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Por uma eclesiologia aberta: Reflexões a partir da eclesiologia de Jürgen Moltmann como uma contribuição teológica à Igreja Batista Brasileira

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Academic year: 2017

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Faculdade de Humanidades e Direito – FAHUD

Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião

POR UMA ECLESIOLOGIA ABERTA

Reflexões a partir da eclesiologia de Jürgen Moltmann

como uma contribuição teológica

à Igreja Batista brasileira

Por

Alonso de Souza Gonçalves

(2)

Alonso de Souza Gonçalves

POR UMA ECLESIOLOGIA ABERTA

Reflexões a partir da eclesiologia de Jürgen Moltmann

como uma contribuição teológica

à Igreja Batista brasileira

Dissertação de Mestrado apresentada em cumprimento parcial às exigências do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião, da Faculdade de Humanidades e Direito da Universidade Metodista de São Paulo, para obtenção do grau de Mestre.

Orientador:

Prof. Dr. Claudio de Oliveira Ribeiro

(3)

A dissertação de mestrado sob o título Por uma eclesiologia aberta: reflexões a partir da eclesiologia de Jürgen Moltmann como uma contribuição teológica à Igreja Batista brasileira elaborada por Alonso de Souza Gonçalves, foi apresentada e aprovada em 30 de Setembro de 2014, perante Banca Examinadora composta pelos professores doutores Claudio de Oliveira Ribeiro (Presidente/UMESP), Rui de Souza Josgrilberg (Titular/UMESP) e Jorge Pinheiro dos Santos (Titular/Faculdade Teológica Batista de São Paulo).

Prof. Dr. Claudio de Oliveira Ribeiro

Orientador e Presidente da Banca Examinadora

Prof. Dr. Helmut Renders

Coordenador do Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião

Programa: Pós-graduação em Ciências da Religião

Área de Concentração: Linguagens da Religião

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A igreja na força do Espírito ainda não é o reino de Deus, mas já é sua antecipação na história. O cristianismo ainda não é a nova criação, mas já é o efeito do Espírito da nova criação. Os cristãos ainda não são a nova humanidade, mas já são sua dianteira na resistência contra o enclausuramento mortífero, em entrega e representação em prol do futuro dos seres humanos.

(5)

Agradeço...

À Lívia de Oliveira Simões Gonçalves e ao André Simões Gonçalves, sem eles não seria possível chegar até aqui;

À Igreja Batista Central em Pariquera-Açu pelo apoio, compreensão e incentivo;

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoa de Nível Superior (CAPES) por financiar parte dessa pesquisa, apoio imprescindível;

Ao professor Etienne Alfred Higuet, que iniciou minha orientação;

Ao professor Claudio de Oliveira Ribeiro, por ser mais que um orientador, um amigo;

Ao Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo, bem como seu Corpo Docente e Administrativo;

Aos colegas e amigos da Casa do Estudante, por tornar o ambiente amigável e favorável ao diálogo;

(6)

Dedico...

(7)

GONÇALVES, Alonso de Souza. Por uma eclesiologia aberta: reflexões a partir da eclesiologia de Jürgen Moltmann como uma contribuição teológica à Igreja Batista brasileira. Dissertação de Mestrado (Programa de Pós-graduação em Ciências da Religião da Faculdade de Humanidades e Direito da Universidade Metodista de São Paulo). São Bernardo do Campo/SP: UMESP, 2014, 125p.

Resumo

A pesquisa pretende tratar de um tema na produção acadêmica do teólogo alemão Jürgen Moltmann, sua eclesiologia. Ela procurará abordar as principais chaves

hermenêuticas da eclesiologia moltmanniana, por entender que o autor, em sua

eclesiologia, desenha uma concepção de igreja em dimensões abertas. Sendo, portanto, uma igreja que procura estar ciente do que ocorre na sociedade e dela fazer parte com um grau alto de comprometimento e inserção significativa nos grandes temas suscitados pela cultura contemporânea. Moltmann, com suas categorias teológicas, favorece o estabelecimento de bases para se pensar em uma eclesiologia com dimensões abertas,

contribuindo assim para o desenvolvimento de uma práxis que seja mais condizente

com o contexto em que a comunidade de fé está inserida. Para isso, considerando que as reflexões de Moltmann podem contribuir para o contexto eclesiológico brasileiro, na pesquisa optamos por fazer a comparação dos principais aspectos eclesiológicos do autor com o modo de ser batista no Brasil, a partir de autores que produzem reflexão teológica para a denominação, sendo, portanto, autores reconhecidos no universo batista. Além destas fontes bibliográficas, a pesquisa trará o pensamento teológico da Igreja Batista brasileira a partir da Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, procurando apontar caminhos que são passíveis de reflexão teológica e contribuição pastoral críticas.

(8)

GONÇALVES, Alonso de Souza. For an open ecclesiology: reflections on the ecclesiology of Jürgen Moltmann as a theological contribution to the brazilian Baptist Church. Master Thesis (Post-graduation in Religious Studies, Faculty of Humanities and Law of the Methodist University of São Paulo). São Bernardo do Campo/SP: UMESP, 2014, 125p.

Abstract

This research aims to work with the ecclesiology in the academic production of the German theologian Jürgen Moltmann. It will seek to handle the principal hermeneutical keys of Moltmann’s ecclesiology. For it understands that his ecclesiology designs a concept of church in open dimensions, i.e., a church that demands to be aware of what occurs in society and be part of it, having commitment and significant inclusion in the major issues raised by contemporary culture. By his theological categories, Moltmann

contributes towards the achievement of thinking about an ecclesiology with open

dimensions, also to the development of the praxis, which is more consistent within the context of the community of faith.For this, considering that Moltmann’s reflections can contribute to Brazilian ecclesiological context, the research chooses to compare the main ecclesiological aspects of the author with the Baptist way of life in Brazil, and uses authors of consensus in the Baptist universe in which they produce theological reflection for the church. In addition to the bibliographical sources, the research will consider the Brazilian Baptist Church theological thinking on the Doctrinal Statement of the Brazilian Baptist Convention, trying to point out ways that are liable to theological reflection and pastoral contribution critiques.

(9)

Caminhante, não há caminho... ...faz-se caminho ao andar.

(10)

Sumário

Considerações iniciais

12

Problemas, objetivos e metodologia

13

Justificativas

15

A teologia de Jürgen Moltmann na América Latina

19

Um –

Jürgen Moltmann: notas

bioteo

gráficas

25

Considerações iniciais

25

1. Jürgen Moltmann: uma trajetória de esperança

26

2. Trilogia da esperança: uma leitura eclesiológica

31

2.1. A igreja na força do Espírito: uma proposta eclesiológica 32

2.2. A eclesiologia na Teologia da esperança 34

2.3. A eclesiologia no O Deus crucificado 37

3. Aspectos hermenêuticos da teologia moltmanniana

40

3.1. Promessa e esperança 42

3.2. Escatologia e história 44

3.3. Messianismo e missão 46

Considerações parciais

48

Dois –

A

eclesiologia aberta

de Jürgen Moltmann

50

Considerações iniciais

50

1. A eclesiologia no contexto da teologia sistemática

51

1.1. Cristologia: o seguimento na eclesiologia messiânica 51

1.2. Pneumatologia: a igreja sob o impulso do Espírito Santo 53

1.3. Reino de Deus: a mediação do futuro a partir da igreja 57

1.4. Criação: a responsabilidade ecológica da igreja 59

(11)

2. A eclesiologia no contexto da práxis

63

2.1. A dimensão comunitária de uma eclesiologia aberta 66

2.2. A eclesiologia pneumática e sua abertura ao mundo 69

2.3. A tarefa missionária da igreja: abertura ao reino de Deus 72

Considerações parciais

75

Três –

A

eclesiologia aberta

de Jürgen Moltmann

como contribuição teológica à

Igreja Batista

brasileira

77

Considerações iniciais

77

1. Os batistas no contexto do protestantismo(s) brasileiro

78

1.1. A teologia dos missionários 82

1.2. Os batistas: aspectos histórico-teológicos 85

1.3. O modo de ser batista 89

2. Contribuições de Jürgen Moltmann à Igreja Batista

92

2.1. Igreja e reino de Deus 93

2.2. Vocações e ministérios 99

2.3. Missão e proclamação 103

Considerações parciais

107

Considerações finais

109

Referências bibliográficas

113

De Jürgen Moltmann

113

Sobre Jürgen Moltmann

115

(12)

Considerações iniciais

O início da minha caminhada com a teologia se deu quando tinha 18 anos de

idade, quando a Primeira Igreja Batista em Hortolândia/SP reconheceu minha vocação para o ministério pastoral e assim ingressei na Faculdade Teológica Batista de Campinas (FTBC), no início do ano de 2001.

