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INSTITUCIONAL À EXTENSÃO DO IFRN

Segundo Durkheim (2007), a educação tem uma função essencialmente social e dessa forma qualquer modalidade de ensino não pode estar alheia à função social que ela, em si, representa para a sociedade. A educação para a cidadania social no Ensino Médio In- tegrado, torna-se, pois, uma premissa necessária ao processo de formação humana defendido e almejado para a Educação Profissional e Tecnológica no Brasil. Mas, para que ela aconteça, é fundamental que haja uma forte relação entre os educandos e a comuni- dade externa. Considerando-se a tríade Ensino, Pes- quisa e Extensão, encontramos, nesta última, a ponte para interligar a escola e a comunidade e, portanto,

para o desenvolvimento da educação para a cidada- nia social junto aos educandos.

Assim, a extensão é uma atividade pedagógica (curricular ou extra-curricular) que pode fazer par- te da dinâmica de formação dos educandos, possi- bilitando a construção de conhecimentos e o desen- volvimento de valores humanos que a estruturação rígida do ensino tradicional não possibilitaria. As interações sociais que a extensão, concebida como princípio educativo, proporcionam aos educandos possibilitam a imersão dos mesmos em atividades educativas que podem contribuir para a construção da sua cidadania social. A interação entre o aluno extensionista e os alunos da comunidade externa é um fator determinante, visto que por meio dos pro- cessos interativos, os estudantes extensionistas têm a hipótese de desenvolver atitudes, valores e compor- tamentos relacionados à educação para a cidadania, conforme discutimos anteriormente. A Extensão no Ensino Médio Integrado caminha nesta perspectiva, pois uma de suas características é o desenvolvimen- to de projetos que envolvam a comunidade externa e, portanto, criem uma relação dialógica que somen- te é possível de acontecer por meio das interações entre alunos extensionistas e membros da comuni- dade externa. Na concepção de Araújo e Silva (2013),

os projetos de extensão são atividades pedagógicas que contribuem com experiências sociais para o es- tudante. Estas experiências proporcionadas pela ex- tensão possibilitam a construção da educação para a cidadania social no Ensino Médio Integrado.

Diante deste contexto, estamos realizando um estudo de caso sobre o Programa de Apoio Institu- cional à Extensão (PAIE) do IFRN. Para tanto, acom- panhamos durante sete meses o desenvolvimento de dois Projetos de Extensão que integram o PAIE no Campus Mossoró e realizamos observações a fim de compreender os contributos do Programa à educa- ção para a cidadania dos estudantes do Ensino Mé- dio Integrado. Neste artigo, discutiremos os resulta- dos parciais que obtivemos por meio da análise de conteúdos das notas de campo do Projeto de Exten-

são Mecânica dos Fluidos Prática – Uma ferramenta didática de apoio ao ensino. Ao analisarmos as no-

tas, encontramos evidências que colocam a extensão como uma atividade pedagógica capaz de contribuir com a educação para a cidadania dos estudantes do Ensino Médio Integrado. Dentre elas, podemos apon- tar o desenvolvimento de alguns valores apontados por Cortina (2005) e Nussbaum (2015): solidarieda- de, tolerância, disponibilidade para o diálogo, preo- cupação, respeito ao próximo e autonomia.

A solidariedade foi um dos valores relaciona- dos à educação para a cidadania que mais pudemos constatar, pois as observações apontaram atitudes comportamentais que demonstram um compromis- so social e o sentimento de participação dos estudan- tes extensionistas na vida dos participantes duran- te todas atividades. Dentre elas, podemos destacar o fato de os estudantes extensionistas dirigirem-se voluntariamente aos participantes para auxiliá-los na resolução dos desafios apresentados pelo gru- po (NOTA 1, 19/10/2017; NOTA 3, 23/11/2017; NOTA 4, 08/12/2017), mostrarem-se solícitos para ajudar a tirar as dúvidas e questionamentos feitos pelos participantes (NOTA 1, 19/10/2017) e pensarem em conjunto com os participantes sobre a resolução dos problemas apresentados (NOTA 4, 08/12/2017).

A tolerância aconteceu em função da aceita- ção, por parte dos estudantes extensionistas, da ma- neira como os participantes reagiram diante de algu- mas circunstâncias. Dentre elas, podemos apontar situações relacionadas a perguntas feitas, proposi- talmente, para testar os conhecimentos dos estudan- tes extensionistas e ainda para avaliar a forma como os extensionistas respondiam aos questionamentos (NOTA 1, 19/10/2017). Neste contexto, os estudantes extensionistas responderam pacientemente, pois

embora estivessem diante de uma situação provoca- tiva, eles mantiveram-se sempre tolerantes.

