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2.4 Etapas do Pânico Moral(II)

2.4.3 Consenso

Tal como em um desastre, o alerta inicial foi ganhando contornos de ameaça quando a incidência dos casos e a análise de alguns especialistas em segurança pública que vinculava os ataques como uma possível retaliação das UPPs se estabeleceram como um discurso padrão.

Palavras de ordem eram também a tônica do discurso do Relações Públicas da PM, coronel Henrique Lima Castro: ―Não começamos a guerra. Fomos provocados a entrar nela e vamos sair vitoriosos. Temos fôlego para isso. Ainda não usamos o pessoal que está de férias e o do interior‖ (O GLOBO, 25/11/2010, p. 17). Já o comandante-geral da PM respondeu pelo Twitter a dez perguntas enviadas por internautas e num discurso afinado com o secretário e o governador escreveu que ―a explicação para os ataques feitos por bandidos nos últimos dias no Rio está no descontentamento deles com as Unidades de Polícia Pacificadora‖ (O GLOBO, 25/11/2010, p. 17).

O governador, em entrevista à rádio CBN, corroborou com a tese e disse que nunca teve a ilusão de que os bandidos não reagiriam às ações do estado: ―Não tínhamos qualquer ilusão, perante as ações que estávamos tomando, a respeito desses marginais. Tivemos vários indícios disso, e agimos permanentemente. Mas é evidente que há, neste momento, uma tentativa desesperada da marginalidade de gerar uma fragilidade na nossa política, um terrorismo na população, um amedrontamento da população, para voltar àquela situação de comodidade (de outros governos)‖.

Uma das matérias do Globo intitulava-se ―O Crime contra as UPPs‖, uma outra apontava que na Zona Norte, em áreas sem a presença das unidades pacificadoras, se

concentravam os ataques e lembrava ―UPPs reduzem ataques na Zona Sul do Rio‖. O editorial deixava claro o posicionamento do jornal. Sob o título ―Nessa guerra não pode haver recuo‖, o texto corroborava com a retórica do governo de um embate entre uma ―nova‖ política de segurança e o velho crime organizado, acostumado com uma comodidade que não deveria existir mais. A primeira frase do texto é quase uma transcrição da entrevista do governador: ―Não deve surpreender a reação de quadrilhas de traficantes ao avanço das forças de segurança, com a retomada do controle por parte do estado de favelas que serviam de santuário da criminalidade‖.

A ideologia da mão pesada do Estado, como ação necessária para a retomada de um caminho melhor, era embasada como o único caminho possível no momento, a política de segurança teria chegado a um ponto sem volta onde o confronto direto era iminente:

―O restabelecimento do monopólio da força por parte do Estado e o banimento de armas pesadas, de guerra, dessas favelas, agora abertas para receber os devidos serviços públicos, são parte essencial do projeto, e nele não se pode recuar.‖ O contexto de guerra, da guerra tradicional entre Estados Nacionais e exércitos constituídos era trazido a tona em um trecho: ―A aberração brasileira é o controle territorial por bandidos e o manejo de armas de guerra. Isto é inadmissível. Algo semelhante pode ser encontrado apenas em regiões remotas, como áreas de exploração do ópio no Afeganistão. E na Rocinha...‖ (O GLOBO, 25/11/2010, p. 6)

Assim também a perspectiva da vitória era associada como outras embates entre forças de segurança e o crime organizado ao redor do mundo que geraram períodos turbulentos mas posteriormente obtiveram sucesso:

―O Brasil, e o Rio em particular, não vive experiência inédita. Há relatos idênticos, por exemplo, de quando as forças de segurança avançaram com êxito contra os cartéis colombianos e as máfias italianas. Em ambos os casos, quadrilhas acuadas reagiram com técnicas de terror. Pode ser a fase em que o Rio começa a entrar.‖ (O GLOBO, 25/11/2010, p. 6)

Ao fim, a aliança entre a sociedade e governo, mediada pelo jornal, era reafirmada com a justificativa novamente da força e do avanço:

Agora mesmo é que não pode haver vacilações. A criminalidade não será contida se o estado e a sociedade brasileira como um todo ficarem inertes. Não serão respostas tópicas nas ruas e nas favelas, embora necessárias, que equacionarão o problema, como disse ontem, em entrevista ao ‗RJ TV‘, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame. (O GLOBO, 25/11/2010, p. 6)

