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Consórcios públicos e a LPAF

No documento Aplicabilidade da lei federal 9.784/99 (páginas 179-200)

Analisar a incidência da processualidade administrativa nos consórcios públicos implica examinar e definir, de antemão, os caracteres relativos à natureza e ao regime jurídico inerente ao referido instituto no direito brasileiro. Realizada tal digressão, resta possível a aferição ora pretendida.

De plano – e em rápida síntese –, a discussão que se instaura parte de patamares federativos, uma vez que o escopo maior da regulamentação atual dos consórcios públicos diz respeito a uma verdadeira conexão cooperativa entre entes federados, tendo-se no instituto uma clara manifestação do chamado federalismo cooperativo. Assim é que o objetivo último da instituição dos consórcios é o de consolidar e viabilizar, entre os entes federados, a gestão associada de serviços públicos, com a consecução de fins de interesse comum.500

Por certo, não é novo o reconhecimento da existência de competências integradas e inter-relacionadas entre os distintos entes federados, sendo notório que a própria existência de uma federação revela a ocorrência de interesses comuns e indissociáveis.501

Historicamente, o que se vê é que a conjugação de esforços para a promoção dos interesses comuns entre entes teve assento constitucional pelo menos desde a Constituição de 1937, que previa a instituição de agrupamentos de municípios de uma mesma região para a prestação de serviços públicos comuns, com a explícita previsão de que o agrupamento seria dotado de personalidade jurídica autônoma limitada a seus fins.502

500 DI PIETRO, 2006, p. 773.

501 JUSTEN FILHO, 2006, p. 675-676. 502

JUSTEN FILHO, 2006, p. 676-677. Eis o texto do dispositivo da Constituição de 1937: Art. 29 – Os Municípios da mesma região podem agrupar-se para a instalação, exploração e administração de serviços públicos comuns. O agrupamento, assim constituído, será dotado de personalidade jurídica limitada a seus fins.

Parágrafo único – Caberá aos Estados regular as condições em que tais agrupamentos poderão constituir-se, bem como a forma, de sua administração.

172 Mais tarde, nas Constituições de 1967 e 1969503, o que se viu foi a autorização para a celebração de convênios entre os entes a fim de disciplinar a necessária institucionalização da atuação conjunta e coordenada, de modo a produzir soluções dotadas de maior estabilidade.504

No patamar atual – e em termos jurídico-normativos –, tal sorte de conjugação de ações em torno de interesse comum abarcou as duas opções anteriormente manejadas: a constituição de pessoa jurídica distinta dos entes (consórcios públicos) e a celebração de convênios de cooperação. É o que vem estampado no art. 241 da Constituição Federal de 1988, com a redação que lhe foi dada a partir da Emenda Constitucional n. 19/1998:

CF/88 – Art. 241. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios disciplinarão por meio de lei os consórcios públicos e os convênios de cooperação entre os entes federados, autorizando a gestão associada de serviços públicos, bem como a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos.

Diante de tal quadro, a Lei Federal n. 11.107/05 houve por regulamentar a figura dos consórcios públicos, dispondo sobre as normas gerais para sua contratação.505 Nesse sentido, criou a possibilidade de instituição, a partir da conjugação dos entes federados, de duas novas classes de pessoas jurídicas no ordenamento jurídico nacional. De fato – e a teor dos artigos 1º, § 1º, 6º e 16, da Lei Federal n. 11.107/05 –, uma vez devidamente trilhado o processo instaurado pela referida Lei para sua criação, resta possível a criação de consórcios públicos com personalidade jurídica de direito público (legalmente designados de associações públicas) e de consórcios públicos com natureza de direito privado.

Regulamentando a citada Lei Federal n. 11.107/05, eis a expressão conceitual do Decreto Federal n. 6.017/07 acerca dos consórcios públicos, já indicando o regime a que submetidas cada uma das espécies consorciais:

503 Conforme já explicitado, adota-se aqui, como Constituição anterior à de 1988, o quadro jurídico- normativo fundado a partir da edição da Emenda Constitucional n. 1, de 17/10/1969, sobre a então Constituição de 1967.

