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2.7 Contribuições dos campos teóricos basilares para o estudo das IEBTs

2.7.1 Conjunto de recursos estratégicos para as IEBTs

É importante entender as condições em que os recursos tangíveis e, particularmente, os intangíveis podem ser fonte de vantagem competitiva sustentável para as IEBTs para conduzi- las a um constante crescimento, aspecto que constitui o maior campo de pesquisa das teorias abordadas. Os recursos intangíveis, tais como, conhecimentos, habilidades, experiência da equipe e network, imprescindíveis para a condução de processos de inovação, são os que mais possibilitam a constituição de vantagens competitivas sustentáveis, de acordo com a literatura

analisada. A confirmação de tal pressuposição irá reforçar a importância dada aos recursos intangíveis pela RBV e pelas suas extensões.

Em termos práticos, os desafios impostos às IEBTs na tarefa de transformar uma pesquisa aplicada em uma nova tecnologia, produto ou serviço com valor para o mercado podem ser superados se essas organizações, por exemplo, direcionarem sua atenção para seus recursos heterogêneos, elaborando opções diferentes de estratégias de crescimento que envolvam a busca pelo equilíbrio entre a exploração dos recursos existentes e o desenvolvimento de novos.

A obtenção dessas vantagens estratégicas, entretanto, depende de vários fatores, entre eles, os limites ex-ante e ex-post. Por exemplo, o Parque Tecnológico de Itaipu, que tem dentre as organizações abrigadas em suas dependências uma IEBT, considera possuir uma vantagem estratégica ex-ante por estar situado nas dependências de uma hidrelétrica e em uma região de fronteira com outros países. Em termos dos limites ex-post, os retornos dessa organização podem vir, por exemplo, de suas estratégias ao combinar recursos heterogêneos desenvolvidos internamente ao longo do tempo.

As incubadoras são, intrinsecamente, entidades históricas e sociais e suas habilidades para adquirirem e explorarem alguns recursos dependem, certamente, da instituição mantenedora à qual está vinculada e da região onde está instalada. A história dessas organizações é um importante antecedente para as capacidades e oportunidades atuais. Suas condições específicas e a maneira adotada por elas para lidarem com problemas e com as tomadas de decisão acerca dos processos de inovação podem fazer com que seus recursos não sejam perfeitamente imitáveis. Além disso, o entendimento da ligação entre os recursos controlados e a vantagem estratégica sustentável constituída pelas concorrentes é uma tarefa árdua para as incubadoras. Por fim, os recursos das incubadoras assumem características de um fenômeno social muito complexo, particularmente pelas numerosas alianças criadas para se tentar operacionalizar os processos de inovação.

Inicialmente, preocupou-se com a adequação do conceito de recursos à realidade das IEBTs. Essa adequação foi conseguida tendo como referência os textos de Brush, Green e Hart (2001), Clarysse et al. (2004) e Schmidt e Balestrin (2015). Nos dois primeiros textos, os recursos organizados, combinados e explorados pelas organizações que desenvolvem empresas de base tecnológica, foram classificados a partir da RBV e, posteriormente, analisados, com o objetivo de esclarecer em que medida eles são cruciais para o desenvolvimento das atividades dessas organizações. Schmidt e Balestrin (2015), partindo de

Barney (1991), conceituaram recursos como sendo os serviços e a infraestrutura aos quais as empresas incubadas têm acesso.

Brush, Green e Hart (2001) e Clarysse et al. (2004) analisaram os recursos desenvolvidos para organizar de forma eficiente as atividades das organizações que apoiam o desenvolvimento de empresas de base tecnológica. Eles classificaram os recursos da seguinte forma: competências humanas (individuais, conhecimento), network (relações externas, redes), financeiro (capital de giro), física (infraestrutura e espaço), organizacional (estrutura e serviços prestados às empresas incubadas) e técnico (foco no conhecimento ou na tecnologia). Posteriormente, Clarysse et al. (2004) agruparam esses recursos em seis conjuntos principais: organizacionais, humanos, tecnológicos, físicos, financeiros e de rede.

