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AS CONCEPÇÕES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES/FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES ATRAVESSANDO A LEGISLAÇÃO:

1 CONCEITOS, TENDÊNCIAS, POSSIBILIDADES E NECESSIDADES DA

1.3 AS CONCEPÇÕES DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES/FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES ATRAVESSANDO A LEGISLAÇÃO:

PRODUÇÃO A CONTRAPELO?

Para pensarmos a formação continuada de professores, é importante lançarmos o olhar pelo tempo e pelo espaço em que as concepções de formação são produzidas e se imbricam, conjugam-se. Somado a isso, entendemos ser importante compreendê-las, pelas narrativas dos professores da educação infantil, como imprescindíveis nesse processo formativo, protagonizado por esses sujeitos, em serviço, nesse tipo de instituição de educação.

Parafraseando Benjamim (2013a), entramos num processo de escovação a contrapelo da história dessa profissionalização, pois afirmamos ainda que se encontram tendências de formação de professores marcadas pelo paradigma dominante10 da ciência moderna, que se funda em procedimentos e técnicas em que os especialistas são as grandes estrelas, os “solucionadores” dos problemas da educação, os pensadores da formação e da profissão.

Nesse mesmo trajeto, Carvalho (2004), ao analisar o enfoque dado ao professor como profissional no Brasil, numa transição paradigmática da modernidade para a pós-modernidade, e manifestada nos sinais apontados pelo fenômeno da globalização “[...] com os avanços científicos e com a adesão a um projeto neoliberal do mundo e da sociedade [...]” (CARVALHO, 2004, p. 12), aponta que existem, ao menos, quatro tendências de profissionalidade, nenhuma em seu estado puro, que acreditamos reverberar na dinamização e nos pilares da formação continuada. Segundo a autora, temos o professor: a) como profissional competente; b) como profissional reflexivo; b) como orgânico-crítico; c) como profissional pós-crítico. Ao analisar cada tendência, a autora enfatiza que:

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Para Santos (2009), o paradigma dominante se dá pela racionalidade científica e assume-se totalitária ao passo que nega qualquer forma de conhecimento que não se estrutura e se guia por princípios epistemológicos e regras metodológicas impostas pela racionalidade científica dominante ocidental.

Cada uma dessas tendências, como dito, apresentam uma determinada filiação a uma corrente e/ou tendência do pensamento sóciohistórico e filosófico da modernidade e da pós-modernidade, a saber: o professor como profissional competente como tributário do tecnicismo (neopositivismo) e do neoliberalismo; professor como profissional reflexivo em sua confluência entre o vitalismo e o pragmatismo de Dewey; o professor como profissional orgânico-crítico em suas relações com o neomarxismo gramsciniano e a sua teorização crítica (Teoria Crítica). Já a tendência do professor como profissional pós-crítico aponta a visão pós-crítica expressa em correntes sóciofilosóficas, como o pós-estruturalismo e o pós-modernismo [sic] (CARVALHO, 2004, p. 22).

Dessas tendências, a autora aponta características que perseguimos, ora para afirmá-las em nossas análises, ora para observá-las como tendências com as quais devemos e podemos romper.

Assim, ao professor como profissional competente, as características apresentadas são: ações marcadas pelo processo e pelo produto, procurando atender as políticas neoliberais, com resultados demonstráveis; apreço maior pela eficiência, pelas capacidades e habilidades, individualidade e rentabilidade; “[...] uma noção de competência como alternativa à qualificação, sendo recriada e atualizada pelas equipes de recursos humanos das grandes corporações capitalistas como critério de avaliação e de permanência no emprego” (CARVALHO, 2004, p. 23).

Nóvoa (2000a), ao criticar essa tendência destaca o realce dado pelos especialistas às competências e capacidades que marcaram o percurso evolutivo das investigações pedagógicas. Nessa perspectiva, o autor aponta que:

Uma ‘certa’ literatura científica refere três grandes fases no percurso evolutivo da investigação pedagógica: a primeira distingue-se pela procura das características intrínsecas ao ‘bom’ professor; a segunda define-se pela tentativa de encontrar o melhor método de ensino; a terceira caracteriza-se pela importância concedida à análise do ensino no contexto real da sala de aula, com base no paradigma processo-produto. Esta literatura considerava um progresso a possibilidade de estudar o ensino, para além dos próprios professores; de caminho, reduzia-se a profissão docente a um conjunto de competências e de capacidades, realçando essencialmente a dimensão técnica da acção pedagógica (NÓVOA, 2000a, p. 14-15, grifo do autor).