O ingresso na FTBC foi uma abertura em termos de vida e crescimento. Lá entrei em contato com alguns professores provenientes dos Estados Unidos e que, de alguma forma, incutiram a maneira de pensar sobre Deus, igreja, Cristo e outros temas teológicos em bases tradicionais. No entanto, com outros professores, pude aprender a pensar de maneira diferente. Um deles foi o professor Natanael Gabriel da Silva, então diretor da instituição. Com ele, pude beber de fontes teológicas como as de Karl Rahner, Paul Tillich, Karl Barth, Leonardo Boff, Juan Luis Segundo dentre outros que jamais eu tinha ouvido falar. Abria-se um novo horizonte de perspectivas e de pesquisa teológica.

Certa vez, ao ouvir a menção sobre o teólogo alemão Rudolf Bultmann, foi despertado em mim o interesse pelo seu processo hermenêutico conhecido como demitologização. Ter outra leitura do Novo Testamento foi uma descoberta frutífera, embora eu não tivesse naquele momento a mínima ideia das consequências de tal método. Daí para chegar até Jürgen Moltmann foi um passo. Ouvi falar da sua Teologia da esperança e fiquei encantado com a perspectiva escatológica desse autor. Pensei: “há outras possibilidades de pensar a escatologia fora dessas três correntes que ouço aqui – pré-milenismo, pós-milenismo e amilenismo”. Confesso que foi um alívio e ao mesmo tempo um desafio.

O teólogo alemão Jürgen Moltmann, conhecido como o teólogo da esperança, tem dado uma importante contribuição ao pensamento teológico contemporâneo em diversos temas, mas principalmente dentro do tema da escatologia. A reflexão teológica do autor é amplamente pesquisada e suas intuições teológicas vêm favorecendo o diálogo no campo ecumênico bem, como também, ampliando o diálogo inter-religioso, em especial o judaico-cristão.

(13)

autor escrevia sobre quase todos os temas da teologia e procurei investigar a sua eclesiologia.

Problemas, objetivos e metodologia

Partindo de alguns aspectos do esboço teológico de Moltmann, esta pesquisa procurará trabalhar com a sua eclesiologia. O objetivo com o tema, dentro do sistema teológico do autor, é procurar mostrar a relevância da eclesiologia moltmanniana e seus elementos que podem contribuir para uma eclesiologia que seja mais aberta ao contexto vivencial da igreja e a cultura contemporânea. Não obstante a isso, o tema eclesiologia, recorrente na produção bibliográfica do autor, ainda não foi objeto de pesquisa no Brasil.

Sobre a sua eclesiologia, o autor considera que a doutrina teológica sobre a igreja precisa observar pelo menos três dimensões: diante de Deus, diante dos seres humanos e diante do futuro. No seu entender isso demonstra a vivacidade da igreja, pois a igreja de Cristo é uma igreja aberta. Ela está aberta para Deus, aberta para o ser humano e aberta para o futuro de Deus e dos seres humanos.

A fim de elaborar questões que possam dar direção à pesquisa, algumas perguntas são necessárias. Quais os fundamentos da eclesiologia aberta de Jürgen Moltmann? Dentro do seu esboço teológico é possível visualizar uma eclesiologia que tenha dimensões de abertura? Cabendo a resposta ser positiva, qual a contribuição que Moltmann poderia dar ao protestantismo(s) no Brasil, particularmente à Igreja Batista brasileira1 e sua eclesiologia? A proposta de Moltmann é fomentar uma concepção de igreja que procura concretizar a abertura dela ao mundo, mas para isso precisa deixar de manter uma fé subjetivista, intimista e incapaz de comunicação.

A eclesiologia moltmanniana que se configura em sua abertura, procura articular temas a partir de um diálogo com a cultura contemporânea, ou seja, uma igreja que tenha interação ecumênica; uma práxis que insira a igreja dentro do mundo e não fora dele; uma dinâmica voltada para as reais necessidades da história; uma eclesiologia

1 Quando, no decorrer da pesquisa, surgir Igreja Batista brasileira, estará se referindo à denominação

Batista representada pela Convenção Batista Brasileira (CBB), uma vez que há outros grupos que também

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marcada pela ação do Espírito Santo; uma dinâmica comunitária baseada em ministérios.

Dentro desse quadro, a realidade eclesial do protestantismo(s) de missão2 parece não retratar a concepção teológica do autor pesquisado e não corresponderia a uma eclesiologia que se elabora em dimensões abertas.

Há no protestantismo(s) de missão alguns elementos que segregam a comunidade de fé de alguns temas e comportamentos sociais nos quais o discurso teológico sobre a igreja é espiritualizado, carecendo de um engajamento político-social mais consistente. Nesse sentido, a eclesiologia moltmanniana pode contribuir por trazer propostas de integralidade entre igreja e sociedade.

A partir disso, a pesquisa persegue alguns objetivos. O primeiro é analisar como o autor pesquisado vê a igreja em sua abertura ao futuro. Daí a concepção da pesquisa em tratar de uma eclesiologia aberta, tendo como consequência a reflexão teológica de temas como reino de Deus, missão, política e a relação igreja-política-e-sociedade. Essa reflexão teológica é possível quando a igreja assimila, conscientemente, de que é a antecipação do futuro, ou seja, um futuro com a marca do reino de Deus. Moltmann pontua de que Jesus, com sua missão e os desdobramentos da ressurreição, trouxe o reino de Deus para a história, sendo assim, a igreja é sua antecipação, ou seja, é a experiência dinâmica do reino de Deus. A esperança do futuro reino de Deus é tarefa da igreja quando assume concretamente a sociedade em que está inserida dando um horizonte de esperança, justiça, vida e humanidade. A eclesiologia moltmanniana não concebe um grupo de pessoas fechado em seus pressupostos teológicos que não contemple sua abertura ao mundo. Aqui, então, o objetivo é articular a eclesiologia de Moltmann dentro do seu esboço teológico a fim de elencar elementos que configuram uma igreja aberta.

Outro objetivo é procurar fazer com que a eclesiologia aberta de Moltmann proporcione chaves de leitura para a realidade eclesial e teológica do protestantismo(s) de missão e, mais especificamente, para a Igreja Batista (Convenção Batista Brasileira – CBB) e sua eclesiologia. Nossa hipótese é que as principais características da eclesiologia moltmanniana podem contribuir para um caminhar da igreja no sentido de

2 Embora a designação protestantismo(s) de missão esteja sendo revisada para identificar as igrejas

históricas, uma vez que pesquisadores prefiram denominar de “protestantismo no Brasil” ou ainda

(15)

fomentar uma discussão teológica a fim de auxiliar na formulação de um discurso mais aberto aos desafios da contemporaneidade. Mesmo pertencendo ao protestantismo(s) de missão, o que em tese deveria favorecer uma eclesiologia livre, a eclesiologia batista parece aglutinar algumas características que acentuam uma postura eclesiológica fechada. Esperamos analisar aspectos como: a concepção soteriológica exclusivista; a incapacidade de trabalhar com a pluralidade eclesial; o fechamento quanto ao

ecumenismo; uma noção de que a única igreja verdadeira se dá na configuração da

denominação. Além disso, há a discussão quanto ao gênero, onde a mulher não tem o seu espaço legítimo no âmbito ministerial e sua capacidade pastoral é condicionada pelo crivo de ser mulher, na maioria das avaliações.

A pesquisa é bibliográfica e explanatória, ou seja, num primeiro momento a pesquisa bibliográfica será desenvolvida a partir dos principais textos de Moltmann e correlatos para fundamentar a abordagem eclesiológica na obra do autor. Além disso, será dada uma atenção especial para autores interlocutores da teologia moltmanniana tais como: Rosino Gibellini (1998), Battista Mondin (1980, 1983, 1984), Levy Bastos (2009, 2011b), Richard Bauckham (1995) dentre outros.