A disponibilidade para o diálogo também esteve fortemente presente, pois, durante as interações, os estudantes extensionistas procuraram desenvolver uma relação de proximidade com os participantes, envolvendo-os por meio de perguntas relacionadas aos conteúdos (NOTA 3, 23/11/2017). Ao abrirem-se ao diálogo, as atividades não se constituíam como um momento de repasse de conhecimentos, mas como ocasião para partilhar, trocar e construir novos co- nhecimentos (NOTA 4, 08/12/2017). Esta perspectiva dialógica estendeu-se durante todas as atividades e, ao término, eles ainda tinham o cuidado e a atenção de perguntar se os participantes haviam entendido e se tinham alguma dúvida (NOTA 3, 23/11/2017). A disponibilidade para o diálogo caracterizou a forma como os estudantes interagiram com os participan- tes, possibilitando uma troca de conhecimentos em perspectiva dialógica, consolidando assim, a exten- são como uma prática educativa.

A capacidade de dar atenção a problemas es-

pecíficos dos participantes esteve sempre relacionada

à preocupação com o aprendizado dos participantes durante a exposição teórica e a realização dos expe-

rimentos práticos sobre Mecânica dos Fluidos (NOTA 2, 23/10/2017; NOTA 4, 08/12/2017). Isto foi perceptível pelas constantes indagações que os estudantes exten- sionistas faziam durante a realização das atividades com o visível objetivo de criar um ambiente dialógico e de confirmar se eles estavam se fazendo entender junto aos participantes (NOTA 1, 19/10/2017; NOTA 3, 23/11/2017; NOTA 4, 08/12/2017). Neste aspecto, ob- servamos clara e objetivamente um cuidado especial dos estudantes extensionistas com a aplicação e dis- cussão dos conteúdos técnicos junto aos participan- tes, conforme demonstram os trechos a seguir:

Diana interviu e disse que quando esti- vessem mostrando a parte prática eles iriam compreender melhor e pediu que eles não se assustassem com o con- teúdo. Os demais também reforçaram dizendo que eles perguntassem, caso não entendessem o conteúdo ou o ex- perimento que fossem realizar (NOTA 1, 19/10/2017).

[...] Começaram a exposição dos con- teúdos teóricos e já adiantaram aos participantes: “estamos começando a teoria, mas vocês vão já se envolver mais” (Diana) (NOTA 2, 23/10/2017).

A preocupação dos estudantes extensionistas, ao inserirem-se na comunidade externa para desen- volver um projeto de extensão que envolve conteúdos

da área de Mecânica dos Fluidos, aponta que as vivên- cias fora da sala de aula é uma oportunidade ímpar para fortalecer o sentimento de responsabilidade so- cial deles. O ponto de intersecção disto ocorre quando os estudantes extensionistas mostram-se preocupados com a compreensão e reforçam que os participantes podem fazer perguntas quando não entenderem.

O respeito ao próximo foi perceptível, especial- mente, diante das perguntas descontextualizadas do assunto que os participantes fizeram (NOTA 1, 19/10/2017) e das soluções apresentadas para a re- solução de situações-problema (NOTA 4, 08/12/2017), conforme reforça o trecho a seguir:

[...] eles pedem que os grupos apresen- tem as soluções e reforçam que “não há respostas erradas, só ideias” (Kleber). Durante a apresentação dos grupos, mesmo diante de soluções absurdas ou impossíveis, os estudantes extensionis- tas ouviram e contra-argumentavam com perguntas que faziam os partici- pantes refletirem (NOTA 1, 19/10/2017).

O excerto nos mostra que o respeito aos par- ticipantes se inicia quando os estudantes extensio- nistas pediram que eles apresentassem soluções, reforçando que não havia respostas erradas. Assim, além de estimular os participantes, demonstraram

capacidade de respeitar as ideias que, posterior- mente, foram reconstruídas mutuamente por meio de reflexões que levaram os participantes a repen- sar alguns posicionamentos e, portanto, reconstruir os seus pensamentos. Assim, o respeito ao próximo, neste contexto em específico, parece-nos ser uma característica que se relaciona diretamente com a construção de sentidos entre extensionistas e parti- cipantes da comunidade externa.

