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4.2 ESTRATÉGIAS DE ENSINO

4.2.1 CONHECIMENTO DAS NECESSIDADES DOS ALUNOS

Os professores revelam uma fragilidade na forma de conhecer as necessidades dos seus alunos em função de algumas limitações como o excesso de alunos por turma, o nível de maturidade dos estudantes, a dificuldade de alcançar as necessidades individuais, os diferentes perfis dos alunos, o dilema da abertura de comunicação para não privilegiar somente alguns da turma, o período curto de tempo das disciplinas, sobrecarga de trabalho do professor, incerteza do docente em como tratar essa questão e a maneira como ocorre a relação tida entre professor e aluno. Esses entraves são indicados nos discursos a seguir.

Não adianta ficar indo apenas atrás das necessidades individuais dos alunos até porque será que os interesses deles realmente é o que é necessário para o aprendizado deles. Será que aquelas estratégias não estão adequadas, mas os alunos é que não querem corresponder a uma maior responsabilidade, pois agem com

imaturidade. [PII.42]

De maneira indireta a gente faz isso, não é? Mas tendo uma turma grande a gente acaba não individualizando até os questionamentos. [PIII.23]

Eu sei que não consigo fazer com todos até porque tem aqueles que são fechados também, tem as suas dificuldades e não expõem (...) é uma classe de alunos que às vezes é como se fossem crianças. A gente também tem que deixar eles trilharem o caminho. Eu tento o possível fazer isso, mas sei também que o tempo é limitado e às vezes você tenta aplicar isso de maneira geral pra turma, ne? [PIV.27]

Eu tenho buscado conhecer, mas eu sempre penso nisso e verifico que ao final do semestre quando a gente está se afinando com o aluno, começando a quebrar as

barreiras naturais das resistências ai o semestre acaba. [PVIII.13]

Eu não consegui ainda aplicar em sala de aula é entender o que tem por trás do esforço do aluno, pois o que eu quero é o resultado. Eu não consigo olhar para a história do aluno e talvez seja uma falha minha. [PIX.24]

Percebe-se que os relatos dos professores para não fazerem essa busca pelo conhecimento das necessidades dos alunos são devido aos fatores acima pontuados, o que dificulta a construção de uma abordagem construtivista. Merriam e Caffarella (1991) afirmam que o processo de aprendizagem é o contexto inter-relacionado e fatores contextuais podem

facilitar ou inibir o desenvolvimento da educação de adultos. Aliás, a educação de adultos deve considerar as diferenças de estilo, tempo, lugar e ritmo de aprendizagem para dar significado às categorias de experiências (MERRIAM; BROCKETT, 2007; LINDEMAN, 1926).

Nesse sentido, os docentes revelam que o ambiente interfere para eles conhecerem melhor os seus alunos e realmente é necessário desenvolver um ambiente favorável para a educação, de tal maneira que se desenvolvam métodos andragógicos. Reynolds (1999) comenta que os aspectos do ambiente de aprendizagem não só afetam o modo como as pessoas aprendem, mas é uma fonte de aprendizagem. Então, é bom que os professores conheçam o ambiente para perceberem as necessidades dos alunos e desenvolver estratégias de ensino coerentes com a realidade desse ambiente que leve à eficácia do aprendizado.

Ainda assim, alguns docentes demonstram pouco interesse e acreditam que não é tão necessário para o desenvolvimento de seus planos de aulas ou alguns se centram apenas em conhecer o perfil profissional dos seus alunos e dar suporte a dimensão técnica do ensino. Nas falas a seguir, esses significados são evidenciados:

Eu tenho que ensinar aquele conteúdo independente de características do aluno.

[PI.24]

Pra tu ver como o sistema te modifica porque hoje eu não faço mais isso. (...) Sabe, assim, por experiência de professor, se tu for escutar realidade e contexto do aluno, tu não dar aula. (...) Conhecer a realidade da turma, com todo respeito, isso ai não

me interessa. [PV.21]

Busco no primeiro dia de aula saber qual é o interesse do aluno pra determinadas áreas da Administração. [PVI.14]

No primeiro dia de aula eu chego na sala para saber qual é a área de atuação deles não só de hoje, mas das experiências passadas e faço depois um agrupamento dos setores. E o reflexo disso no plano de aula é levar textos relacionados com os segmentos desses alunos. [PIX.16]

