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O Imposto sobre o Valor Acrescentado surgiu em Portugal no momento da entrada para a atual UE, antiga CEE. Este imposto veio substituir o Imposto das Transações, que pelas suas características aparentava trazer mais vantagens do que o imposto que vigorava até a altura, como, por exemplo, o facto de possuir um âmbito de incidência mais alargado, abrangendo para além de produtores e grossistas, prestadores de serviços e retalhistas.

Tendo em conta que o IVA é um imposto comunitário e dada a variedade de políticas fiscais que são adotadas pelos estados-membros, verifica-se uma necessidade constante de harmonizar a legislação a ser aplicada relativamente a este imposto. Um dos principais obstáculos que se opõem à harmonização é a dificuldade de encontrar um equilíbrio entre o princípio da neutralidade e o princípio da subsidiariedade.

Com o objetivo de reduzir as divergências encontradas, têm sido desenvolvidas várias ações para encontrar soluções que se possam adequar da melhor forma ao IVA.

Neste contexto, a última ação que foi realizada com um caráter de maior relevância foi a introdução do Livro Verde, onde se levantou um debate público de modo a resolver determinadas questões que ainda não estavam bem definidas quanto ao seu enquadramento em IVA. Dessa discussão pública, foi feito um comunicado pela Comissão, relatando que, no sentido de minimizar a fuga e a evasão fiscal, deveria ser feito um alargamento das bases fiscais, limitar o recurso a taxas reduzidas e rever as isenções previstas.

Atualmente a diretiva que regulamenta o IVA é a Diretiva 2006/112/CE, denominada “Diretiva IVA”, que revogou a Sexta diretiva e instaurou o segundo sistema comum do IVA.

Como apuramos, o sistema do imposto sobre o valor acrescentado possui características muito particulares em comparação com outros impostos do sistema fiscal português. O facto de passar por todas as fases do processo produtivo e de permitir a sua dedução e liquidação em cada patamar do circuito económico, faz com que se identifique o seu princípio base: o princípio da neutralidade. Ou seja, ao longo de todas as etapas que o produto atravessa, apenas se deve verificar a existência do IVA junto do consumidor final, não interferindo nos preços que são praticados pelos produtores.

Neste sentido, o princípio da neutralidade define a personalidade deste imposto, sendo uma referência para as decisões tomadas pelos tribunais. Assim, podem ser identificados dois tipos de neutralidade: neutralidade sobre o consumo e neutralidade sobre a produção.

Verificamos que a incidência do IVA revela-se como um fator importante na determinação da tributação das transmissões de bens, das prestações de serviços, do sujeito passivo e da atividade económica.

Neste seguimento, o conceito de sujeito passivo em sede de IVA assume uma particular relevância em comparação com os outros impostos do sistema fiscal, na medida em que apresenta um carácter funcional, ou seja, em IVA o sujeito passivo é aquele que desenvolve a atividade económica e não aquele que tem a capacidade contributiva para pagar o imposto ao Estado. De acordo com a Diretiva IVA, devem estar presentes três requisitos para definir o conceito de sujeito passivo. Deve ser possível identificar o desenvolvimento de uma atividade económica com carácter de habitualidade e, nesse sentido, reconhecer a entidade que a desenvolve, independentemente do resultado que venha a ser obtido. Assim sendo, em IVA, o sujeito passivo é aquele que tem a obrigação de entregar o imposto ao Estado.

Atestamos que o conceito de sujeito passivo e de atividade económica estão interligados, quando relacionados com o imposto sobre o valor acrescentado. O conceito de atividade económica, pelo facto de tentar abranger o maior número de atividades possíveis, tem gerado dúvidas na jurisprudência produzida pelo TJUE. Este conceito foi-nos apresentado pela segunda diretiva, mas não com uma clareza quanto à sua definição. Tal como foi apresentado pela segunda diretiva, na legislação portuguesa não foi utilizado o termo de atividade económica, preferindo o legislador referir-se à atividade propriamente dita.

Assim, o IVA apresenta-se como um imposto de natureza objetiva, ou seja, as intenções com o que o sujeito passivo exerce determinada atividade económica e o resultado que esse pode gerar são irrelevantes para o ato da tributação.

