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Como visto, as abordagens correntes foram capazes não só de resgatar e consolidar proposições e conceitos derivados de diferentes blocos teóricos, como, também, de ir além, forjando um conjunto original de concepções e propostas para tratamento das aglomerações produtivas, desenvolvimento e competitividade.

A figura a seguir (figura 1) retrata a evolução e a situação atual das principais correntes de pensamento voltadas para o tema da competitividade e do desenvolvimento regional, de acordo com a linha de abordagem aqui adotada. Como pode ser observado, existe uma grande interpretação e influência mútua

entre as várias abordagens, apesar de divergências internas, geradas, sobretudo, pela presença de diferentes pressupostos e premissas. Como elementos comuns encontrados na maioria delas, salientam-se os seguintes: a concepção de crescimento e desenvolvimento como um processo de natureza endógena; uma íntima associação entre a competitividade empresarial e os padrões de competitividade regional ou sistêmica; a vinculação da competitividade nacional a padrões de configuração regional e espacial da organização produtiva; a ênfase na inovação e no aprendizado como motores do progresso; o papel das economias de aglomeração a economias de aglomeração; a importância dos fatores locacionais, inclusive de natureza intangível, para a criação de um ambiente propício à inovação; a relevância das instituições em geral; a tentativa de expandir o escopo da análise para além da dimensão econômica buscando incorporar elementos gerados em outras disciplinas das ciências sociais; a relevância das interações, inclusive de natureza não mercantil, entre os agentes produtivos e a inserção do local na lógica das cadeias produtivas em âmbito global.

Figura 1 Desenvolvimento regional e aglomerações produtivas: contribuições teóricas

Observando-se as conexões presentes na figura 1, pode-se verificar o papel particular de três grandes blocos de construção teórica. Em primeiro lugar, as vertentes mais associadas às concepções neoclássicas, onde se insere, por exemplo, Krugman. São herdeiras diretas da “economia regional”, que foi, por sua vez, capaz de resgatar produções pontuais passadas – advindas, sobretudo da geografia econômica -, gerando um grande acervo de reflexões e concepções fundamentais, que evoluíram e atingiram seu pico na década de 1970. Em segundo lugar, situa-se a vertente herdeira direta de Marshall, na qual se destaca a literatura sobre os distritos industriais, com sua ênfase no papel das aglomerações na geração de externalidades e de ativos relacionais. Em terceiro lugar, a vertente da economia institucional, com duas linhas alternativas: a primeira, representada por Williamson, com a teoria dos custos de transação e a segunda representada pela economia institucional evolucionaria, com forte influência de Shumpeter, em que se incluem as concepções dos sistemas produtivos e inovativos locais.

A problemática associada às interações locais e às redes empresariais, em várias dessas abordagens, tem um papel destacado. Mas, cada uma destas diferentes vertentes teóricas aborda o tema de maneira distinta. No que diz respeito às proposições sobre redes sociais, em particular sobre embeddedness, geradas no contexto da sociologia econômica, salienta-se a grande identidade existente entre esta literatura e os pressupostos e interesses da vertente dos sistemas produtivos e inovativos locais. Tais interfaces, no entanto, não foram, até o momento, totalmente exploradas. Salienta-se, finalmente, que, embora as concepções sobre embeddedness tenham enriquecido as análises sobre aglomerações produtivas, provocando inúmeros estudos e pesquisas, elas não parecem se constituem, até o momento, um corpo unificado e coerente de investigação. Tais temas serão abordados, em maiores detalhes, no capítulo seguinte.

CAPÍTULO 2

A CONCEPÇÃO DO CAPITAL SOCIAL RELACIONAL OU CAPITAL RELACIONAL

RESUMO

Este capítulo apresenta, em detalhe, como foi forjada a concepção teórica sobre Capital Social Relacional ou Capital Relacional. Demonstra como esta surgiu, a partir de um processo de resgate, associação e ampliação de duas distintas construções teóricas, hoje existentes nas ciências sociais: por um lado, a teoria das redes sociais, com as propostas derivados da literatura sobre “o poder dos vínculos frágeis” e sobre “embeddedness” (enraizamento); e, por outro, as proposições existentes sobre capital social. Este novo conceito, aqui introduzido, demonstra ser capaz de tratar a realidade das aglomerações produtivas, no contexto de uma análise mais estática e deve, consequentemente, ser ampliado.

ABSTRACT

This chapter introduces, circumstantially, the progressive evolution of the theoretical notion of Relational Social Capital. Such object, is shown, evolved in the wake of a process involving the rescuing by widening and association, of two peculiar theoretical constructs, namely; in on hand, the theory of social network, particularly as it stresses the explanatory power of “weak ties” and embeddedness, and; in the other hand, the mainstream proposals associated to social capital. This new notion, it is purportedly shown, brings greater understanding to the reality of local productive clusters, particularly in the context of comparative static analyses.

1 INTRODUÇÃO

A proposição teórica que será construída advém da literatura sobre redes. No campo das ciências exatas, o conceito de redes encontra-se vinculado a elaborados e sofisticados construtos matemáticos, dotados de grande poder analítico, e isomórficos com muitos sistemas no mundo real. Ou seja, são capazes de representar e extrair propriedades desses sistemas. Como salientado por Britto (1999), o conceito de redes encontra-se associado a um amplo e sofisticado conjunto de instrumentos, que busca o estudo dos elementos constitutivos da estrutura morfológica de sistemas complexos para, a partir daí, identificar as forças responsáveis pela coesão interna da estrutura, bem como os estímulos endógenos responsáveis pela sua reprodução e transformação. Segundo o autor (1999:11) “este tipo de análise parte da suposição de que as redes operam como estruturas dinâmicas, sendo dotadas de uma capacidade endógena de transformação, engendrada pelos estímulos que surgem no seu interior”. Nas ciências sociais, tal conceito vem sendo utilizado de maneira ampla e diversificada, seja como uma metáfora, como um instrumento de pesquisa ou uma teoria.

