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De Coisa a Bem Cultural: uma questão de atribuição de valor

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CAPÍTULO 1 – A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE PATRIMÔNIO CULTURAL NO OCIDENTE PATRIMÔNIO CULTURAL NO OCIDENTE

1.1 De Coisa a Bem Cultural: uma questão de atribuição de valor

Esta primeira parte foi motivada, em grande medida, pelas discussões com colegas do grupo de pesquisa Lepam5 que compartilham da mesma dificuldade para aqueles que estudam o campo do patrimônio, que é estabelecer um conceito claro do que é patrimônio cultural ou, pelo menos, desenhar os contornos. Afinal há ou não limites para o patrimônio cultural?

A resposta a esse questionamento neste trabalho é de grande valia, pois se não fizermos o esforço teórico para delimitar a extensão e capacidade do conceito em cena o mesmo pode perder sua função enquanto categoria analítica, já que tudo hoje é passível de ser reconhecido como patrimônio cultural. Assim é importante traçarmos, como sugere o antropólogo José Reginaldo Gonçalves, os limites do centro.

Daí talvez a pertinência de trazermos a noção de “limites”, pois nesse inflacionamento há o risco de trivializarmos o potencial descritivo e analítico que possa ter a categoria, além dos riscos propriamente políticos e que consistem na eliminação da força dessa categoria como instrumento de luta pelo reconhecimento público de grupos e de indivíduos. (GONÇALVES, 2007: 239).

Assim, acredita-se que é de fundamental importância a reflexão teórica sobre os “limites” do patrimônio cultural tanto para a academia, já que infelizmente o campo do patrimônio ainda carece de aportes teóricos mais consolidados, quanto para o Estado na formulação de políticas culturais mais contundentes à valoração, preservação e promoção dos bens culturais.

Não é novidade que “patrimônio”, hoje, é uma categoria “nômade” (CHOAY, 2006: 11). A palavra está entre as que são utilizadas com maior frequência no cotidiano das pessoas e que não para de ser requalificada por diferentes adjetivos – além dos já consagrados histórico e artístico –, fala-se em genético, natural, ambiental, arqueológico, museológico, arquivístico, cultural, etc. Processo inflacionário esse que “parece não haver limite” (GONÇALVES, 2009: 25). Alguns estudiosos que dissertam

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O Lepam - Laboratório de Estudos em Patrimônio Histórico e Memória Social -, coordenado pelo professor Ricardo de Aguiar Pacheco, é um grupo de pesquisa multidisciplinar que acomoda pesquisadores de várias áreas de atuação como historiadores, museólogos, pedagogos, etc.

sobre o tema denunciam que, no ocidente, vivenciamos uma sociedade patrimonial. Peixoto (2002) aponta para uma “febre do patrimônio” ou uma “histeria do patrimônio”. Já Lowenthal (1998) descreve a atual reivindicação dos grupos sociais sobre as políticas patrimoniais como uma “newly popular faith”; Choay (2006) faz referência a um “culto ao patrimônio” ou “inflação patrimonial” e Hartog (2013) a uma “ardente obrigação” do patrimônio cultural.

Sabe-se também que o campo do patrimônio é interdisciplinar (MARTINS, 2012: 285), o que possibilita a incorporação de perspectivas de diferentes profissionais e a elaboração de várias abordagens. É cada vez mais comum, pelo menos nas ciências humanas, o uso da categoria analítica patrimônio cultural nos trabalhos acadêmicos. Contudo, é identificada, muitas vezes, uma indefinição na utilização da categoria de acordo com o lugar de fala. Não ignorando a validade da pluralidade dos diversos enfoques, mas isto pode ocasionar, em certos casos, uma imprecisão ou até gerar entendimentos antagônicos ou contraditórios entre os pesquisadores durante o manejo de categorias que, apesar de relacionadas à de patrimônio cultural, não são equivalentes a ela.