Como um dos objetivos da pesquisa, além da análise da eclesiologia de Moltmann, é dialogar e apontar caminhos de um discurso mais acentuadamente comunitário e libertador para uma comunidade de fé, no caso a Igreja Batista brasileira como instituição e ramo do protestantismo(s) de missão, pretende-se abordar os principais teóricos do discurso eclesiológico da referida denominação, mas principalmente a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira (1986), com o propósito de confrontar ideias, conceitos e comportamentos e, no sentido de contribuir, sugerir, apontar e mediar possíveis contribuições, a partir da leitura moltmanniana, para uma realidade eclesial que venha ter uma inserção ética, social e prática com alguns valores de uma eclesiologia aberta que serão elencados na pesquisa.

Justificativas

(16)

na pauta das Nações Unidas e demais contextos no mundo. Quanto à eclesiologia do autor, ainda é recente a pesquisa e escassa a produção acadêmica sobre este tema dentro do esboço teológico moltmanniano.

A reflexão sobre a igreja sempre ocupou um espaço considerável na produção teológica. Diversos teólogos de diferentes concepções, conservadores ou progressistas, tem se dedicado ao tema em vários momentos da história da igreja. Aqui nos interessa Moltmann, pela importância que ele tem no cenário teológico. Com sua reflexão eclesiológica, Moltmann passa a fazer parte do grupo de teólogos sistemáticos que refletiram sobre a igreja, tanto católicos quanto protestantes.3 O autor, quando se propõe a fazer uma leitura da eclesiologia4 em perspectiva messiânica, se junta a Karl Barth que elaborou a sua Dogmática eclesial, alguém que exercerá certa influência nele, principalmente com o método dialético; a Hans Küng, com suas obras dedicadas à eclesiologia da Igreja Católica e que, recentemente, publicou no Brasil um texto provocativo: A igreja tem salvação? (2012). Outro teólogo de expressão, Roger Haight, que ficou conhecido pelo seu livro Jesus, símbolo de Deus (2005), dedicou-se ao tema da igreja em dois volumes com o título A comunidade cristã na história (2012). Por esses e outros autores, o tema da eclesiologia se faz importante e necessário tanto a sua reflexão no contexto protestante, quanto no contexto católico. No universo católico o tema voltou com força principalmente depois da eleição do cardeal Jorge Mario Bergoglio, o primeiro papa latino-americano, que vêm assumindo, como papa Francisco, posições que causam, em alguns setores da igreja, entre os mais conservadores, por exemplo, certo desconforto. Por outro lado, Francisco está promovendo novos ares de libertação e projetando uma igreja que seja mais aberta aos temas da sociedade como divórcio, casamento de pessoas do mesmo sexo e contraceptivos. Esses e outros temas estão sendo trazidos à tona para que a igreja e seu papa possam responder de maneira pastoral e, pelo menos é o que alguns estão esperando, que não sejam posições enrijecidas pelo dogma, ou seja, que seja com o

3 Quando o termo protestante ou protestantismo(s) surgir no texto não tem um sentido teológico definido

de uma igreja específica, apenas uma distinção em relação à Igreja Católica. Aqui o termo será para identificar as igrejas comumente conhecidas como igrejas históricas.

4 Tomo o conceito eclesiologia sempre como um discurso teológico que se faz a partir da igreja, não

(17)

objetivo de contribuir para o diálogo. O caminho, ao que tudo indica, será difícil, mas necessário.

Voltando a Moltmann, a pretensão em refletir sobre sua eclesiologia se deve não somente ao fato dele ser um teólogo contemporâneo que vêm exercendo uma influência benéfica em diferentes lugares onde a teologia está sendo pensada de maneira responsável, principalmente na América Latina. Ela se deve, principalmente, à originalidade e criatividade do autor, que o torna um teólogo relevante para a discussão acadêmica e pastoral. Embora a sua ênfase seja na escatologia, isso não o impediu de contribuir para se pensar e projetar uma eclesiologia mais humana e caracterizada pela dinâmica concreta da vida. Na sua extensa bibliografia, há implicações definitivas em seu trabalho para o tipo de eclesiologia necessária para sustentar a visão escatológica que ele descreve. A sua escatologia o leva a assumir algumas posições a respeito da igreja e sua relação com o mundo (sociedade).

A teologia de Moltmann vem sendo objeto de intensa reflexão e produção acadêmica. É um autor de linhas definidas em termos teológicos e uma história de vida marcada pela experiência de prisioneiro de guerra em um campo de concentração na Segunda Guerra Mundial, e de exercer o pastorado por um tempo em uma comunidade pequena em uma região bucólica da Alemanha.

A pesquisa se dá por entender de que a eclesiologia do autor ainda não foi

devidamente pesquisada. Por um bom tempo a sua eclesiologia foi preterida por outros temas, igualmente importantes, como a trindade, a criação, a cristologia e sua escatologia. Até recentemente a sua principal obra sobre eclesiologia, A igreja na força do Espírito (1975), ainda não havia sido traduzida para o português, sendo trazida ao Brasil em 2013 com o título A igreja no poder do Espírito.

(18)

exemplo, que há uma necessidade de formular bases para se pensar em uma eclesiologia aberta ou que pelo menos contribua com uma abertura gradativa nesses temas.

Nesse sentido, como já referido, nos orientamos por algumas perguntas: a eclesiologia de Moltmann pode contribuir para ampliar a concepção teológica da eclesiologia da Igreja Batista ao pontuar críticas e promover a sinalização de alguns caminhos pastorais alternativos? Caso sim, quais seriam eles? O teólogo de Tübingen traz novidades eclesiológicas para propor a discussão em alguns temas da realidade denominacional da eclesiologia batista? Quais seriam? Nesse sentido, essa pesquisa nasce do anseio em contribuir com a igreja da qual o pesquisador faz parte. A dissertação tem como propósito fazer apontamentos a fim de refletir sobre possibilidades que sejam relevantes com o atual momento da cultura contemporânea e os desafios pastorais que dela suscitam.

Quais seriam os aspectos norteadores para se falar em uma eclesiologia aberta a partir de Moltmann?

(19)

do reino de Deus e a continuação-construção desse projeto são engavetados na eclesiologia protestante sendo que a Igreja Batista participa dessa mesma perspectiva.

A eclesiologia que Moltmann propõe é marcada por alguns elementos que podem contribuir para uma reflexão eclesiológica que favoreça o engajamento da igreja com uma práxis comprometida com o contexto em que a igreja está inserida.

Outro aspecto que justifica a nossa pesquisa são as relações que Moltmann estabeleceu com a teologia latino-americana.

A teologia de Jürgen Moltmann na América Latina

A teologia moltmanniana, desde a sua gênese, foi bem recebida na América Latina. Um teólogo que transita bem entre católicos e protestantes, Moltmann desde o início abriu um profícuo debate, não isento de tensões, em torno de suas ideias com teólogos latino-americanos. Há um intenso e proveitoso debate em torno dos temas propostos por Moltmann feito por teólogos latino-americanos, tanto os ligados à teologia latino-americana da libertação quanto aos ligados à teologia latino-americana da missão integral.

Como o próprio autor relata, o início foi conturbado, principalmente com o colega José Míguez Bonino, mas a colaboração mútua esteve presente nas reflexões de teólogos latino-americanos como também a teologia latino-americana da libertação esteve presente nas reflexões de Moltmann (MOLTMANN, 2004, p. 185). Na América Latina o teólogo da esperança irá contribuir com a cristologia de Jon Sobrino; também com a concepção trinitária de Leonardo Boff, onde a reflexão, de alguma forma, está relacionada com a de Moltmann. Nesse sentido, Moltmann tem sido bem acolhido na América Latina, tanto com a sua contribuição bibliográfica como pessoalmente, vindo ao Brasil por algumas vezes e, na Universidade Metodista de São Paulo por duas, sendo a última em 2008.

(20)

O laço de Moltmann com Sobrino foi apertado mais ainda depois da tragédia que culminou na morte de seis jesuítas dentre outros assassinados no campus da Universidade Centro-americana (UCA) de El Salvador em 1989. Nesse episódio, Moltmann toma conhecimento, pela fotografia da cena do martírio, de que o seu livro, El Dios crucificado, estava caído em meio ao sangue de um dos jesuítas assassinados.

