• Nenhum resultado encontrado

2 DOS CONCEITOS DE SISTEM A, ECOSSISTEM A E SISTEM A SOCIO-ECOLÓGICO ENQUANTO BASE DE UM A VISÃO SISTÉM ICA DA PAISAGEM

No documento ÍNDICE DO VOLUME IV (páginas 66-75)

VISION AND M ETHOD: CONTRIBUTION OF THE SYSTEM IDEA IN THE READING AND CONSTRUCTION OF THE CONTEM PORARY LANDSCAPE

2 DOS CONCEITOS DE SISTEM A, ECOSSISTEM A E SISTEM A SOCIO-ECOLÓGICO ENQUANTO BASE DE UM A VISÃO SISTÉM ICA DA PAISAGEM

A noção de paisagem, e de paisagem urbana, como sistema vivo e como sistema complexo tem as suas origens no século XIX e está presente em abordagens desenvolvidas, entre outras, por F. L. Olmsted, L. M umford, J. Jacobs ou C. Alexander. M ais recentemente, as noções de sistema aberto e sistema sócio ecológico acrescentam aos conceitos anteriores novas possibilidades, permitindo uma aproximação progressiva à ideia de paisagem enquanto realidade complexa, palco de interações naturais-culturais.

A construção de uma visão sistémica contemporânea da paisagem tem na sua base um conjunt o de conceitos, que permitem uma progressiva aplicação dos princípios dos sistemas complexos à paisagem. Estes conceitos são: sistema aberto, ecossistema e sistema sócio ecológico. Todos

67

eles estão ancorados numa visão holística que, desde a antiguidade, tem procurado compreender a realidade a partir do “ todo” , privilegiando, não apenas as partes que a compõem, mas também o modo como estas se influenciam mutuamente .

2.1 - Sistema

O termo sistema (que deriva da língua grega) foi formalmente introduzido nas ciências modernas, concretamente na termodinâmica, no início do século XIX. Até aos anos 40 do século XX foi usado por vários cientistas, especialmente em correntes orientadas para uma visão holística da realidade . Contudo, foi o biólogo austríaco Ludwig von Bertanlaffy (1901-1972) que na Teoria Geral de Sistemas (TGS), desenvolvida na primeira metade do século XX, formulou o conceito moderno de sistema, o sistema aberto. A TGS colocou em evidência que a noção de sistema formulada pela termodinâmica clássica (baseada no encerramento do sistema, equilíbrio termodinâmico e aumento de entropia) não descrevia corretamente os organismos vivos, cuja sobrevivência depende de uma alimentação exterior contínua e que evoluem no sentido da ordem e não da desordem. Em alternativa concebeu um sistema aberto, onde as constantes trocas de energia e matéria permitem uma permanente reposição dos componentes e asseguram a sua manutenção num estado de aparente equilíbrio, diferente do equilíbrio que ocorre nos sistemas fechados.

Esta nova noção de equilíbrio, inerente aos sistemas abertos, abriu caminho para outras formas de entender a realidade e os seus processos. Enquant o num sistema fechado o estado final é determinado pelas suas condições iniciais sendo possível antecipar o seu desenvolvimento, no sistema aberto não existe este tipo de relação linear entre as condições iniciais e o estado final, não podendo o seu desenvolvimento ser antecipado com exatidão. Assim, a incerteza e a imprevisibilidade passam a ser aceites como condições incontornáveis do comportamento do sistema aberto. O facto do conceito de sistema aberto ter sido formulado como uma noção ambígua, nem real nem puramente conceptual, possibilitou a sua aplicação a muitos campos diferentes do saber, a diversas realidades e a vários tipos de problemas complexos concretos, tanto no âmbito dos sistemas vivos como dos sistemas sociais . Um campo de aplicação, de particular interesse para o estudo e intervenção na paisagem, são os sistemas ambientais. A noção de sistema aberto foi fundamental na ecologia para a reformulação do conceito de ecossistema e para a sua ampliação no sentido da integração da componente ambiental e social.