Está longe da pretensão deste trabalho impor que deva existir, imprescindivelmente, um conceito único sobre patrimônio cultural. Seria até uma atitude, no mínimo, arrogante. O que se defende aqui é um mínimo de entendimento dos limites e alcance da categoria analítica patrimônio cultural, para que não haja a errônea equivalência entre patrimônio cultural e bem cultural. Portanto, o objetivo do esforço teórico que será apreendido neste item é para tentar identificar subsídios que permitam, minimamente, clarear e delimitar um conceito de patrimônio cultural, tornando-o, dessa forma operacional para o decorrer da pesquisa.

Por outro lado, reconhece-se que o processo de conceituação do que vem a ser patrimônio cultural é bastante complexo, já que diferentes agentes o percebem por distintas maneiras. É plausível até argumentar que a tentativa de buscar uma possível definição é desnecessária, pois o processo de patrimonialização – o que seja ou o que constitui por patrimônio cultural -, é mutável de acordo com os valores sociais e culturais de cada sociedade. Já que para realizar uma investigação sobre o processo de patrimonialização é necessário identificar a maneira na qual a sociedade em estudo constrói seu patrimônio (POULOT, 2009: 12). Sendo, assim, “perca de tempo” a

pretensão acadêmica de criar “limites” ao patrimônio cultural e, assim, formular um conceito.

Apesar da situação exposta acima, acredita-se que a busca por uma definição ou, pelo menos, pelos pressupostos básicos sobre o que se entende por patrimônio cultural não se configura como um esforço teórico desnecessário. Faz parte da função do pesquisador buscar por uma definição que torne, pelo menos, visíveis os critérios de classificação dos bens patrimoniais, esforço essencial para a própria existência do conceito de patrimônio cultural.

De acordo com o antropólogo Antônio Augusto Arantes (1989: 29 - 41), todo processo de conceituação do que pode vim a ser entendido por patrimônio cultural, independente do sistema social e cultural, requer uma prática social de classificação. Para classificar o que será reconhecido como patrimônio cultural é preciso, antes de tudo, selecionar entre uma vasta gama de bens culturais quais serão preservados para as gerações futuras como importantes para o porvir. Enquanto os outros não selecionados, serão esquecidos no final do processo.

A sociedade, geralmente através de suas instâncias representativas, seleciona o que deve ser patrimonializado, o que deve ser mantido, conservado, ressignificado e, portanto, o que deve ser atribuído de valor a partir dos enunciados discursivos. Estas escolhas são sempre atos políticos que definem o que e como deve ser patrimonializado um bem. (GONZALEZ; JUNIOR & MICHELON, 2012: 07).

No Brasil, são as agências governamentais com a participação dos agentes que produzem os bens culturais - mesmo que por muito tempo esses agentes tiveram sua participação restrita ou inibida -, os responsáveis em classificar e, portanto, selecionar o que deve ser oficialmente reconhecido ou não como patrimônio cultural. É importante salientar que o Poder Público, para ter legitimidade perante os grupos sociais diretamente envolvidos no processo, deve ter claramente definido, pelo menos, o conceito ou o entendimento do que vem a ser patrimônio cultural brasileiro. Só assim é possível ao Estado brasileiro elaborar e pôr em prática uma política cultural para o patrimônio cultural - ou seja, as políticas de valoração, preservação e promoção dos bens patrimoniais oficialmente legitimados pelo Estado.

A interação entre Poder Público e a sociedade é fundamental para chegar próximo de um consenso sobre a validade do processo de patrimonialização dos bens culturais e, assim, diminuir os questionamentos a respeito da política cultural. Para

evitar posteriores complicações no decorrer deste item, apesar de todas as implicações sobre o que venha ser cultura, entende-se por política cultural:

... um conjunto de ações elaboradas e implementadas de maneira articulada pelos poderes públicos, pelas instituições civis, pelas entidades privadas, pelos grupos comunitários dentro do campo do desenvolvimento simbólico, visando a satisfazer as necessidades culturais do conjunto da população. (CALABRE, 2009: 12).

