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Conclusão: a importância da ação empreendedora capaz de inovação na

As considerações sobre o empreendedor como um articulador de redes permitem questionar uma noção corrente do empreendedor como um agente otimizado e individualista, que atua de maneira isolada. Na realidade, como salientado, ele é, antes de tudo, um articulador e um forjador de redes, com capacidade de unir e conectar, de maneira muitas vezes inovadora, diferentes atores e recursos dispersos no mercado e na sociedade, agregando valor à atividade produtiva. O ato de empreender, no entanto, não se limita a indivíduos, se estendendo para grupos e empresas, deslocando o foco para o conceito de ação empreendedora.

A capacidade de inovar situa-se na essência da capacidade empreendedora, da mesma maneira que a habilidade de conjugar e associar recursos distintos. A ação empreendedora, implementada por indivíduos, grupos e empresas dotados de capacidade de inovação, possui a capacidade de alterar a configuração das redes de um dado território. Empreendedores e empresas encontram-se, a todo momento, realizando novas combinações de recursos

produtivos, buscando novos insumos, concebendo novas estratégicas para novos nichos de mercado, explorando novas tecnologias. Assim procedendo, afetam, também, a própria configuração de suas redes de conexão e vão alterando o estoque de capital social presente em um dado território. As interações existentes, em um determinado território, entre os diferentes atores produtivos aí presentes, permitem tratar o fenômeno da inovação como resultante de um processo coletivo de construção social.

A ação empreendedora capaz de inovação possui a capacidade de alterar a configuração das redes existentes, gerando novos tipos de conexão. Ao longo do processo, fornecedores são trocados, clientes são substituídos, novos mercados, com diferentes tipos de clientes são acessados, alianças estratégicas são desfeitas, novas alianças se consolidam, novos interesses se formam. Grupos antigos e novos se vinculam a novos grupos e, nesse processo, relações mercantis, imbricadas e entranhadas em relações sociais vão se interpenetrando e se reforçando, mutuamente.

O ritmo da mudança dependerá da natureza da inovação (se incremental versus radical) e de seu impacto (se pequena versus grande e se localizada versus abrangente). Grandes inovações podem gerar grandes transformações. Inovações incrementais geram transformações incrementais. Em um dado território, o ritmo de transformação é, em geral, lento. Como já salientado, cada empresa possui uma certa dotação, em termos de rotinas e procedimentos técnicos, que evolui, geralmente, de maneira mais gradual e possui, também, um determinado conjunto de ativos relacionais – seu estoque de capital social - que evolui também de maneira mais gradual. Tal ritmo pode ser quebrado, apenas, no caso de grandes inovações.

É possível ampliar as considerações de Malerba sobre as interações existentes entre, por um lado, redes como expressão de escolha de empresas e como reflexo da estrutura tecnológica e, por outro, redes como resultantes de

mudanças tecnológicas, como já comentado, para incorporar duas noções distintas, embora interconectadas: a proposta das redes sociais como condicionando as possibilidades e as oportunidades; o impacto da ação empreendedora capaz de inovação, rompendo algumas vinculações e conexões até então existentes.

CAPÍTULO 4

CAPITAL RELACIONAL: CONCEITOS, HIPÓTESES E PROPOSIÇÕES

RESUMO

Este capítulo resgata e integra as discussões precedentes, introduz os conceitos fundamentais de análise, as hipóteses básicas e um conjunto de proposições complementares, para permitir a análise das aglomerações produtivas, da perspectiva do Capital Relacional. O resultado final é a apresentação de uma nova concepção teórico-analítica, integrada e articulada, que representa a essência das reflexões aqui realizadas.

ABSTRACT

This chapter rescues and integrates the preceding discussion, as well as puts forth the fundamental analytical concepts needed to attack the subject of local productive clusters, from the perspective of Relational Social Capital. The final result is the presentation of an articulated and novel theoretical conception, integrating the analytical reflections hitherto dealt with.

