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3. BASE LEGAL

4.3 CONSERVAR OU PRESERVAR

Quando se fala em questões atinentes ao meio ambiente, se faz importante precisar a distinção entre conservar e preservar. A palavra “preservar” vem do latim “praeservare” que significa observar previamente, prever Drumond (2006, p. 108). Na língua portuguesa, preservar significa, “resguardar” (XIMENES, 2000, p. 752). Quando se fala preservar, em matéria ambiental, quer se dizer: manter intocado.

No entanto entende-se que nem sempre o isolamento pode ser a forma mais correta de não degradação do meio ambiente e a segurança que as futuras gerações poderão ter acesso a ele. O entendimento é que uma relação equilibrada entre o homem e a natureza seja a forma mais adequada de mantê-lo vivo, pensamento que faz surgir o que se chama de conservacionismo. A palavra conservar, segundo Ximenes (2000, p. 246) significa “manter, resistir ao tempo”.

Preliminarmente as duas palavras parecem sinônimos, mas sua diferenciação será destacada a partir da relação que o homem exercer dentro do seu ambiente. Para Diegues

(2002, p. 77), “reside na interação homem-natureza um dos pontos que diferenciam as várias correntes no que diz respeito à cultura”.

Logo, se a ideia for o preservacionismo, a intervenção do homem será praticamente nula. Este procurará manter aquela coisa intocada, da maneira mais natural possível. Segundo (LARRÈRE, 2012), o preservacionismo corresponde ao pensamento do século XIX, quando se pensou em proteger a natureza isolando-a em parques e mantendo esses inertes ao processo de desenvolvimento. No entanto esqueceram que os homens também são seres naturais, segundo a autora (2012, p. 17), “a humanidade não é somente sujeito, ela é também uma força”. E é baseado nessa força que entra a ideia do conservacionismo, no qual, o próprio homem, enquanto ator principal desse processo buscará meios em que possa usar o ambiente em que vive da forma mais racional possível.

Diegues (2002, p. 83), cita Dasmann, que considera que são as “sociedades interligadas a uma economia global, de alto consumo e poder de transformação da natureza, que causam grande desperdício de recursos naturais”. Manter intocado torna o bem estagnado e a cultura não é estática, seu caráter é dinâmico e daí a necessidade que passe por transformações que funcionarão como adequações necessárias à perpetuação da identidade daquele grupo com determinado bem, seja ele material ou imaterial. Mas esse pensamento não é uniforme. Vejamos o que nos diz Lemos acerca da questão que vimos examinando:

[...] será mais fácil a manutenção de nossa identidade cultural se soubermos controlar os processos de evolução que fatalmente se desenvolvem mercê de alterações inevitáveis no campo do saber fazer. Neste controle esta implícito registro dos vários estágios que passamos. Aqui registrar é sinônimo de preservar, de guardar para amanhã informações ligadas a relações entre elementos culturais que não têm garantias de permanência. (LEMOS, 2006, p. 27)

Na segunda metade do século XIX, segundo Diegues (2002), foi grande a criação de áreas de proteção, os chamados parques e reservas. Isso porque a revolução industrial trouxe o ônus do crescimento desordenado das cidades e a destruição acelerada do meio ambiente. Naquele momento, dentro daquele contexto, o ideal foi providenciar áreas em que se mantivesse a natureza intocada, na verdade uma espécie de demarcação foi criada, liberando o homem a destruir o que não estivesse dentro daquele eixo criado.

Apesar do despertar do homem para a finitude dos recursos naturais, se em tese houve uma modificação na forma de pensar, na prática, o homem continua sendo o principal ator no

processo contínuo de degradação do ambiente. Papel importante nesse processo, como exemplo, são as chamadas comunidades tradicionais, ou seja, aqueles povos que vivem em contato constante com natureza, chegam a retirar dela a sua subsistência, mas adotam uma relação de cumplicidade com o meio natural e conseguem mantê-lo vivo e útil. Nesse sentido, utilizando o pensamento de Sachs (2002), não se pode equacionar conservação com a opção de “não-uso” dos recursos naturais e sim com o uso racional para atender as necessidades.

[...] De modo geral, o objetivo deveria ser o do estabelecimento de um aproveitamento racional e ecologicamente sustentável da natureza em benefício das populações locais, levando-as a incorporar a preocupação com a conservação da biodiversidade aos seus próprios interesses, como um componente de estratégia de desenvolvimento. Daí a necessidade de se adotar padrões negociados e contratuais de gestão da biodiversidade. (SACHS, 2002, p. 53)

De outra vertente, quando se fala em meio ambiente artificial, geralmente o termo mais ouvido é o de preservação. Criou-se o costume que a história para ser mantida viva deve estar sob a égide do tombamento, sob a guarda dos museus. Estamos longe aqui de discordar desta prática que tem sido realmente eficaz no sentido de guardar em segurança, mas questiona-se se ao invés da prática preservacionista, talvez a prática conservacionista não trouxesse resultados mais eficazes no sentido de manter viva a história se associada com o caráter dinâmico próprio da cultura, de modo a evitar que as cidades se tornem mortas, como aconteceu com Atenas.

A Atenas moderna não tem mais nada em comum com a cidade arcaica, coberta, absorvida, desmesuradamente estendida. Os monumentos e os lugares (ágora, acrópole) que permitem encontrar a Grécia antiga não representam mais do que um local de peregrinação estética e de consumo turístico. (LEFEBVRE, 2001, p. 17)

Entende Lefebvre (2001), que estes lugares sobrevivem graças a uma troca que os fazem ter um duplo papel, o do lugar que se vende e o lugar que se consome. De certa forma são atribuídos dois tipos de valor aos lugares. O valor de uso e o valor de troca, como se refere (LEFEBVRE, 2001). Ou seja, valor de uso tem relação com o sentimento das pessoas e valor de compra ou de troca, o valor como produto de mercado. O valor de uso é aquele ligado ao sentimento desenvolvido com relação ao lugar, tem relação com a identidade das pessoas que vivem em determinado espaço. Já o valor de troca é o valor pecuniário que a exploração daquele lugar pode ter, ou seja, aquele atribuído ao lugar de acordo com intenções

na sua concepção. Criam espaços voltados exclusivamente a atrair o olhar de investidores, mas, descarta o sentimento das pessoas que ali vivem. Muitas vezes esses espaços passam por tantas modificações que pouco interessa àquele que nasceu e sempre viveu na localidade. Em matéria cultural, acredita-se que o manter vivo só se dá quando o homem entende seu papel conservacionista.

Acredita-se que existe um grande equívoco em achar que a sensibilização surge de maneira controlada, como se fosse uma mercadoria que se coloca numa prateleira para ser comprada ou não pelo consumidor. No caso da cultura, é preciso que exista a identificação, o sentimento, por isso que se entende que as práticas conservacionistas surtiriam um efeito mais promissor do que a prática comum preservacionista.