O mesmo autor afirma que ao se transpor isso para o plano da identidade do professor, se estabelece uma crise identitária, pois se separa o eu pessoal do eu profissional e aumenta o “[...] controlo sobre os professores, favorecendo o seu processo de desprofissionalização” (NÓVOA, 2000a, p. 15).

Ao professor como profissional reflexivo, Carvalho (2004) analisa que essa tendência está calcada nos estudos de Donald Schön, na perspectiva do pragmatismo de John Dewey. A autora salienta que, em Schön (2000), as competências profissionais são: “‘conhecer na ação’, que vem a ser uma competência de reconhecimento, julgamento e performance [...]; a reflexão- na- ação, [...] refletir durante a ação; a reflexão sobre- a- ação, [...] com o objetivo de sistematizar e descrever um saber que está implícito nela” (CARVALHO, 2004, p. 24). Entretanto, a autora concorda que a visão de mundo na qual se apoiam Schön e Dewey não é explícita, podendo arrancar o sentido da ação dos professores, por elas não se valerem de um contexto, ou dos “‘[...] pressupostos éticos e políticos em que se baseiam o professor e o pesquisador’” (CARVALHO, 2004, p. 25).

Sobre o professor como profissional crítico-orgânico, Carvalho (2004) afirma que os seus ideais estão calcados nos ideais de potencialização dos mais fracos para transformar a ordem social vigente, numa ruptura com as desigualdades sociais. Para tanto, essa tendência tem direta relação com engajamento político, consciência crítica e movimentos sociais. Assim, a autora aponta para a reflexão que se fortalece na escola por essa tendência, naquilo que diz respeito à transformação acontecendo de baixo para cima, da base da estrutura, ou seja, a partir dos estabelecimentos de ensino e de seus profissionais.

A última tendência apresentada por Carvalho (2004) é a do professor como profissional pós-crítico. De acordo com a autora, essa tendência está baseada em “[...] correntes filosóficas como o pós-estruturalismo e o pós-modernismo” (CARVALHO, 2004, p. 22). Segundo a autora, as suas características básicas são apresentadas sem o desejo de criar rótulos, podendo ser identificada no profissional quando este apresenta “[...] abertura e incompletude, traz em si a forma do concebido e do vivido, pós-estruturalista, pós-moderno, que não se opondo ao crítico, busca ampliar e repensar os campos de possibilidade do saber, fazer e poder do professor como profissional” (CARVALHO, 2004, p. 26).

As constatações feitas pelos autores acerca das tendências de profissionalização do professor nos coloca em movimento para compreender como os marcos legais dialogam com tais tendências a partir de 1996, com o advento da LDBEN nº 9394/96 (BRASIL, 1996), que traz a educação infantil como primeira etapa da educação

básica, pois, por essa Lei, observamos a dinâmica que as políticas públicas têm produzido como dispositivos que podem ser consolidadores da formação de professores, e como isso atinge essa etapa da Educação na dinâmica de formação dos seus profissionais.

Na educação infantil, podemos afirmar que essas tendências do professor como profissional são sentidas na produção da identidade dos seus profissionais, em especial, da identidade do educador.

Isso está além da simples consideração desses profissionais como sendo da educação, ao respeitar sua historicidade que, marcadamente nela, lidam com a necessidade do cuidar imbricada à necessidade do educar (KRAMER, 2005), pela própria constituição dessa etapa da educação, ao ter a sua gênese marcada pela perspectiva assistencialista (GOMES, 2013), pela negação dos direitos da criança e pela preparação para o ensino fundamental.

Buscamos, então, afirmar, com veemência, que os confrontos e as tensões que compõem o bojo dessas tendências atingem, diretamente, as identidades dos professores, e que, ao serem produzidas, buscam superar ou conformar-se com essa origem, visto que a própria conformação e/ou superação significam garantias, avanços, estabilizações e retrocessos dos direitos dos educadores de crianças (GOMES, 2013).

Esses confrontos e tensões estão no ínterim das tendências de formação de professores e passam por políticas maiores e mais amplas que se encontram na gênese da LDBEN nº 9394/96. Dessa forma, é importante enfatizar que as políticas públicas da década na qual essa Lei foi elaborada e promulgada, período em que os Organismos Multilaterais, em especial o Banco mundial, influenciaram fortemente as políticas nacionais, colocavam como condições de intervenções no país, ações como a oferta de materiais didáticos (livros didáticos), a capacitação técnica de professores para reduzir sua “baixa qualidade” profissional e a repetência dos alunos, e elevação da capacidade gerencial setorial (sistemas de avaliação e informação) (ZANETTI, 2016).

