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O presente trabalho argumentou que as análises dos momentos interativos, numa perspectiva conversacional, permitiram um melhor entendimento da complexidade que envolve o processo de construção de sentidos nas aulas de Ciências do ensino fundamental. As análises dos dados coletados permitiram identificar uma diversidade nos usos dos não verbais e verbais, constituindo a íntima relação entre fala, gestos, expressões faciais, ações de apontamento, distância entre os interlocutores, representando, dessa forma, a unidade linguístico-não verbal, termo defendido neste trabalho.

A sala de aula, como dito nos transcorrer desta tese, é um local em que as relações se efetivam assimetricamente. No entanto, foi possível observar que a professora colaboradora se posicionava de forma a romper com as barreiras hierárquicas típicas do ambiente de sala de aula, permitindo que houvesse uma relativização do termo assimetria, conforme mencionado por Fávero et al (1999), ao tratar da relação relativamente assimétrica e Kerbrat-

Orecchioni (2006), quando aborda o tipo de relação horizontal, sendo caracterizada pela familiaridade e aproximação entre os interactantes.

Isso se deu não somente pela maneira como a docente conduzia sua aula de ciências, perguntando, dialogando, dando oportunidades de fala para os alunos, mas também pela forma com que L1 se aproximava de seus interlocutores, constituindo um dado proxêmico altamente relevante nessa relação, permitindo a criação de um contexto para a interação e para a aprendizagem, como bem defende Erickson (2001) em seus estudos.

Para que esta tese pudesse ser realizada, foram traçados alguns objetivos, afim de melhor organizar as ideias que sustentaram o trabalho. Nesse sentido, pesquisas em comunicação não verbal foram contempladas no sentido de mostrar os elementos verbais e não verbais como uma unidade.

Dedicou-se um capítulo sobre esse tópico para fundamentar teoricamente a tese, sendo constituído por vários estudos acerca das categorias que compõem a comunicação não verbal. Dessa forma, foram apresentadas as atividades paralinguísticas que acompanham o comportamento verbal; foi produzida uma tipologia gestual que serviu de alicerce para interpretar os fenômenos cinestésicos que apareceram na relação professor-aluno; foi feita uma classificação do território social, observando o espaço mantido entre os interlocutores que estiveram presentes nas atividades conversacionais de sala de aula; e foram analisados os momentos interativos, dando atenção às categorias não verbais mencionadas, funcionando como ações que possibilitaram a construção de significados.

Integrados aos estudos sobre os elementos verbais e não verbais estiveram presentes também alguns domínios teóricos da área Pragmática. Para traçar esse percurso, foram apresentadas várias definições do campo, dentre as quais se optou por aquela que afirma ser a Pragmática uma corrente que pertence ao domínio funcional dos estudos linguísticos, distanciando-se da concepção estruturalista, que entende a língua como um sistema abstrato de signos e que, para seu estudo, não devem ser levadas em consideração questões contextuais. Compondo essa seção, teorias como os atos de fala, as máximas conversacionais e o princípio de cooperação permitiram melhor observar os objetos evocados pelo trabalho, sustentando a ideia defendida pela pesquisa: a unidade linguístico-não verbal.

O discurso de sala de aula analisado revela bem os esforços cooperativos postos em prática pelos interlocutores a fim de efetivar o processo conversacional. Os propósitos do diálogo já estavam fixados, isso porque é um encontro para a aprendizagem, em que a professora se dispõe a preparar os conteúdos e os materiais usados e os alunos se dispõem a interagir com sua interlocutora, configurando o Princípio da Cooperação, postulado por Grice (1982).

O que não estava fixado, nem poderia sê-lo, dado sua configuração status nascendi, foi o planejamento do texto oral, que se constitui essencialmente como processo (HILGERT, 2001). Certo que L1 se preparou anteriormente para ministrar suas aulas de ciências, mas a construção do seu texto oral se deu no próprio ato de produção, de forma on-line.

