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Condutas comissivas e omissivas da administração

2.2 A responsabilidade administrativa ambiental

2.2.4 Condutas comissivas e omissivas da administração

O Estado exprime-se por meio de seus órgãos, os instrumentos e meios de ação pelos quais se coloca em condições de querer, atuar e de relacionar-se com outros sujeitos de direito.

Por efeito da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) foi criado um sistema que congrega diversos órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e as fundações instituídas pelo Poder Público com o objetivo de proteger e melhorar a qualidade do meio ambiente. Esse sistema denomina-se Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA (art. 6º, I a VI, da citada lei).

O SISNAMA tem atuação harmônica e cooperada para proteger o meio ambiente e sempre garantir ou restaurar o equilíbrio do ecossistema.

Os órgãos são formados pelo Elemento Subjetivo, isto é, a pessoa ou o conjunto de pessoas que expressam a vontade da administração, os agentes públicos, e pelo Elemento Objetivo que são as atribuições, meios técnicos, informativos e coativos pelos quais os agentes atuam em nome do órgão.

Cabe ao Poder Público adotar uma série de ações e programas que, no seu conjunto, constituam a Política Ambiental do País, como providências indispensáveis à garantia da efetividade do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, direito humano fundamental consagrado no texto constitucional (art. 225, § 1º. da CF). A Lei 6.938/81 foi criada para ratificar essa determinação, arrolando instrumentos de implementação da Política Nacional de Meio Ambiente (arts. 4º, 9º. ao 12 da Lei PNMA).

Na administração temos o agente público que, em virtude de suas atribuições, pode ser: a) Agentes Políticos, os titulares de cargos que compõem a estrutura fundamental do governo; b) Agentes Administrativos, os titulares de cargos, empregos ou funções públicas. A denominação abrange, portanto, todos os que mantêm com o Poder público relação de trabalho, não-eventual, sob o vínculo de dependência, caracterizando-se, assim, pela profissionalidade e relação de subordinação hierárquica.

Nessa qualidade encontram-se os Servidores Públicos (art. 37, I e IX da CF) que são: os funcionários públicos( investidos em cargos); os empregados públicos (investidos em emprego); os servidores públicos em sentido estrito ( servidores admitidos em funções

públicas); os prestacionistas de serviço público temporário (contratados por tempo determinado); os militares.

Como a Constituição Federal equiparou a pessoa de direito público às de direito privado que prestem serviços públicos (concessionárias, permissionárias e as autorizatárias de serviços públicos), os agentes dessas empresas (presidente, superintendentes, diretores, empregados em geral) ficaram na mesma condição dos agentes públicos no que se refere à responsabilidade pelos danos causados a terceiros.

A Administração pode atuar através de condutas comissivas ou de condutas omissivas. A doutrina e a jurisprudência brasileiras são unânimes quanto à natureza objetiva da responsabilidade do Estado por conduta comissiva. Porém, quanto às condutas omissivas, o direito pátrio apresenta duas correntes divergentes. A primeira, capitaneada por Oswaldo Aranha Bandeira de Mello e secundada por Celso Antônio Bandeira de Mello, aponta a responsabilidade do Estado como sendo de natureza subjetiva, com base no artigo 43 do novo Código. A segunda corrente, que sustenta ser a responsabilidade objetiva, é seguida pelos doutrinadores Odete Medauar, Celso Ribeiro Bastos, Álvaro Lazzarini, Aguiar Dias, Hely Lopes Meirelles, Weida Zancaner Brunini, Yussef Said Cahali, entre outros, e fundamenta-se no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.

Celso Antônio Bandeira de Mello, a fim de justificar a aplicação da Teoria Subjetiva à responsabilidade do Estado por conduta omissiva, argumenta que a palavra "causarem" do artigo 37, § 6.º, da Constituição Federal, somente abrange os atos comissivos e não os omissivos, afirmando que estes apenas “condicionam” o evento danoso, ou seja, são apenas “condição”, e não “causa”, do dano, pois causa é o fato que positivamente gera um resultado e condição é o evento que não ocorreu, mas que, se tivesse ocorrido, teria impedido o resultado110.

A outra corrente, que sustenta ser a responsabilidade do Estado por conduta omissiva regida pela Teoria do Risco, fundamentada no artigo 37, § 6º, da CF, contraria os argumentos de Celso Antônio Bandeira de Mello, afirmando que a conduta omissiva estatal não pode ser considerada condição, mas sim causa, pois esta é todo fenômeno capaz de produzir um poder jurídico pelo qual alguém tem o direito de exigir de outrem uma prestação (de dar, de fazer, ou de não fazer).

A Constituição Federal, no artigo citado, não diferenciou as condutas comissivas e omissivas; assim, o vocábulo “causarem”, do aludido dispositivo, deve ser lido como

110 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2002,

“causarem por ação ou omissão”, pois, em caso contrário, o legislador teria recuado no tempo estabelecendo a responsabilidade objetiva apenas para os casos de conduta comissiva, o que é inconcebível diante dos avanços em outras matérias constitucionais, tais como a substituição da expressão “funcionário” por “agente”, muito mais abrangente e a extensão da responsabilidade também para os particulares prestadores de serviço público (na época, a desestatização apenas engatinhava).