Os resultados sugerem uma falta de confiança nos alunos, pois os professores afirmam que os alunos são, por vezes, atrevidos e se utilizam de artimanhas para não arcar com suas responsabilidades. Com isso, torna-se necessário tomar atitudes inflexíveis porque o apoio a alguém da turma que está passando por algum problema pode levar o professor a ceder para os demais alunos e estes costumam abusar da boa vontade do professor. Também eles indicam o quanto o sistema em si é forte para te moldar, pois prevalece o sistema educacional tradicional positivista, em que o professor se sente barrado ao querer buscar instrumentos diferenciados. Por isso, se restringem ao perfil profissional do aluno, mas é interessante que um dos relatos explicita o resgate de experiências passadas dos alunos para envolver os assuntos o mais próximo possível das experiências reais dos estudantes.

Também há professores que acham essa abordagem como sendo puramente discursos advindos da Pedagogia e estão dissociados do contexto real do ambiente de ensino, como é visto na fala: ―Olha eu acho que isso é um pouco de discurso, sabe? (...) esse discurso de que você vai adaptar seus métodos de ensino às necessidades dos alunos eu acho que tem alguma restrição. [PII.21]. Essa restrição está relacionada a dificuldade de conseguir identificar as necessidades individuais dos alunos, assim como ao número exagerado de alunos na sala de aula, reforçado pelo discurso a seguir: ―Eu acho que tratar individualmente os alunos, principalmente com mais de 60 alunos em sala de aula é meio difícil (...) As necessidades do grupo talvez, mas as necessidades individuais eu acho que pra nós é uma realidade muito distante‖ [PII.19]. Outro docente complementa: ―Eu confesso que é difícil porque com

turmas muito grandes com mais de 60 alunos é quase impossível trabalhar com certas ideias

da pedagogia, onde fica às vezes só no discurso onde você conhecer um a um dos alunos dentro de uma sala cheia é muito difícil.‖ [PX.15]

Apesar de alguns professores não considerar relevante um maior conhecimento dos seus alunos para direcionar com afinco suas aulas e que até acreditem que isso não passa de teoria, o conhecimento das necessidades dos alunos é fundamental para um bom desenvolvimento das aulas para que se alcance da melhor forma possível as habilidades esperadas nos alunos a partir dos conhecimentos adquiridos na disciplina. Além disso, esses conhecimentos das necessidades resultam em um estreitamento na relação entre professor e aluno, atendendo melhor as expectativas de ambos com relação à disciplina. ―Se eu não conhecer meu aluno eu posso ter problemas sérios no andamento da disciplina.‖ [PVII.19]

Contudo, sabe-se que alguns fatores são inibidores para o conhecimento de tais necessidades dos estudantes e requer maiores esforços e mudanças de pensamento entre os atores envolvidos nesse processo de favorecimento da aprendizagem. Essa mudança passa pela alteração das perspectivas de significado da aprendizagem transformadora de Mezirow (2000, 2009), exigindo dos envolvidos um exame de consciência para que possa ocorrer um aperfeiçoamento das competências, levando-os a um novo esquema de significado, dentro de um processo de transformação compartilhada (MEZIROW, 2000; CRANTON, 2006). Essa transformação reduz esses obstáculos existentes, uma vez que pode contribuir em uma maior sensibilidade dos professores em conhecer as necessidades dos alunos até para aprimorar suas estratégias de ensino e também pode conduzir no comprometimento do aluno com o aprendizado.

Quando os docentes organizam suas aulas para se aproximar das necessidades dos alunos, eles agem com espontaneidade, como diz Lowman (2004), para conduzir a um

pensamento independente. Todavia, alguns fatores sugerem a necessidade de um olhar mais analítico da própria instituição de ensino em relação às deficiências estruturais e político- educacionais adotadas que se delineiam de forma prejudicial à qualidade do ensino superior. Enquanto predominar a concepção de universidade organizacional e bancária, atribuídas por Pimenta e Anastasiou (2002) e Freire (1981), se torna difícil considerar a relevância dos aspectos sociais para o âmbito do ensino. Por isso, é mínimo o impacto das necessidades dos alunos sobre as estratégias de ensino, como mostra este discurso: ―Acho que eu não consegui ainda efetivamente conhecer essas necessidades e fazer com que elas influenciem nas estratégias que eu adoto.‖ [PX.15]

