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CAPITULO 3 – CARACTERIZAÇÃO DO CONTEXTO DA PESQUISA: O ESTADO

3.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O MODELO CATARINENSE DE

Antes de aprofundar a análise do caso do CODETER da Serra Catarinense, é importante situar o contexto do “modelo catarinense de desenvolvimento”. Algumas especificidades na forma como ocorreu o desenvolvimento em Santa Catarina, como o tipo de colonização, presença significativa do cooperativismo e associativismo, experiências diversas de integração da agricultura familiar com o agronegócio e a descentralização e diversificação de pólos de desenvolvimento econômico, ajudam a explicar as suas peculiaridades (também presentes no caso em estudo) e o porquê da pequena produção familiar, a policultura e o empreendedorismo coletivo terem dado mais certo em Santa Catarina do que nos restante do país.

Contudo, apesar dessas especificidades, no geral, o desenvolvimento de Santa Catarina acompanhou as grandes tendências do processo de crescimento brasileiro, ou seja, um desenvolvimento focado essencialmente na dimensão

econômica que trouxe benefícios principalmente para grupos de organizações bem estruturadas e consolidadas economicamente e que contribuiu para acentuar ainda mais as desigualdades socioeconômicas das regiões. (SCHMIDT et. al, 2002; MICHELS, 1998).

As peculiaridades da sociedade catarinense já deram origem a diversos estudos e análises interpretativas sobre a formação econômica do estado. Em síntese, os estudos sobre o desenvolvimento15 de Santa Catarina podem ser divididos em três correntes teóricas de pensamento: os Periféricos; os “Schumpeterianos”; e os Desenvolvimentistas (MICHELS, 1998; GOULARTI FILHO, 2007). Os periféricos buscam explicar a evolução histórico-econômica de Santa Catarina, baseando-se em uma lógica de relação centro-periferia. Para eles, o desenvolvimento catarinense sempre foi dependente do centro econômico do país, em especial do eixo Rio - São Paulo. A economia de Santa Catarina seria periférica, porque a demanda externa do centro (indústria e mercado do Sudeste do Brasil) determinaria a sua estrutura de produção (MICHELS, 1998). Entre os principais precursores dessa corrente, destacam-se os trabalhos de Etienne Luiz Silva e do Centro de Assistência Gerencial de Santa Catarina (CEAG) 16.

Os “Schumpeterianos” atribuem aos empresários catarinenses, sobretudo os de descendência germânica e italiana, a responsabilidade pelo processo de industrialização do Estado. Para eles, o desenvolvimento de Santa Catarina se deu graças à iniciativa empreendedora e inovadora do imigrante-empresário, cuja característica básica foi o pioneirismo (MICHELS, 1998). Essa corrente de pensamento baseada teoricamente em Joseph A. Schumpeter17 ganhou força nos

estudos sobre a historiografia econômica catarinense devido ao sucesso de diversos grupos de origem europeia, cujas histórias de vida de seus fundadores confundiam- se com o sucesso de suas empresas. Como exemplo desses empreendedores

15 Desenvolver neste caso entende-se por Industrializar. Estas abordagens teóricas privilegiam estritamente a formação econômica de Santa Catarina, focando de forma mais específica na evolução econômica de empresas, regiões ou do estado. Os estudiosos destas correntes teóricas não se preocupavam em oferecer uma abordagem mais ampla e crítica acerca da realidade catarinense, analisando os múltiplos aspectos da história política, econômica e social de Santa Catarina que contribuíram para seu desenvolvimento.

16 CEAG. “Evolução Histórico-Econômica de Santa Catarina – Estudos das alterações estruturais (Séc. XVII-1960). Florianópolis. Imprensa Universitária, UFSC. 1980

