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6. A ÁREA DE ESTUDO NO CONTEXTO DAS SUPERFÍCIES DE

7.2. CONSEQÜÊNCIAS DAS GLACIAÇÕES

7.2.2. Conseqüências na distribuição da cobertura vegetal

A alternância entre climas úmidos e tipos climáticos tendendo à aridificação influenciou diretamente nos esquemas distributivos dos mosaicos vegetacionais do Brasil, com expansão de fisionomias abertas de caráter xerofítico e retração das formações florestais durante os períodos glaciais seguidas de (re)expansão das florestas por ocasião das fases interglaciais.

Christofoletti (1968) assevera que, quando da instalação das fases secas, a vegetação é o primeiro componente da paisagem a sofrer influências, o que é expresso pela substituição da floresta por vegetação aberta. Sobre isso, Charles Darwin em sua obra “A Origem das

efetuaram desde as épocas geológicas recentes devem ter rompido a continuidade da distribuição primitiva de muitas espécies” (DARWIN, 1985, p. 349). O formulador da Teoria da Evolução das Espécies e da Seleção Natural avaliou o quadro florístico da Europa em sua faixa temperada, provavelmente ocupada por espécies árticas durante a última fase glacial, conforme está registrado na seguinte passagem:

“À medida que o frio aumenta, as zonas mais meridionais tornam-se mais propícias para receber habitantes do Norte; estes dirigem-se para o sul e substituem as formas das regiões temperadas que lá se encontravam. Estas últimas, por seu turno e pelo mesmo motivo, descem cada vez mais para o Sul, salvo se forem obstadas por algum obstáculo, quando então morrem. Cobrindo-se as montanhas de neve e de gelo, as formas alpinas descem para as planícies e, quando o frio tiver atingido o máximo, uma flora e uma fauna árticas ocuparão toda a Europa Central até os Alpes e Pireneus, alastrando-se mesmo até a Espanha” (DARWIN, p. 358).

A respeito da distribuição espacial da cobertura vegetal durante as fases glaciais, Ab’Sáber (1977, p. 02) argumenta da seguinte maneira:

“do Plioceno Superior para o Pleistoceno após a fase principal de soerguimento dos Andes – alternaram-se quadros de distribuição de solos e floras, a períodos relativamente curtos de tempo geológico, baseados nas bruscas mudanças dos mosaicos climáticos e ecológicos. Desta forma, no mesmo espaço global do continente americano do Sul, e através da atuação dinâmica dos mesmos “stocks” globais de vegetação, sucederam-se clichês complexos de distribuição de coberturas vegetais, diretamente associadas a condições ambientais úmidas e quentes nas fases interglaciais e, mais secas e relativamente frias, nas fases glaciais”.

As modificações do clima em larga escala trouxeram a reboque alterações no quadro paisagístico, tanto no tocante aos processos morfogenéticos atuantes como no que se refere aos esquemas distributivos da cobertura vegetal e da fauna. Bigarella (1994) assevera que a redução da radiação solar durante os períodos glaciais provocou um abaixamento da temperatura média oceânica – acompanhado de um deslocamento para o norte do anticiclone do Atlântico Sul – reduzindo assim a evaporação no cinturão dos ventos alísios, o que provocou uma diminuição nas taxas de precipitação sobre o Brasil e, conseqüentemente, levou a efeito mudanças sistemáticas nos padrões de vegetação. Foi dessa maneira que as áreas anteriormente cobertas por florestas deram lugar à instalação da vegetação aberta.

Conforme especula Bigarella (1964), nas épocas semi-áridas as florestas deixaram de ocorrer na maior parte do território brasileiro, restringindo-se a áreas submetidas a condições ambientais especiais que permitiram sua sobrevivência.

predominaram, por ocasião das épocas glaciais, sobre as grandes massas florestais por praticamente toda a América do Sul. Tomando como munição as colocações do referido autor na comunicação supracitada, sintetizamos a provável distribuição espacial dos diferentes biomas durante o último período glacial (Würm IV-Wisconsin Superior).