Clarysse et al. (2004) explicam que a ênfase das IEBTs pode variar, mas a missão que guia essas organizações é sempre a exploração das pesquisas para serem empreendidas. Eles estudaram três diferentes modelos de incubação para gerenciamento do processo de desenvolvimento de spin-outs14 e constataram que eles podem ser complementares entre si e, por isso, podem ser desenvolvidos em paralelo.

O primeiro modelo é voltado para o desenvolvimento de um grande número de empresas pequenas, com o objetivo maior de estimular o clima empresarial. Essas empresas são criadas por jovens com base no conhecimento que adquiriram na universidade e são, predominantemente, orientadas ao serviço. O segundo modelo volta-se para o desenvolvimento de empresas de alto valor agregado, a partir da tecnologia desenvolvida dentro das instituições de pesquisa, exigindo recursos substanciais de assistência e apoio em propriedade intelectual. As empresas que são desenvolvidas dentro desse modelo, geralmente, têm como alvo um nicho de mercado específico. O terceiro modelo volta-se para o desenvolvimento de um pequeno número de empresas, mas mais capitalizadas e mais propensas a serem empresas de ponta, líderes de mercado, que poderão operar em mercados globais e alcançar níveis mais altos de inovação na vanguarda da tecnologia. Todavia, para os propósitos desta pesquisa, essa distinção não será considerada, mas sim a interpretação dada aos conjuntos de recursos relacionados a esses modelos.

Dentre as definições elaboradas para o conjunto de recursos organizacionais, destaca-se que inclusas nele estão as rotinas desenvolvidas no processo de interação entre os atores (pesquisadores, órgãos de financiamento, empreendedores e empresas, entre outros).

Além disso, está toda a estrutura organizacional necessária ao desenvolvimento das novas empresas (CLARYSSE et al., 2004).

O conjunto de recursos humanos, de acordo com Schmidt e Balestrin (2015), subdivide-se naqueles que fornecem competências técnicas, científicas, jurídicas, de marketing e de estratégia. Salvo exceções, os recursos humanos das incubadoras são originados de instituições públicas, o que pode representar um gargalo para as incubadoras. Constata-se, também, o envolvimento de pesquisadores altamente qualificados e dotados de conhecimentos bastante específicos. Contudo, a experiência na criação de empreendimentos empresariais tecnológicos, muitas vezes ausentes nos atores públicos, é primordial para o desenvolvimento das novas empresas (CLARYSSE et al., 2004). Engelman e Fracasso (2013) reforçam o quanto é significativo para as IEBTs possuir recursos humanos (equipe, assessores e consultores) com acesso às redes internacionais de negócio e Silva et al. (2012) afirmam que os gerentes desempenham papel importante para obtenção dos resultados das IEBTs.

O conjunto de recursos tecnológicos refere-se, principalmente, àqueles disponibilizados pelas instituições mantenedoras, os quais representam suas experiências mais ricas ou seu know-how mais específico. O conjunto de recursos físicos inclui todos os itens de infraestrutura empregados na educação profissional e técnica, no processo de P,D&I e nas atividades sociais (SCHMIDT; BALESTRIN, 2015). Compreende, portanto, os espaços dos escritórios, laboratórios, restaurantes, cafeterias, lojas e a infraestrutura como um todo. Geralmente, os recursos físicos não desempenham papel determinante para a constituição de vantagens competitivas sustentáveis das organizações em análise (CLARYSSE et al., 2004).

O conjunto de recursos financeiros cobre tanto os recursos provenientes de órgãos públicos de fomento quanto os dos investidores de risco (Schmidt e Balestrin, 2015) e os que são gerados internamente pelas incubadoras. Esses recursos são substanciais para a criação e desenvolvimento das empresas incubadas. Por essa razão, as incubadoras buscam obter um fluxo constante de receitas provenientes dos governos (imprescindíveis, particularmente, na fase inicial das empresas), dos serviços prestados, dos contratos de pesquisa e de investidores privados (imprescindíveis para o desenvolvimento das empresas).