Nesse sentido, Carvalho (1998) discute que o projeto que contemplava as perspectivas neoliberais de desenvolvimento da década de 1990 em detrimento do

anteprojeto que fora mais debatido por entidades sociais, portanto mais democrático e composto coletivamente, transformado nessa Lei, de autoria de Darcy Ribeiro, prevaleceu. O autor aponta que:

Na disputa entre o coletivo e o individual, entre a esfera pública e a privada, entre os representantes da população e os representantes do governo, está vencendo a política neoliberal, dominante não só na dimensão global, mas também com pretensões de chegar a conduzir o trabalho pedagógico na sala de aula. Objetivo: a busca da qualidade (total), no sentido de formar cidadãos eficientes, competitivos, líderes produtivos, rentáveis, numa máquina quando pública, racionalizada. Este cidadão ─ anuncia-se ─ terá empregabilidade e, igualmente, será um consumidor consciente (CARVALHO, 1998, p. 81).

Isso nos diz muito acerca dos dispositivos com aberturas para a implantação de propostas e projetos de formação com características que se vinculam à racionalidade técnica que, segundo Zanetti (2016), se desdobrou em respostas que o governo, à época Fernando Henrique Cardoso, estipulou como planejamento estratégico do MEC, consolidando-se em “[...] fiscalização e utilização de recursos através do controle de resultados, os quais se darão, na escola, através do aproveitamento dos alunos” (ZANETTI, 2016), provisão do livro didático, “[...] programas de treinamentos de professores e diretores, particularmente através do ensino à distância” (idem) e continuação da prioridade para o ensino fundamental. Podemos concluir que o texto legal foi estruturado, no que tange à formação de professores, para garantir a formação por capacitação, treinamento e movimentos formativos aligeirados, focados em métodos e conteúdos, sem se ligar ao sentido da docência que defendemos nesta pesquisa.

Dentre alguns dispositivos, podemos ver essa concepção técnico-instrumental da formação autorizada por textos legais que tratam da formação inicial e continuada, conforme art. 61, inciso III, e § único, Inciso I, II, e, o art. 67, inciso III (LDBEN nº 9394/96), sendo, respectivamente, do curso técnico em área pedagógica ou afim, das competências de trabalho, da capacitação em serviço e do aperfeiçoamento profissional continuado.

Salientamos que a importância dessa discussão dá-se pelo fato de observamos os modos pelos quais tem se constituído a formação continuada de professores da educação infantil, ao passo que a própria LDBEN nº 9394/96, em seu art. 87,

parágrafo 4º, determinou que “até o fim da Década da Educação somente serão admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em serviço” (BRASIL, 1996). O que está em discussão, no nosso caso, não é a formação inicial, mas a compreensão da Lei acerca da formação continuada de professores, tratando-a como treinamento em serviço, e o desdobramento disso nas políticas públicas. Compreendemos que por esse dispositivo legal a formação ─ treinamento em serviço ─ deveria ganhar espaço nos sistemas municipais de ensino, responsáveis pela Educação Infantil, de modo que fossem capazes de disponibilizar profissionais para uma efetiva atuação nas escolas dessa etapa da educação.

Desse modo, Kramer (2005), em pesquisa no estado o Rio de Janeiro, na década de 1990, ao analisar a conjuntura de políticas de formação voltadas para os profissionais dessa etapa da educação básica, elencou a necessidade de as Secretarias de Educação atuarem, efetivamente, no investimento em formação continuada com certificação formal para aqueles profissionais que trabalham com crianças em creches e pré-escolas.

Todavia, a LDBEN 9394/96, em seu art. 61, ao preconizar a respeito do que se considera “profissionais da educação básica escolar”, incluiu, com o discurso de buscar eficácia nessa formação, em parágrafo único, pela Lei 12.014/2009, que alterou o mesmo artigo de 1996 da referida Lei, a perspectiva da racionalidade técnica-instrumental ─ já muito criticada por autores como Nóvoa (2002), Kramer (2005), Gomes (2009) e Diniz-Pereira (2011) ─ e determinou os fundamentos da formação desses trabalhadores. Vejamos:

Parágrafo único. A formação dos profissionais da educação, de modo a atender às especificidades do exercício de suas atividades, bem como aos objetivos das diferentes etapas e modalidades da educação básica, terá como fundamentos:

I – a presença de sólida formação básica, que propicie o conhecimento dos fundamentos científicos e sociais de suas competências de trabalho; II – a associação entre teorias e práticas, mediante estágios supervisionados e capacitação em serviço;

III – o aproveitamento da formação e experiências anteriores, em instituições de ensino e em outras atividades (BRASIL, Lei nº 12.014/2009, art. 61, grifo nosso).