A cristologia de Sobrino é um resgate do seguimento de Jesus e suas

consequências na história tendo como interface a situação da América Latina. Como teólogo da libertação, Sobrino parte do pressuposto de que há crucificados na América Latina e que Jesus continua solicitando a retirada desses da cruz. Tomando isso como condição, a cristologia moltmanniana faz todo o sentido para a reflexão teológica de Sobrino, posto que para Moltmann o presente não se dê a partir de uma “tábula rasa com possibilidades abertas ainda-não atualizadas, mas é diretamente miséria, opressão, injustiça, numa palavra, pecado” (SOBRINO, 1996, p. 176-177). Ele concorda com Moltmann de que o “presente não é só distanciamento com respeito ao futuro, mas contradição com respeito ao futuro esperado” (SOBRINO, 1996, 177). A esperança se dá contra a miséria presente e diante dela há uma convocação para favorecer uma práxis

da esperança (SOBRINO, 1996, p. 177). A práxis se dá no seguimento de Jesus e

Sobrino interpreta Moltmann dentro dessa categoria, uma vez que para ele

é possível viver já na história escatologicamente, realizando, ao mesmo tempo, a esperança presente na ressurreição de um crucificado e o amor da vida de Jesus. Dito em linguagem de ressurreição, já se pode viver como ressuscitado nas condições da história. Dito em linguagem histórica, já se pode viver com o amor do crucificado. E isto não é outra coisa senão o seguimento de Jesus (SOBRINO, 1996, p. 178).

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Quando Gustavo Gutiérrez escreve sua clássica obra – Teologia da libertação –,

ele traz a discussão da escatologia em sua vertente política e chega à Moltmann

(GUTIÉRREZ, 1976, p. 181). A crítica de Gutiérrez é de que falta à Moltmann uma “linguagem suficientemente enraizada na experiência histórica concreta do [ser humano]” (GUTIÉRREZ, 1976, p. 182). Como teólogo da libertação, Gutiérrez está interessado na práxis da teologia em sua concretização na história de espoliação e dilemas sociais, daí a sua crítica à Moltmann de que sua teologia não procura vivenciar

o âmago da práxis histórica, sendo apenas uma espécie de evasão, futurismo

(GUTIÉRREZ, 1976, p. 182). Mesmo assim, Gutiérrez admite de que a teologia de

Moltmann é uma das mais importantes da contemporaneidade, pois ela ajudou “a superar a associação fé e medo ante o futuro” (GUTIÉRREZ, 1976, p. 183). Para o teólogo peruano, Moltmann ajuda a entender que a esperança e o futuro que se espera é um dom que cumpre “uma função mobilizadora e libertadora da história” (GUTIÉRREZ, 1976, p. 183). Mesmo tecendo algumas críticas quanto à ausência de

elementos que promovam uma práxis voltada para o “chão das pessoas”, Gutiérrez

esclarece quanto às possibilidades da teologia moltmanniana e, dentre algumas, se destaca a necessidade de encarar o futuro como uma oportunidade de transformá-lo no presente, uma vez que aquele (o futuro) depende deste. Nesse aspecto, tod@s5 estão

convocad@s a exercerem uma função libertadora no mundo a partir da esperança, o futuro será mais humano quando no presente for possível suprimir as injustiças promovendo libertação (GUTIÉRREZ, 1976, p. 183).

Rubem Alves, em sua tese de doutorado, Para uma teologia da libertação, obra que foi publicada nos Estados Unidos como Teologia da esperança humana e conhecida no Brasil com o título Da esperança (1987), faz uma análise da teologia da esperança de Moltmann apontando algumas deficiências epistemológicas no seu sistema.

Alves faz uma leitura da Teologia da esperança tendo como foco a história e o humanismo político. Assim, ele formula algumas críticas ao sistema moltmanniano

principalmente em sua concepção de história e sua relação com o futuro. Alves

considera que Moltmann vê o movimento da história platonicamente. Ao se apropriar do conceito aristotélico do primum movens (primeiro movimento), Alves entende que

5 A fim de contribuir com a equidade de gênero, a pesquisa fará uso, sempre que possível e quando a

(22)

Moltmann concebe um Deus que arrasta a história para o futuro sem nela se envolver (ALVES, 1987, p. 108). A crítica mais contundente de Alves (1987, p. 113) à Moltmann é de que “a história não está aberta”. Ele vê a história cativa de poderes que produzem morte, “assim, a história não está fechada devido a realidades orgânicas, e sim devido a poderes ativos de natureza política” (ALVES, 1987, p. 113). Ainda em reação à Moltmann quanto à história, Alves é contrário à concepção do primum movens, uma vez que para ele o que coloca a história em movimento é a “dialética da liberdade enquanto encarnada no sofrimento do mundo e que, em consequência, faz nascer a negação, a esperança e a ação” (ALVES, 1987, p. 114). Apesar de suas críticas, Alves assimila à linguagem moltmanniana da ressurreição e aceita a dialética do autor futuro-presente (HIGUET, 1995, p. 37).

Outro personagem latino-americano que teceu reação ao pensamento de Moltmann foi Míguez Bonino. Moltmann escreveu uma carta aberta ao colega em 1976 que, segundo ele, causou algum alvoroço (MOLTMANN, 2004, p. 186). Nessa carta Moltmann formula algumas perguntas que destaco duas: (1) o que é latino-americano na teologia latino-americana da libertação?; (2) o que é crítica, se no final o crítico afirma mais ou menos a mesma coisa que o criticado? Essas questões resultaram em reações que, infelizmente, foram negativas (MOLTMANN, 2004, p. 186). Diante do episódio, Moltmann deixa bem claro de que não rejeita a teologia latino-americana da libertação, antes ele assimila seus pressupostos e, de alguma maneira, faz com que eles sejam refletidos na sua reflexão teológica mais recente.

A reação de Míguez Bonino é, num primeiro momento, de contentamento, pois a obra de Moltmann é “notável e decisiva para a história do pensamento teológico” (BONINO, 1987, p. 112-113). O entusiasmo de Míguez Bonino é de que a ideia moltmanniana de esperança “está longe de levar a uma fácil acomodação ao status quo”

(BONINO, 1987, p. 113). É uma esperança que coloca em movimento, que não se

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idealistas (BONINO, 1987, p. 115). O que Míguez Bonino rejeita é a ideia de que o Deus crucificado é, de fato, um Deus sem Estado nem classe. Mas nem por isso ele é um Deus apolítico. Ele é o Deus dos pobres, oprimidos e humilhados. O teólogo argentino questiona: “ora, os pobres, os oprimidos, os humilhados são classe e vivem em Estados” (BONINO, 1987, p. 115). No seu entender não há como não se envolver a favor dos desfavorecidos sem um comprometimento político. Do contrário não há como ler de fato a situação histórica concreta. O que Míguez Bonino cobra, especialmente da teologia política europeia, é uma decisão política e não uma abstenção dela. A pobreza, os oprimidos são materializados na história e para contemplar essa realidade é preciso uma inserção mais coerente com a história, ou seja, há que haver um “reconhecimento claro e coerente das mediações históricas, analíticas e ideológicas” (BONINO, 1987, p. 116). Em outras palavras, a secularização política não poderá ser absorvida por uma teologia que procura ser crítica, formulando um discurso libertário que contempla a condição de inumanidade do ser humano.

Quanto a essas críticas, Moltmann faz uma distinção política e de locus theologicus entre a teologia política europeia e a teologia latino-americana da libertação. A primeira estava envolvida com as constantes ameaças das potências mundiais e com a iminência de um apocalipse atômico; já a segunda estava (está?) envolvida com o “sofrimento e a morte dos pobres” (MOLTMANN, 2004, 187).

A reação de Higuet à Teologia da esperança caminha na mesma direção de

Gutiérrez, Alves e Míguez Bonino. Higuet trata do método moltmanniano quando lida

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As críticas pontuadas aqui são importantes, pois elas favorecem o debate e demonstra o quanto a teologia moltmanniana é importante no cenário latino-americano. As críticas levantadas aqui aguçam mais ainda o debate em torno dos problemas que todo e qualquer método teológico tem. No caso de Moltmann é possível verificar os principais pontos do seu sistema teológico que permite estabelecer um profícuo debate com a reflexão teológica latino-americana. Por ser um teólogo lido e pesquisado na América Latina e, no caso do Brasil, ser uma referência na discussão teológica, Moltmann continua sendo interpretado a partir de diferentes aspectos e perspectivas. No caso dessa pesquisa, a sua eclesiologia será o foco por entender que ela constitui fonte de reflexão que pode favorecer uma leitura crítica diante das eclesiologias existentes no cristianismo, mais detidamente a eclesiologia presente no protestantismo(s) de missão e, mais especificamente, a eclesiologia que a Igreja Batista brasileira representa.

