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Como na maioria das cidades brasileiras, a estratégia espacial de localização dessas obras de mobilidade urbana, expressa no Dos- siê da Copa 2014 em Fortaleza, revelou os interesses específi cos da Fifa e dos governos ao preparar a cidade para a realização do evento, priorizando os investimentos em obras que facilitassem o acesso entre à zona hoteleira da cidade, às áreas de desembar- que de turistas e à arena esportiva. Em virtude do próprio escopo das obras, suas localizações restringiram-se a alguns setores do município polo da RMF, ligando os quatro polos: Arena Castelão,

Aeroporto Internacional Pinto Martins, Terminal Marítimo de passageiros do porto do Mucuripe e os espaços de lazer e turismo da RMF,

A análise das experiências nem sempre acenam resultados positi- vos. Ainda mais, a fl exibilização dos aparatos jurídicos-administra- tivos (parcerias público privada, regime de licitação diferenciado) promove o desmonte das políticas públicas distributivas (Lei da Transparência, Licitação Pública, Estatuto da Cidade, Plano Dire- tor Participativo, Lei da Mobilidade) em razão da implantação de um regime de exceção para elaboração e execução das obras e re- alização dos eventos cuja justifi cativa seria a celeridade necessária para preparação da cidade. Esta passa a ser regida por uma ordem externa-global, negando as especifi cidades e realidades locais em favor de um padrão único, respeitando as diretrizes das grandes corporações, implantando ilhas de modernidade, na produção de um espaço fragmentado, vigiado e excludente.

Os legados resultados de projetos orientados pelas grandes corpo- rações internacionais destinam-se a parcela da população locali- zada nos espaços globalizados e promovem uma valorização dife- renciada entre as áreas da cidade. Em Fortaleza, as intervenções benefi ciaram notadamente, bairros onde estão concentrados gru- pos de maior renda, de equipamentos e serviços modernos e lazer (centro-leste) e as áreas em que se verifi cou o aumento recente da dinâmica imobiliária (sudeste) e próximas à Arena Castelão (cen- tro-sul), reforçando a valorização dos imóveis nestes setores. Esta dinâmica urbana também foi induzida por outras obras e projetos, em execução, pela administração pública e o setor privado.

Verifi ca-se que os investimentos constantes do Dossiê da Copa des- tinaram-se à construção da Arena, do Terminal Portuário e da in- fraestrutura viária (BRTs e o VLT) de acesso a estes equipamentos. Essas obras foram realizadas sem os estudos técnicos necessários exigidos nas legislações pertinentes e sem plano de gestão, basea- dos em análise de custo-benefício que justifi quem os investimen- tos públicos.

Conforme exposto anteriormente, todas as intervenções prepa- ratórias deste megaevento foram realizadas com utilização de re- cursos públicos, os quais comprometem as fi nanças e prejudicam a realização de outras obras promotoras do desenvolvimento so- cioespacial da RMF. Por outro lado, a maioria destas obras não foi concluída, como o Aeroporto, os BRTs e o VLT, obras que poderiam supostamente benefi ciar a população.

A realização destas obras, principalmente de mobilidade urbana, promove uma reestruturação urbana, cujos benefícios atingem parcela privilegiada da população, agravando a segregação e as di- ferenças sociais existentes. Inicia-se, assim, um novo ordenamento urbano, focado nas exigências de grandes corporações, do turismo e do correlato setor de serviços articulado com o mercado global. As obras no sistema viário são indutoras da ocupação do solo ur- bano e atraem investimentos do mercado imobiliário. No entanto, ainda não foi possível aquilatar o impacto destas obras nas áreas benefi ciadas pelo PAC-Copa, pois sua implantação parcial é muito recente e não permite avaliação competente.

Depreende-se que, ao contrário do que seria um dos principais le- gados da copa, as obras de mobilidade propostas e realizadas não asseguram o direito à cidade como preconiza a política de mobili- dade urbana, assentada no transporte coletivo, que benefi ciariam todos os extratos sociais. Estes projetos são indutores de valoriza- ção imobiliária e benefi ciam parcela restrita da população e estão associados às políticas econômicas que reforçam o rodoviarismo, compremetendo a dinâmica urban em decorrência dos congestio- namentos, da poluição e dos acidentes.