68 2.2 - Ecossistema

O conceito de ecossistema, apesar de integrar a noção de sistema, teve um desenvolvimento inicial independente da TGS. A primeira utilização do termo, definido pelo biólogo britânico Arthur Tansley em 1935, encerra a ideia de que o ecossistema é o conjunto formado pela comunidade biótica e pelos componentes abióticos de um determinado lugar, bem como, pelas relações que se estabelecem entre estes component es. Este facto destaca-se na escolha do termo sistema (já usado pela física) que continha esta ideia de interação. À semelhança do conceito de sistema aberto, o conceito de ecossistema também foi formulado de um modo bastante aberto e relativamente flexível, o que lhe permite uma vasta aplicação e aceitação. Contudo, esta flexibilidade obriga à construção de m odelos para que possa ser efetivamente aplicado a situações reais. Ao contrário do conceito, que é genérico, os modelos já refletem teorias, princípios e ferramentas de análise específicas, relacionadas com os aspetos particulares que se pretendem investigar. Um dos modelos com maior relevância para o estudo da paisagem é o de ecossistema como sistema aberto que resulta da integração das propriedades do sistema aberto complexo da TGS no conceito de ecossistema. Este modelo entende o ecossistemas como um sistema aberto e complexo evidenciando, como principais propriedades, o equilíbrio dinâmico, a abertura ao exterior e a complexidade. O ecossistema aberto é profundamente influenciado pelas trocas que estabelece com a envolvente e também por perturbações, que desafiam o seu equilíbrio, mas que suportam o seu desenvolvimento.

2.3 - Sistema sócio ecológico

Na perspetiva do estudo da paisagem a noção de ecossistema aberto não fica completa se não incluir a componente social, indissociável da construção da paisagem. Todas as paisagens onde se regista a ação humana, e atualmente reconhece-se que não há nenhum habitat terrestre que não esteja sujeito, direta ou indiretamente, à influência humana podem ser entendidas como realidades complexas, onde interagem component es e processos ecológicos e humanos (individuais e sociais).

Apesar do conceito de ecossistema ter, desde a sua formulação inicial, abertura para incluir os seres humanos enquanto componente biológica do sistema, a sua participação não pode ser entendida apenas deste modo, uma vez que estes se organizam em sistemas sociais complexos. Assim, o estudo dos ecossistemas considerando a com ponente humana implica a construção de modelos híbridos que reúnam propriedades de ambos os tipos de sistemas complexos - ecológico e social - e ainda as propriedades que emergem das interações entre os dois tipos de

69

sistemas. Nas últimas décadas, abordagens transdisciplinares para as quais têm convergido os domínios científicos de vários ramos da ecologia e das ciências sociais, têm potenciado o aparecimento de modelos de (eco) sistemas que integram as componentes ecológicas e humana. Vários dos modelos propostos têm em comum o facto de entenderem que a interação dos sistemas humanos e ecológicos gera um novo tipo de realidade, com qualidades e propriedades que não são exibidas por cada um dos sistemas separadamente. Um destes modelos, o sistema sócio ecológico é particularmente adequado para o estudo da paisagem contemporânea, em particular da paisagem urbanizada.

A aplicação da ideia de sistema (ou de conceitos gerados por esta ideia) intervenção e gestão da paisagem não é uma estratégia nova. Também a noção de ecossistema está incorporada na prática de planeamento e de projet o (em especial na arquitetura paisagista) desde há muit o tempo.

A noção de cidade como um sistema vivo tem as suas origens no século XIX no âmbito do planeamento urbano. No início do século XX, Patrick Geddes identificou as cidades e a sua envolvente como um “ todo” , cujo desenvolvimento futuro deveria basear-se na identificação dos seus fluxos (processos) biológicos e sociais. Também na arquitetura paisagista esta visão sistémica da paisagem é evidenciada desde o século XIX em abordagens que destacam a importância da interdependência entre as componentes culturais e naturais na construção e funcionamento do sistema urbano. Estas ideias continuaram durante o século XX a serem integradas no planeamento, nomeadamente por Lewis M umford e M cHarg. Em Portugal, os conceitos de continuum naturale (1960) e de paisagem global (1990), dos arquitetos paisagistas portugueses F. Caldeira Cabral e G. Ribeiro Telles, expressam esta visão sistémica na leitura e atuação na paisagem.