Quanto ao método moltmanniano, alvo de inúmeras reações, ele arremata: “frequentemente sou questionado a respeito do meu método teológico e raramente tenho dado alguma resposta. Num tempo em que tantos colegas praticamente só se ocupam com questões de método, interessam-me os conteúdos teológicos, sua revisão e inovação” (MOLTMANN, 2002b, p. 13-14).

(25)

Um

Jürgen Moltmann: notas

bioteo

gráficas

Jürgen Moltmann, da Igreja Reformada alemã, talvez seja atualmente o teólogo mais representativo da cristandade.

(Leonardo Boff)

Considerações iniciais

A pretensão em refletir sobre a eclesiologia de Moltmann se deve não somente porque ele é um teólogo contemporâneo que vêm exercendo uma influência benéfica em diferentes lugares onde a teologia está sendo pensada de maneira responsável e solidária, principalmente na América Latina. Não apenas por isso, mas principalmente porque sua originalidade e criatividade, o torna um teólogo imprescindível para a discussão acadêmica e pastoral. Embora a sua ênfase seja na escatologia, isso não o impediu de contribuir para se pensar e projetar uma eclesiologia caracterizada pela dinâmica da vida e que reforce processos humanizadores. Na extensa bibliografia dele, há implicações decisivas em seu trabalho para o tipo de eclesiologia necessária para sustentar a visão escatológica que ele descreve. A sua escatologia o leva a assumir algumas posições a respeito da igreja e sua relação com o mundo (sociedade).

Com este capítulo serão analisadas as principais obras de Moltmann procurando pontos de acesso à sua eclesiologia. Será uma tentativa de articular a visão eclesiológica moltmanniana, descrevendo tanto a eclesiologia explícita e implícita encontrada nas mais destacadas obras do autor.

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publicada em 1964 e O Deus crucificado, publicada em 1972. O que se pretende é observar as principais ideias e conceitos de Moltmann sobre a igreja em suas principais obras (trilogia da esperança), a fim de demonstrar que o tema da eclesiologia está presente no sistema teológico do autor ao longo de sua inicial produção acadêmica. Trata-se de uma contribuição para uma teoria teológica da eclesiologia quanto para uma pastoral que seja integradora no atual contexto contemporâneo.

Em seguida uma análise quanto alguns aspectos da hermenêutica de Jürgen Moltmann. O eixo hermenêutico moltmanniano gira em torno dos temas: promessa e esperança; escatologia e história; messianismo e missão.

Antes de tecer algumas observações quanto à eclesiologia de Moltmann em suas obras se faz necessário expor, mesmo que sucintamente, algumas notas sobre a sua trajetória de vida e o surgimento de algumas obras que ganharam um peso maior na sua produção acadêmica.

1. Jürgen Moltmann: uma trajetória de esperança

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O jovem Moltmann foi capturado e levado prisioneiro para a Escócia e Inglaterra e por três anos procurou respostas existenciais para as experiências vividas no

contexto de guerra. Levou consigo os poemas de Goethe, o Fausto e as obras de

Friedrich Nietzsche para suportar aquele difícil período de sua vida (MOLTMANN, 2002a, p. 11). Este tempo, como prisioneiro em diversos campos de concentração, o fizeram refletir na vida e perceber a esperança por meio de uma cerejeira que florescia e a Bíblia que ganhou de um capelão. Essa experiência irá dar outra direção à sua vida e temas como o sofrimento e a injustiça serão contemplados em suas obras posteriormente.

Nos campos da Bélgica e da Escócia, vivenciei tanto o colapso daquelas coisas que tinham sido certezas para mim quanto uma nova esperança de vida na fé cristã. Devo provavelmente a essa esperança não só minha sobrevivência mental e moral, mas também física, pois foi ela que me salvou do desespero e da resignação. Quando voltei, havia me tornado cristão, e tinha um novo “objeto pessoal” de estudar teologia para entender o poder da esperança à qual devia minha vida (apud MILLER & GRENZ, 2011, p. 123).

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Moltmann regressou para casa, em 1948, com vinte e dois anos de idade, em um contexto de ruínas no pós-guerra. É nesse contexto, que o autor irá esboçar suas primeiras linhas teológicas. A sua primeira tentativa foi elaborar uma reflexão teológica que viesse contribuir para que os anseios de um “novo tempo” pudessem ser possíveis e, ao mesmo tempo, amenizar os sofrimentos dos sobreviventes daquela tragédia humana chamada Segunda Guerra Mundial.

Com o objetivo de continuar a estudar teologia, Moltmann ingressa na Universidade de Göttingen, uma instituição em que os professores seguiam o pensamento teológico de Karl Barth. Daí a influência que o teólogo de Basiléia irá ter no pensamento e produção do nosso autor. A teologia para ele se abria como uma possibilidade nova, uma aventura das ideias, um caminho aberto e convidativo, fascinando o autor e aguçando a sua curiosidade intelectual (MOLTMANN, 2004, p. 9).

Quanto a sua relação com a igreja, Moltmann se aproximou do grupo que passou ser conhecido como igreja confessante, uma vez que as igrejas nacionais tinham se calado diante do regime nazista. A igreja confessante mereceu o respeito de Moltmann, por ser o grupo que se opôs ao regime de Hitler no Terceiro Reich. Foi também por meio da igreja confessante que Moltmann teve a oportunidade de lecionar teologia na Escola Teológica (Kirchliche Hochschule) de Wuppertal. Ali Moltmann – e seu colega Wolfhart Pannenberg – experimentaram um tempo de profunda reflexão teológica sem a tutela do Estado e a interferência das instâncias políticas da Igreja Evangélica da Alemanha.

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a teologia acadêmica, além de erudita, é também pastoral. Meus alunos universitários procedem de diversas escolas secundárias. Vivem igualmente separados do povo que não pode mais frequentar escolas e, certamente, a universidade. Nossa teologia acadêmica relaciona-se com a Bíblia, os Pais da Igreja, bem como com outras ciências e ideologias. Mas não fala a linguagem do povo nem expressa suas experiências e esperanças (MOLTMANN, 1978, p. 31-32).

Moltmann tem “alma” pastoral, por isso o seu compromisso com a teologia só tem sentido porque ele sempre propõe, a partir do reino de Deus, uma “teologia missionária, que liga a igreja à sociedade e o povo de Deus aos povos da terra” (MOLTMANN, 2004, p. 13).

Quanto aos aspectos teológicos, Moltmann recebeu certas influências de Barth, como colocado acima. Segundo Richard Bauckham (1995, p. 1-2), Moltmann, como um estudante em Göttingen do pós-guerra, assimilou a teologia de Barth e durou algum tempo antes de ver qualquer necessidade de ir além do teólogo suíço. Os rumos que Moltmann tomou, foram inspirados por seus professores como: Otto Weber, Ernst Wolf dentre outros. No campo exegético, coube a Gerhard von Rad e Ernst Käsemann, o primeiro para o Antigo Testamento e o segundo para o Novo Testamento, influenciar o autor na leitura exegética da Bíblia.

Em 1964, o autor se torna conhecido com sua obra Teologia da esperança. Em 1967 foi-lhe oferecido à oportunidade de lecionar na prestigiada Universidade de Tübingen como professor de Teologia Sistemática, deixando de ser apenas com a sua aposentadoria em 1994.

Ainda nos aspectos teológicos do autor, é possível visualizar dois grandes momentos na sua produção acadêmica além de outros títulos de reflexões teológicas

pontuais. A sua trilogia começa com a chamada Teologia da esperança (1964),

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partir dele. A Teologia da esperança atribui um significado decisivo à história e à própria revelação, mas a partir da promessa. Nesse sentido, a história torna-se o espaço do compromisso político e social da práxis dos cristãos.

Em O Deus crucificado (1972), Deus é pensado a partir da cruz, do sofrimento e de como Deus é solidário com o sofrimento. O sofrimento é visto como não sendo uma contraposição a Deus, pois o ser de Deus está no sofrimento. A cruz é então a identificação de Deus com o sofrimento do mundo no sofrimento de Cristo. Para Moltmann, se Deus é amor, então Deus está no sofrimento e o sofrimento está em Deus.