Caatinga – Penetrou por vários compartimentos interiores dos atuais planaltos intertropicais brasileiros atualmente ocupados por matas e cerrados. O referido bioma avançou sobre as depressões periféricas e interplanálticas (depressões entre os chapadões do Urucuia e o planalto central de Goiás, áreas deprimidas ao norte de Brasília e Anápolis, pediplano cuiabano, pediplano do alto Araguaia), depressões interplanálticas e intermontanas da Bahia e Minas Gerais e setores do estado de São Paulo (trechos da depressão periférica e sul do estado e parte da porção meridional do Planalto Ocidental Paulista).

Cerrado – Ocupou amplas áreas da Amazônia Oriental e Central, pequenos núcleos na região Centro Oeste (então ocupada pelas caatingas) e a maior parte do Planalto Ocidental Paulista.

Mata de araucárias – Expandiu-se da porção meridional do território brasileiro em direção ao sudeste acompanhando os terrenos elevadiços do Brasil Oriental ao longo de espigões e serranias dotados de cimeiras sub-úmidas e úmidas, como a Serra de Paranapiacaba, o Planalto de Campos do Jordão, a Serra da Bocaina, terrenos elevados do Centro-Sul de Minas e Espinhaço Meridional. Ab’Sáber (1958) se posiciona a favor da interpretação da ocorrência de araucárias nas terras altas do Brasil de Sudeste em função das modificações no clima.

Pradarias mistas – Ocupou latitudes mais baixas na borda sul do Planalto Brasileiro, ao passo que formas de vegetação xerófitas, sub-xerófitas e subtropicais do norte e noroeste argentino avançaram rumo ao interior das depressões centrais sul-americanas e alguns setores do Brasil centro-ocidental. A maior parte das coxilhas do Uruguai e do Rio Grande do Sul estiveram sob a ação de climas secos, dando aporte à cactáceas e com ausência de florestas galerias.

Formações florestais – Às matas latifoliadas restaram os ditos ambientes de refúgio, locais mais contemplados pela umidade, seguindo o alongamento de grandes rios ou se dispondo de

Santo.

Reforçando as linhas mais gerais dos padrões distributivos da vegetação brasileira no Pleistoceno tardio, Ab’Sáber (1977) chama a atenção para a complexidade intrínseca à biogeografia que marcava o último período glacial, salientando que, do Brasil Central em direção à Amazônia Central, o que existia, muito provavelmente, era um esquema de faixas que tinha início com a predominância de cerrados, sucedida por uma faixa marcada pela ocorrência de caatingas com uma nova recorrência aos cerrados.

A respeito da discussão em vigor, Viadana (2002) postula que a área core do cerrado esteve em vários momentos do Quaternário bastante reduzida, sendo que em sua extremidade meridional medravam formações vegetais abertas, do tipo estepes, pradarias mistas e manchas de menor densidade de araucárias. Em estudos realizados no estado de São Paulo (VIADANA, 2001; 2002), o autor identificou vasta ocorrência de cerrados entre 13.000 e 18.000 anos na maior parte do Planalto Ocidental, ocupando ainda trecho da Depressão Periférica Paulista e do Vale do Paraíba do Sul, próximo a São José dos Campos. No mais, as caatingas penetravam a depressão, o Vale do Ribeira e parte do sul e do extremo sudoeste do estado, ao longo do rio Paranapanema em direção ao seu pontal, com refúgios de mata na região das cuestas basálticas, Serra de Paranapiacaba e Serra do Mar.

No nordeste brasileiro as mudanças climáticas comportaram uma relativa fixidez das zonas morfoclimáticas, salvo pequenas modificações, sugerindo para a referida região condições de semi-aridez bastante antigas, reforçando a capacidade adaptativa das caatingas (TRICART, 1959).