Vale ressaltar que, somente em 2009, 13 anos depois da entrada da LDBEN nº 9.394/96 em vigor, esses fundamentos aparecem mais marcantes no tocante ao campo da formação e, nessa Lei, aparece como fundamento o termo “competências” como sendo algo imprescindível para o bom desenvolvimento do trabalho do docente da educação básica e/ou como fundante de uma “sólida” formação. Também é importante destacar que a formação é intrínseca à compreensão do que se entende como profissional desse campo.

Marca-se, ainda, que, por esse viés, se evidencia a formação forjada pela própria identidade docente e associada às experiências anteriores dos profissionais, com a tentativa de promover a ruptura do binômio teoria e prática, tais como a responsabilidade dos estágios supervisionados e a capacitação em serviço. No entanto, nota-se que a associação entre teoria e prática pela capacitação em serviço já constava na época da publicação da referida Lei, bem como o aproveitamento das experiências.

O termo competência busca relacionar as experiências, denominando-as como práticas. Contudo, não define o que se compreende por experiências, se aquelas mais voltadas aos conteúdos trabalhados ao longo dos anos, numa espécie de transposição didática, aproximando-se mais ao conceito de vivência, de Benjamin, ou se aquelas que, de fato, consideram a vida imbricada na profissionalidade, que produzem sentido, que afetam, corruptoras da tradição, do jeito próprio, que consideram o interlocutor como ativo no processo, como práticas coletivas, conforme o conceito de experiência em Benjamin.

Vale frisar que a formação embasada pelos pilares da eficiência e da eficácia na LDBEN nº 9394/96 desdobrava-se na ampla produção de outras Leis que a garantiam sob o domínio das competências.

O Plano Nacional de Educação (PNE) da década de 2000, dado pela Lei nº 10.172/2001, determinava, pela meta 7, a colocação do programa de formação em serviço com foco na atualização permanente e no aprofundamento dos profissionais que atuavam na educação infantil.

A Resolução do MEC/CNE/CP/2002 nº 01 instituiu “[...] as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior,

curso de licenciatura, de graduação plena”. A Portaria nº 1.403, (MEC/2003), art. 2º, tratava da certificação de professores e avaliava, dentre outras características, as competências e as habilidades compreendidas como leitura e escrita, educação matemática e científica básicas, conhecimentos e competências pedagógicas específicas da área de certificação e da especialidade pretendida.

A ideia de competências e habilidades foi o conceito estrutural pelo qual se pautaram esses institutos legais. Essa característica foi fixada por eles como fundamental para a formação do graduando em licenciatura e para a formação continuada de professores, ou seja, a missão da formação de professores estava sustentada, em seu início, meio e fim, pela teoria das competências.

Ainda de acordo com essa Resolução, art. 3º, inciso I, a competência deveria ser a “[...] concepção nuclear na orientação do curso” (MEC/CNE/CP, Resolução nº 01, 2002). Destarte, enfatizamos que, nessa Resolução, a menção sobre a formação continuada de professores não define formação continuada e não traz princípios teórico-metodológicos próprios, levando-nos a inferir, portanto, que as concepções são as mesmas da formação inicial.

Esses dispositivos reguladores da formação, como meios de controle da profissão do professor, pela reforma da educação, imprimem, na identidade desses sujeitos, não só a necessidade do “novo” na profissão, da mudança de procedimentos e métodos, da ampliação e inovação dos saberes científicos. Ball (2002), ao fazer uma análise das reformas educacionais em Portugal, denomina esse movimento como tecnologias políticas11, argumentando que essas mudanças não implicam apenas em processos pedagógicos, mas em mudanças ontológicas. Esse autor expõe que:

[...] as tecnologias políticas da reforma da educação não são simplesmente veículos para a mudança técnica e estrutural das organizações, mas também mecanismos para “reformar” professores para mudar o que significa ser professor. Isto é, ‘a formação e a atualização das capacidades do SER do professor’. A reforma não muda apenas o que nós fazemos. Muda também quem nós somos ─ a nossa ‘identidade social’. Quer dizer, na reforma da educação ‘trata-se dos poderes que vieram abater-se sobre a existência subjectiva das pessoas e das suas relações umas com as outras’. [...] é uma luta pela alma do professor. ‘Seria errado dizer que a

