldade de identificação do sujeito / agente, que em nível micro pode ser identificado facilmente como a firma, mas que em nível macro suscita dúvidas. O segundo ponto é a definição de critérios objetivos para medição da competitividade, bem como a identificação das fontes de competitividade.

Definições centradas o conceito da firma

“Competitividade é a aptidão de vender aquilo que é produzido” (Mathis et al, 1988) "Significa a capacidade das empresas de um dado país de conceber / desenhar, desenvolver, produzir e vender seus produtos em concorrência com outras empresas baseadas em outros países" (Alic, 1987, pag. 5)

"A competitividade industrial é uma medida da capacidade imediata e futura dos empresários de conceber, produzir e vender produtos cujos atributos em termos de preço e além dos preços configurem um pacote mais atrativo que os produtos similares oferecidos pelos competidores: onde o juiz final será o mercado"(European Management Forum, 1980, citado por Chesnais, 1981, pág.10)

"A capacidade de uma indústria (ou empresa) de produzir bens com padrões de qualidade específicos, requeridos por determinados mercados, utilizando recursos em níveis iguais ou inferiores aos utilizados por indústria semelhantes no resto do mundo por um determinado período de tempo" (Haguenauer, 1989, pag. 23)

"Uma economia é competitiva na produção de um determinado bem quando pode, pelo menos, igualar os padrões de eficiência vigentes no resto do mundo em termos de utilização de recursos e qualidade do bem" (Tavares de Araujo Jr et al, 1989, pag 1 y 2) "Uma firma (ou uma economia nacional) será competitiva se é vitoriosa (possui uma boa colocação) em sua confrontação com seus competidores no mercado (nacional ou mundial)" (Michalet, 1981, pag.1, subrayado en el original)

Quadro 01: Definições de Competitividade – Conceito da firma.

Fonte: Elaborado a partir do texto La Competitividad Intenacional: Principales Cuestiones Conceptuales y Metodológicas. CHUDNOVSKY, 1990. Elaboração própria.

Definições centradas na capacidade de uma economia nacional em atuar no comércio internacional

"Se identifica a competitividade com a capacidade de fazer retroceder os limites de restrição externa..." Mathis et al (1988) (pág. 7).

"A capacidade de um país (ou grupo de países) de enfrentar a competição a nível mundial. Inclusive tanto a capacidade de um país exportar e vender nos mercados externos como sua capacidade de defender seu próprio mercado doméstico da excessiva penetração das importações" (Chesnais, 1981, pág. 8).

“É basicamente a participação das exportações de um país no mercado mundial” (Fouquin, 1986).

Quadro 02: Definições de Competitividade – Comércio internacional.

Fonte: Elaborado a partir do texto La Competitividad Intenacional: Principales Cuestiones Conceptuales y Metodológicas. CHUDNOVSKY, 1990. Elaboração própria.

Definições centradas não apenas em termos de comércio internacional ou da defesa do mercado nacional, mas no bem estar econômico e aumento

do nível de renda

"A capacidade de um país em alcançar objetivos fundamentais de política econômica, tais como o crescimento de entradas e empregos, sem incorrer em dificuldades na balança de pagamentos " (Fagerberg, 1988, pag. 355)

"É quando uma nação pode, em condições de livre comércio, produzir bens e serviços que satisfaçam as exigências dos mercados internacionais e simultaneamente, manter ou expandir a renda de seus cidadãos" (President's Commission on Industrial Competitiveness, 1985, pag. 6)

"A capacidade de produzir, distribuir e prover bens e serviços na economia internacional em concorrência com bens e serviços de outros países, e fazê-lo de forma a aumentar o nível de vida da população" (Scott, 1985, pag.14 y 15)

"É quando um país, em um mundo de mercados abertos, produz bens e serviços que satisfaçam as exigências do mercado e simultaneamente expanda seu PIB per capitã, ao menos tão rapidamente quanto seus parceiros comerciais " (Jones y Teece, 1988, pag. 108)

"A capacidade de um país para sustentar e expandir sua participação nos mercados internacionais e elevar simultaneamente o nível de vida de sua população. Isto exige o incremento da produtividade e, por último, a incorporação de progresso técnico" (Fajnzylber, 1988, pag. 13)

Quadro 03: Definições de Competitividade – Bem estar econômico.

Fonte: Elaborado a partir do texto La Competitividad Intenacional: Principales Cuestiones Conceptuales y Metodológicas. CHUDNOVSKY, 1990. Elaboração própria.

Kupfer (1992) não concorda com o posicionamento de Chudnovsky (1990) com relação ausência de dificuldades na conceituação de competitividade em termos microeconômico, o qual seria:

[…] A nivel microeconómico el concepto de competitividad no ofrece mayores dificultades. Em primer lugar, el agente económico de que se trata es fácilmente identificable, una empresa productora de bienes o servicios. En segundo lugar, dicha empresa está dirigida por sus dueños o ejecutivos que fijan una estrategia de producción y comercialización y, eventualmente, de desarrollo tecnológico y toman decisiones para poner en práctica dicha estrategia. Finalmente, los resultados obtenidos se van a reflejar en las ventas logradas y, por ende, en la participación en el mercado respectivo. Aún cuando a veces una mayor participación en el mercado se logra a costa de los márgenes de ganancia, es lícito suponer, en el mediano plazo, una correlación positiva entre participación en el mercado y márgenes de ganância. (CHUDNOVSKY, D. La Competitividad Intenacional: Principales Cuestiones Conceptuales y Metodológicas.p.10)

Kupfer (1992) justifica ainda sua discordância postulando que mesmo em nível microeconômico, estabelecer uma noção precisa e operacionalizável de competitividade encerra ainda muitas dificuldades:

[...] A seleção de estratégias competitivas e a tomada de decisão empresarial está longe de ser um processo trivial, mormente em ambientes sujeitos a inovação tecnológica, pois as informações que condicionam esse processo não podem ser completamente obtidas dos sinais emitidos a cada instante pelo mercado.