504 JUSTEN FILHO, 2006, p. 677. Os dispositivos das duas constituições (ambos estampados no art. 13, §3º) têm redação bastante assemelhada. Eis a redação na Constituição de 1969: Art. 13, §3º A União, os Estados e Municípios poderão celebrar convênios para execução de suas leis, serviços ou decisões, por intermédio de funcionários federais, estaduais ou municipais.

505 Ainda que não se adentre em tal discussão, importa ressaltar o intenso debate acerca da natureza e do caráter contratual dos consórcios públicos. No ponto, Marcelo Harger aponta que “a nova figura, embora seja instituída por intermédio de um procedimento que culmina com a celebração de um instrumento contratual, tem identidade diversa da desse instrumento. Não se trata de um contrato destinado a regulamentar relações jurídicas entre dois sujeitos de direitos que se mantêm autônomos enquanto partes signatárias do contrato. Trata-se de um instrumento contratual que objetiva criar uma nova pessoa jurídica, um novo sujeito de direitos e deveres, por intermédio da cooperação entre os contratantes (consorciados)” (HARGER, 2007, p. 69-70).

173 Decreto Federal n. 6.017/07 – Art. 1º Este Decreto estabelece normas para a execução da Lei no 11.107, de 6 de abril de 2005.

Art. 2º Para os fins deste Decreto, consideram-se:

I – consórcio público: pessoa jurídica formada exclusivamente por entes da Federação, na forma da Lei no 11.107, de 2005, para estabelecer relações de cooperação federativa, inclusive a realização de objetivos de interesse comum, constituída como associação pública, com personalidade jurídica de direito público e natureza autárquica, ou como pessoa jurídica de direito privado sem fins econômicos;

De tal afirmação decorre a necessidade de apreciação do lócus ocupado por tais entidades, sendo possível extrair da própria Lei de regência que, acaso constituídos como associação pública (consórcio público de direito público), os consórcios expressamente integrarão a administração indireta de todos os entes da Federação consorciados (art. 6º, § 1º).

Por outro lado, no caso de se revestirem de personalidade jurídica de direito privado, observarão as normas de direito público no que concerne à realização de licitação, celebração de contratos, prestação de contas e admissão de pessoal, que será regido pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT (art. 6º, § 2º), inexistindo menção legal direta quanto ao seu lócus na estrutura administrativa do Estado.

Sobre o tema – e sintetizando a posição prevalecente acerca da matéria –, válidas as palavras de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

Do exposto decorre que o chamado consórcio público passa a constituir-se em nova espécie de entidade da Administração Indireta de todos os entes federados que dele participarem. Embora o art. 6º só faça essa previsão com relação aos consórcios constituídos como pessoas jurídicas de direito público, é evidente que o mesmo ocorrerá com os que tenham personalidade de direito privado. Não há como uma pessoa jurídica política (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) instituir pessoa jurídica para desempenhar atividades próprias do ente instituidor e deixá-la fora do âmbito de atuação do Estado, como se tivesse sido instituída pela iniciativa privada. Todos os entes criados pelo Poder Público para o desempenho de funções administrativas do Estado têm que integrar a Administração Pública direta (se o ente for instituído como órgão sem personalidade jurídica) ou indireta (se for instituído com personalidade jurídica própria). Até porque o desempenho dessas atividades dar-se-á por meio de descentralização de atividades administrativas, inserida na modalidade de descentralização por serviços.506

506

DI PIETRO, 2006, p. 775-776. Contemporizando a afirmação de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, importa mencionar a possível criação de entidades pelo Poder Público que, ainda assim, não integram organicamente a Administração Pública. É o que se dá, pois, com o chamado lócus público não estatal, exemplificado pelas corporações profissionais tratadas no item 3.7.1 acima.

174 A partir de tal acepção – e apontada a integração orgânica de ambas as espécies de consórcios à estrutura estatal, na qualidade de entidades criadas a partir de descentralização (Administração Indireta) –, a discussão na matéria traz como foco, adiante, as especificidades de atuação de cada uma das modalidades de consórcio público (público ou privado).