Os professores demonstram disposição em, pelo menos no início do semestre, discutir o plano de ensino com seus alunos, podendo realizar pequenas alterações conforme as primeiras impressões deles em relação à turma. Esses docentes afirmam que podem inserir alguma atividade complementar de acordo com o nível de conhecimento identificado por eles ou até elaboram alguma atividade para estimular mais a discussão e elevar, assim, o grau de conhecimento da turma. Esse conhecimento está relacionado com a maturidade e habilidade, não se caracteriza apenas pela aquisição de conhecimento técnico. Então, o conhecimento das necessidades dos alunos pouco influencia no desenvolvimento das estratégias de ensino, em que alguns docentes se mostram mais fechados e outros mais flexíveis, como se observa nessas falas:

Não, as minhas já são pré-estabelecidas. Em nível de graduação eu não moldo nada não. (...) eu determino qual nível de aula eu acho que é ideal e os alunos tem que

acompanhar esse ideal. Aquele que não acompanhar vai ficar repetindo até

conseguir acompanhar. [PVI.17]

Impacta sim porque no início do semestre você prepara um plano de ensino. Você tem o material para distribuir durante todo o semestre, mas há turmas que não acompanha e você tem que mudar todo seu planejamento para adequar. Eu não tenho esse problema de alterar porque o plano de ensino é flexível e mudo conforme o perfil da turma, do nível de conhecimento da turma e das respostas que eles dão daquilo que você vai trazendo de informação. [PVIII.14]

Elas seguem permanentes, geralmente o que eu vou moldando é conforme a

carência, por exemplo, eu vejo que um texto chamou a atenção dos alunos, então,

eu passo posteriormente algo complementar a temática desse texto. [PIX.17] Eu acho que eu deveria mapear essas mudanças conforme perfil da turma, os estilos dos alunos, mas não tenho feito. O que acontece em termos de alteração é o

nível de discussão em sala de aula. Eu tento instigar a ter um nível de discussão um

pouco diferenciado com os alunos. [PIX.18]

As falas dos professores indicam que eles tentam preservar as estratégias já estipuladas por eles de forma deliberada. Por sua vez, outros consideram que o acompanhamento da turma deve-se também ao nível que o próprio professor estabelece de exigência, pois possa

ser que tal nível não esteja adequado com o estilo daquela turma. Porém, muitos professores tentam padronizar os perfis dos alunos até porque não é fácil encontrar um tom certo para o nivelamento. Então, para que o aluno acompanhe é necessário que os conceitos encontrem as experiências por meio das reflexões, ou seja, o professor ensina, mas é fundamental que o aluno tenha aprendido o que foi passado (MINTZBERG; GOSLING, 2003).

O último discurso citado apresenta franqueza ao dizer que não faz o reconhecimento das necessidades para moldar seus métodos de ensino e ainda sugere um mapeamento do perfil da turma para conhecer os distintos estilos de aprendizagem existentes na sala de aula. Isso reflete em uma das dimensões do sistema de aprendizagem em ação do projeto ao qual o presente trabalho se insere que é a dimensão dos estilos de aprendizagem tanto do docente quanto do discente. Esta dimensão trata das diferentes formas que o professor ensina e de que o aluno aprende em que são identificados alguns estilos que também podem ser moldados ao longo da vida, até porque Hake (1999) e Knowles (1980) mostram que a aprendizagem é um processo permanente, passando por todo o decorrer da vida por meio de contextos formais e informais. E Dewey (2001) corrobora quando afirma que a educação e a aprendizagem caminham juntas em um processo ao longo da vida.

Portanto, a aprendizagem faz parte da vida e passa pelo ambiente formal de ensino, sendo necessário que os professores se atentem mais para as necessidades dos alunos para que se tenha um aprendizado mais engajado nesse relacionamento interpessoal. O que se tem visto é que alguns obstáculos e também a falta de disposição de professores atrapalham nesse alinhamento das estratégias de ensino a partir de um conhecimento mais próximo das necessidades reais que surgem dentro da sala de aula. A partir dos discursos dos professores, percebe-se que eles têm dado pouco significado às necessidades dos seus alunos. Essas necessidades não podem ser estritamente técnicas. Porém, para isso se torna imprescindível contornar os tais fatores considerados como empecilhos para a identificação dessas necessidades.