1 INTRODUÇÃO

Na acepção proposta, o Capital Social Relacional ou Capital Relacional representa o conjunto de recursos enraizados (embedded) em redes sociais, de usufruto de um ator – individual ou coletivo – e derivado de seus relacionamentos, conexões e laços. Tais recursos lhe garantem informações, permitem acesso a bens valiosos e geram oportunidades, ajudando-o na obtenção de resultados pretendidos. Nesse contexto, atores sociais, detentores de conexões capazes de lhes permitir transpor distâncias sociais e estabelecer “pontes” com outros atores e redes (grupos sociais) distintos, gozarão de condições mais privilegiadas. Por outro lado, atores desprovidos de relações e laços adequados podem, eventualmente, se encontrar em posições de desvantagem, ainda que sejam bem dotados com outro tipo de tipo de capital.

No contexto de um determinado território – uma aglomeração produtiva –, o capital social seria representado pelo conjunto de recursos inseridos nas conexões e laços à disposição dos atores produtivos aí presentes, vinculando-os entre si e com o “resto do mundo” e condicionando a natureza dos empreendimentos - individuais e coletivos - que são capazes de implementar. Estes “ativos” relacionais, em interação com os demais recursos produtivos aí presentes, condicionam a evolução do próprio território.

O capital social representa, em um dado momento, um determinado “estoque” de recursos relacionais. Não é, no entanto, estático, sendo dotado de uma característica dinâmica. A configuração das redes, em um dado momento, reflete a história e a natureza da evolução da própria comunidade. Relações e interações passadas influenciam a natureza das relações futuras que, por sua vez, são afetadas por variáveis de natureza institucional, social e cultural aí presentes. Mas, na dinâmica de reconfiguração das redes, dois fatores, em particular, são de

nosso interesse: a ação empreendedora e a inovação, ambos intimamente interconectados entre si.

A inovação, resultante da ação empreendedora, possui a capacidade de alterar a configuração das redes e a natureza dos recursos inseridos ou enraizados (embedded) nas redes, ou seja, o capital social presente na localidade. A capacidade de inovar – seja no plano individual (da perspectiva de uma empresa, vista isoladamente) ou coletivo (da perspectiva de uma dada aglomeração produtiva) é, por sua vez, influenciada, em parte, pela natureza das interações e laços sociais prevalentes. A inovação pressupõe, em geral, interação e contato entre atores, redes e grupos sociais distintos, detentores de diferentes conjuntos de recursos e informações afins. O fluxo de informação resultante da interação que ocorre no interior de um grupo mais homogêneo pode apresentar alto grau de redundância, podendo ser pouco propícia à transformação e mudança.

O ponto de vista que aqui é esposado é o de que a ação empreendedora capaz de inovação pode alterar não só a configuração das redes existentes - preenchendo brechas ou vazios no mercado, destruindo e criando diferentes laços e conexões entre distintos atores e grupos sociais e recombinando recursos novos e ou antigos – como altera, também, a natureza dos recursos enraizados (embedded) nestas redes. E, neste processo, vinculações sociais e mercantis, imbricadas (embedded) umas nas outras, vão se reforçando e interpenetrando, afetando a dinâmica do próprio Capital Relacional aí presente.

A reconfiguração de redes passa não só pela capacidade de combinação de recursos produtivos convencionais, disponíveis no mercado e compatíveis com um determinado padrão de conhecimento já existente, mas também, e sobretudo, pela capacidade de combinação de recursos existentes mas não relacionados ou não considerados compatíveis em face de um dado paradigma produtivo existente. Fornecedores, distribuidores e representantes são,

eventualmente, substituídos ou acrescidos; novos produtos são lançados, exigindo a criação de novas redes voltadas para outros segmentos ou nichos de mercado; novas combinações de produtos e mercados são realizadas; alianças estratégicas são construídas e desfeitas; novas alianças se consolidam; relações empresariais e institucionais são transformadas. Novos “laços fortes” consolidam-se, novos “laços fracos” são criados, novas instituições surgem.

