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O conjunto de bens tombados

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Patrimônio Cultural

CAP 5 – PERNAMBUCO SOB O RITUAL DO TOMBAMENTO: OS MECANISMOS DE REPRESENTAÇÃO ESTADUAL A PARTIR DOS BENS

5.2 O conjunto de bens tombados

Os 6123 requerimentos de tombamento analisados apresentam números interessantes sobre o ritmo de atividade do Sistema Estadual do Tombamento, pois percebesse que há uma grande quantidade de bens culturais tombados na primeira década de funcionamento do Sistema e um declínio na década de 1990. Sendo a primeira década dos anos 2000 um reflexo da década anterior, com poucas solicitações para abertura dos processos de tombamento.

Dezenove processos foram iniciados no período entre 1979, quando é instituído o Sistema Estadual de Tombamento, até 1982, véspera do primeiro decênio de atividades da Fundarpe. Essa quantia representa 31% do total dos processos pesquisados. Mais 23 processos, totalizando 38%, foram requisitados entre 1983 e 1986, anos do mandato de Roberto Magalhães e o vice Gustavo Krause. De 1987 até 1991, durante o governo Miguel Arraes e o vice Wilson

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Para a pesquisa, foram aceito os 61 tombamentos que tiveram a resolução favorável do Conselho Estadual de Cultura e a publicação do decreto que os regulamentam, pois, apesar de que o ato de registro dos bens no livro de tombo seja substancial para o tombamento, o Estado de Pernambuco reconhece como patrimônio estadual dez bens tombados que não foram inscritos ainda nos livros de tombo.

Campos, foram nove requerimentos (15%). De 1992 até 1995, durante o governo de Joaquim Francisco de Freitas Cavalcanti, foram abertos quatro processos representando 6% do montante. No segundo mandato de Miguel Arraes, durante os anos 1995 a 1999, houve apenas uma solicitação para tombamento (2%). Já nos mandatos consecutivos de Jarbas Vasconcelos, entre o período de 1999 a 2003 e 2003 a 2006, foram dois processos abertos resultando em 3% do total. De 2006 até 2010, durante o governo de Eduardo Campos, foram mais três solicitações para tombamento (5%).

Figura 11- Distribuição gráfica dos pedidos de tombamento por ano. Fonte: gráfico elaborado pelo Autor

Entre os principais fatores para o declínio dos processos de tombamento abertos para exame técnico durante o decorrer dos anos foi o aumento gradativo do grau de complexidade teórico e metodológico para a resolução. Assim, procurou-se diminuir a quantidade de processos de tombamento em trâmite para melhor atender as exigências do campo do patrimônio. É bom ressaltar que entre a solicitação para abertura do processo de tombamento e a inscrição do bem cultural num livro de tombo, diversos fatores determinam o tempo para conclusão do processo. Na maioria das vezes, o intervalo de tempo é de 1 a 3 anos.

Muitos interesses são mobilizados para a celeridade ou retardamento deste processo. Sendo o principal deles o interesse dos órgãos que integram o Sistema

Estadual de Tombamento em efetivar o tombamento ou não. Por exemplo, cabe ao secretário de Cultura fazer a primeira triagem quando recebe a solicitação por escrito para abertura do processo, analisando se o texto possui todos os dados necessários sobre o bem cultural que o proponente deseja ver tombado. Dependendo do interesse do secretário, essa etapa pode levar vários dias e até meses.

Alguns outros fatores identificados ao analisar os documentos, como pendências jurídicas, oposição por parte do proprietário, distância geográfica ou problemas nos trâmites burocráticos também podem interferir no tempo para conclusão do processo de tombamento.

Como exemplo, pode-se citar o caso do processo nº 0665, de 06/04/1982, relativo ao tombamento do Cine-teatro Recreios Benjamin. Trata-se da reconstituição do processo nº1125, solicitado em dezembro de 1979, mas somente aberto no ano 1980, cujo parecer favorável ao tombamento foi decidido ainda em setembro do mesmo ano. O processo que havia demorado menos de um ano, porém, desapareceu após análise do então presidente da Fundarpe, Ulysses Pernambucano, como demonstra correspondência anexa ao processo. Foi necessário um novo processo em que foi recuperada parte das informações fotocopiadas do anterior e refeita outra parte, sendo concluído somente em maio de 1983. (NETO, 2012: 70).