Como verificamos, as transmissões de bens são definidas como sendo uma transferência de bens corpóreos por forma correspondente ao exercício de propriedade. Como forma de transmissão de bens podemos ter um contrato de locação financeira leasing, em que é aplicada uma prestação mensal e apenas no final se opta pela compra ou não do bem em questão e, nesse caso, a liquidação do imposto deverá ser feita numa

primeira fase em prestações mensais e no final, no caso de opção de compra do imóvel, a liquidação deverá ser efetuada sobre o valor residual. Não obstante, perante um contrato de locação venda, que é assimilado a uma transmissão de bens, a operação é desde logo tributada.

No entanto, a cessão a título oneroso ou gratuito do estabelecimento comercial, da totalidade de um património ou de uma parte dele, que seja suscetível de constituir um ramo de atividade independente, quando, em qualquer dos casos, o adquirente seja, ou venha a ser, pelo facto da aquisição, um sujeito passivo do imposto, não é considerada uma transmissão de bens.

No que diz respeito ao conceito de prestação de serviços, constatamos que este é-nos apresentado pelo CIVA como possuindo um carácter de universalidade. Isto é, o Código do IVA classificou as prestações de serviços pela negativa, ou seja, as prestações de serviços são todas aquelas operações que não são tratadas como transmissão, aquisição intracomunitária ou importação de bens. Não obstante, para classificarmos determinada atividade como prestação de serviços, devemos ter sempre presente uma atividade económica, ou seja, deve existir sempre um ato de consumo. Atestamos ainda, relativamente ao direito de usufruto relacionado com as isenções e tendo em conta o conceito de prestação de serviços e a reposta do TJUE, que este pode ser igualado a uma locação de imóveis, pois embora sendo diferentes, economicamente são comuns, uma vez que consistem em conferir a um destinatário, por um determinado período de tempo e em contrapartida de uma remuneração, o direito de ocupar um imóvel e de excluir outra pessoa desse mesmo benefício.

Relativamente às isenções, em particular as isenções relativas aos bens imóveis, verificamos que se caracterizam por serem enquadradas na Diretiva IVA como isenções de ordem técnica, ou seja, foram criadas devido à dificuldade administrativa em as tributar. Em Portugal, para além de se considerar estas dificuldades administrativas como barreiras na tributação destas operações, a fuga e a evasão fiscal que se poderiam verificar neste campo, constitui justificação para a utilização de isenções nas locações de bens imóveis, tanto por particulares como por empresas.

Como notamos ao longo do estudo, o simples facto do sistema possibilitar a aplicação de isenções em sede de IVA, faz com que se verifique uma rutura naquele que é o princípio basilar do IVA: o princípio da neutralidade. Segundo este princípio,

operadores económicos que efetuem o mesmo tipo de operação não devem ser tratados de forma diferente, salientando-se assim a objetividade das isenções.

Neste contexto, as isenções relativas às operações imobiliárias estão enquadradas nas isenções incompletas, ou seja, no tipo de isenções em que o sujeito passivo não liquida o imposto, mas também não pode deduzir o IVA que suporta.

Como já expusemos, neste tipo de isenções é quebrado o funcionamento normal do sistema do IVA, afetando o princípio da neutralidade. Assim, o facto do sujeito passivo não poder deduzir o valor do imposto suportado a montante, irá gerar um custo, que será acrescido ao valor final do produto e como tal influenciar a decisão do consumidor. Nestas situações, o valor do IVA permanece camuflado no preço final do bem, tornando-se oculto.

Quando nos referimos às isenções relativas às operações imobiliárias, referimo-nos a operações que abrangem tanto a locação como a transmissão de bens imóveis.

Neste sentido, como observamos, a locação de bens imóveis é isenta de IVA. No entanto, um contrato de locação pode abranger outras prestações de serviços para além do arrendamento do espaço propriamente dito. Neste seguimento, é posta em causa a isenção que é atribuída pelo art.º 9º do CIVA. Como tal, o conceito de locação é fundamental para fazer o enquadramento da tributação em IVA. Assim, deve ser possível evidenciar num contrato de locação, o direito de usufruto sobre determinado imóvel (como se fosse um bem próprio), durante um certo período de tempo, mediante o pagamento de uma prestação. Num contrato de locação podemos ter três tipos de situações. No caso do imóvel ser locado apenas por “paredes nuas”, a operação ficará enquadrada no n.º 29 do art.º 9º, não havendo, portanto, lugar a tributação. O conceito de “paredes nuas” pretende identificar o espaço como não estando preparado para o desenvolvimento de uma atividade económica, ou seja, não se baseia apenas na mera transmissão do imóvel sem ser acompanhado por mobiliário.