O editorial do Dia também afirmava categoricamente: ―Ataques: o Rio não pode recuar‖. Ambos editoriais relacionavam a onda de violência com a implantação das UPPs nas comunidades e defendem a política de segurança do Estado. Argumentam que neste momento não deve haver vacilações e que em nenhum momento o Estado pode abandonar a população como refém do medo. Elogiam como louváveis os esforços da polícia em todas as suas esferas, tanto no âmbito estadual com a Polícia Militar quanto no âmbito federal, com o reforço da Polícia Rodoviária Federal. Porém, apenas O DIA mantém críticas ao Estado relacionando parte dos problemas ao ineficiente sistema penitenciário:

Por outro lado, a se confirmarem investigações policiais, é inaceitável que bandidos que cumprem pena continuem a ordenar ataques à população, como os arrastões em série, incêndios a veículos e atentados a cabines da PM que ultimamente apavoram o Rio. Já passou da hora de o sistema penitenciário reforçar medidas legais de segurança para impedir que os criminosos trancafiados passem ordens aos seus asseclas fora da prisão e promovam o terror na cidade, como vem acontecendo nos últimos anos no Rio. (O DIA, 24/11/2010, p. 22)

A personificação da cidade em afirmações como ―O Rio não pode recuar‖ exacerbava o sentimento de agregação ao valor coletivo em um momento de violência e dúvidas acerca do futuro. Apesar das críticas do texto, o próprio legitima as ações das forças do Estado como representantes e defensores da população.

No editorial seguinte em O DIA, o sentimento de mobilização cívica cresceu e o texto atingiu um aspecto de palavra de ordem, como novas diretrizes para tempos de guerra. Sob o título ―Um não à chantagem dos facínoras‖ atinge-se um novo degrau na escalada de apoio ao Estado. Defende-se em virtude da gravidade da situação uma reação da força policial ―proporcional ou mais intensa ainda‖ aos atos de vandalismo. Segundo o jornal, isto é uma exigência da sociedade, apesar de que no mesmo editorial ponderar que ―a repressão, se própria para o presente, a longo e médio prazos, não é a única solução para combater o crime.‖ Se faz importante destacar a escolha do termo facínora pois este carrega um sentido muito maior do que criminoso. Criminoso é uma palavra que dialoga com o direito jurídico como o infrator, aquele que comete o crime. A palavra facínora acarreta um sentido moral. O facínora é o temido, o perverso, o malvado. É aquele conhecido publicamente como um câncer na sociedade. Não é a toa que é identificado como o vilão nos filmes de faroeste, vide ―O Homem que matou o facínora‖.

Assim também deve ser entendido o emprego do termo chantagem. Não é uma mera barganha pessoal que o crime estava fazendo, era uma covardia, a chantagem entra nesse

contexto como a falta de caráter, o achincalhamento da tranquilidade da vida dos cidadãos de bem por parte destes indivíduos, os celerados.

A opção pela ―mão de ferro do Estado‖ é descrita literalmente e ao final do texto novamente a população é conclamada a participar deste esforço de guerra:

Por isso, por mais que seja difícil manter a serenidade quando cenas de veículos incendiados passam a ser presenciadas na porta de casa, nas ruas da cidade ou quando se vira a própria vítima, a população há de unir forças nesta queda de braço entre o Estado e o crime organizado e dizer um não à chantagem dos facínoras. (O DIA 25 /11/2010, p. 30)

Reportagens sobre a repercussão dos fatos entre a população carioca focavam explicitamente no apoio ás ações das forças do Estado. As manifestações da sociedade civil, em especial de pessoas de renome cultural como músicos, apresentadores de TV, escritores de novela, atrizes e atores ganharam destaque como um movimento que ―reavivou o sentimento de cidadania‖.