A noção de competitividade, portanto, não pode prescindir de fundamentos microeconômicos genéricos, que sejam pertinentes com suas particularidades enquanto objeto analítico. Esses fundamentos, por sua vez, são demarcados pela dinâmica do processo de concorrência, em particular, pela interação entre as condições estruturais que o direcionam e as condutas inovativas das empresas que o transformam.(KUPFER, D. Padrões de Concorrência e Competitividade .p.01. 1992)

Essa correlação entre os conceitos de competitividade e de concorrência feita por Kupfer (1992) é importante para a compreensão da complexidade que envolve as definições de competitividade. No enfoque do autor, depreende-se que sem os conceitos de concorrência e a as noções de firma, industria e mercado com a identificação de suas variáveis básicas descritivas, não existe, a princípio, competitividade.

Haguenauer33 (1989) procurou sistematizar conceitos de competitividade em dois grandes grupos. Os conceitos de competitividade baseados no desempenho e na eficiência:

CONCEITO DESEMPENHO

[...] A noção mais simples, implícita em grande parte dos textos, associa competitividade ao desempenho das exportações industriais. Trata-se de um conceito ex-post, que avalia a competitividade através de seus efeitos sobre o comércio externo: são competitivas as indústrias que ampliam sua participação na oferta internacional de determinados produtos. Além de ser quase intuitivo, a vantagem deste conceito está na facilidade de construção de indicadores, argumento utilizado, por exemplo, por Gonçalves (1987) na análise das exportações brasileiras. É ainda o conceito mais amplo de competitividade, abrangendo não só as condições de produção como todos os fatores que inibem ou ampliam as exportações de produtos e / ou países específicos, como as políticas cambial e comercial, a eficiência dos canais de comercialização e dos sistemas de financiamento, acordos internacionais (entre países ou empresas), estratégias de firmas transnacionais, etc..

Mesmo autores que incorporam outros elementos à noção de competitividade enfatizam o papel do desempenho exportador no conceito: “a competitividade consiste na capacidade de um país para manter e expandir sua participação nos mercados internacionais e elevar simultaneamente o nível de vida de sua população. (Fajnzylber, 1988, p.13)”.(HAGUENAUER, L.

33

- Haguenauer, L. Competitividade: Conceitos e Medidas: Uma resenha da Bibliografia recente com ênfase no caso brasileiro. Texto para discussão n. 211. p.02. UFRJ / IEI. 1989.

Competitividade: Conceitos e Medidas: Uma resenha da Bibliografia recente com ênfase no caso brasileiro .p.02. 1989) CONCEITO EFICIÊNCIA

[...] Outra linha de autores vê a competitividade como uma característica estrutural, conceituando-a como a capacidade de um país de produzir determinados bens igualando ou superando os níveis de eficiência observáveis em outras economias. O crescimento das exportações seria uma provável conseqüência da competitividade, não sua expressão. Em relação à competitividade no desempenho, é um conceito potencial, ex-

ante, e geralmente restrito às condições de

produção.(HAGUENAUER, L. Competitividade: Conceitos e Medidas: Uma resenha da Bibliografia recente com ênfase no caso brasileiro .p.03. 1989)

Essa sistematização efetivada pela autora leva a uma outra possível caracterização sobre a abordagem da competitividade que é seu enfoque ex-ante ou ex-post. Segundo Kupfer, o conceito competitividade desempenho tenderia a um enfoque ex- post, ou seja, como resultado de um vasto conjunto de fatores utilizados pelo agente. E o conceito competitividade eficiência estaria atrelado a um enfoque ex-ante, ou seja, o grau de capacitação detido pela firma de concorrer.

Ambos enfoques auxiliam no entendimento das dimensões dos conceitos de competitividade, porém, não extinguem as limitações conceituais efetivadas até então, pois, não conseguem ainda tratar o caráter estático das abordagens. Kupfer analisa que, em uma abordagem dinâmica, os conceitos e enfoques sobre competitividade relacionando com desempenho e eficiência são tautológicos, não se podem, em princípio, estabelecer relações diretas de causalidade.

Fanjzylber34 além de sua conceituação para competitividade acrescenta uma nova dimensão para o conceito.

34

- Fajnzylber, F. (1988).Competitividad Internacional: Evolucion y Licciones; Revista de La Cepal; n. 36; Santiago.

[...] A capacidade de um país para sustentar e expandir sua participação nos mercados internacionais e elevar simultaneamente o nível de vida de sua população. Isto exige o incremento da produtividade e, por último, a incorporação de progresso técnico[...] (Fajnzylber, F. (1988).Competitividad Internacional: Evolucion y Licciones; Revista de La Cepal; n. 36; Santiago).

Segundo o autor a competitividade pode ser considerada espúria se consistir em ganhos de produtividade e de fatias de mercado conquistados através de um empobrecimento da nação / região (salários baixos e subsídios); e, a competitividade legítima que consiste em um conceito com forte vinculação à incorporação de progresso técnico, dinamismo industrial e elevação da produtividade.

Possas e Carvalho35 (1990), ainda sob a ótica da firma, definem competitividade como sendo “o poder de definir (formular e implementar) estratégias de valorização do capital, desde que baseado em aspectos econômicos e não institucionais”.