Caso o contrato de locação englobe, para além da locação do imóvel propriamente dita, prestações de serviços, estamos perante contratos mistos. Neste tipo de contratos deve ser feita uma análise particular relativamente a cada contrato, uma vez que no caso do valor das prestações de serviços ser facilmente separado do valor da locação, será isenta a parte relativa à locação do imóvel e tributada a parte relativa à prestação de serviços.

No entanto, como verificamos no caso Field Fischer Waterhouse, quando o contrato englobar o arrendamento e prestações de serviços sem autonomização, ou seja, em que uma atividade implica a outra, verifica-se uma dificuldade na atribuição de valores separadamente, o que nos leva a classificar o contrato como sendo de natureza atípica. Normalmente, estes contratos estão relacionados com cedências de espaços de lojas em centro comercial e, nesse sentido, pelo facto do imóvel estar preparado para o desenvolvimento de uma atividade económica e estar inserido num ambiente propício ao negócio, o contrato será tratado como atípico, sendo a prestação totalmente tributada em sede de IVA, afastando, assim, a isenção na locação de bens imóveis.

Neste seguimento, o CIVA apresenta-nos determinadas situações de locação que não estão abrangidas pela isenção, como por exemplo, os parques de estacionamento, em que à partida, seriam tributados, no entanto, se estiverem ligados a uma locação isenta podem ser abrangidos por essa mesma isenção. Como verificamos no caso Skatteministeriet/Morten Henriksen, em que refere que não se pode excluir da isenção prevista na locação de áreas destinadas ao estacionamento de veículos, quando essa mesma área esteja ligada a uma locação isenta e as duas locações constituam uma única operação económica.

No que diz respeito às isenções nas transmissões de bens imóveis, o CIVA isenta as operações sujeitas a IMT. Neste contexto, apuramos que os prédios para revenda estão isentos de IMT durante um período de três anos. Este período temporal surge da necessidade de se evitar eventuais situações de utilização abusiva deste regime, sendo que a Lei parte do pressuposto de que o período médio de rotação de stocks destas empresas é de três anos. O facto de não existir nenhum valor acrescentado neste tipo de operações, para além da capacidade de colocar o imóvel no mercado, poderá justificar a isenção que é atribuída em sede de IVA.

Para além das transmissões de prédios, o CIMT também considera que a cessão de posição contratual integra o conceito fiscal de transmissão onerosa de imóveis, assim como os contratos de arrendamento com a cláusula em que os bens arrendados se tornam propriedade do arrendatário depois de satisfeitas todas as rendas acordadas.

Como já referido, as isenções quebram a estrutura do IVA e, nesse sentido, é dada a possibilidade de renunciar a essa mesma isenção, permitindo restabelecer a neutralidade perdida. Não obstante, a renúncia pode ser utilizada como forma de minimizar o custo que as empresas suportam por força da aplicação das isenções.

Verificamos que o processo de renúncia está sujeito a determinados requisitos e condições que vêm discriminadas no Regime de Renúncia à isenção do IVA nas operações relativas a bens imóveis aprovado pelo Decreto-lei nº 21/2007, de 29 de janeiro. Estas condições referem-se ao sujeito passivo, ao imóvel e a questões do nível burocrático, que têm como objetivo uniformizar e certificar que todos os sujeitos passivos que pretendam renunciar à isenção possuem as mesmas características e estão dentro dos “limites legais”. Como referimos, as condições de natureza objetiva passam por impor requisitos ao imóvel, que se traduzem, por exemplo, no facto do imóvel, estar inscrito na matriz e de ser transmitido/locado pela sua totalidade. As condições subjetivas, impõem que o sujeito passivo utilize o imóvel numa atividade que confira o direito à dedução, excluindo desta possibilidade os pequenos retalhistas. No caso de se tratar de sujeitos passivos mistos, o valor global da prestação deverá ser superior a 80% do volume de negócios, ou então, se inferior, a atividade deverá ser exercida com um carácter de habitualidade e estar relacionada com operações imobiliárias. Relativamente às condições formais, referenciamos a importância que o certificado de renúncia possui, pois constatamos que este é um elemento fundamental no processo, uma vez que a renúncia apenas produz efeitos após a celebração do contrato e o certificado já deve estar emitido e na posse do sujeito passivo, como consta do acórdão do STA de 03 de Julho de 2002 proferido no processo nº 0139/02. O certificado dever ser emitido num prazo de 10 dias após a data da confirmação das condições e tem uma validade de seis meses. Após a celebração do contrato e com o processo de renúncia aprovado, o sujeito passivo passará a ter obrigações fiscais e contabilísticas, como qualquer outro que esteja enquadrado no regime de tributação do imposto sobre o valor acrescentado.