Quando a política cultural para o patrimônio cultural é conduzida de forma democrática, ao oferecer a possibilidade de efetiva participação de todos os agentes interesados, torna o Poder Público parceiro da comunidade civil no processo de patrimonialização e, assim, reconhece a diversidade de bens culturais que compõem o patrimônio cultural brasileiro (SOARES, 2009: 35). Política cultural que propaga a diversidade cultural, princípio que rege todo o setor da cultura na contemporaneidade. Tal atitude é amplamente implantada, no âmbito das políticas culturais para o patrimônio cultural imaterial, pela utilização do conceito de referência cultural (FONSECA, 2009b: 69), o qual condiciona a atuação do Poder Público a atuar junto daqueles bens escolhidos pelas comunidades.

Apesar das reflexões expostas até o momento terem sido fundamentais para dar início à seção, o questionamento principal ainda não foi respondido, há ou não limites para a categoria patrimônio cultural? Ou melhor, como ocorre o processo de constituição do patrimônio dito cultural? Acredita-se neste trabalho que, para responder essas questões, é preciso, primeiro, partir de um ponto de vista jurídico para criar os contornos de um possível conceito de patrimônio cultural, sem, contudo, excluir outros enfoques que permeiam esta pesquisa.

A escolha por uma perspectiva jurídica se dá pelo motivo no qual neste trabalho o foco é apenas aqueles bens culturais oficialmente protegidos pelas agencias governamentais, estas que se vale de aparatos jurídicos e legais – o decreto-lei nº 25/1937 e o decreto nº 3.551/2000 que instituíram, respectivamente, os instrumentos do Tombamento e do Registro no território brasileiro - para legitimar suas intervenções na preservação dos bens culturais das comunidades que os produzem.

Para a análise do processo de constituição do patrimônio cultural “oficial”, optamos por dissertar sobre os conceitos de bem e patrimônio, originários da teoria civilista do Direito, os quais, por sua vez, são baseados no conceito clássico de coisa. Essa opção se deu pelo motivo no qual o Estado Brasileiro se vale dos mesmos

pressupostos da teoria civilista do Direito para definir o conceito de patrimônio cultural brasileiro (o qual irá ser utilizado nesta pesquisa como já foi escrito anteriormente).

De acordo com o Dicionário Aurélio Online, coisa pode ser “tudo o que existe”, todo tipo “de objeto suscetível de apropriação”, mas também poder ser “coisa nenhuma”, ou seja, “nada”. Numa perspectiva filosófica, a noção de coisa tem duas acepções: uma mais restrita e outra mais abrangente. A restrita diz respeito àquilo que possui um corpo material, àquilo que pode ser visualizado, tocado e apropriado. Enquanto que na acepção abrangente, coisa se refere a tudo que pode ser apreendido ou conhecido pelo pensamento humano, quer imaginário ou real (HEIDEGGER, 1987).

Para o Direito Civil brasileiro operacionalizar o conceito de coisa, ele se apropria da acepção mais abrangente, ou seja, coisa pode ser algo tanto material quanto imaterial (FILHO, 2000). Para a jusambentalista6 Lúcia Reisewitz, existe um passo essencial para que uma coisa possa se transformar em um bem, pois “as coisas em si, materiais ou imateriais, ainda não são bens. Para que algo passe de coisa para bem é preciso que receba um valor” (2004: 52, grifo do original). Neste sentido, é a atribuição de valor – seja histórico, afetivo, econômico, artístico e etc. – sobre uma coisa que o torna um bem. Todo bem é necessariamente uma coisa, mas nem toda coisa é um bem.

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Figura 01 - Esquema do processo de transformação de coisa para bem. Fonte: esquema elaborado pelo autor.

E qual é relação entre as categorias coisa, bem e patrimônio? Para responder, primeiro, é importante lembrar que etimologicamente a palavra patrimônio tem sua origem na Antiguidade e vem da expressão latina patrimonium, que, de acordo com o direito romano, significava naquela época o conjunto de bens que deveria ser transmitido dos pais para os filhos, aqueles “vislumbrados não segundo seu valor pecuniário, mas em sua condição de bens-a-transmitir” (POULOT, 2009: 16, grifo nosso). Neste sentido, a noção de patrimônio traz em seu bojo a ideia de propriedade e de herança paterna.