Em relação ao conjunto de recursos de rede, os autores destacam que o sucesso das incubadoras parece ser muito dependente das redes sociais estabelecidas com diversos órgãos públicos, com os departamentos das instituições de pesquisa e das instituições mantenedoras, com os departamentos de desenvolvimento de negócios, com as empresas, com consultores especializados e com as empresas de venture capital. Por essa razão, os recursos de redes podem ser, também, substanciais para as incubadoras quanto mais estreitas forem as relações

mantidas com esses atores sociais (Clarysse et al., 2004), pois eles encorajam a troca de conhecimentos e a sinergia entre esses atores.

Adicionalmente, Schmidt e Balestrin (2015) argumentam que, se a colaboração e a cooperação são umas das estratégias de aprendizagem e inovação, as incubadoras deveriam fornecer às empresas incubadas o acesso aos recursos de rede, pois estes é que promovem os relacionamentos interorganizacionais.

Para os efeitos desta pesquisa, os seis grupos apresentados por Clarysse et al. (2004) foram sintetizados em quatro, como explicados a seguir:

Recursos organizacionais (com base em Clarysse et al., 2004, receberam as mesmas

definições). Compreendem: modelo de negócio, imagem e reputação, cultura, toda uma estrutura formal de relatórios, rotinas, planejamento formal e informal, controle e sistemas de aprendizagem e coordenação, entre outros, adequados ao desenvolvimento de empresas de base tecnológica. Os recursos intangíveis deste grupo têm profunda relação com a constituição de vantagens competitivas.

Recursos físicos e financeiros (junção dos recursos tecnológicos, físicos e

financeiros, explicados por Clarysse et al., 2004 e Schmidt e Balestrin, 2015; receberam as mesmas definições). Compreendem: tecnologias físicas, tais como, planta, equipamentos, laboratórios de uso compartilhado, localização geográfica e os recursos financeiros, entre outros, utilizados no desenvolvimento das empresas de base tecnológica. Destacam-se os recursos financeiros, como aqueles que podem ter maior relação com as vantagens competitivas criadas pelas IEBTs.

Recursos intelectuais (são os recursos humanos, como explicado por Clarysse et al.,

2004, Silva et al. , 2012, Engelman e Fracasso, 2013 e Schmidt e Balestrin, 2015; receberam as mesmas definições). Compreendem: treinamento, experiência, julgamento na tomada de decisão, inteligência, relacionamento e perspicácia dos gestores e dos demais profissionais, entre outros. Por serem intangíveis, têm profunda relação com a formação de vantagens competitivas.

Recursos relacionais (são os recursos de rede, como explicado por Clarysse et al.,

2004 e Schmidt e Balestrin, 2015; receberam as mesmas definições). Compreendem: relacionamentos formais e informais entre os grupos dentro das incubadoras e entre as incubadoras e seu ambiente. Junto com os intelectuais, são os que conseguem estabelecer maior relação com as vantagens competitivas.

Embora a literatura, em geral, não especifique com exatidão quais recursos influenciam o desempenho das IEBTs, alguns podem ser mencionados. Sintetizados e

categorizados de acordo com a classificação acima, eles foram parcialmente utilizados na operacionalização da pesquisa. Como a construção do instrumento de operacionalização contou com a colaboração de profissionais que atuam diretamente em IEBTs, acatou-se a sugestão desses profissionais de elencar parte desses recursos, apresentados no Quadro 2, para a composição do instrumento (Apêndice A – Bloco II do survey), considerando os objetivos da pesquisa.

Quadro 2 - Recursos desenvolvidos pelas IEBTs

Grupo Exemplo

Organizacionais

 Planejamento estratégico e sistemas administrativos;

 Imagem e reputação da incubadora;

 Cultura organizacional que valoriza o empreendedorismo e a inovação;

 Cultura nacional com baixa aversão ao riscoa;

 Contexto político, econômico e socialb;

 Sistemas coletivos de aprendizagem;

 Capacidade de promover uma rede relacional com os empreendedores locais;

 Apoio de sistemas de busca e tratamento de informações estratégicas (linhas de financiamento, estado da arte e propriedade intelectual, entre outras);

 Capacidade do setor empresarial local e regional de absorver as empresas graduadasc;

 Grau de inserção da incubadora e da instituição mantenedora no ambiente acadêmico e empresarial, entre outros.