Acreditamos que o desenvolvimento da auto-

nomia aconteceu quando os estudantes se depara-

ram com alguma situação em que eles foram for- çados, circunstancialmente, a fazer escolhas ou a tomar decisões para dar continuidade à realização das atividades. Dentre as situações que observamos, podemos apontar a falta dos paquímetros em uma atividade (NOTA 2, 23/10/2017) e experimentos que não funcionaram durante a exposição junto aos participantes (NOTA 3, 23/11/2017). Na primeira si- tuação, eles, sem consultar os professores coorde- nadores, pensaram e decidiram que os paquímetros seriam substituídos por réguas (NOTA 2, 23/10/2017). Na segunda, eles procuraram encontrar uma solu- ção e quando não conseguiam, justificavam aos participantes e explicavam as possibilidades para o problema ter acontecido (NOTA, 23/11/2017). No

caso dos paquímetros, eles poderiam simplesmente ter decidido não realizar o experimento, denotando autonomia, mas ao contrário optaram por realizar e substituí-los por réguas, o que para nós se mostrou iniciativa/proatividade.

Estes valores e atitudes comportamentais que observamos não podem ser ensinados ou ministra- dos durante uma aula tradicional entre um docente e o grupo de alunos, porque eles são internalizados por meio de atividades pedagógicas que estimulam a interação e a convivência, impulsionando, assim, o desenvolvimento humano dos envolvidos. A par- ticipação em atividades de extensão contribui com a educação para a cidadania social dos educandos do Ensino Médio Integrado e, portanto, desenvolve os valores e atitudes comportamentais. Nesse con- texto, podemos afirmar que a extensão, como dire- triz institucional é “[...] um processo que deve ser vivenciado, cotidianamente, pelos sujeitos acadêmi- cos e comunitários, pelos processos instituídos e ins- tituintes, e pelos resultados individuais e coletivos” (SÍVERES, 2013, p. 20). Portanto, podemos perceber que a extensão pode contribuir para a efetivação dos aspectos preconizados pela perspectiva da educação para a cidadania, uma vez que ela possibilita aos educandos sua inserção na sociedade por meio de atividades extensionistas.

A extensão está, assim, imbricada à concep- ção de educação para a cidadania social no Ensino Médio Integrado, pois como pudemos perceber ela compõe a tríade da Educação Profissional e Tecno- lógica, e ao se materializar por meio da implementa- ção de programas/projetos, contribui, em função de seu caráter natural de integração, efetivamente para a construção da educação serve os sujeitos, as comu- nidades e os contextos.

CONCLUSÃO

A integração entre os conhecimentos técnicos

e gerais na Educação Profissional e Tecnológica de

Nível Médio é um desafio constante, pois, histori- camente, esta dissociação caracterizou a formação dos educandos nesta etapa de formação. Contudo, a indissociabilidade entre o saber fazer e o saber pen-

sar é o caminho para garantir a formação humana

integral dos estudantes. Nesta perspectiva, situamos a abordagem deste artigo que teve como objetivo trazer à discussão e reflexão o papel da extensão no desenvolvimento da educação para a cidadania no Ensino Médio Integrado.

Conforme discutimos, o conceito de cidada- nia não é estanque na história, mas uma construção contínua, que adquire características peculiares de acordo com o tempo e os contextos históricos. As- sim, no mundo contemporâneo percebemos que a cidadania social é uma perspectiva que se coaduna com os objetivos da educação e é condizente com a função social da escola. No âmbito do Ensino Médio Integrado, a educação para a cidadania se apresenta como uma discussão imprescindível à consolidação da formação humana pretendida para essa etapa de formação dos educandos.

Neste sentido, compreendemos que a cidada- nia social pode ser consolidada por meio de ativida- des que proporcionem o desenvolvimento de valores capazes de contribuir com a formação humana dos educandos. Este processo exige a integração huma- na e a educação torna-se o instrumento mediador na construção dos valores humanos que tornam os educandos cidadãos conscientes do seu papel na so- ciedade. Assim, a educação para a cidadania no En- sino Médio Integrado consiste em desenvolver no educando suas capacidades técnicas e humanas, de forma que ambas constituam um ser social capaz de compreender o mundo ao seu redor e de sentir-se um indivíduo responsável pelas transformações sociais.

Diante deste contexto, defendemos que a exten- são é uma atividade pedagógica capaz de desenvolver valores e atitudes comportamentais que constituem a base da educação para a cidadania. Assim, durante o Ensino Médio Integrado a extensão é uma dimen- são que, integrada ao Ensino e a Pesquisa, contribui para formar educandos que não se sintam técnicos em áreas específicas, mas técnicos que, com o Nível Médio Integrado, são cidadãos que podem contribuir com a sociedade. Portanto, perseguir este caminho e compreender a extensão como princípio educativo significa trazer para o Ensino Médio Integrado uma outra possibilidade que vem corroborar com a for- mação humana integral dos estudantes, com o suces- so de um currículo de formação e, de forma notável, comprometida com melhorias na sociedade.

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O PNAES e a política de