Ante todos os argumentos expostos, nosso posicionamento é no sentido da aplicabilidade da Teoria do Risco Administrativo111, ou seja, da aplicação da responsabilidade

de natureza objetiva ao Estado pelas condutas omissivas que causarem danos a terceiros, haja vista a necessidade de proteger o lesado (meio ambiente e coletividade) ante a dificuldade deste em demonstrar a culpa ou dolo de algum agente ou de um serviço que não funcionou como deveria. Ademais, o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, é claro ao dispor que o Estado responde, independentemente de culpa, pelas condutas comissivas ou omissivas que causarem danos a terceiros. Todos os argumentos utilizados pelos doutrinadores a fim de sustentar a tese da aplicação da Teoria Subjetiva na responsabilização das condutas omissivas estatais são frágeis e contraditórios. Além disso, o novo Código Civil, ao mencionar essa regra no art. 43, corroborou a norma constitucional, no sentido de que será verificada a culpa ou o dolo somente em ação regressiva do Estado em face do agente causador do dano. Afinal, o objetivo maior a ser alcançado é a preservação do meio ambiente e a sadia qualidade de vida.

Contudo, ainda surgem questionamentos que incomodam. Se levarmos em consideração que a administração pública e a pessoa de direito privado podem agir regressivamente contra o agente causador do dano, na hipótese de serem condenadas a indenizar terceiro por ato lesivo do agente e por este ter agido com dolo ou culpa, o que dizer quanto à possibilidade de o terceiro lesado promover ação de ressarcimento contra o próprio agente, prescindindo de responsabilizar o próprio Estado ou quem lhe faça as vezes, ou ainda buscando a solidariedade de ambos?

111 A Teoria do Risco Administrativo, imaginada por Léon Duguit e desenvolvida por renomados

administrativistas, parte da premissa de que a Administração Pública no exercício de sua normal ou anormal atividade pode gerar risco ou danos para os administrados e, portanto, deve suportar o ônus da sua atividade. CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 239-240: “Em apertada síntese, a teoria do risco administrativo importa atribuir ao Estado a responsabilidade pelo risco criado pela sua atividade administrativa. ...É a forma democrática de repartir os ônus e encargos sociais por todos aqueles que são beneficiados pela atividade da Administração Pública. Toda lesão sofrida pelo particular deve ser ressarcida, independentemente de culpa do agente público que causou. O que se tem que verificar é , apenas, a relação de causalidade entre a ação administrativa e o dano sofrido pelo administrado”.

No que pertine à primeira situação, pensamos que a vítima teria que se submeter à discussão no âmbito da responsabilidade subjetiva.

Contudo, o posicionamento de Hely Lopes Meirelles é o de que o agente só pode responder perante o Estado, não podendo a vítima acioná-lo diretamente, sob o fundamento estabelecido no art. 37, § 6º. da CF, de que lá estaria estabelecido que o lesado aciona o Estado e este retornaria contra o agente.

Posição divergente tem Celso Antônio Bandeira de Melo quando assevera que não vislumbra no texto da norma qualquer caráter defensivo do funcionário perante terceiro, pois a norma tende a proteger o administrado, oferecendo-lhe um patrimônio solvente e a possibilidade da responsabilidade objetiva em muitos casos. E acrescenta,

sendo um dispositivo protetor do administrado, descabe extrair dele restrições ao lesado. A interpretação deve coincidir com no sentido para o qual caminha a norma, ao invés de sacar dela conclusões que caminham na direção inversa, benéfica apenas ao presumido autor do dano112.

Ressalte-se que a posição do STF tem sido no sentido da possibilidade de propositura de ação contra o Estado e o agente conjuntamente113.

Oswaldo Aranha Bandeira de Melo defende que “a vítima pode propor ação de indenização contra o agente, contra o Estado, ou contra ambos, como responsáveis solidários, nos casos de dolo ou culpa”114.

A solidariedade passiva não se presume, deve estar expressa na lei. No caso do dano ambiental o nexo de causalidade é bastante atenuado, prevendo as normas pertinentes que são responsáveis todos os que, direta ou indiretamente, causarem danos (art. 14, § 1º. c/c art. 3º., IV ambos da Lei no. 6.938/81, informados pelo sistema construído pela CF- art. 225, caput e §. 3º.) . O sistema de proteção ao meio ambiente institui uma solidariedade passiva entre os poluidores.

A responsabilidade solidária objetiva decorre de omissão da administração quando não comprova que agiu com o seu poder/dever de polícia a fim de evitar possíveis danos. Afinal,

para compelir, contudo, o Poder Público a ser prudente e cuidadoso no vigiar, orientar e ordenar a saúde ambiental nos casos em que há prejuízo

112 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2002,

p. 917.

113 RE 90.071, RDA 142/93 e AI 106.483, RDA 162/236.

114 MELO Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais de Direito Administrativo, v. II, Rio de Janeiro:

Forense, 1969. p. 481-482. In MELO, Celso Antonio Bandeira de, Curso de Direito..., ob. cit. P. 917. MELO Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais de Direito Administrativo, v. II, Rio de Janeiro: Forense, 1969. In: MELO, Celso Antonio Bandeira de (org.). Curso de Direito Administrativo, 17a. ed., rev. e atual. até as emendas 41 (da Previdência) e 42, de 2003. São Paulo: Malheiros Editores, 2004, p. 917.

para as pessoas, para a propriedade ou para os recursos naturais, mesmo com a observância dos padrões oficiais, o Poder Público deve responder solidariamente com o particular115.