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O núcleo constitucional comum de processualidade administrativa e a extensão

No documento Aplicabilidade da lei federal 9.784/99 (páginas 145-149)

3.2 O entendimento da doutrina sobre a nacionalização da LPAF: pontos comuns de

3.2.2 O núcleo constitucional comum de processualidade administrativa e a extensão

Na visão de Wellington Pacheco Barros, o processo administrativo tem seus fundamentos básicos na Constituição Federal, razão pela qual cada ente federativo pode legislar a seu respeito na medida em que alinhado aos preceitos constitucionais. Haveria, 383 DALLARI, 2013, p. 690. 384 DI PIETRO, 2011a, p. 190. 385 DI PIETRO, 2011a, p. 190. 386 DI PIETRO, 2011a, p. 191.

138 assim, um núcleo comum constitucional de processualidade administrativa que vincularia toda a Administração Pública, de quaisquer das esferas federadas.

Com base nesse núcleo comum, cada ente tem a possibilidade de criar suas regras próprias para a disciplina da atividade administrativa, mas “desde que respeite as regras vinculadoras de toda Administração Pública, como são aquelas previstas no art. 37 da Constituição Federal”.387

Dessa forma, ainda que não exista uma autonomia legislativa absoluta no âmbito subnacional, fica claro que o processo administrativo tem características de direito local, “o que, sem nenhuma dúvida, dificulta uma codificação ou mesmo a sistematização doutrinária de temas comuns”.388

Para Arnaldo Esteves Lima, a autonomia dos entes subnacionais evidencia que a LPAF é mesmo lei federal e não nacional. Caso tivesse sido manejada como lei nacional, padeceria do vício de inconstitucionalidade no pertinente à referida autonomia. De qualquer forma, ainda que o diploma não seja diretamente aplicável aos Estados, Distrito Federal e Municípios, o autor deixa “claro que várias de suas regras incidem nacionalmente, porque decorrem diretamente da CF”.389

Romeu Felipe Bacellar Filho trabalha com uma noção de unidade constitucional do direito administrativo, eis que a compatibilidade entre o direito administrativo constitucional e o infraconstitucional é dada formal e materialmente: a primeira a indicar a competência e o procedimento de elaboração para as normas administrativas; a segunda representando o respeito a uma ordem de valores que se irradia por todo o sistema jurídico nacional.390

A partir dessa concepção – e baseado nas lições de Roberto Dromi –, Bacellar Filho menciona a existência de “uma „solução de continuidade‟ entre o direito administrativo e a Constituição”.391

Em seguida, o professor paranaense enuncia que essa unidade constitucional do direito administrativo ganha especial relevo nas federações, eis que

diante da repartição constitucional de competências legislativas entre as unidades federativas, se garante um núcleo mínimo de unidade e coerência a partir dos postulados constitucionais.

387 BARROS, 2005, p. 33. 388 BARROS, 2005, p. 33-34. 389 LIMA, 2005, p. 5. 390 BACELLAR FILHO, 2012, p. 29-30. 391 BACELLAR FILHO, 2012, p. 30.

139 A circunstância de a Constituição de 1988 ter dedicado capítulo próprio à administração pública conduz à formação de um direito administrativo nacional, baseado em normas constitucionais principiológicas, gerais e específicas. A autonomia dos entes federados – e notadamente o exercício de suas competências legislativas – subordina-se às normas constitucionais aplicáveis à União, aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal, segundo o caput do art. 37.392

À luz dessa unidade constitucional do direito administrativo e tendo em vista a complexa distribuição de competências relativas à disciplina na Constituição, entende Bacellar Filho que o texto constitucional privilegia de forma separada os vários institutos administrativos, enfocando-os unitariamente em sua dupla face: material e procedimental/processual.393 Assim, o direito administrativo, em geral, não suportaria a divisão de competências entre processo e procedimento exposta nos artigos 22, I, e 24, XI, da CF/88.