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Cidade, turismo e Copa 2014:

da infraestrutura aos eventos em

Fortaleza-CE

Alexandre Queiroz Pereira Enos Feitosa de Araújo Bruno Rodrigues da Silveira

Resumo

Desde os anos 1990, o turismo apresenta-se como um importante vetor eco- nômico do estado do Ceará, privilegiado por várias políticas governamen- tais federais e estaduais. Nesse contexto, o turismo consegue ter um papel relevante na produção espacial das cidades no Ceará, notadamente as li- torâneas, e em destaque sua capital, Fortaleza. Como subsede da Copa de 2014, várias infraestruturas urbanas foram construídas no intuito de colocar a cidade num patamar turístico que ultrapassasse os atrativos já conheci- dos do turismo de sol e praia, e, com isso ampliasse os fl uxos turísticos, até então consideráveis. Neste escrito, objetiva-se analisar as novas estratégias de consolidação e ampliação dos fl uxos turísticos na metrópole cearense. São analisados, principalmente, dados fornecidos pela Secretaria de Turis- mo do Estado do Ceará e outros relatórios de investimentos. Conclui-se que o aumento de público em congressos e feiras é resultado sobremaneira do crescimento econômico da região Nordeste na última década, todavia ainda de forma embrionária e complementar aos fl uxos turísticos direcionados ao

turismo de sol e praia.

Palavras-chave: Planejamento, metrópole, lazer.

1. Introdução

A imagem do Ceará moderno é elaborada, principalmente, pela promoção da identidade turística da cidade de Fortaleza, especifi - camente associada às práticas desenvolvidas na sua orla marítima (DANTAS, 2008). Processo iniciado mais incisivamente na década de 1990, a organização da atividade turística no Ceará tem como condição importante o convencimento da sociedade local acerca da vocação turística do estado, notadamente a face litorânea da

metrópole. Para tanto, o principal argumento do governo estadu- al está relacionado aos desdobramentos econômicos da atividade, em destaque o aumento das taxas de emprego e a elevação da ren- da da população. Tal estratégia é relevante para consolidar politica- mente um projeto que nasce dos gestores/planejadores e carece da alocação de signifi cativo volume de recursos públicos.

No ano de 2009, com a divulgação da inclusão da cidade de Forta- leza como subsede do Campeonato Mundial de Futebol (COPA Fifa 2014), surge a “oportunidade” para a ampliação do hall de atrativos ditos turísticos (além do sol e da praia). Nesse contexto, o governo estadual (em consonância com o planejamento do governo muni- cipal) faz uso político da propaganda e do marketing desse aconte- cimento, promovendo Fortaleza não mais como cidade do semiári- do, mas como metrópole moderna e apta a organizar eventos com desdobramentos mundiais.

Na concepção dos planejadores públicos e privados, o turismo apresenta-se como uma atividade econômica estratégica para o desenvolvimento do estado. Concomitantemente, e já como des- dobramentos, os projetos privados adensam-se nas áreas mais bem servidas de infraestrutura, pré-requisito básico para a efetivação das práticas turísticas de massa no litoral. A engrenagem da elabo- ração de projetos e da alocação de recursos passa por várias fases e escalas governamentais, desde a municipal até a federal.

A análise aqui proposta partirá da compreensão do papel do tu- rismo como vetor estratégico do planejamento da cidade, desde a proposição de políticas públicas até sua projeção nas dimensões metropolitana e regional. Dessa forma, faz-se, inicialmente, uma discussão teórica sobre o empreendedorismo urbano e a relação entre planejamento e turismo (turismo, cidade e planejamento governamental). Em seguida, discute-se a atividade turística pela análise dos fl uxos e fi xos (empreendimentos e circulação de visi- tantes) e, por fi m, analisam-se as recentes estratégias vinculadas ao turismo de eventos, que se apresenta como nova possibilidade de ampliação dos fl uxos de visitantes no Ceará. Utiliza-se, assim, um

discurso turístico relacionado à lógica da metrópole, destacando- -se a cidade de Fortaleza como o principal espaço gerador e atrativo da dinâmica turística.