Para Powell & Smith-Doerr (1994:368), “as redes oferecem um ponto de convergência (entre diferentes abordagens nas ciências sociais), um terceiro caminho, mesmo que ninguém esteja, exatamente, seguro, se trata-se de uma metáfora, de um método ou de uma teoria”. Britto (1999:1), referindo-se à utilização do conceito genérico de redes no âmbito dos estudos sobre relações empresariais, afirma que este “constitui uma metáfora representativa das interdependências produtivas e tecnológicas que caracterizam os ambientes econômicos complexos”. Como teoria, pode-se dizer que não existe, no momento, uma teoria única das redes sociais. Diferentes abordagens teóricas apresentam proposições, conceitos e perspectivas bastante distintos, embora,

muitas vezes, com alguns pontos relevantes em comum. Para Borgatti & Foster (2003:991), o “boom na pesquisa de redes é parte de um movimento geral, que se iniciou na segunda metade do século XIX, afastando-se de explicações de cunho mais individualista, essencialista e atomística, em direção a uma compreensão mais relacional, contextualizada e sistêmica”.

A partir da década de 1970 e, em especial, após 1990, ocorreu uma valorização das abordagens das redes, simultaneamente, nos meios acadêmicos e na prática empresarial. Ver, por exemplo, Adler, 2001; Alvarez & Barney, 2001; Amato Neto, 2005; Athanassiou & Nigh, 1999; Borgatti & Cross, 2003; Campbell et al., 1986; Gerlach & Lincoln, 1992; Nohria 1992; Nohria & Eccles, 1992; Jarrilo, 1998; Jones et al. 1997; Messner & Meyer Stamer, 2000; Oliver, 2001; Powell, 1990; Powell et al., 1996; Stuart, 2000; Walker et al., 2000; Westphal et al., 2001; Vale et al, 2006a.

Como salientado por Harrison (1994:190), “criação de redes, entre as empresas, tornou-se uma moda, em todo lugar do mundo”. No meio acadêmico, especialistas desenvolveram um grande conjunto de conceitos e métodos para analisar as relações sociais. Segundo a Sociological Abstratcts, a quantidade de publicação contendo, no título ou no abstract, as palavras “redes sociais (social network) aumentou cerca de 600 vezes, no período 1970-2000, com destaque para a década de 1990. Em 1990, a Harvard Business School organizou um colóquio, de natureza interdisciplinar, para discutir os temas redes e organizações, com o propósito de avaliar o estado corrente do conhecimento na área e as perspectivas de trabalhos futuros. Os resultados do trabalho integram o livro – Network and organizations: structure, form and action –, que se constituiu um marcos de reflexão na área (Nohria & Ecches, 1992).

Pode-se afirmar que a evolução das abordagens de redes, nas ciências sociais, apresenta duas características muito peculiares: em primeiro lugar, ela tem se desenvolvido com contribuições interdisciplinares, provenientes de vários

ramos do pensamento; em segundo lugar, ela vem evoluindo por meio de uma forte interação entre teoria, método e pesquisa empírica. Wasserman & Faust (1999:13), por exemplo, salientam que “tendências empíricas importantes levam a novos e importantes métodos de redes”. O estudo das redes, nas ciências sociais, tornou-se um ponto de confluência e convergência de várias disciplinas e de distintas abordagens e um espaço fecundo de interação e sinergia entre conceitos teóricos, metodologias e resultados empíricos.

Entre os temas proeminentes na abordagem das redes, atualmente, situam-se capital social e embeddedness (enraizamento)1. Suas origens e proposições são, no entanto, distintas, embora apresentem alguns pontos de identidade, como será demonstrado. Os temas capital social e redes sociais inserem-se, atualmente, entre as principais vertentes de estudo na área, como salientado por Borgatti e Foster. Segundo estes autores (Borgatti & Foster, 2003:993), os estudos sobre capital social, na dimensão organizacional, realçam a importância das conexões e representam, em grande medida, uma tentativa de “renomear e somar um largo conjunto de pesquisas sobre redes, provenientes da literatura sobre social support e sobre recursos sociais”. Quanto ao tema do embeddenss, os autores salientam que, da mesma forma que capital social, “embeddedness encontra-se na moda entre scholars organizacionais, tornando-se extremamente popular imediatamente após as discussões de Granovetter”.

Neste capítulo serão resgatadas e associadas duas distintas concepções teóricas hoje existentes nas ciências sociais. Por um lado, a teoria das redes sociais, em particular as propostas derivados da literatura sobre “o poder dos vínculos frágeis” e sobre embeddedness e, por outro, as concepções existentes sobre capital social. A partir daí será elaborada a proposição sobre “Capital Relacional”. A utilização desta designação visa, apenas, distingui-la e separá-la

de outras concepções correntes sobre capital social. Para isso será tratada, na primeira parte, a literatura sobre redes sociais, aí incluindo a literatura sobre “laços fracos” e sobre embeddedness (enraizamento); na segunda, será abordado o tema do capital social e sua associação com as redes sociais. Será concebida, a partir daí, a proposição sobre Capital Relacional.

1.1 Redes sociais: a proposição sobre “laços fortes” no argumento de