Estas obrigações e direitos passam por informar a Administração Tributária e Aduaneira, através da declaração de início de atividade ou da declaração de alterações, que a operação a ser realizada irá incluir IVA e, como tal, no caso de transmissões de imóveis, passará a incluir nas suas faturas a expressão “IVA autoliquidação”, sendo possível a dedução do valor do imposto suportado a montante. As faturas devem ser contabilizadas de acordo com o CIVA e a contabilidade deve ser organizada.

Atestamos que o valor normal a considerar nas operações entre empresas que possuem relações especiais, ou seja onde se verificam os denominados “preços de transferência”, não deverá ser inferior ao Valor Patrimonial Tributário que serviria de

base para o cálculo do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis. Desta forma, pretende-se evitar a fuga e a evasão fiscal.

Após ter sido validado o processo de renúncia, o direito à dedução do imposto suportado a montante “nasce” na data da escritura ou do contrato de locação. No entanto, no caso de se verificar adiantamentos, pode ser feita a dedução, desde que não resulte imposto a receber por parte do sujeito passivo. O prazo para se poder deduzir o valor do imposto, regra geral, é de quatro anos. Não obstante, este período pode ser alargado até oito, desde que o sujeito passivo exerça, com habitualidade, uma atividade de construção de imóveis, quando o prazo de construção tenha ultrapassado o período de quatro anos.

Verificamos que existem dois métodos de cálculo para a dedução do imposto sobre o valor acrescentado no caso de sujeitos passivos mistos. Neste sentido, pode ser utilizado o método do pro rata, que é calculado através de uma fração e por essa via é aplicada uma percentagem ao valor da operação. O método da afetação real é o mais aconselhável para aplicar nas operações imobiliárias, e pretende identificar a efetiva utilização dos inputs na produção do bem, ou seja, a dedução através deste método deve ser efetuada com base em critérios objetivos, de forma a que seja possível determinar com maior rigor o grau de utilização desses bens e serviços em operações que conferem e não conferem o direito à dedução.

Deve ser feita uma regularização do imposto sobre o valor acrescentado quando determinado imóvel seria para afetar a uma operação tributável e à posteriori não se verifica essa intenção. Não obstante, apuramos que, no caso de ter sido transacionado um bem imóvel em que foi feita a dedução do IVA nos bens utilizados para a sua construção e posteriormente a respetiva transação é abrangida pela isenção em sede de IVA, caso o sujeito passivo possua todos os requisitos necessários para que o processo de renúncia e esse processo seja aceite, não é necessário proceder à regularização do imposto.

Concluímos, assim, que, apesar de, regra geral, as operações imobiliárias, a locação e transmissão de imóveis, serem isentas de IVA, esta isenção pode não ser benéfica para o sujeito passivo, uma vez que pode gerar um custo acrescido, já que o valor de imposto que não lhe é possível deduzir terá de ser incluído no preço final do bem. Relativamente à isenção na locação, apesar de, de uma forma geral, a operação ser isenta, concluímos que, consoante o contrato, deve ser feita uma análise para apurar se

efetivamente este pode estar isento ou não de imposto. Relativamente à isenção nas transmissões de imóveis, verificamos que as operações de cedência de posição contratual num contrato de locação financeira imobiliária, caso reúnam as condições de sujeição a tributação em IMT, ficam abrangidas pela isenção do art.º 9º do CIVA. Neste seguimento, os contratos de arrendamento com a cláusula de que os bens arrendados se tornam propriedade do arrendatário depois de satisfeitas todas as rendas acordadas, também são considerados como transmissões de bens imóveis e, como tal, sujeitos à isenção em sede de IVA.

Sendo que o princípio da neutralidade do IVA é quebrado, só a renúncia à isenção permite restabelecer a neutralidade perdida. Neste sentido, dever ser feito um pedido de renúncia, que está sujeito a várias condições objetivas, subjetivas e formais, que pela sua burocracia poderá levar o sujeito passivo a não se submeter ao respetivo processo, ou levar à fuga e à evasão fiscal e que nesse sentido deveriam ser revistas.

No documento O IVA NAS OPERAÇÕES IMOBILIÁRIAS (páginas 100-108)

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