Prevalece a noção de que ao consórcio público de direito público (associação pública) são dadas prerrogativas e competências equivalentes ao Estado, ao passo que aos consórcios criados sob roupagem de direito privado não poderão ser atribuídas manifestações próprias de império inerente aos órgãos estatais.507 Em outras palavras, o primeiro restaria apto a titularizar e regular o serviço público a cargo do Estado, com regime autárquico, enquanto o segundo seria caracterizado como prestador de tais serviços, com regime assemelhado às empresas estatais.508

De qualquer sorte, é inegável a existência de um regime comum a ambas as espécies de consórcios públicos, o que denota sua evidente integração e regulamentação enquanto entidades subjetivamente componentes da Administração Pública, independentemente das especificidades de sua atuação em concreto.509

Diante desse regime comum, interessa demarcar a existência de um lócus notadamente público no que tange às associações públicas, as quais, indiscutivelmente, sofrerão incidência integral da processualidade administrativa em sua atuação. De fato, é certo que o regime autárquico a que se submetem e o manejo de função administrativa não deixam dúvidas sobre a conexão material com a processualidade administrativa para as chamadas associações públicas.

No que concerne aos consórcios de direito privado, ressalta-se a existência de um regime jurídico de direito público derrogatório do direito privado aplicável a essas pessoas, sendo que tal regime nada mais é do que aquele aplicável às entidades de Direito Privado integrantes da Administração Indireta (especialmente o regime das empresas estatais prestadores de serviços públicos).510 Resta possível afirmar, pois, a incidência da

507

HARGER, 2007, p. 89-90. 508

Sobre os consórcios públicos de direito privado, Marcelo Harger aponta que “podem ser atribuídas a esse ente competências prestacionais, mas não regulatórias” (HARGER, 2007, p. 89-90).

509

Como base para tal afirmação, basta aludir ao processo similar de sua criação a partir da vontade funcional administrativa dos entes primaciais e, ademais, a submissão das duas espécies de consórcio ao regime de compras, de prestação de contas e de admissão de pessoal inerente à Administração Pública.

510

HARGER, 2007, p. 96. Na linha do que ocorrido com as entidades privadas componentes da Administração Indireta tratadas no Capítulo anterior, chega-se a um verdadeiro regime híbrido que, a par de sua criação a partir de entidades com personalidade jurídica de direito privado, sofre notável influxo de normas de direito público (em especial, de direito administrativo).

175 processualidade administrativa, em sentido amplo, aos consórcios de direito privado, na medida em que o controle estatal e o arcabouço de princípios gerais da Administração Pública e de direito público assim os direciona.

Vistas em linhas gerais as características dos consórcios públicos, com suas distintas vertentes, a questão que salta aos olhos é a seguinte: no manejo de suas atribuições, independentemente de quais sejam, a processualidade administrativa operada por tais entidades será regulada por quais normas? Emanadas por quais dos entes consorciados?

A situação que se apresenta demonstra a complexidade da questão. Para tal, basta que se imagine um consórcio público composto pela União, um Estado e um Município: sob qual ordenamento processual administrativo seriam manejadas as atuações do consórcio? Como seria definido seu regime jurídico em termos federativos? É certo, assim, que a eventual pluralidade de normativos inerentes à atuação administrativa dos entes criadores do consórcio entraria em choque no momento da efetiva realização de atividades pelo consórcio, o que geraria enorme insegurança em sua atuação.

No que diz respeito ao controle externo – o que denota, pois, apenas uma parcela de seu regime jurídico –, vê-se que a Lei Federal n. 11.107/05 preocupa-se em definir, em seu art. 9º, parágrafo único, que os consórcios públicos estarão sujeitos à fiscalização contábil, operacional e patrimonial pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas do Chefe do Poder Executivo representante legal do consórcio, sendo que tal representante legal será eleito entre os Chefes do Poder Executivo dos entes consorciados e terá seu mandato de acordo com o que dispuser o protocolo de intenções ratificado em lei (art. 4º, VIII).