Há outros fatores que não são perceptíveis nos documentos que compõem o processo de tombamento e que aumentam drasticamente o tempo para registro do bem cultural no livro de tombo. Não por acaso, esses fatores partem do CEC que é responsável por efetivar o ato. Da mesma forma que ocorre a seleção para compor o Conselho e para elaborar o parecer sobre o tombamento de determinado objeto, a instituição não consegue justificar a demora do registro de determinados bens culturais já tombados nos livros de tombo. A situação é alarmante, pois identificamos dez bens culturais tombados que já são oficialmente reconhecidos pelo Estado de Pernambuco como patrimônio cultural e que ainda não foram devidamente registrados pelos conselheiros nos respectivos livros de tombo.

Como já foi citado, o tempo para conclusão dos processos de tombamento é de 1 a 3 anos, entretanto há casos que pode chegar até 14 anos de espera. Foi o caso da Igreja Matriz de Nossa Senhora Rainha, localizada na cidade de Petrolina, interior de Pernambuco. O pedido de tombamento correu no dia 10 de outubro de 1986. Dois anos depois, no mês de junho, obteve parecer técnico favorável da Fundarpe. Contudo, apenas no ano 2000 que os conselheiros aprovaram o tombamento e inscreveram no livro de tombo de edifícios e monumentos isolados.

Após o tempo necessário à conclusão do processo, o patrimônio cultural é devidamente registrado e, depois, divulgado em cartas, ofícios, históricos, anotações, matérias de jornais, mas, sobretudo nas publicações do Estado de Pernambuco: livros e folhetos elaborados e distribuídos pela Fundarpe ao grande público (FUNDARPE 2007, 2009, 2011). Nesse conjunto de mecanismos de promoção, o patrimônio cultural é posto como um documento material portador de valores culturais coletivos que todos os pernambucanos devem reconhecer como deles e, por isso, que devem proteger. Contudo, os sentidos e conteúdos que são atribuídos aos bens culturais durante o processo de ativação patrimonial não são nada homogêneos e muito menos correspondem às expectativas de todos os envolvidos na questão.

O processo de tombamento, então, se caracteriza por acomodar parte da heterogeneidade das representações sobre o bem cultural, ora conflituosas, ora concordantes, que estão sempre em negociação. Agentes envolvidos no processo como os requerentes, Fundarpe, CEC, Secult, prefeituras, proprietários, intelectuais ou mesmo a imprensa atuam durante o trâmite do processo de tombamento.

E mesmo depois de tombado, a recepção do patrimônio cultural na sociedade ocorre de múltiplas formas, ora reconhecido como bem cultural a se proteger e preservar para gerações futuras, ora visto como apenas um bem que detém várias restrições que comprometem o seu uso primário sendo considerado por muitos um empecilho.

Ao analisar o conjunto de informações que fazem parte da ativação patrimonial pelo Estado de Pernambuco que resultaram em 61 bens culturais tombados, percebesse que as efetivações dos pedidos se deram, majoritariamente, em um curto espaço de tempo, quando 42 processos foram concluídos no período de 1979 até 1986, totalizando 69% do patrimônio cultural pernambucano. Podem ser identificados também os mecanismos jurídicos e retóricos que, por muitas vezes, não estão explícitos para o grande público. Já que quando exposto, o patrimônio cultural tombado é apresentado como cultural material que sempre esteve à espera do devido reconhecimento do Estado, que os sentidos e conteúdos que representa são naturais e não construídos por diferentes agentes. E mais, que o processo de tombamento é restritivamente constituído por elementos técnicos e administrativos que são de interesse exclusivamente “público”. Diante disso, cabe indagar: preservar o quê? A quem essa preservação realmente serve? Ou melhor, quem realmente se preocupa em preservar o quê?

Na tentativa de responder tais perguntas, analisamos os requerentes dos processos de tombamento. Pessoas e instituições que motivadas por diferentes interesses diversos recorrem ao aparelho estatal para consagrar determinados bens culturais distribuídos no espaço urbano como patrimônio cultural de Pernambuco.

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