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Denomina-se jusambentalista o jurista que se dedica ao estudo do Direito Ambiental.

Na perspectiva jurídica moderna, o conceito de patrimônio “refere-se a um complexo de bens, materiais ou não, ações, posse e tudo o mais que pertença a uma pessoa ou empresa e seja suscetível de apreciação econômica” (ABREU, 2009: 35, grifo nosso). O patrimônio seria, enfim, o somatório de bens de valor econômico apropriados por uma pessoa7, sem, necessariamente, se configurar como herança paterna. Assim, na teoria civilista do Direito, que é o campo que estuda o patrimônio (não cultural), o critério de constituição de patrimônio é quantitativo e não qualitativo. Não há como muitos acreditam, a necessidade de uma segunda atribuição de valor sobre um bem para que ele se transforme em patrimônio de uma pessoa.

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Figura 02 - Esquema do processo de transformação do bem em patrimônio. Fonte: esquema elaborado pelo autor.

Já o processo de transformação dos bens culturais em patrimônios ditos culturais ocorre de maneira diferente. O que vale aqui é o qualitativo em decorrência do quantitativo. Segundo o jurista Francisco Luciano Lima Rodrigues (2008), existe no Direito uma teoria do bem cultural8, inaugurada pelo jurista italiano Massimo Severo Giannini (1976) na Comissão Franceschini9. Rodrigues expõe um resumo do texto de

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Note-se que essa definição não cultural de patrimônio se aplica às pessoas – pessoa física ou jurídica – e não aos grupos sociais ou coletividades.

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A expressão bem cultural teve sua primeira aparição para o mundo jurídico com o Convênio para a “Proteção dos Bens Culturais no caso de conflito armado” realizado em Haia, em 1954.Nesse momento o conceito de bem cultural se refere fundamentalmente aos bens portadores de valores históricos e artísticos, inscrevendo-se ainda numa concepção de patrimônio ligada à ideia de “acervo material”. Cf. UNESCO, Convenção para a proteção em caso de conflito armado. Haia: (s.n.), 1954. Disponível em: <http://www.unesco.org/culture/natlaws/media/pdf/bresil/brazil_decreto_44851_11_11_1958_por_orof.p df. >. (acesso em 14/01/2014).

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A Comissão Franceschini, realizada pelo parlamento italiano, em 1966, desenvolveu um trabalho de enumeração dos diferentes tipos de categorias de bens e nesse trabalho inaugurou uma noção genérica de bem cultural em virtude da qual deveriam ser considerados como tais “os bens que constituam um testemunho material dotado de valor de civilização”. Postulando que o bem constitui o elemento material de “interesses de natureza imaterial e pública”. Cf. COMISIÓN FRANCESCHINI Apud: CASTELLS, Alicia Norma González & ROTMAN, Monica. Patrimônio e cultura: processos de politização, mercantilização e construção de identidade. In: Antropologia e Patrimônio Cultural: diálogos e desafios contemporâneos. LIMA FILHO, Manuel Ferreira; ECKERT, Cornélia; BELTRÃO, Jane. (Orgs). Florianópolis: Nova Letra/ABA, 2007. P. 56 – 79.

Bem

Valor

econômico

Giannini intitulado I beni culturali (1976), no qual se identifica os elementos que diferencia bem de bem cultural para o jurista italiano:

Há uma distinção entre ‘coisa’ e ‘bem em sentido jurídico’, considerando que no bem cultural coexistem dois direitos: um direito da coletividade à fruição do bem e um direito do proprietário de gozá-lo dentro dos limites consentidos pela lei; a segunda, resultado do entendimento do Tribunal Constitucional Italiano, é traduzida pela existência de uma categoria de bens de interesse público, na qual estariam os bens culturais, que orbitam entre os bens de propriedade privada e bens de propriedade pública. (RODRIGUES, 2008: 55).