17 O autor analisa a economia a partir de ciclos econômicos. A criação de um novo ciclo se daria a partir das inovações tecnológicas introduzidas por empresários empreendedores. SCHUMPETER, Joseph A. Teoria do Desenvolvimento Econômico. São Paulo. Abril Cultural. 1982

catarinense, tem-se: Attilio Fontana, da Sadia; Saul Brandalise, da Perdigão; Diomicio Freitas, da Cecrisa; Maximiliano Gaidzinski, da Eliane; Herman Hering, da Hering; Albano Schmidt, da Tupy; e João Hansen, da Tigre (GOULARTI FILHO, 2007). Os precursores desta corrente tentavam desassociar a industrialização catarinense da economia nacional. Para eles, a economia catarinense desenvolveu- se a partir de determinantes internos, dependendo apenas de forma secundária do Centro Econômico brasileiro. Primeiro, no mercado regional e estadual, e, depois, no nacional. A indústria surgiria primeiramente para atender o mercado local, e somente depois o seu excedente seria comercializado no mercado nacional (MICHELS, 1998). Entre os principais autores dessa corrente, destacam-se os trabalhos de Idaulo José da Cunha, Maria Luiza Renaux Hering, Ondina Pereira Bossle e Ady Vieira Filho.

Os Desenvolvimentistas também atribuem o desenvolvimento de Santa Catarina em grande parte aos imigrantes - empresários. Porém, eles enfatizam a necessidade de intervenção do Estado na economia, por meio de planejamento, criação de infraestrutura, crédito e educação, para auxiliar a ação do empresário catarinense na industrialização do estado. Os desenvolvimentistas foram ideólogos e burocratas do aparelho estatal catarinense (MICHELS, 1998). Eles participaram ativamente em diversos governos estaduais, especialmente a partir dos anos 1960, sendo os responsáveis pela constituição do modelo catarinense de desenvolvimento. Uma das premissas deste modelo catarinense era a existência de empresários empreendedores e inovadores capazes de fomentar o desenvolvimento econômico local. Aliado a isto estava a vontade e aptidão de trabalhadores locais e de pequenos proprietários rurais catarinenses em contribuir para o alcance do desenvolvimento estadual, mais notadamente no setor industrial. Os desenvolvimentistas defendem este modelo catarinense dizendo ser a luz no final do túnel do desafio do desenvolvimento nacional (MICHELS, 1998). Entre os principais precursores dessa corrente, destacam-se os trabalhos de Alcides Abreu, Fernando Marcondes de Mato e Paulo Fernando Lago.

A crítica que se faz ao chamado “modelo catarinense de desenvolvimento” é que a distribuição de terras e acumulação de renda em Santa Catarina, no geral, aconteceu da mesma forma que em outros estados, isto é, de um lado um pequeno número de grupos econômicos com grandes posses, e de outro, pequenas empresas e propriedades rurais com pequena participação social e econômica no

desenvolvimento do estado (MICHELS, 1998). Santa Catarina está longe de se constituir num estado onde as desigualdades, relações de poder e dominação inexistam, ou sejam menores que em outros estados do Brasil. Segundo dados de Ferreira Filho, em 1960, os 10% mais pobres da população ganhavam 2,6% da renda global gerada e distribuída; em 1970, caiu para 1,8% e, em 1980, ganhavam somente 1,3%. Enquanto os 10% mais ricos, nos mesmos anos, concentravam 30,9%; 34,4% e 37,5% da renda estadual, respectivamente (apud. MICHELS, 1998). Existem também grandes desigualdades socioeconômicas entre as regiões do estado (THEIS, 2010). Esses dados reforçam a tese de que o modelo de desenvolvimento adotado em Santa Catarina contribuiu para acentuar as desigualdades no estado.

Para Michels (1998),

O suposto modelo catarinense de desenvolvimento é, na verdade, mais um argumento de marketing, uma ideologia desenvolvida pela elite catarinense para falsear uma realidade socioeconômica excludente, concentradora, na qual o empresariado, particularmente os grandes grupos, apoderam-se do aparelho estatal para, através dele, ampliar o seu enriquecimento privado. (MICHELS, 1998, pág. 151).

Evidencia-se, então, que apesar do estado de Santa Catarina possuir algumas especificidades que o diferem do restante do país, no geral, o seu desenvolvimento seguiu a mesma tendência que norteou o crescimento brasileiro. Esta tônica economicista, centralizadora e pouco participativa da forma de conceber o desenvolvimento persistiu até o inicio da década de 1990.

A seguir serão apresentados alguns dados sobre as zonas rurais de Santa Catarina e mais especificamente sobre a Serra Catarinense que contribuirão para colocar à prova essa tese defendida, bem como para auxiliar na compreensão e análise dos resultados buscados nesta dissertação.