O parágrafo inicial da referida matéria dava uma clara indicação de que o caminho tomado pelo Estado era unânime e indiscutível. A guerra incendiária do tráfico teve um efeito que ninguém imaginava. Das zonas Norte à Sul, a cidade do Rio está unida, pela primeira vez, em torno do tema segurança, que sempre dividiu opiniões e suscitou críticas em relação à ação da polícia. Ao atear fogo no primeiro carro, no domingo, as facções criminosas, que se aliaram contra a política de segurança que tem como diferencial a instalação de UPPs em morros e favelas, acenderam a fagulha de um sentimento de coletividade que estava apagado, estimulou cariocas a acreditar na polícia, que no passado andava desacreditada, e que é possível resgatar a paz do Rio. Nas ruas, o que se vê é a população com medo, mas convencida de que o governo não pode retroceder e a guerra ao terror é um mal necessário.‖ Depoimentos de intelectuais e personalidades reforçavam a retórica do confronto:

O Chefe do Departamento de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, Marcelo Neri, disse que, com o advento das UPPs, o confronto ―estava escrito‖. - Agora, é a hora de pacificar a cidade. Existe uma luz no fim do túnel – analisa. – Tem que se passar pelo processo, é um mal necessário.

(O GLOBO, 27/11/2010, p. 34)

Tanto na página de Opinião do DIA quanto no editorial, todas as edições contaram com artigos sobre os episódios. Chama a atenção que na quarta-feira, 24, havia um artigo que condenava as UPPs apesar dele estar imediatamente ao lado de um editorial que afirmava

―Ataques: Rio não pode recuar‖. Era um texto de um cientista político e juiz de direito, João Batista Damasceno. Nele, o autor lembrava do centenário da Revolta da Chibata e relacionava a opressão que a população pobre sofria em 1910 com a opressão que a população favelada sofre: ―Hoje, jovens pobres e negros já não sofrem açoites legais. Mas, morrem em decorrência de similar política que reprepara, com suas UPPs, a Zona Sul para a elite. Já não é o açoite que mata. É o caveirão, a política de extermínio e a indiferença dos que se acreditam seguros em suas zonas protegidas, tal como a oficialidade em seus camarotes‖.

Com exceção desse texto, todos os outros com depoimentos de intelectuais e personalidades que não faziam parte do corpo de profissionais do jornal eram a favor da ação policial. Na quinta-feira, 25, o engenheiro Luiz Murillo Tobias, relembrava a importkncia da ―Confiança na Polícia‖. Emoldurado com uma montagem do Capitão Nascimento, protagonista do filme Tropa de Elite, com o letreiro das UPPs, o texto descrevia como a morte de um Policial Militar era depreciada pela mídia e como a confiança na corporação estava abalada nos últimos tempos. Porém, o autor disse que a crise de segurança pública só seria contornada com um a polícia forte e ―de auto-estima elevada‖. Mais uma vez a palavra de ordem era a participação da sociedade em conjunto neste combate:

―E o cidadão faz parte do processo. Os constantes debates gerados a partir de ‗Tropa de Elite‘ mostra que há esperança e crença popular na existência de não apenas um, mas vários ‗Coronel Nascimento‘. Não p bom para a sociedade ter uma polícia vista com desconfiança. Os bons policiais e seus atos de bravura devem, sim, virar manchete. Questões de honra e vergonha multiplicadas. E a implantação das UPPs continuada. Espera-se do governo, e dos policiais, uma postura forte aos atos de vandalismo e desrespeito às leis públicas‖. (O DIA, 25/11/2010, p. 30)

No dia seguinte, um artigo do deputado federal Jair Bolsonaro dava novo empurrão em direção à ascensão do Estado como restaurador da ordem. Sob o lema ―Tolerância zero‖ afirmava: ―é utópico acreditar que soltar pombinhas brancas na Cinelândia, abraçar a Lagoa Rodrigo de Freitas ou fincar cruzes nas areias de Copacabana inibe a ação de criminosos‖ (O DIA, 26/11/2010, p. 38). Tratava-se de um claro deboche as ações de movimentos sociais como a ONG Viva Rio e as organizações de direitos humanos. No sábado, 27, o mesmo espaço do jornal contava com um texto de teor muito menos crítico do Juiz do Trabalho Marcelo Alexandrino C. Santos. Intitulado ―Rumo a um Rio de Luz‖ trazia consigo a ilustração de um policial apontando o seu fuzil em direção a palavra paz como uma relação de caminho e objetivo. Ao fundo uma imagem do Pão de Açúcar mundialmente associada ao conceito de ‗Cidade Maravilhosa‘. Era como se para o carioca recuperar seu orgulho, sua

chance estava nas mãos da polícia, restauradora da ordem e da paz. O autor classificou o contexto como uma indiscutível guerra civil e defendeu severamente a política das UPPs como ―parte da solução, não do problema‖. O texto remete a esperança de dias melhores de forma ótica:

Se há sombras, um foco de luz esta por perto. Lembramos que a luz tem o poder de afugentar as sombras, não o contrário. E não nos esqueçamos que o Rio é um lugar espetacularmente luminoso. (O DIA, 27/11/2010, p. 26)

No domingo 28, um artigo de Fabiano Dias Monteiro, pesquisador do Viva Rio intitulado ―O Rio contra o crime‖, defendia mais uma vez as UPPs. Além disso, ele propunha que conforme as UPPs fossem se estendendo para as áreas da Zona Norte onde estão conflagrados os conflitos, mais cresceria a adesão da população ao projeto do Governo do Estado. Esta série de artigos nos revela um contexto social interessante.

Apesar de não serem redigidos pela equipe de O DIA também não foram censurados por estes que, afinal de contas, viabilizaram a sua publicação. A edição poderia muito bem cortar um texto que considerasse indesejável ou que ferisse a ideologia ou o código de conduta do jornal. Com exceção do primeiro artigo, todos os subsequentes se colocavam na corrente direta do apoio as forças do Estado. O deputado federal Jair Bolsonaro (PP- RJ) ridicularizou as ações de organizações não-governamentais como o Viva Rio e dois dias depois, no mesmo espaço, havia um pesquisador desta instituição defendendo algo semelhante ao que propunha o referido deputado. A expansão dos projetos das UPPs é que acarreta, num contexto de conflito bélico como o do Rio de Janeiro naquele momento, a aplicação da mão forte do Estado. O jornalismo é em sua origem uma esfera pública de discussão, sua coluna de opinião traz um traço de acrópole, de ambiente de discussão da sociedade. Ora, se lados tão extremos concordam em pontos que geralmente são tão delicados, devemos pensar que o jornal está inserido neste paradigma consensual que se desenha.

2.3.3.1 Predição

Predição em uma conotação denotativa é o processo de determinação de acontecimentos futuros com base em dados subjetivos. Sinônimo de adivinhação ou profecia

é um elemento propalador da ameaça em um Pânico Moral. Fenômeno por sua vez que catapulta o consenso como ação reacional necessária. A predição em novembro de 2010 era que os eventos continuariam a ocorrer sem uma reação forte da polícia. As cartas dos leitores expostas em O Globo, nos dias anteriores à ocupação da Vila Cruzeiro demonstravam um forte pessimismo na população:

Terror no Rio

Sim, são ataques terroristas o que estão chamando de arrastões. As autoridades têm que reconhecer isto! Se o Exército já veio para o Rio

por tão menos, por que não vem desta vez? Qual é a jogada política do

momento? Quem está lucrando com isto? Seria a vinda da Força Nacional de Segurança desmoralizante para as Unidades de Polícia Pacificadora? O carioca está em pânico. As pessoas não param nos sinais, ou ficam a dezenas de metros da faixa de pedestre, evitando chegar até ela, com pavor dos cruzamentos. As pessoas estão fazendo manobras arriscadas e arrancando com os veículos por qualquer emparelhamento normal de trânsito ou ao ver qualquer motocicleta. Ataques terroristas, sim.

Bruno de Faria, Rio

Já estamos em Beirute. De novo, mais arrastões com carros incendiados nas linhas expressas importantes. A polícia chega em vários carros, mas só depois do ocorrido. Como sempre, a PM diz que não tem efetivo suficiente para proteger a população. Então, só resta solicitar a Força Nacional de Segurança ao governo federal. O que será que está faltando?

Lucio de Jesus, Rio

Até quando abusarão de nossa paciência? Sou carioca e amo a minha cidade, todavia, fico pasmo e ver a inércia e a omissão das autoridades policiais, que dizem proteger os cidadãos. O que vejo é quase todo dia é um arrastão e pessoas sendo assaltadas e veículos queimados em pleno luz do dia. E o pior é ouvir das autoridades de segurança, depois dos assaltos, que estão reforçando o policiamento na área em que houve a violência. Haja paciência.