Nesse quadro, indica Marcelo Harger que a fiscalização deve ser realizada por todos os Poderes Legislativos e Tribunais de Contas cujos entes estejam envolvidos no contrato de consórcio público.511 É que, como ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a definição do controle externo a partir do representante legal do consórcio, como induz a lei (art. 9º, parágrafo único),

não tem e não pode ter o condão de afastar o controle efetuado pelo Tribunal de Contas competente para apreciar as contas dos demais entes federativos partícipes do consórcio, sob pena de infringência às normas constitucionais

511

176 sobre fiscalização pelo Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas.512

Afora a questão do controle – que, por si, já traz inúmeros questionamentos, como visto –, a regulamentação da atividade administrativa realizada pelos consórcios merece análise peculiar.

Muito embora os instrumentos instituidores do consórcio possam prever algum regramento específico para sua atuação, é certo que a atividade cotidiana de tais entidades não encontrará regulamentação integral nesses documentos.513 Assim, o que comumente ocorre nas leis ratificadoras dos protocolos de intenções que subsidiam a formação dos consórcios é a menção à LPAF como ordenadora de preceitos específicos relativos à atuação da entidade multifederativa.

Partindo-se para casos concretos, interessa notar o que ocorrido com a Autoridade Pública Olímpica (APO), consórcio público formado entre a União Federal, o Estado do Rio de Janeiro e o Município do Rio de Janeiro com o escopo de coordenar a atuação de tais entes na preparação e realização dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016.

Nessa situação específica, o protocolo de intenções ratificado pelos entes políticos indica que os estatutos da APO estabelecerão o procedimento administrativo para a aplicação da pena de exclusão de consorciado, respeitando o direito à ampla defesa e ao contraditório. Para além disso, informa expressamente que, em casos tais, o procedimento previsto na Lei Federal n. 9.784/99 será aplicado subsidiariamente.514

Por fim, a solução que se apresenta para um eventual vácuo normativo que regulamente a atuação administrativa cotidiana dos consórcios públicos reside na LPAF, com sua incidência direta ou mesmo subsidiária, na medida em que criadas normas específicas pelo consórcio. É que a atuação dos consórcios públicos pode e deve ser informada, assim, pelo quadro normativo da LPAF, na medida em que a mesma se reveste do possível caractere de norma geral nacional decorrente do núcleo comum constitucional

512 DI PIETRO, 2012, p. 248. 513

Nada impede, todavia, a criação específica, via leis ratificadoras, protocolos de intenções ou estatutos, de todo um quadro geral de processualidade para os consórcios. De qualquer sorte, no mais das vezes essa situação não é encontrada no cenário prático de criação dos consórcios públicos.

514 Vide Protocolo de Intenções relativo à formação da Autoridade Pública Olímpica (no âmbito federal, ratificado pela Lei Federal n. 12.396/2011). Situações semelhantes de referência expressa à LPAF em seus documentos constitutivos são encontradas na formação de vários consórcios públicos. Apenas como exemplo, é o que ocorre, também, no Estatuto do Consórcio Intermunicipal Grande ABC, cujo objeto é o desenvolvimento da região a partir do planejamento, da articulação e da definição de ações de caráter integrado. Frise-se que o referido consórcio abrange apenas municípios. Vide documentação constante do sítio oficial do consórcio na Internet (http://www.consorcioabc.sp.gov.br).

177 de realização da função administrativa. E frise-se, como já dito, a desnecessidade de qualquer providência específica dos entes consorciados para que se opere tal incidência.

Invariavelmente, é no quadro da LPAF que as entidades multifederativas hão de buscar a regulamentação de sua atividade administrativa, já que virtualmente impossível uma coordenação legislativa entre seus entes políticos criadores. O que se extrai da LPAF, pois, é um quadro normativo geral capaz de emprestar segurança jurídica à atuação dos consórcios públicos, especialmente diante da pluralidade de fontes normativas a que poderiam restar submetidos em sua atuação.

