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Para alcançar os objectivos inicialmente propostos procedeu-se a estudos de análise morfológica e morfométrica com base no Modelo Digital de Terreno produzido, análise dos padrões de backscatter de fundo rochoso e sedimentar, bem como outros aspectos (tectónica, por exemplo) observáveis nas sonografias de sonar lateral, e interpretação de perfis de reflexão sísmica monocanal. De forma complementar a estes estudos, foram ainda analisadas amostras de sedimentos superficiais e enquadradas as amostras de rocha obtidas durante os cruzeiros Lusitanie e compiladas em Mougenot (1976).

O recenseamento do relevo submarino da área de estudo tendo por base os dados batimétricos disponibilizados para este estudo permitiu a construção de um Modelo Digital de Terreno que, face ao mapa batimétrico apresentado em Mougenot (1989), tornou os contornos de alguns acidentes morfológicos mais concisos, sendo possível identificar claramente famílias de lineamentos morfológicos, como é o caso do Vale Submarino da Ericeira e os relevos acidentados entre os paralelos da Ponta da Lamparoeira e Peniche. Permitiu ainda segmentar a plataforma em três domínios fisiográficos distintos – interno, intermédio e externo – onde actuaram processos geodinâmicos distintos.

A análise morfológica complementada com interpretação das sonografias de sonar lateral e dos perfis de reflexão sísmica monocanal permitiu concluir que o principal factor condicionador da fisiografia da plataforma continental foi o controlo tectónico responsável por:

1. Rejuvenescimento morfológico de altos-fundos marinhos, como acontece com os Relevos Marginais da Plataforma Média, Costeiras Pêro da Covilhã, Serro do Sudoeste, Pico Gonçalves Zarco, Planalto Diogo Gomes e Pico Focinho.

2. Criação e/ou reactivação de linhas de fraqueza estrutural que facilitaram posteriormente a erosão linear diferencial através de processos erosivos submarinos ou sub-aéreos, como acontece no Vale Submarino da Ericeira, Serro do Sudoeste e Costeiras Pêro da Covilhã.

3. Formação de áreas restritas de sedimentação, tais como: (1) depressão da plataforma interna ao largo da Lourinhã (Bacia da Lourinhã); na plataforma média sobre a parte vestibular do Mar da Ericeira; e (3) na plataforma externa, quer no desenvolvimento do prisma progradante que cobre o Monoclinal da Lourinhã, como no enchimento e colmatação do Vale Submarino da Ericeira. Da articulação entre a interpretação geomorfológica, apoiada na análise do Modelo Digital de Terreno, a interpretação das sonografias de sonar de varrimento lateral e a análise qualitativa das amostras de sedimentos de fundo adquiridas no âmbito dos cruzeiros SEPLAT, logrou-se construir um mapa de afloramento rochoso para a plataforma continental do Esporão da Estremadura. Esta cartografia temática, inédita para a área, mostra uma elevada densidade de afloramento rochoso por área de superfície, com cerca de 20% da área total coberta por rocha consolidada.

Este trabalho, que usufrui da amostragem e datações realizadas por Mougenot (1976) permitiu melhorar e pormenorizar a cartografia geológica existente de Boillot et al. (1978) principalmente no que respeita à localização, extensão e delimitação das formações neogénicas e quaternárias e tectónica. Consequentemente foi possível estabelecer quatro etapas fulcrais para a evolução da área de estudo:

1. Exposição sub-aérea generalizada da plataforma continental – na transição do Paleogénico ao Neogénico. Aproximadamente 2/3 da totalidade da área encontrar-se-ia em exposição sub-aérea, tendo sido talhada uma plataforma de abrasão e ravinado o soco mesozóico.

2. Transgressão e abatimento da plataforma externa – deverá ter sido na transição do Chatiano para o Aquitaniano, ou mesmo já no Aquitaniano, que se terá começado a gizar uma tendência transgressiva, a qual levou ao estabelecimento de dois grandes golfos sobre a plataforma média, um onde se situa actualmente a Bacia da Lourinhã e outro no Mar da Ericeira. Abatimentos sectoriais de aproximadamente 40 metros (Fig. VI.17; Fig. VII.9) na plataforma externa conduziram à individualização das sub-bacias do Monoclinal da Lourinhã, a leste do Pico Focinho, Bacia-Alta, Vale Submarino da Ericeira e a sul e sueste do Pico Gonçalves Zarco. O máximo transgressivo deverá ter ocorrido no Langhiano.

3. Inversão tectónica miocénica – no Tortoniano ocorreu a reactivação dos acidentes tectónicos de direcção NNE-SSW como cavalgamentos e dobramentos na cobertura sedimentar e soco varisco, criando ou reforçando os relevos seguintes: Costeiras Pêro da Covilhã, Serro do Sudoeste, Serro do Centro, Pico Gonçalves Zarco e Planalto Diogo Gomes, como se podem observar exemplos no Cap. VI.6. As dobras têm eixos orientados segundo NE-SW e, por vezes, com planos axiais tendencialmente vergentes para sudeste, como observado na Fig. V21. Admite-se um retrocesso da linha de costa a nível regional (regressão forçada), colocando novamente uma área significativa da plataforma interna e média em exposição sub-aérea.

4. Sedimentação e tectónica no Plio-Quaternário – após o evento tectónico ocorrido no Tortoniano, estabelece-se definitivamente uma sedimentação predominantemente siliciclástica, com deposição de prismas proximais progradantes e depósitos distais agradantes sobre o Monoclinal da Lourinhã, preenchimento e colmatação de paleovales e depressões de acentuado desgaste linear na proximidade do Vale Submarino da Ericeira e tapeamento do bloco sudoeste da Falha do Esporão da Estremadura (entendida como uma evidência superficial da fractura Tore – Sintra) no sector vestibular do Mar da Ericeira. Possivelmente na transição Miocénico – Pliocénico esta falha experimentou rejogo, tendo sido calculado uma de movimentação vertical de 8.6 x 10-4mm / ano. A assimetria na espessura das unidades sísmicas da

cobertura Plio-Quaternária, exposta na presente cartografia, permitiu discutir algumas questões ao nível das fontes sedimentares e mecanismos de transporte desses sedimentos. Na ausência de rios de grande caudal como ocorre nos sectores adjacentes (a norte os rios Minho, Douro, Mondego e Vouga; a sul os rios Tejo e Sado), e dada a contribuição actual das Ribeiras do Oeste (Sizandro, Alcabrichel, Lizandro, Sefarujo, etc) Baseado em evidências encontradas no onshore (Gomes, 1986; Freire, 1986) sugere-se, que um grande rio terá banhando, à época, a generalidade da plataforma litoral e continental. Uma outra hipótese para a elevada espessura dos depósitos plio-quaternários na plataforma média resulta do próprio desmantelamento da plataforma continental que, em períodos de abaixamento do nível médio do mar, expunha uma parte substancial da sua área devido ao rejuvenescimento do relevo proporcionado pela inversão tectónica miocénica.