Contudo, a referência explícita ao conceito de sistema complexo, promovida pela TGS e pelas teorias da complexidade, foi registado em dois contributos importantes para a incorporação desta ideia no estudo e intervenção na paisagem urbana. Em 1961, Jane Jacobs, urbanista e ativista canadiana, identificou a realidade urbana como um problema de complexidade organizada, idêntico aos que se colocam às ciências da vida, e sugeriu que as profissões envolvidas na construção da cidade olhassem para os modelos e ferramentas das ciências da vida, como uma referência para a construção dos seus próprios modelos de intervenção urbana. Quatro anos mais tarde, em 1965, o arquiteto e mat emático Christopher Alexander também relacionou a construção da paisagem urbana com teorias desenvolvidas no âmbito da matemática e do estudo dos sistemas complexos. No amplamente divulgado ensaio “ A City is Not a Tree” distinguiu a cidade natural, cujo aparecimento e desenvolvimento considerava

70

espontâneo, da cidade artificial ou planeada, concluindo que a complexidade existente na cidade natural é, como consequência da imposição do modelo urbano modernista, fortemente reduzida ou anulada. Afirmou que a razão pela qual as cidades planeadas são subordinadas a uma organização hierárquica, tem a ver com a procura de modos facilitados de raciocínio sobre problemas complexos, através da sua separação em subconjuntos não sobreponíveis e identificou a necessidade da formulação de modelos (diferentes dos modernistas) para lidar com a realidade urbana, sem anular a sua complexidade.

Posteriormente a estes contributos, um novo impulso para reforço da visão sistémica no estudo da paisagem veio da Ecologia Urbana, em particular a linha de investigação que entendia a paisagem urbana como um sistema, procurando compreender o seu metabolismo. O modelo de ecossistema aplicado à cidade, assumido por esta sub-disciplina da ecologia, contribuiu para que se consolidasse a noção de que os processos ecológicos também estavam presentes no ambiente urbano e que as cidades deviam ser vistas como fazendo parte do mundo natural. O conceito de ecossistema era assim aplicado à cidade, mas também, aos subsistemas que dela fazem parte.

O entendimento da paisagem como sistema, com implicações tanto no seu estudo como na gestão e intervenção, continuou a desenvolver-se na última década do século XX e início do século XXI, com a incorporação da noção de sistema aberto. A possibilidade da paisagem se expressar como sistema complexo, e em particular como sistema sócio ecológico complexo, tem especial interesse o estudo e intervenção na paisagem.

A paisagem, tal como é definida na Convenção Europeia da Paisagem (2000) é o resultado da interação entre fatores naturais e humanos. Os sistemas sócio ecológicos foram definidos por Berkes, Folke e Colding (1998) como sistemas complexos e integrados onde os seres humanos são parte da natureza. Neste sentido, o conceito identifica realidades complexas onde interagem componentes e processos ecológicos e humanos (individuais e sociais). Este é o caso de todas as paisagens onde se regista a ação humana, independentemente de se reportarem ao contexto rural ou urbano. A paisagem vista como um sistema sócio ecológico é considerada um sistema aberto complexo que tem como principais características o facto de se constituir como uma realidade complexa, com inúmeras componentes e interações, que exibe desenvolvimentos que não podem ser previstos, apenas antecipados em termos de probabilidade e que apresenta capacidades de resiliência, adaptação, auto-organização e emergência como reação a alterações nas condições externas ou internas do sistema. Finalmente, depende dos sistemas que se posicionam nas escalas superiores e inferiores.

71

Este reconhecimento de que as características e propriedades dos sistemas complexos, em particular do ecossistema aberto e do sistema sócio ecológico descrevem adequadamente a paisagem, é o primeiro passo para estabelecer uma visão sistémica contemporânea da paisagem. O segundo passo prende-se com a demonstração de que estas propriedades podem ser simultaneamente uma qualidade e uma ação, ou seja, podem ser identificadas no estudo/ leitura da paisagem, mas também podem ser usadas enquanto estratégias de transformação material desta mesma paisagem.

