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CAPÍTULO 5. USO DE BENS IMÓVEIS PÚBLICOS POR PARTICULARES

5.2. USO PRIVATIVO DE BENS PÚBLICOS

5.2.5. Concessão de Domínio

É prevista a concessão de domínio no artigo 188, § 1º da Constituição Federal e pertine apenas a terras públicas e devolutas, cuja destinação deverá ser compatibilizada com a política agrícola aplicada e com o plano nacional de reforma agrária.

Exige-se, para tanto, avaliação, lei autorizadora, e aprovação prévia do Congresso Nacional, no caso de terras públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares.

A concessão de domínio, a despeito do vocábulo empregado, não transfere domínio.

Esclarece Maria Sylvia Zanella DI PIETRO:186

185 Cf., a respeito, a Representação nº 008/97-CF, que formou o Processo TCDF nº 3564/97. Da decisão do

Plenário, de nº 8126, publicada no DODF de 11.12.2001, interpôs o Ministério Público recurso, uma vez que o Tribunal de Contas houvera decidido deixar a cargo do Poder Legislativo regulamentar a questão. O recurso do Ministério Público, após lembrar que "a ausência do termo 'uso de bens públicos' nas disposições do inciso XXI do art. 37 da CF não permite que se conclua no sentido da insubordinação do instituto aos contratos regidos pela Lei n.º 8.666/93. Ao contrário, reza o § 1º do art. 54 do referido diploma legal que os contratos administrativos devem guardar 'conformidade com os termos da licitação e da proposta a que se vinculam', finda por exortar o Tribunal de Contas a exercer suas competências de controle: "Naturalmente, espera-se que o E. Tribunal de Contas do Distrito Federal, como órgão julgador de contas, sob pena de abdicar de sua competência constitucional e legal (artigos 70 e seguintes da CF; 77 e seguintes da LODF; Lei Complementar n.º 1/94; e Regimento Interno do TCDF, aprovado pela Resolução n.º 38/90), interprete e aplique a legislação concernente à matéria em debate, para fins de uniformização e fixação de seu entendimento: os mecanismos jurídicos integrativos postos à disposição do magistrado de contas não permitem a ausência de resposta ao problema ora colocado, sob o argumento de omissão ou lacuna legal." Cf., ainda, a Representação nº 10/2002-CF, oferecida ao Plenário do Tribunal de Contas em 14 de outubro de 2002.

CI

Quanto à concessão, que alguns autores incluem entre as formas de alienação de bens públicos, enquadra-se melhor entre as modalidades de utilização do domínio público pelo particular, uma vez que não confere título de propriedade. Assemelha- se, em determinadas hipóteses, ao instituto do aforamento ou enfiteuse e, nesse sentido, prende-se às origens do regime de terras no Brasil. Com efeito, após o descobrimento do Brasil, sendo este colônia de Portugal, todas as terras eram públicas e a sua transferência aos particulares se dava pelo sistema de concessão de cartas de sesmaria, sob um regime semelhante à enfiteuse, ou por meio de doação. Sesmaria era uma área desmembrada do domínio público e concedida ao particular, para que este fizesse a sua utilização econômica, conservando, no entanto, o monarca, a titularidade sobre o bem; o sesmeiro pagava ao rei determinados privilégios e, não cumprindo a sua obrigação, ocorria o comisso, perdendo o direito sobre a sesmaria.

Ainda hoje algumas leis e a própria Constituição fazem referência à concessão, mas como transferência de posse e não do domínio.

Igor TENÓRIO sustenta, também, que, quando se trata de concessão, o Poder Público "não aliena a coisa, isto é, não se despe do domínio da terra; cede-a apenas para um determinado fim e, cumprida a finalidade para a qual fora feita a concessão, a terra volta a integrar o patrimônio do Estado."187

Hely Lopes MEIRELLES ensina que:

...concessão de domínio é a forma de alienação de terras públicas que teve sua origem nas concessões de sesmaria da Coroa e foi largamente usada nas concessões de datas das Municipalidades da Colônia e do Império. Atualmente, só é utilizada nas concessões de terras devolutas da União, dos Estados e dos Municípios, consoante prevê a Constituição da República (art. 188, § 1º). Tais concessões não passam de vendas ou doações dessas terras públicas, sempre precedidas de lei autorizadora e avaliação das glebas a serem concedidas a título oneroso ou gratuito, além da aprovação do Congresso Nacional quando excedentes de dois mil e quinhentos hectares. Quando feita por uma entidade estatal a outra, a concessão de domínio formaliza-se por lei e independe de registro; quando feita a particulares exige termo administrativo ou escritura pública e o título deve ser transcrito no registro imobiliário competente, para a transferência do domínio.

A concessão de domínio de terras públicas não deve ser confundida com a concessão administrativa de uso de bem público, nem com a concessão de direito real de uso de terrenos públicos, que já estudamos precedentemente, porque importa alienação do imóvel, enquanto estas - concessões de uso como direito pessoal ou real - possibilitam apenas a utilização do bem concedido, sem a transferência de sua propriedade. 188

A despeito do histórico da concessão, que tinha por intuito a povoação e a colonização do Brasil, interpretação que a conduza a, efetivamente, transferir domínio, não pode perdurar.

187 TENÓRIO, Igor. Curso de Direito Agrário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 36.

CII

Não se trata, aqui, de contrato de concessão administrativa de uso, ou de concessão de direito real de uso, mas de concessão de uso que só se aplica a terras públicas e devolutas, para realização da política agrícola e de reforma agrária.

Não haveria sentido que o constituinte distinguisse a alienação da concessão se essa fosse modalidade daquela e também transferisse domínio. A par de alienar terras devolutas, o Poder Público pode também concedê-las, com a finalidade de promover a política agrícola.

A questão mostra-se bem resolvida se analisada mediante a ótica do artigo 189 da Constituição Federal:

Art. 189. Os beneficiários da distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária receberão títulos de domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de dez anos.

Parágrafo único. O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil, nos termos e condições previstos em lei.(grifamos)