Físicos e Financeiros

 Localização geográfica da incubadora;

 Acesso a laboratórios de parceiros (universidades, outros centros de pesquisa e empresas);

 Laboratórios próprios e da mantenedora;

 Acesso a recursos financeiros;

 Infraestrutura física, equipamentos, mobiliários, internet e outros recursos tecnológicos disponibilizados para o funcionamento da incubadora e para os empreendedores residentes.

Intelectuais

 Apoio, por meio de consultorias, dado por equipes internas da incubadora e da mantenedora, ou por equipes externas (parceiros), aos incubados;

 Metodologias específicas para captação de projetos;

 Metodologias específicas em gestão de projetos e negócios;

 Metodologias específicas em gestão da propriedade intelectual;

Know-how tecnológico da incubadora e da mantenedora;

 Acesso a treinamentos e a capacitações;

 Mentalidade empresarial dos pesquisadores envolvidos no processo de incubação, entre outros.

Grupo Exemplo

Relacionais

 Associação formal da incubadora às redes regionais, nacionais e internacionais (Ex.: RMI, ReINC, RPITec, RECEPETi, Anprotec, IASP, NBIA, EmprendeSur, Red TT

» INOVA)d

Networking (relacionamentos);

 Capital social dos membros gestores;

 Relações de confiança estabelecidas com os parceiros internos e externos;

 Alianças e parcerias (FAPs, CNPq, FINEP, SEBRAE etc.)

 Relações colaborativas;

Stakeholders diversos;

 Parcerias público-privadas;

 Relacionamento com NITse, grupos de pesquisa e empresas juniores, fundações de apoio vinculadas às instituições mantenedoras e com o INPIf.

Fonte: BRUSH; GREEN; HART, 2001; CLARYSSE et al., 2004.

Notas específicas: “a”, “b” e “c”: Recursos que assumem a condição de limite para a competição ex-ante; “d”: RMI – Rede Mineira de Inovação, ReINC – Rede de Incubadoras, Parques Tecnológicos e Pólos do Rio de Janeiro, RPITec: Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica, RECEPETi: Rede Catarinense de Inovação, IASP: International Association of Science Parks and Areas of Innovation (Europa), NBIA: National Business Incubation Administration (Estados Unidos), Red TT » INOVA: Rede Ibero Americana de Transferência de Tecnologia para Inovação Tecnológica Competitiva; “e”: NITs - Núcleos de Inovação Tecnológica; “f”: INPI – Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

Identificar os recursos estratégicos para as IEBTs foi o primeiro passo para a compreensão da relação entre os recursos e a constituição de vantagens competitivas, no âmbito do modelo teórico da RBV. A partir daí, verificaram-se empiricamente as características adicionais que esses recursos devem possuir para gerar vantagem competitiva sustentável para essas organizações.

De fundamental importância para o estudo das IEBTs, dentro desta base teórica, é o que Hamel e Prahalad (2005) acrescentam à afirmação de Barney (1991) acerca dos recursos distintos que a organização possui. De acordo com esses autores, para alcançar diferenças de desempenho, é essencial que as organizações sejam capazes de gerar valor, e não apenas possuir recursos distintos, implicando mudanças na própria natureza da concorrência, uma vez que a competição entre recursos e competências é mais importante do que a competição entre produtos.

Entende-se, ainda, que é a combinação de recursos, e não apenas o controle dos recursos, a principal geradora de vantagens para as IEBTs. Nesse sentido, compreende-se que não é o valor do recurso individual que importa, mas sim a combinação sinérgica dos recursos desenvolvidos pelas incubadoras. Além disso, para criar uma vantagem estratégica sustentável, as IEBTs precisam tanto de um conjunto de recursos como das competências internas para reconhecer e explorar as oportunidades produtivas implícitas nesses recursos (SIRMON; GOVE; HITT, 2008).

Com base nos estudos sobre a RBV, pressupõe-se a hipótese 1, cuja representação gráfica é exposta na Figura 2:

Hipótese 1: Os recursos organizacionais, físicos e financeiros, intelectuais e relacionais explorados pelas IEBTs, no sentido atribuído pela RBV, influenciam positivamente as vantagens competitivas sustentáveis dessas organizações.

Figura 2 - Representação gráfica da hipótese 1 Fonte: Elaborada pela autora