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A igreja entende-se na presença do Espírito Santo como povo messiânico para o reino que está vindo, quando ela ouve a fala do tempo messiânico e celebra em batismo e ceia do Senhor os sinais do êxodo e da esperança. Na festa messiânica, ela se torna consciente de sua liberdade e de sua missão. Na força do Espírito Santo, a igreja se experimenta como comunidade de serviço ao reino de Deus no mundo (MOLTMANN, 2013, p. 367).

A citação acima, ainda que sucinta, resume bem a eclesiologia moltmanniana. Uma eclesiologia que tem como marca o impulso do Espírito Santo para continuação- construção do reino de Deus na história. Com essa iniciativa, a igreja se torna em

comunidade messiânica e antecipa, por meio do batismo e da ceia, a realidade futura do

mundo quando desenvolve a sua missão no mundo como um serviço ao mundo.

Assim, partindo de alguns aspectos do esboço teológico de Moltmann, a pesquisa procurou trabalhar a eclesiologia do autor a partir de dimensões abertas. Isso foi possível, porque a eclesiologia que Moltmann desenha em seus textos e no seu principal trabalho eclesiológico, A igreja no poder do Espírito (2013), é uma

eclesiologia que procura cumprir, verbalizar e transformar a realidade (em âmbito

teológico, social e político) por meio de uma igreja que compreenda o seu lugar na história escatológica sendo fomentadora do reino de Deus.

O pensamento teológico de Moltmann é caracterizado pela sua abertura, ou seja, os seus sistemas teológicos são concebidos a partir da esperança, portanto, o futuro é condição sine qua non para a sua reflexão teológica. Uma vez tendo o futuro como chave hermenêutica, ou seja, o futuro é o espaço em que se dá a promessa e, ao mesmo tempo, proporciona a dinâmica divino-humana no transcorrer da história, Moltmann elabora uma teologia que nunca está fechada em si mesma, mas sempre aberta para o além mais. Para o teólogo alemão a teologia não é uma dogmática apenas para a igreja em seu aspecto eclesiástico, antes a teologia precisa ter como alvo o mundo. A partir disso, as principais contribuições teológicas de Moltmann tem como pressuposto uma

teologia aberta como na teologia da criação, na teologia da trindade e, no caso dessa

Quanto à sua eclesiologia, Moltmann considera que a doutrina teológica sobre a igreja precisa observar pelo menos três dimensões: diante de Deus, diante dos seres humanos e diante do futuro. No seu entender isso demonstra a vivacidade da igreja, pois a igreja de Cristo é uma igreja aberta. Ela está aberta para Deus, aberta para o ser humano e aberta para o futuro de Deus e dos seres humanos. A igreja atrofia se abandonar uma dessas aberturas e se fechar contra Deus, o ser humano e o futuro.

A abertura da igreja se dá com alguns elementos que se tornam imprescindíveis para uma reflexão teológica que queira de fato ser relevante no seu contexto: (1) uma

eclesiologia comprometida com o reino de Deus – o elemento essencial do discurso da igreja é o reino de Deus. Para Moltmann o reino de Deus deve ser a paixão da teologia

como um todo. Deve haver teologia do reino de Deus. Uma teologia missionária que amarra a igreja à sociedade, tornando-a, desta forma, em uma igreja aberta que participa dos sofrimentos do povo e propõe esperança. A característica missionária da

igreja é essa abertura ao mundo. Quando a igreja compreende que é continuadora do

projeto do reino de Deus, ela se desdobra na esfera pública com comprometimento e solidariedade. Para Moltmann, a igreja que assim se comporta tem uma dimensão inclusiva, porque entende que a “promissio do reino fundamenta a missio do amor no mundo” (MOLTMANN, 2003, p. 265). Uma igreja aberta, portanto, não tem como preocupação o milênio e suas interpretações milenaristas, pois encarna nela mesma a dinâmica integradora da mensagem do reino de Deus; (2) uma eclesiologia aberta – para Moltmann a principal característica da igreja é a sua abertura para Deus, para o ser humano e para o futuro. Agindo assim ela modifica o seu discurso, a sua dinâmica e sua interação na sociedade quando, por exemplo, não limita a redenção e a felicidade das

almas para um céu no além. Essa abertura se dá quando missão não é entendida como

conquista, expansão, mas como a participação de toda a igreja na proclamação do reino

de Deus; quando a igreja acolhe a dinâmica ecumênica, pois entende que as demais

igrejas estão comprometidas em comum com a missão messiânica de Cristo e que são a

igreja do reino vindouro, sendo assim, a igreja se abre em diálogo e fraternidade para

alcançar o bem comum; quando a igreja concebe uma práxis politicamente engajada, pois assume a sociedade e procede com credibilidade, favorecendo a lutar com e pelo povo por paz e justiça.

Em uma eclesiologia aberta o batismo é um sinal de comprometimento dos membros com a tarefa do reino de Deus, daí ser tod@s vocacionad@s; a ceia do Senhor

nunca seria restrita, mas um convite a tod@s, porque é o chamamento do próprio Cristo para participar da mesa e do reino que vem.