Em 1975 com A igreja na força do Espírito, Moltmann une duas perspectivas: eclesiologia e pneumatologia. É o Espírito Santo que recorda os não recordados do mundo. Ele, que deriva do evento da cruz e da ressurreição, move a realidade à resolução da dialética que invade o mundo do esquecimento e da paixão, enchendo-o com a presença de Deus. É uma igreja que faz evidenciar nela e por meio dela, a partir da comunhão eclesial e fraterna, uma igreja no horizonte do mundo, ou seja, não é uma igreja mundanizada, mas uma igreja comprometida ética e politicamente com o mundo.

O segundo período (1980-1991) será o propriamente sistemático do autor, conhecido como contribuições sistemáticas para a teologia. Em 1980 publica a sua doutrina trinitária social em Trindade e reino de Deus tentando superar o conflito entre a exegese antropológica e a exegese teológica do texto bíblico com o auxílio da hermenêutica trinitária. Neste livro tenta libertar a doutrina cristã de Deus do confinamento da antiga metafísica da substância. Desenvolve aqui a sua doutrina social da trindade. Na obra, Moltmann faz uma opção pela relação pericorética capadócia intra-trinitária e recusa qualquer concepção monoteística ou monarquista de Deus.

Em 1985 publica Deus na criação para enfatizar o significado ético da doutrina de Deus nas suas posições trinitárias e escatológicas. Nesta obra aponta para o panenteísmo em ordem a superar o panteísmo e o deísmo de um Deus radicalmente separado do mundo, pois o conceito de natureza permite pensar as marcas do próprio Deus triúno.

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caminho de Jesus Cristo se dá que na primeira ele busca entender a dinâmica da paixão de Deus e a cruz do seu Filho; aqui ele procura desenhar uma cristologia que não olhe apenas para o céu, mas sim uma cristologia para homens e mulheres que caminham e buscam orientações diante dos conflitos e da história, daí o seu sentido messiânico e pneumatológico. Como Messias, Jesus enxuga lágrimas e encoraja os desesperados, libertando os oprimidos. Nesta obra o autor procura abordar as diferentes perspectivas cristológicas, inclusive a cósmica.

Em 1991 Moltmann publica O Espírito da vida. Das suas contribuições sistemáticas para a teologia esta obra é indubitavelmente um marco no tema do Espírito Santo. O autor procura conectar as experiências da vida com as experiências de Deus por meio do seu Espírito e isso ele faz tratando das concepções contemporâneas da pneumatologia, fazendo uso da Bíblia com suas manifestações do Espírito de Deus na história. Com O Espírito da vida, Moltmann deflagra um intenso debate no campo da pneumatologia.

Depois de elencados alguns aspectos da vida e principais produções acadêmicas do autor, passo a analisar aspectos de algumas obras com o objetivo de ressaltar as principais ideias explicitas ou implícitas do teólogo alemão quanto a sua eclesiologia.

2. Trilogia da esperança: uma leitura eclesiológica

Como teólogo sistemático, o tema da eclesiologia não poderia ficar de fora das suas reflexões, é por isso que ele dedica uma obra, A igreja na força do Espírito, ao tema e, segundo Battista Mondin (1980, p. 200), esta será a obra mais sistemática do autor. Acolhendo a opinião de Mondin de que esta é a mais sistemática obra do autor é que procuro dar uma síntese do trabalho A igreja na força do Espírito. Em seguida, passo a observar em outros trabalhos do autor, como a Teologia da esperança e O Deus crucificado, suas reflexões que estão de alguma maneira, conectadas ou que se relacionam, com sua eclesiologia de maneira explícita ou implícita.

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fim de oferecer um esboço da sua eclesiologia e, num segundo momento, as duas principais obras que compõem o eixo temático do autor conhecido como trilogia da esperança: Teologia da esperança e O Deus crucificado.

2.1.

A igreja na força do Espírito

: uma proposta eclesiológica

A obra A igreja na força do Espírito surgiu em 1975 como a última parte que compõe a conhecida trilogia da esperança. Um texto denso e que procura abordar quase todas as áreas da eclesiologia como discurso teológico da igreja. No Brasil, ela só foi publicada em 2013, demonstrando que o tema da eclesiologia foi por muito tempo preterido por outros temas de igual importância na produção acadêmica do autor. No Brasil a obra é traduzida como A igreja no poder do Espírito. Embora o título da obra em alemão traga a palavra força (Kraft) e não poder (Macht), uma vez que Macht, geralmente indique potência, ou seja, um poder soberano, e, por outro lado, Kraft denota energia, esforço, força.6 A versão espanhola preserva a palavra traduzindo Kraft por fuerza. Já a tradução em inglês preferiu power ao invés de force. A obra em português chega com certo atraso, ou seja, depois de trinta e oito anos, mas continua atual levantando assuntos e contribuindo com relevância para o cenário teológico e o diálogo com a sociedade.

Com A igreja no poder do Espírito: uma contribuição à eclesiologia messiânica, Moltmann quer elaborar uma eclesiologia que seja orientadora dentro de um contexto de incertezas e ameaças, como era a década de 1970, principalmente com os desdobramentos e consequências da Guerra Fria. Com o avanço técnico-científico, as disputas armamentistas, as crises e a sensação de insegurança, a igreja, no entender de Moltmann (2013, p. 13), “não teria esperança se ela apenas partilhasse a desorientação e inseguranças generalizadas ou até mesmo as aprofundasse, criando um clima de fim do mundo”. Uma vez chamada para alimentar a esperança no mundo, a igreja é a presença do reino de Deus e o seu Espírito é o renovador desse processo.

6 Monika Ottermann, a tradutora da obra para o português, relatou-me de que foi uma opção da editora

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As reflexões em A igreja no poder do Espírito não surgiram das aulas do autor em Tübingen, nem mesmo em seu escritório de estudos. Moltmann credita a obra ao período que passou como pastor por cinco anos em uma pequena comunidade rural em Bremen-Wasserhorst (MOLTMANN, 2013, p. 15).

Sua obra está dividida em sete capítulos, sendo o capítulo terceiro o mais extenso deles, a igreja de Jesus Cristo. Como quer Moltmann, a sua eclesiologia procura ser um tratado sobre o discurso e a teoria eclesiológica estabelecendo as dimensões em que ela se dará: sua conexão imprescindível com Jesus Cristo, sua tarefa missionária, sua condição ecumênica e sua práxis política (capítulo um). No capítulo dois, o autor procura fazer uma leitura da igreja a partir da história, não a história eclesiástica comumente, mas a história onde a própria igreja está inserida. No capítulo terceiro, ele trata de Jesus ser o “fundador” da igreja, sua condição de “comunidade do êxodo”, sua relação com a cruz, o reino de Deus e os membros desse reino. No capítulo quatro ele se dedica apenas ao tema do reino de Deus. Um capítulo com diversas facetas do reino de Deus, como a relação com Israel e as consequências em ser uma igreja para o reino. Como é uma eclesiologia onde o Espírito Santo tem a sua primazia, o capítulo cinco traz uma discussão sobre a sua presença na igreja ou a igreja na presença do Espírito Santo. Um capítulo em que Moltmann trata do evangelho, a pregação da igreja, o batismo, a maneira com que as pessoas entram na comunhão da comunidade, a ceia como um convite aberto a tod@s, o culto como uma celebração ou festa messiânica, e, por último, alguns apontamentos éticos da comunidade de fé. Já no capítulo seis, Moltmann procura trabalhar a dinâmica da comunidade de fé com seus “ministérios” a partir dos dons e vocações. Além disso, ele aponta para uma práxis da comunidade de fé na sociedade com alguns critérios como, por exemplo, a amizade com os “de fora” da comunidade. O último capítulo ele faz um resumo das principais marcas da igreja, sua unidade, santidade, catolicidade e apostolicidade.

Como essa obra será analisada nos próximos capítulos, no segundo e terceiro, aqui, por enquanto, interessa perceber os caminhos que o teólogo de Tübingen procura traçar com a sua principal obra eclesiológica.

(34)

Passo agora a tecer algumas considerações quanto à eclesiologia que está na sua obra mais expressiva, a Teologia da esperança de 1964.

2.2. A eclesiologia na

Teologia da esperança

A intitulada trilogia da esperança7 tem início com a tão conhecida obra

Teologia da esperança publicada em 1964. Uma obra em que o autor tem como interlocutor o filósofo Ernst Bloch a partir do seu livro O princípio esperança. A

proposta da obra moltmanniana é tratar a escatologia como um tema importante da

teologia, ou seja, um tema de primeira grandeza. Na Teologia da esperança, Moltmann

trata da eclesiologia em diversos momentos. Aqui interessa esse olhar para a

eclesiologia na Teologia da esperança.