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Ball (2002) classifica as tecnologias políticas como aquelas que compõem técnicas e artefatos para ordenar os modos de existir do humano, suas capacidades e, funcionalidade do poder. Nisso estão envolvidos hierarquia, papéis sociais e suas representações, movimentos de avaliações regulares e comparativas das ações dos sujeitos e deles mesmos. Evidenciamos aqui que essa definição do autor é focada nos professores e professoras.

alma é uma ilusão, ou efeito ideológico. Ao contrário, ela existe, tem uma realidade, cria-se permanentemente em volta, sobre e dentro do corpo através de um funcionamento de uma força, de um poder...’ (BALL, 2002, p. 03).

Percebemos por onde vai e até onde chega essa reforma. Essa ideia de competência técnica, instalada por esses dispositivos no coração desse movimento da profissão, cria a realidade na qual atua o professorado e pela qual se orienta o sujeito em processos básicos de formação, criando as suas subjetividades, os seus modos de ser socialmente, na relação com as suas crenças e nas formas de se relacionar com o mundo.

Para nos aprofundarmos acerca das concepções e tendências de formação continuada de professores, no diálogo com a referida Lei, buscamos em Nóvoa (2002), orientação, pois esse autor, ao analisar as leituras de Lise Demaily (1990) e Zeichner e Liston (1990), apontou a existência de “[...] dois grandes grupos de modelos de formação contínua de professores”:

- os modelos estruturantes (tradicional, comportamentalista, universitário, escolar), organizados previamente a partir de uma lógica de racionalidade científica e técnica, e aplicada aos diversos grupos de professores.

- os modelos construtivistas (personalista, investigativo, contratual, interativo-reflexivo), que partem de uma reflexão contextualizada para a montagem de dispositivos de formação contínua, no quadro de regulação permanente das práticas e dos processos de trabalho (NÓVOA, 2002, p. 54).

Nóvoa (2000b) afirma que o seu pensamento se encontra fundamentado pelo paradigma ‘investigativo’ e na forma ‘interactiva-reflexiva’. Nas justificativas para essa adesão, o autor destaca:

Baseio esta opção na necessidade de conceber uma formação contínua que contribua para a mudança educacional e para a redefinição da profissão docente. Não ignoro que os modelos estruturantes são mais eficientes a curto prazo, tal como a ‘formação de professores por competências’ amplamente demonstram. Mas estes modelos tendem a reproduzir as realidades educativas existentes, dificultando o trabalho de invenção (e de produção) de uma ‘nova’ escola e de um ‘novo’ professor (NÓVOA, 2002, p. 55).

Esse paradigma investigativo que, para o autor, muito contribui para a ruptura com os modelos estruturantes pautados pela competência, foi evidenciado em diversos estados da arte e do conhecimento, desenvolvidos por pesquisas acerca da formação de professores, realizadas, no Brasil, por André et al. (1999), André (2009,

2014), Brzezinsk (2001, 2006, 2009, 2010, ), Oliveira (2010) e Astori (2014), em bancos de teses e dissertações, distintos periódicos, pela ANPEd, no GT 8 - Formação de professores e no ENDIPE.

Essas autoras desenvolveram suas pesquisas investigando a década de 1990 e a década de 2000, mais especificamente até 2012, e cada uma vislumbrou períodos e categorizações distintas ou deu continuidade aos levantamentos já existentes, inferindo que a ideia de professor reflexivo tem sustentado, inclusive, a formação continuada em serviço. As pesquisas dessas autoras apontaram que as investigações colaborativas a respeito da formação continuada têm se despontado significativamente. Elas demonstraram que essa formação, como meio para se desenvolver a competência profissional, tem sido bastante criticada pelas produções em programas de pós-graduação pelo país, bem como pelos eventos sobre educação e pela publicação em periódicos.

Acreditamos que tais críticas negativas à formação e à formação continuada buscando a competência devem-se ao fato de que essa concepção está intimamente ligada ao modelo empresarial de recursos humanos e estruturada em pressupostos técnicos e de eficiência. Segundo Carvalho (2004), “[...] é uma noção que parece desconsiderar as competências e habilidades humanas de modo desvinculado das dimensões e de lugar e, mais ainda, de tempo e espaço” (CARVALHO, 2004, p. 23). A autora destacou:

A primeira tendência apontada, ou seja, a do professor como profissional competente, aparece no contexto das políticas neoliberais que apregoa a competência profissional como a habilidade para produzir, de uma forma empiricamente demonstrável, os resultados desejáveis, e socialmente