2.4 - Da visão à prática. A ideia de sistema na construção da paisagem contemporânea

Nesta segunda parte coloca-se em evidência, a partir da análise da prática e da teoria de projeto de paisagem contemporâneo, o modo como a aceitação da paisagem como sistema sócio ecológico complexo pode promover a articulação entre o estudo e a intervenção na paisagem. Em primeiro lugar interessa perceber que na perspetiva do projeto de arquitet ura paisagista, a ideia de sistema complexo aplicada ao projeto se regista principalmente de duas formas. Primeiro enquanto área de análise/ intervenção e segundo, direcionada para o próprio projet o. No que respeita à área de intervenção o projeto contemporâneo vê-a como uma realidade complexa, como um campo de interações entre inúmeras componentes, naturais e sociais, sujeitas a uma evolução temporal. A componente social é habitualmente desagregada em aspetos culturais, económicos, políticos e ainda pessoais ou individuais. Cumulativamente, reconhece, na paisagem a intervencionar, processos e propriedades dos sistemas complexos, nomeadamente a ligação à envolvente (contexto) e a capacidade de adaptação. Este entendimento da área de intervenção como um sistema sócio ecológico complexo foi estimulado por necessidades práticas relacionadas com as características apresentadas, atualmente, pelo tipo de áreas onde decorre a intervenção projetual. Estas são, muitas vezes, áreas de grande dimensão, com uma elevada complexidade, relacionada com a grande quantidade de elementos e processos existentes e com uma grande diversidade, decorrente da presença de vários subsistemas (também eles complexos).

A segunda forma como o conceito de sistema aberto complexo é usado é no modo com é vista a realidade produzida pelo ato de projetar, ou seja, o próprio projeto. Enquant o que o entendimento da área de intervenção como sistema complexo pode ser visto em continuidade com a visão da paisagem como ecossistema, já posta em prática tanto na arquitetura paisagista como noutras subdisciplinas da ecologia (ecologia urbana e ecologia da paisagem), a aceitação do projeto como um sistema complexo é uma ideia nova (apesar de ter evoluído sobre vários

72

contributos anteriores). Entender o projeto deste modo significa que, se a paisagem é considerada como um sistema sócio ecológico complexo e aberto, então, o projeto deve ser pensado e concebido como tal. Deste modo, o projeto tem de ser capaz de lidar com três condições: complexidade, dinâmica e incerteza. Primeiro, tem que ser capaz de gerir a complexidade que advém das inúmeras componentes ecológicas e sociais e das diversas forças e relações que têm que ser integradas no processo de conceção. Tem ainda que criar condições para que esta complexidade se mantenha ao longo do tempo. Segundo, tem que assumir que a realidade projetada está sujeita a uma dinâmica temporal que implica mudanças no projeto, ao longo do tempo. Isto significa que o projeto tem que ter a capacidade de integrar mudanças que podem relacionar-se com vários fatores nomeadamente, condições ecológicas, organização espacial e formal, programa de atividades ou outras. Por fim, em terceiro, tem que aceitar que as mudanças que poderão ocorrer não são conhecidas no momento em que se projeta, tendo, o projeto que possuir os recursos para lidar com as perturbações que irão promover a mudança, absorvendo-as ou adaptando-se a elas. A aceitação destas ideias implica o abandono da visão do projeto enquanto objeto desenhado, materializado e finalizado. Esta mudança de visão, que se reflete necessariamente na forma de projetar, solicita a necessidade de se formularem novas estratégias de abordagem projetual.

A aceitação do projeto como sistema sócio ecológico complexo no projeto contemporâneo da paisagem é fundamental, uma vez que estabelece uma ponte de ligação entre a ciência, que disponibiliza conhecimentos e métodos e a prática de projeto, que usa esta informação na formulação de conceitos e abordagens de projeto. As várias propriedades dos abertos sistemas complexos, em particular as já est udadas pela ecologia urbana e pela ecologia da paisagem, são referências importantes para a prática projetual. Neste âmbito as propriedades que têm sido objeto de maior atenção são a noção de contexto, a relação entre forma e processo e os aspetos relacionados com a capacidade de evolução dinâmica dos sistemas.

2.5 - A abertura do sistema: hierarquia e contexto

O entendimento do projeto como um sistema socio ecológico complexo trás consigo a ideia de abertura do sistema relativamente à sua envolvente ou contexto. Como vimos, num sistema aberto as trocas que o sistema estabelece com a envolvente têm uma forte influência na sua dinâmica. Nas palavras de M orin (1995) a importância da envolvente para o sistema está para além da influência, sendo constitutiva do próprio sistema, ou seja, um contributo indispensável para a sua construção. “ O sistema só pode ser compreendido incluindo nele o meio, que lhe é simultaneamente íntimo e estranho e faz parte dele próprio sendo-lhe sempre exterior” .