Como já salientado, o ritmo de transformação das redes e de evolução do capital social é, em geral, lento. Existe, nas empresas, uma certa dotação de rotinas e procedimentos técnicos que evolui, geralmente, de maneira mais gradual. Cada empresa possui também um determinado conjunto de ativos relacionais – seu estoque de Capital Relacional - que evolui também de maneira mais gradual. Tal ritmo pode ser quebrado, apenas, no caso de grandes inovações. O ritmo da evolução dependerá da natureza e do impacto da inovação (se incremental versus radical, se pequena versus grande e se localizada versus abrangente). Grandes inovações podem gerar grandes transformações. Inovações incrementais geram transformações incrementais.

Durante o processo de desenvolvimento de uma aglomeração produtiva ocorre evolução e ampliação das redes aí existentes, capazes de preencher os vácuos e lacunas que separam não só distintos atores, grupos e segmentos sociais presentes naquela comunidade (reduzindo as facções, o isolamento e a distância existente entre eles, permitindo, conseqüentemente, um maior fluxo de informação e a difusão e renovação da inovação entre as empresas) como também que separam esta região de centros mais dinâmicos, localizados fora de seu território, ou seja, situados no “resto do mundo”. Enquanto o adensamento dos vínculos locais garante a criação de um padrão produtivo local e a implementação de ações coletivas, são os vínculos exteriores, com os centros dinâmicos, capazes de “capturar” recursos valiosos e diversificados, localizados

fora do território, que funcionam como mecanismos indutores de permanente transformação e inovação.

Uma ênfase demasiada em vínculos interiores, em detrimento dos exteriores, leva o território a uma situação de isolamento e contração. No outro extremo, uma valorização excessiva dos vínculos exteriores, sem um correspondente desenvolvimento dos vínculos interiores, leva à formação de enclaves territoriais, em que os benefícios do progresso podem ficar concentrados nas mãos de poucos privilegiados conectados com exterior, ao mesmo tempo em que se amplia a vulnerabilidade local, visto que processos decisórios relevantes podem, eventualmente, situar-se fora da esfera do próprio território.

Para o desenvolvimento de uma região, concebe-se, como fundamental, o estoque de ativos relacionais existentes (capital social) e sua interação com os demais ativos, tradicionalmente citados na literatura corrente. Dessa maneira, a transformação, de um território desarticulado ou de uma região economicamente deprimida, em uma localidade próspera e produtiva, depende não apenas da natureza dos recursos produtivos aí presentes e da qualidade da mão-de-obra (como, aliás, amplamente defendido pelos teóricos do desenvolvimento, que a isto vêm adicionando, mais recentemente, outros fatores, como história e cultura) – mas também, em grande dose, dos ativos relacionais. No processo de desenvolvimento regional existe uma interação dinâmica entre estes ativos relacionais e os demais ativos, tradicionalmente citados na literatura corrente.

Se, por um lado, os modelos econômicos regionalizados de relações interindustriais, de Leontief, são capazes de captar as vinculações produtivas existentes, em um dado momento, entre certos tipos de recursos produtivos locais e os recursos produtivos externos, ele não é, no entanto, capaz de captar as múltiplas dimensões existentes na configuração das redes sociais aí presentes e nem o caráter dinâmico de tais configurações. Estas configurações afetam, de

certa forma, a própria conformação da matriz de insumo produto, à medida em que condicionam o que será ou não “apropriado” como recurso local e o que será “transacionado” com o mundo exterior, dentro de um conjunto de possibilidades objetivas e concretas, teoricamente disponíveis para a região.

Três hipóteses básicas e um conjunto de sete proposições orientam o presente trabalho, como especificado a seguir. Na primeira parte serão introduzidas as hipóteses, seguidas por um conjunto de proposições complementares, concluindo, ao final, com uma síntese da concepção teórico- analítica.

1.1 As hipóteses básicas e as proposições de apoio