Moltmann expõe as incumbências que são postas pela sociedade moderna à igreja no transcorrer da história (MOLTMANN, 2003, p. 361-398). Ele sintetiza isso da seguinte maneira. Com o surgimento da sociedade burguesa e as relações baseadas nas necessidades, o conceito de religião foi emancipado. Em outra época, era dado à igreja funções, ou tarefas, na sociedade e com o advento do modernismo isso foi suplantado. Vista como coração da sociedade, sustentadora e unificadora de interesses político-sociais no Império Romano, a igreja era tida como culto público, detentora da fé, da moral e da adoração a Deus. Com a chegada da modernidade, ela perde seu ideal moral e unificador e passa a ser um culto privado. A religião torna-se religiosidade individual. Dando ao indivíduo esta liberdade, a religião torna-se intimista e particularizada. Tem, a partir de agora, uma função consoladora diante da angústia existencial; é sua função dar às pessoas o sentido de existir.

As novas funções eclesiológicas são consequências de mudanças econômicas e político-filosóficas. Além desses fatores, Moltmann aponta o crescimento do consumo e das relações pessoais baseadas nas necessidades. Com isso, o ser humano recorreu à subjetividade como compensação para as tumultuadas relações sociais.

As necessidades subjetivas dão novas formas a igreja: (1) a igreja-subjetividade: a cosmologia cedeu lugar à metafísica subjetiva. O salvamento depende da

7 Como mencionado acima, é Rosino Gibellini que assim define o conjunto dessas três obras – Teologia

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interiorização do transcendente. Há um isolamento social de quem encontra esta religião subjetiva e a fé passa a não ter nenhuma consequência prática para o próximo. O que conta é o sentimento de eternidade garantida e os desejos, existenciais e de consumo, atendidos; (2) a igreja-solidariedade: ligada a pequenos grupos, a igreja funciona como uma arca de Noé. Ela aliena e acrisola as pessoas das situações sociais. A integração a uma igreja é compensatória porque concede privações sociais ao indivíduo que vive em uma sociedade secular. O grupo é fechado em si mesmo e não produz nenhum compromisso social, tornando ineficiente o amor cristão para com a sociedade; (3) a igreja-instituição: é o retorno do velho jeito Constantino de ser igreja. A este tipo de comunidade cabem às regras, os padrões de comportamentos. Afinal de contas, a igreja instituição confere segurança em tempos inseguros porque diz em que se crê e como crê. Permite ainda aquela sensação de certeza e de caminho certo, além, é claro, de produzir um sentimento de agraciado por estar ali e sentir, ao mesmo tempo, uma leve pena de quem não se encontra no lado de cá da fronteira.

São papéis que a sociedade, no entender de Moltmann, requisita para a igreja. Papéis esses derivados de necessidades ou eventos sociais, mas que não coadunam nem um pouco com o parecer teológico da igreja neotestamentária: “se o cristianismo quer e deve ser outra coisa, segundo a vontade de Cristo, em quem crê e a quem espera, deve tentar nada menos do que irromper para fora desses papéis sociais assim fixados” (MOLTMANN, 2003, p. 382).

O discurso de Moltmann é uma provocação e, ao mesmo tempo, um desafio para que a igreja sinta-se parte da sociedade e participe de sua vida. Os modelos que a sociedade quer da igreja não são mais concebíveis, ela é maior que isso, ela tem uma grandeza peculiar, porque a ela é dada tarefas superlativas. Em outro momento, Moltmann passa a expor as funções e tarefas da igreja para um novo contexto.

(36)

promessa dada na ressurreição de Jesus e seu cumprimento no futuro escatológico. Por meio da missão da igreja, o mundo já é afetado na antecipação da nova criação e começa a ser transformado em direção da promessa de transformação escatológica.

Em outro momento Moltmann atrela a igreja ao reino de Deus e esta, a igreja, se torna expressão do reino de Deus quando passa a ser anunciadora da esperança que foi confirmada pela ressurreição de Jesus Cristo. A igreja, portanto, é chamada para mediar à presença de Cristo que, por sua vez, faz a mediação do futuro de Deus (ERICKSON, 1982, p. 41). Cabe à igreja ser construtora da realidade futura, e não apenas intérprete da história (como é visto nas concepções milenaristas, por exemplo, que analisaremos no capítulo terceiro). À igreja, é-lhe dada a tarefa de esforça-se para trazer o futuro para o presente. Sendo a igreja portadora do futuro, a promessa do reino de Deus torna-se fundamento para a missão do amor pelo mundo (MOLTMANN, 2003, p. 265).

O reino de Deus é o real fundamento da teologia da igreja, pois à igreja é dada uma obrigatoriedade missionária, pois ela está ligada à sociedade e compartilha com ela os sofrimentos desta época, formulando esperança em Deus para as pessoas (MOLTMANN, 2004, p. 13). A igreja, neste sentido, é “uma comunidade na qual o fiel vive continuamente e não ocasionalmente; uma comunidade de fé, esperança e fraternidade que se torna fermento de vida para todo o mundo” (MONDIN, 1980, p. 201). Para ela ser isso, fermento de vida, ela deve assimilar conscientemente de que é a antecipação, o sinal do reino de Deus. Jesus, com sua missão e ressurreição, trouxe o reino de Deus para a história, a igreja é a sua antecipação; portanto, é o povo do reino de Deus (MOLTMANN, 2003, p. 386). O que isso significa? Ora, para Moltmann a promessa gera missão; a promessa do reino de Deus é o fundamento da missão do amor pelo mundo; a missão é a esperança da fé em ação (MOLTMANN, 2003, p. 202). O seguimento de Cristo implica no serviço ao mundo.

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Foi dado à igreja papéis que não correspondem com o Novo Testamento

(MOLTMANN, 2003, p. 361ss). À igreja cabem as funções outorgadas pelo Novo

Testamento, ou seja, a colaboração no projeto do reino de Deus.

Cabe à igreja ter uma consciência ética e responsável pelo seu contexto social;

contar com o comprometimento de tod@s na missão ao mundo, tornando patente seu

plano de amor pelo mundo; incentivar o uso das vocações para a transformação da

sociedade por meio dos valores do reino de Deus; procurar ser a sinalização da graça de Deus, pois ela é a consciência mais profunda do manifestar de Deus; tornar realidade, nela mesma, a presença amorosa de Deus por meio do cuidado fraterno; alimentar a fé de um mundo melhor por meio da esperança; celebrar a chave do futuro, a ressurreição de Cristo; ser uma igreja que consiga fazer uma leitura de seu contexto de maneira aberta, ou seja, dialogal e fraterna.

2.3. A eclesiologia no

O Deus crucificado

A discussão sobre a igreja na obra O Deus crucificado se dá no primeiro capítulo. Nesta clássica obra, Moltmann procura trabalhar a teologia da cruz e sua relação com o sofrimento. Essa obra ficou amplamente conhecida, principalmente na América Latina, depois da tragédia com os seis jesuítas em San Salvador em 1989. No triste fato, conforme Moltmann relata, “o corpo do padre Ramón Moreno foi arrastado pelos soldados para dentro do quarto de Jon Sobrino que não estava presente no local. No seu sangue, foi encontrado um livro caído. Tratava-se de El Dios crucificado” (MOLTMANN, 2004, p. 187). Um livro que procura tratar a cristologia a partir da cruz e sua relação com Deus. O texto é sua teologia da cruz.

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igreja toma o nome de Jesus e professa fé nele, algumas atitudes, comportamentos, precisam ser evidenciados para dar credibilidade a essa assertiva. Nesse sentido, Moltmann está dizendo que a igreja precisa tomar consciência de que ela está ligada a Jesus e, portanto, é preciso estar ciente das implicações que o crucificado traz.