3.8 Sinopse conclusiva do Capítulo

1. Várias das temáticas tratadas nos dois Capítulos anteriores acabam por remeter as questões inerentes à processualidade administrativa a um patamar federativo, chegando- se ao ponto do trabalho em que uma virtual aplicabilidade nacional da LPAF há de ser discutida. Pretende-se investigar, a partir de então, o alcance geopolítico da processualidade administrativa instaurada pela Lei Federal n. 9.784/99, com foco em uma virtual nacionalização processual administrativa, suas premissas, consequências e repercussões.

2. Discute-se, assim, a possível formatação de um corpo normativo unitário capaz de representar e regulamentar as possíveis formas de atuação administrativa, levando em conta notadamente os direitos do cidadão-administrado na relação com o ente estatal e o próprio desenvolvimento regular e conveniente das atividades administrativas.

3. Respeitada a organicidade do direito administrativo, conclui-se pela possibilidade de estabelecimento, em legislação única, das decorrências da relação jurídica havida entre Administração e administrados, a representar a mecânica processual tendente a garantir o exercício pleno dos direitos em uma ordem jurídica notadamente democrática e justa.

4. A própria ordenação da atuação administrativa seria trilhada e regulamentada por esse corpo normativo. É que ao processo administrativo cabe, em última análise: 1) dar aos litigantes, além de ampla defesa, instrumental para a solução das contendas que surjam; 2) dar à Administração instrumentos efetivos para a realização dos serviços e

178 tarefas públicas, essenciais ou não; 3) dar aos administrados segurança nos seus direitos e à Administração segurança para que o Estado atinja seus fins, com a realização profícua da função administrativa.

5. Em outras palavras, tal corpo teria como escopo último organizar a Administração, fazendo-a segura naquilo que concernente ao resguardo do interesse público que lhe compete perseguir e tutelar: seja mediante a justa aplicação do direito objetivo, seja quanto ao respeito dos interesses dos administrados, pelo correto atendimento de seus direitos subjetivos.

6. Três considerações preliminares são necessárias para se afirmar a possibilidade de utilização da LPAF, em seus termos, como lei geral sobre o processo administrativo: 1) o tratamento da processualidade de forma ampla; 2) a normatização do processo administrativo em caracteres eminentemente principiológicos, mormente a partir da base constitucional do devido processo legal administrativo; 3) o tratamento do processo administrativo a partir de normas básicas e com o instrumental da subsidiariedade, com a possível interpenetração de normas referentes a específicas modalidades processuais.

7. É que, em suma, uma atomização dos princípios e das normas básicas do processo administrativo nas três ordens federativas seria apta a causar tumultos e indefinições que a ninguém aproveitam, dificultando a plena observância da garantia constitucional do devido processo legal administrativo.

8. Grande parte das manifestações doutrinárias de apoio à extensão do alcance da LPAF para os chamados entes subnacionais adota como ponto de partida o seu caractere principiológico e explicitador de uma pauta constitucional de atuação administrativa. De outro lado, o aspecto fulcral dos posicionamentos que negam a possibilidade da extensão nacional da LPAF reside em uma perspectiva de autonomia e auto-organização administrativa dos entes federados, o que implicaria, diante da estrutura constitucional brasileira, a impossibilidade de uma lei de processo administrativo aplicável a todos os entes da federação.

9. Ainda na linha das expressões doutrinárias, a temática ganha nítidos contornos constitucionais na medida em que se põem em jogo as alegações acerca da competência

179 para tratamento da matéria processual. Ressurgem, pois, os embates entre processo e procedimento e, bem assim, as controvérsias acerca da competência legislativa para a matéria processual (art. 22, I, da CF/88), para os procedimentos em matéria processual (art. 24, XI, da CF/88) e sobre o encaixe do processo administrativo dentro de uma noção e de uma teoria geral do processo, a culminar ou não em uma eventual e possível regulamentação do processo administrativo a partir de normas gerais nacionais.

10. Como primeiro posicionamento, é possível identificar na doutrina uma série de autores que apontam para uma extensão eminentemente principiológica da LPAF aos entes subnacionais. Em vistas disso, o quadro normativo da LPAF restaria aplicável aos entes subnacionais na medida em que representaria a conformação, em sede legal, de princípios gerais inerentes à atuação administrativa.

11. Em segundo, exalta-se a existência de núcleo constitucional comum de

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