Os elementos que compõem a eclesiologia moltmanniana, estão presentes em outras obras do autor. Uma vez que sua eclesiologia está atrelada à dimensão messiânica de Cristo e ao Espírito Santo, Moltmann entende que a igreja precisa ser mais relevante, com sua teologia, no contexto social, ou seja, deixar de pertencer ao gueto e ser uma comunidade para fora agindo assim, a igreja “adquire importância quando mostra os problemas do mundo moderno unicamente revelando o ‘núcleo duro’ de sua identidade com Cristo crucificado e deixando-se questionar por ele juntamente com a sociedade em que se vive” (MOLTMANN, 2010, p. 25). Se a igreja toma o nome de Jesus e professa fé nele, algumas atitudes precisam ser evidenciadas na vivência da comunidade de fé. Em outras palavras, Moltmann está dizendo que a igreja precisa tomar consciência de que ela está ligada a Jesus e, portanto, é preciso estar ciente das implicações que o crucificado traz, sendo uma dessas implicações, no pensamento moltmanniano, a dimensão messiânica da igreja. Para o autor, olhar para Jesus como

messias, significa conceber a práxis de Jesus e, sendo a igreja messiânica, cabe a ela ser

continuadora dessa dimensão messiânica.

Moltmann soube ler o seu contexto eclesial e propor uma eclesiologia que pode contribuir com o atual momento da cultura contemporânea. Se a igreja não compreender que é preciso estabelecer uma relação igreja-mundo que vá além das

fronteiras, e que, portanto, seu discurso precisa integrar-se à cultura e seu contexto

histórico, assimilando as mudanças da sociedade, entendendo que as mesmas favorecem outros comportamentos e que, assim, a novidade de uma práxis contextualizada se faz necessárias, ela se encontrará em ostracismo.

Dentre várias contribuições de Moltmann à eclesiologia batista, há o desafio de que a igreja se torne mais significativa no seu contexto político-social. Para isso, é preciso favorecer uma eclesiologia aberta que tenha dimensões messiânicas e isso significa rever e repensar certos preconceitos e exclusivismos como condição imprescindível para que a igreja tenha uma dimensão aberta.

A fim de contribuir para uma eclesiologia batista que tenha dimensões de

abertura, será preciso refletir sobre a tarefa missionária da igreja a partir do outro e sua

a questão ministerial e as vocações, onde a questão de gênero ainda é um fator preponderantemente discriminatório. Quanto ao aspecto social, a eclesiologia batista carece ainda de uma escatologia que não veja a igreja como tendo um fim em si mesma, mas como um meio de favorecer o mundo com uma práxis que não tenha como foco o proselitismo, mas antes uma concepção de alteridade e de mudança com os referenciais de justiça social.

Os estudos revelam que a eclesiologia expressa na Igreja Batista ainda tem dificuldades em equacionar problemas e desafios da contemporaneidade. Ainda mais com alguns modelos eclesiológicos que permeiam a realidade eclesial brasileira propondo outra perspectiva do evangelho sendo, nitidamente, uma proposta que não contempla um agir significativo como comunidade do reino de Deus na sociedade. Não obstante a isso, ainda é permanente o debate dentro das fronteiras eclesiásticas, no âmbito protestante-evangélico, e em particular na eclesiologia batista, do real sentido da

igreja na sociedade, se ela é uma sala de espera, onde as pessoas esperam apenas a

concretização escatológica do fim dos tempos, ou se ela é uma esperança de justiça e fraternidade para com (e pelo) o mundo.

Quando a pesquisa traz o foco da eclesiologia presente na Igreja Batista

brasileira, é por entender que a eclesiologia moltmanniana pode contribuir com

elementos que favoreçam dimensões abertas na eclesiologia batista tais como: (1) uma

abertura ao ecumenismo, começando por abrir diálogo com a Aliança de Batistas do

Brasil, que é o resultado da participação de batistas nos principais fóruns de reflexão teológica no Brasil e na América Latina como, por exemplo, na Fraternidade Teológica Latino-americana (FTL), bem como outros grupos que procuram viabilizar um engajamento político-social mais efetivo na sociedade brasileira (SILVA, 2013, p. 141); (2) uma concepção de missão onde o maior interesse seja na proclamação do evangelho, valorizando as dimensões existenciais do ser humano e não apenas a sua “alma”; (3) uma noção de vocação onde não haja uma supervalorização da figura do pastor e tod@s possam desempenhar suas funções eclesiais a partir de seus dons; (4) uma abertura ao

ministério ordenado feminino por entender que o pastoreio é um dom e não,

propriamente, um ofício; (5) uma igreja aberta que promova a esperança a partir de uma clara concepção de sua atuação no futuro do reino de Deus.

Ao realizar a pesquisa acentuou-se em mim a visão de que há esperança para uma eclesiologia que favoreça uma pastoral fraterna e acolhedora.

Referências bibliográficas