No capítulo primeiro, Moltmann trata da “identidade e relevância da fé”. A teologia, mas principalmente a igreja, se torna irrelevante no contexto atual quando, por exemplo, tentam afirmar a identidade a partir dos dogmas, ritos e padronização moral. No entender do autor é aí que cresce a sua irrelevância e falta de credibilidade (MOLTMANN, 2010, p. 29). Quais as razões que levam a essa irrelevância e falta de credibilidade? Como a obra está em um contexto pós-guerra, Moltmann quer colocar a questão a partir do que seja importante ou não para a igreja. Para o autor, “quando esta igreja, que somente se preocupava em conservar a mesma estrutura e ideologia até o momento, chegou ao ponto de perder o contato com a realidade científica, social e política do seu ambiente” (MOLTMANN, 2010, p. 30). A igreja, pelo seu acrisolamento, se fechou em si mesma e, de algum modo, se manteve afastada das questões que a sociedade estava discutindo e passando, principalmente com crises políticas e sociais. É por isso, que para Moltmann (2010, p. 30),

muitos abandonam o estudo teológico, seus cargos de pastores, o sacerdócio e suas congregações, e se põem a estudar sociologia e psicologia, ou a promover a revolução e a trabalhar nos bairros miseráveis de nossas cidades, convencidos de que assim contribuem mais eficazmente para a solução dos conflitos desta sociedade desgarrada.

A questão levantada pelo autor é quanto à relevância da teologia e, consequentemente da igreja, para o contexto atual quando algumas iniciativas estão sendo tomadas, ou seja, quando a teologia e a igreja não estão tendo relevância exatamente por não discutir temas relevantes. A consequência disso é o não engajamento social que era esperado da igreja, uma vez que ela se identifica como seguidora de Jesus. Moltmann (2010, p. 31) pontua que

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abandonar as igrejas existentes por não encontrar em suas instituições nenhuma possibilidade de realizar seu compromisso.

A crise da igreja se dá pelas disputas internas, desfigurando o evangelho de Cristo e sua práxis, esquecendo-se da dimensão política-profética da igreja. A relevância da igreja no cenário social seria possível mediante o ajuntamento ecumênico, e não propriamente o dogmático, para superar a falta de identidade com Cristo e a crise interna das igrejas. Moltmann ressalta de que a morte de Jesus teve a sua dimensão política, por isso a “fé no crucificado é, em sentido político, testemunho público em prol da liberdade de Cristo e o direito da graça frente às religiões políticas dos povos, frente a impérios, raças e classes” (MOLTMANN, 2010, p. 175). A igreja necessita recordar de que a fé que ela professa é no seguimento de Jesus, portanto uma “fé sem seguimento se reduziria a mera aceitação de doutrinas e participação em cerimonias” (MOLTMANN, 2010, p. 85). Outra obra cristológica em que o autor amplia o tema do seguimento como práxis é O caminho de Jesus Cristo (2000a). Aqui Moltmann começa discutindo a questão do messianismo e seus desdobramentos, sendo para ele, o conceito messiânico uma chave hermenêutica importante. Ele trata dessa categoria, messiânico, em sua obra eclesiológica, mas em O caminho de Jesus Cristo ele amplia a partir da práxis de Jesus emergindo uma cristologia que não olhe apenas para o céu, mas sim “uma cristologia para homens e mulheres que caminham e buscam orientações diante dos conflitos e da história” (MOLTMANN, 2000a, p. 11). Nesse sentido, a igreja é continuadora dessa dimensão messiânica.

Uma leitura eclesiológica da obra O Deus crucificado se faz a partir da estreita relação entre Jesus e a igreja, entre a sua práxis e a postura da igreja. Ocorre que, no entender de Moltmann, a crise de irrelevância está em não levar em consideração as dimensões da cruz, e uma delas é o seu aspecto político-social.

A fim de sustentar epistemologicamente a concepção de uma eclesiologia aberta, é importante pontuar alguns aspectos da hermenêutica moltmanniana.

A proposta desse capítulo é procurar mostrar que a eclesiologia está presente na obra de Moltmann e o autor tem, além da sua principal obra A igreja no poder do Espírito, outras contribuições valiosas quando o tema é igreja. A delimitação foi a partir do seu principal livro sobre igreja, já citado, e as duas obras que o projetaram

(40)

Diante disso, importa finalizar este capítulo introdutório elencando alguns aspectos da hermenêutica de Jürgen Moltmann que serviram para fundamentar sua eclesiologia, tema que será trabalhado no próximo capítulo dessa dissertação.

3. Aspectos hermenêuticos da teologia moltmanniana

O filósofo, denominado de neomarxista, Ernst Bloch, exerceu uma importante influência em Jürgen Moltmann com a sua filosofia da esperança. Bloch, como leitor e pesquisador de Karl Marx, diferiu quanto à tese marxista segundo a qual o ser humano se encontra em estado de alienação (MONDIN, 1983, 244). Para Marx o ser humano se encontra alienado em sentido econômico e social, ou seja, o trabalhador (proletário) só tem a sua força de trabalho caindo sob o domínio do outro. Isso só poderia ser superado pela supressão da economia capitalista (DUROZOI & ROUSSEL, 2005, p. 23). Já Bloch entende alienação do ser humano por razões ontológicas. A sua alienação se dá pela sua incompletude, pela sua limitação, pelo “não-ainda-ser” (REALE & ANTISERI, 2006, p. 447). É aqui que o filósofo alemão coloca a esperança como mediadora das

relações humanas. Para Bloch, a esperança se dá em um movimento antecipador do

futuro. Nesse sentido, “aquele que espera (o ser), projeta o seu ainda-não-ser para esse futuro ainda-não-realizado” (KUZMA, 2014, p. 97). É a partir disso que Bloch elabora a sua filosofia da esperança postulando a ideia de que o ser humano “é, por essência, a criatura que tende para o possível que lhe está adiante” (MONDIN, 1983, 244). O esperar não é um fator de imobilidade, pelo contrário, segundo Bloch “somos ardentes e

indecisos” e é essa dimensão humana que impulsiona para a ação. É a partir dessa

dimensão humana do esperar que vive-se “estimulado em primeiro lugar por si

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acontecer que faz com que a realidade se desenvolva. Para isso, há duas dimensões dialéticas em Bloch. A subjetiva e a objetiva. Para o filósofo alemão, “o fator subjetivo é a potência inacabada de fazer as coisas evoluírem; o fator objetivo é a potencialidade não terminada da mutabilidade do mundo” (apud MONDIN, 1983, 244). É dentro dessa dialética que se dá a construção da possibilidade de transformação histórica. “Essa abertura, esse estado incompleto, não é condição negativa. Pelo contrário, é muito mais condição positiva, constituindo o caminho para o cumprimento” (REALE & ANTISERI, 2006, p. 447). Não é um abandono da história, pelo contrário, é um assumir a história com suas vicissitudes e contradições e, concomitantemente, com esperança pelo futuro aberto de possibilidades.

A religião é parte substancial no sistema filosófico blochiano. Diferente de Marx

que a compreendia como ópio do povo,8 Bloch formula a ideia de que “onde há

esperança, há religião” (apud REALE & ANTISERI, 2006, p. 448). A religião, antes de ser instrumento alienatório, “é a esfera na qual o ser humano ainda incompleto projeta a sua ânsia perene por uma existência reconciliada” (MONDIN, 1983, p. 246). É dentro dessa perspectiva que Moltmann encontra o aporte hermenêutico para construir a sua teologia da esperança. Ainda que houvesse diferenças nos caminhos traçados por ambos, há uma interação entre os dois, havendo uma profícua interlocução em temas como utopia, messianismo e religião. Moltmann se apropria das “bases filosóficas de Bloch para produzir uma teologia que fosse orientada para o futuro, de maneira histórica, servindo-se da práxis” (KUZMA, 2014, p. 98). Uma vez que o ser humano “vive voltado unicamente para o futuro; o passado chega somente mais tarde, e quanto ao presente propriamente dito, pode-se dizer que ainda não chegou” (apud MONDIN, 1983, 244). O teólogo de Tübingen vê nisso uma chave para formular uma escatologia que alimente a esperança em uma Europa dilacerada pela Segunda Guerra Mundial, onde fracassa o sonho de uma sociedade madura proclamada pelo iluminismo. Surge então, a teologia da esperança propondo uma nova perspectiva para o futuro do ser humano. A iniciativa é olhar para frente e procurar idealizar um futuro mais humano, colocando Deus e sua promessa no cenário do discurso moderno.

Moltmann se apropria da filosofia da esperança de Bloch abrindo um diálogo com a teologia, mais especificamente, com a escatologia. Bloch irá suscitar em

8 “A religião é o suspiro da criatura oprimida, a alma de um mundo sem coração, tal como é o espírito de

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