O que diferenciaria, então, a noção de bem em relação à de bem cultural na visão de Giannini é o “interesse público” sobre um determinado objeto da cultura que foi valorado como bem a ser usufruído e preservado por toda coletividade. Resposta semelhante a do jurista italiano é a de Pedro Vives (2007), ao apontar que um bem cultural se define por sua utilidade pública, assim como por seu conteúdo simbólico, ou seja, seu valor cultural.

Não há a intenção de um maior aprofundamento sobre a teoria do bem cultural, mas acredita-se que é de grande contribuição para este trabalho fazer mais uma citação de Luciano Rodrigues que, ao discutir sobre o tema, aponta de forma simplificada os elementos que diferencia os bens culturais dos outros tipos de bens:

A definição de bens culturais não pode perder de vista que o elemento indispensável a sua construção é a compreensão de que o valor da coisa como forma de traduzir a memória de um povo é o seu ponto de diferenciação para com as demais classificações referentes a bens e, ainda, que o objeto da tutela relativa aos bens culturais reside muito mais no valor que o bem expressa do que o objeto material que lhe serve de suporte, como refere Giancarlo Rolla. (RODRIGUES, 2008: 46, grifo do original).

Pode-se resumir, então, que um bem cultural é o produto do processo cultural, que proporciona ao ser humano o conhecimento e a consciência de si mesmo, e do ambiente que o cerca. Como afirma a jurista brasileira Inês Virgínia Prado Soares:

Os bens culturais, materiais ou imateriais, são veículos de transmissão de ideias e conteúdos. Por isso a importância de preservar os bens dos grupos discriminados historicamente ou excluídos social ou economicamente durante longo tempo, embora tenham participado da formação cultural da sociedade brasileira. (SOARES, 2009: 47).

Utilizando o mesmo esquema descrito na teoria civilista para explicar o processo de transformação de uma coisa para um bem, pode-se dizer, de forma mais simplificada, que um bem se transformar em bem cultural quando o enfoque do valor é o cultural.

Ao se considerar um bem como bem cultural, ao lado de seu valor utilitário e econômico (valor de uso enquanto habitação, local de culto, ornamento etc.; e valor de troca, determinado pelo mercado), enfatiza-se seu valor simbólico,

enquanto referencia a significações da ordem da cultura. (FONSECA, 2009a:42).

A partir dos autores citados até aqui, pode-se afirmar então que é o desejo da comunidade de usufruir e preservar o bem comum que o transformar em bem cultural. Ou melhor, é quando o bem se desloca da esfera do privado e passa, também, a frequentar a esfera do público que ele ganha o adjetivo cultural. Nesse processo é depositado no bem, valores sociais e culturais que a comunidade deseja preservar e promover entre seus membros (Figura 3).

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Figura 03 - Esquema do processo de transformação do bem em bem cultural. Fonte: esquema elaborado pelo autor.

Então surge a questão da atribuição de valor cultural aos bens. Pois, por uma necessidade da prática e da técnica jurídica não é possível trabalhar com o conceito de cultura que “remete a ideia de uma forma que caracteriza o modo de vida de uma comunidade em seu aspecto global, totalizante” (COELHO, 2004: 103). Visto a grande abrangência conceitual que essa noção engloba. Doravante, no intuito de formular um conceito jurídico de bem cultural, o Direito Civil brasileiro utiliza-se da Teoria dos Direitos Culturais, formulada por Francisco Humberto Cunha Filho (2004), a qual atende a uma necessidade delimitadora do conceito de cultura que a Ciência Jurídica demanda:

Cultura para o mundo jurídico é a produção humana juridicamente protegida relacionada às artes, à memória coletiva e ao repasse de saberes, e vinculada ao ideal de aprimoramento, visando à dignidade da espécie como um todo, e de cada um dos indivíduos. (CUNHA FILHO, 2004:49, negrito nosso).

Assim, para os juristas brasileiros o conceito de cultura refere-se à arte, memória e repasse de saberes juridicamente protegida. É a proteção jurídica cultural que transforma um bem em bem cultural para o Poder Público brasileiro. Antes do processo de reconhecimento jurídico, um bem não é considerado, para o Direito Civil, como bem cultural.

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