73

Reciprocamente, uma vez que as trocas não decorrem apenas num sentido, o sistema também influencia o contexto que o rodeia. Partindo desta assunção, pensar o projeto como um sistema aberto e complexo significa dar uma particular atenção ao seu contexto e à natureza das articulações que se estabelecem com este.

A compressão da articulação do ecossistema com o seu contexto tem na sua base a Teoria Hierárquica que explica as inter-relações entre sistemas pertencentes a diferentes escalas. Esta teoria postula que cada sistema está contido num sistema pertencente a um nível superior e contém, por sua vez, subsistemas que pertencem a um nível inferior. A paisagem, como todos os sistemas complexos, também obedece a esta organização hierárquica o que significa que qualquer paisagem (natural, rural ou urbana) é, ela própria, constituída por subsistemas e está contida em sistemas de maiores dimensões, designados por contexto. No caso do estudo da paisagem, o contexto é o sistema mais abrangente que contém a paisagem de referência. Um aspeto fundamental desta teoria, de particular relevância para o projeto, é o facto de assumir que a compreensão do sistema onde se está a intervir, tem que incluir o estudo dos níveis que se posicionam imediatamente acima e abaixo ou seja, que qualquer intervenção na paisagem deve incluir o seu estudo a diferentes escalas. Esta consideração deve ser tida em conta tant o na fase de análise e interpretação da paisagem de intervenção como na fase de conceção, já que as alterações produzidas pelo irão afetar os sistemas hierarquicamente superiores e inferiores. Conjuntamente com a identificação do contexto e dos sub-sistemas, outro aspet o interrelacionado, que tem que ser considerado é a definição do sistema de referência e das suas fronteiras que, no caso de um projeto, não têm necessariamente que coincidir com os limites de intervenção estabelecidos. O facto de, no âmbito da ecologia contemporânea, a ideia de fronteira, enquanto limite de separação, estar progressivamente a ser substituída por uma noção de intensidade ou densidade de interações , significa que os limites dos sistema-projeto poderão ser muito mais subtis do que são atualmente entendidos.

Ainda que importância do contexto para o projeto da paisagem não seja uma atitude recente, em particular nas abordagens que valorizam a ideia do lugar, o projeto contemporâneo regista algumas diferenças no modo de o considerar. Em primeiro lugar, para além das componentes físicas e biológicas do contexto são também consideradas e valorizadas as condições sociais, políticas e económicas da envolvente. As continuidades físicas continuam a ter importância, até porque elas são um requisito necessário para vários processos que articulam o projeto com o seu exterior, mas as relações socioeconómicas ou políticas que a paisagem de intervenção ou

74

projetada estabelecem com a envolvente mostram-se também como uma condição fundamental para o projeto, nomeadamente ao nível da sua apropriação, gestão e financiamento.

Um segundo especto que caracteriza o modo como as abordagens contemporâneas veem o contexto expressa-se no carácter de interdependência que este estabelece com o lugar projetado. Por um lado, o contexto confere especificidade ao projet o enquanto lugar concreto. Por outro, reconhece-se que cada lugar tem várias escalas de funcionamento, que atuam simultaneamente, e que muitos dos processos que ocorrem, nomeadamente os ecológicos, não estão contidos no lugar de intervenção. Assim, a prática contemporânea propõe que, a noção de projeto e contexto como entidades articuladas, mas distintas, seja substituída pela ideia de relações. O objetivo da intervenção não será tanto o lugar/ objeto mas sim as várias relações que se estabelecem entre este e a sua envolvente. As consequências diretas deste pensamento são duas. Por um lado cai a ideia de fronteira do sistema-projeto, uma vez que cada processo de inter-relações tem o seu âmbito de atuação ou seja, a sua fronteira. Por outro cai também a ideia de uma única escala de projet o pois cada relação funciona numa escala própria e todas elas têm que ser consideradas no processo de projeto.

Finalmente um terceiro aspeto tem a ver co o papel que o contexto desempenha na capacidade de persistência do projeto. Tal como enunciado pela TGS, a abertura do sistema à sua envolvente é uma condição essencial para sua sobrevivência. Seguindo esta linha de raciocínio, no projet o da paisagem também se identifica a ligação entre o projeto e o seu contexto como uma condição para que a paisagem projetada possa persistir e evoluir, acompanhando as transformações, que

No documento ÍNDICE DO VOLUME IV (páginas 66-75)