Os enunciados proferidos pela professora tinham finalidades específicas e, de acordo com os tópicos discursivos trabalhados, as estratégias para comunicá-los variavam: ora os enunciados eram construídos através de gestos de apontamento, ora por gestos relacionados à fala, ora por meio de imagens no quadro-negro e uso das figuras do livro didático. Por serem aulas de ciências, em que os conteúdos podem ser apresentados imageticamente, L1 se utilizou desse recurso não verbal para veicular as informações necessárias, transmitindo conhecimentos e construindo-os.

As máximas conversacionais (GRICE, 1982) apareceram no trabalho pelo fato de haver nas trocas conversacionais quase sempre um princípio cooperativo, segundo o qual, por exemplo, um dos falantes deve expressar somente aquilo que lhe fora questionado (máxima da qualidade). Isso se estende ainda quando, em havendo um diálogo entre dois interactantes, um deles é interceptado por outro para ser questionado por assunto alheio ao que estava conversando; o que houve nesse caso foi uma ruptura com o falante anterior, surgindo a chamada implicatura conversacional, isto é, o circuito conversacional foi interceptado por outra fala com assunto adverso ao que estava sendo tratado. Dessa maneira, este trabalho não poderia deixar de tratar desse assunto por ele ser frequente nas instâncias de sala de aula.

O presente trabalho se insere na linha de investigação conhecida como Análise da Conversação; por isso, foi de fundamental importância elaborar um capítulo que trouxesse um olhar mais minucioso da área conversacional. Nesse

sentido, trabalhos que inauguraram o campo compuseram uma das seções da tese, apresentando as inquietações de Sacks, Schegloff e Jefferson (2003 [1974]), que elaboraram uma teoria sobre a organização da tomada de turnos, detendo-se nas regras que governam a constituição da conversa. Conforme dito no desenvolvimento do texto, o campo conversacional muda de perspectiva teórica, passando de uma preocupação estrutural das conversações para um posicionamento interpretativista, ou seja, dá-se atenção aos processos cooperativos que compõem a atividade conversacional.

Com essa mudança de enfoque, começam a fazer parte das pesquisas conversacionais aspectos paralinguísticos, supra-segmentais, cinestésicos, proxêmicos, dados não verbais que estão inseridos no texto oral, constituindo- o. Dessa forma, esta pesquisa enfocou tais elementos, que são inerentes à fala, com o objetivo de estudá-los dentro de um contexto social de sala de aula, onde interagem interlocutores que negociam, cooperam, dialogam, falam ao mesmo tempo, aprendem, constroem sentidos, enfim, tecem, em conjunto, o texto conversacional, característica que representa o enfoque interacionista dos estudos linguísticos, representando o incessante “trabalho colaborativo” defendido por Kerbrat-Orecchioni (2006).

Ainda na perspectiva conversacional, foi de interesse da tese não somente apresentar alguns modelos teóricos que tentam dar conta da complexa situação que representa o encontro face a face, selecionando as contribuições de Cestero Mancera (1994), Gallardo Pauls (1996), Van Dijk (1983), mas também os aspectos que representam o caráter comunicativo da linguagem dialogada, bem como centralizar a língua oral como objeto de análise, uma vez que o corpus se situa nessa modalidade de uso da língua.

Por ser um estudo de caráter conversacional, não poderia deixar de ser citado um dos principais nomes da área, Luiz Antonio Marcuschi, fundador da Análise da Conversação no Brasil. Esse pesquisador foi de fundamental importância para o campo da língua(gem) em uso e para a consolidação do chamado estilo falado (MARCUSCHI, 2002), participando ativamente da construção da Gramática do Português Falado, bem como sendo nome central do GT Linguística de Texto e Análise da Conversação, da ANPOLL.

Metodologicamente, o presente estudo se identifica com os postulados contidos na vertente qualitativa de pesquisa, isso porque a interpretação dos