A partir desse entendimento, Bacellar Filho indica que a competência para legislar tanto sobre processo quanto sobre procedimento administrativo será do ente a quem a Constituição atribuiu competência legislativa para o respectivo direito administrativo material.394

De qualquer sorte, o autor é enfático ao estabelecer que o caractere de unidade constitucional conforma a autonomia dos entes, eis que equivocada a evocação do princípio federativo a fim de reconhecer a competência de cada ente da federação para a disciplina do processo administrativo. Há na Constituição, pois, uma ordem mínima que confere unidade à multiplicidade.395

Em específico sobre a LPAF, Bacellar Filho reafirma que a autonomia dos entes federados, em sede de direito administrativo, subordina-se às normas constitucionais a todos os entes aplicáveis. Diante disso, a Lei Federal n. 9.784/99 “deve ser respeitada pelos demais entes da federação quando desdobra princípios constitucionais”.396

392 BACELLAR FILHO, 2012, p. 30-31. 393 BACELLAR FILHO, 2012, p. 88.

394 BACELLAR FILHO, 2012, p. 88-89. Especificamente quanto ao direito disciplinar dos servidores públicos – e a competência para legislar sobre tal tema –, o autor informa que “a matéria está compreendida no „regime jurídico‟, previsto no art. 61, §1º, II, alínea c, da Constituição Federal. Força convir que cada ente da Federação, ao legislar sobre regime jurídico dos servidores da administração direta, será competente também para legislar sobre procedimento e processo administrativo disciplinar” (BACELLAR FILHO, 2012, p. 89).

395 BACELLAR FILHO, 2012, p. 84-86. 396

140 Márcia Maria Tamburini Porto Saraiva instaura o processo administrativo como uma espécie típica da figura geral “processo”, embora ressalte os traços peculiares que o matizam de modo singular entre as espécies processuais já tradicionais.397

Em seguida, ainda que estabeleça a existência do processo em sentido estrito (ou em sua dupla face) apenas quando se impõe a presença do contraditório, indica que no âmbito da Administração Pública a processualidade não se faz presente apenas nas situações contenciosas, eis que possível vislumbrá-la na emanação de qualquer ato. Haveria, assim, uma processualística administrativa geral moldável dentro de uma teoria geral do processo (processualidade ampla).398

Nesse contexto, Márcia Saraiva denota a ausência de regras gerais a conferir consistência, segurança e uniformização aos processos administrativos, sendo possível alçar a LPAF para o suprimento desse vácuo normativo, eis que tal lei reúne de forma ordenada os preceitos do processo administrativo com o sentido de disciplina geral federal.399 Na expressão da autora,

em que pese o caráter federal da Lei n. 9.784/99, a autorizar sua incidência somente na esfera da Administração da União, possível nela identificar o embrião de uma uniformização normativa nacional, capaz de estruturar, ao lado do direito administrativo material, o direito administrativo processual, a quem incumbirá conferir igual tratamento às questões comuns aos diversos tipos de processo administrativo. Preenche-se, ao menos em parte, a lacuna legislativa tantas vezes reclamada pelos administrativistas.400

Na conclusão de seu trabalho, indica que a pulverização do direito administrativo e sua processualidade entre estatutos de níveis federal, estadual e municipal inibe a formulação de um diploma nacional. No entanto, o fundamento da LPAF na Constituição dá vazão a uma possível acepção de processualidade ampla, instrumentalizando as garantias constitucionais em relação ao administrado e na busca dos fins da Administração (art. 1º da LPAF).401

Assim é que a autora considera que a LPAF construiu o embrião de um novo ramo do saber jurídico, especialmente na medida em que lança luzes para sua releitura sob

397 SARAIVA, 2005, p. 117. 398 SARAIVA, 2005, p. 120-121. 399 SARAIVA, 2005, p. 118-119. 400 SARAIVA, 2005, p. 118. 401 SARAIVA, 2005, p. 155-156.

141 outra perspectiva: não apenas como base para uma lei geral de processo administrativo, mas como novo ramo do direito processual, o direito processual administrativo.402

No documento Aplicabilidade da lei federal 9.784/99 (páginas 145-149)