Ronaldo de Oliveira Lima, Rio

Autoridades legalmente constituídas, vamos combater a guerrilha urbana, colocando as Forças Armadas na rua, e fogo neles! Faz-se necessário um basta a tudo que está acontecendo.

Altair Santos, Rio

Prezados governador e secretário de Segurança, será que os srs. Têm alguma dúvida dos locais em que estes atos são diariamente cometidos? Linhas Vermelhas e Amarela, Perimetral. Os srs. criaram as UPPs e livraram as comunidades do tráfico. No entanto, esqueceram que as ações desceram para o asfalto. Uma vez que esta barbárie acontece diariamente, não seria de bom senso colocar policiamento diário e ostensivo ao longo destas vias? A população não tolera mais. Governador, o sr. foi reeleito prometendo mais segurança. Por favor, comece a mostrar serviço.

Geraldo Luiz Lisboa, Niterói

O Rio de Janeiro vive um trágico clima de guerra terminal. Bandidos chacinam a população indefesa, roubam e destroem seus bens. Os cidadãos foram abandonados. Cartazes, publicidade e retórica no lugar de soluções, força pública e medidas eficazes. Pouco significam estatísticas, possivelmente maquiadas. Pouco interessa quem serão os próximos governadores e os prefeitos, se não sobrevivermos. Todas, as medidas, das Forças Armadas às rezas para Nossa Senhora Aparecida, devem ser usadas para salvar o povo da dizimação. Basta de conversas fiadas fingindo

preocupações mais formais do que legais. Basta de propaganda cara e inútil. Ou o desfecho é morrermos à míngua?

Piero Bondi, Rio

Por favor, não critiquem a segurança do Rio. Afinal, temos as UPPs. Como diz a nota da secretaria - foi do secretário, da assessoria de imprensa? - ―Crimes, não só arrastões fazem parte do contexto do Rio‖. Afinal, foi retratado no filme ―Tropa de Elite 2‖ o contexto do Rio. Que Deus tenha piedade de nós!

Eliza Sampaio, Rio

Acuados nas favelas pelas bem-sucedidas UPPs, traficantes do Rio intensificam suas ações no asfalto. Até aí, nada de novo: a sociedade apostava que isso aconteceria. O que a sociedade espera, como novidade, é eficiência das autoridades no incansável combate à corja criminosa. Os cidadãos de bem não aguentam mais arrastões, veículos incendiados, milícias, ―bondes‖, bandidos cruzando as ruas da cidade ostentando armas, corrupção nas policiais: verdadeiro rosário de ilicitudes. Tanto quanto as bem-vindas UPPs, já passa da hora de as autoridades criarem as UPPAs: Unidades de Polícia Pacificadora do Asfalto.

Nelson Nóbrega

Rio (O GLOBO, 23/11/2010, p. 8)

2.3.3.2 Simbolização

Se o Pânico é de raiz moral sua aflição tem valor simbólico, assim como sua reação para ser realmente efetiva deve atingir um patamar moral de valor antagônico, ou seja, a vitória deve atingir os demônios populares de uma forma que simboliza uma derrota efetiva das facções criminosas. Este momento foi alcançado com a fuga em massa dos bandidos relatadas pelas redes de televisão e pelo domínio de um território que simbolizava uma esfera de poder pelo tráfico de drogas no Rio de Janeiro. Para entendermos a euforia posterior devemos abordar também o simbolismo no imaginário carioca que possuíam as comunidades da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão.

O simbolismo da Vila Cruzeiro

No universo das comunidades carentes cariocas, a Vila Cruzeiro vista a partir de sua localização e tamanho não teria grande relevância. Com uma população de 19.511 moradores, espremidos em 5.593 domicílios - a média é de uma moradia a cada 43m² - ocupa uma encosta no bairro da Penha, subúrbio do Rio de Janeiro. A Vila Cruzeiro alcançara relevância no imaginário policial da cidade por conta de um episódio particular.

Em junho de 2002, o jornalista Tim Lopes fora sequestrado, torturado e assassinado na favela enquanto fazia uma reportagem investigativa para a TV Globo. Sua morte se tornou um símbolo do poder paralelo dos traficantes na região. O Jornal Extra inclusive destacou em