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3.2 FONTES DO DIREITO PENAL INTERNACIONAL

4.1.1 Constituição

O Tribunal Militar Internacional (Tribunal de Nuremberg) foi estabelecido pela Carta Anexa ao Tratado de Londres (1945), assinado pelos poderes aos quais a Alemanha tinha incondicionalmente se rendido (Estados Unidos, França, Grã- Bretanha e União Soviética), no exercício de suas soberanias legislativas sob o

310 McGOLDRICK, 2004, p. 14-18: “The Nuremberg IMT was undertaken only after other options, such

as summary executions, were considered by the major Allied powers. The establishment of the UN War Crimes Commission preceded it, but the Commission was marginalized […] Major or minor status depended on rank rather than the seriousness of the crime charged. To that extent, it was intended as a show trial (in the proper sense) of the ‘big fish’. […] Alongside them were tried a mixture of other political figures, military and naval officers, economic and financial figures, and propagandists. In this way, the Nazi system was put on trial.”

311 AVALON PROJECT. The Moscow Conference, October 1943. Disponível em:

direito internacional. 312 Dezenove outros Estados aderiram posteriormente ao

tratado, conferindo-lhe maior legitimidade internacional. 313 A sede do Tribunal era

em Berlim, porém o único julgamento ocorreu em Nuremberg (artigo 22, Carta). 314 A autoridade dos Estados para a constituição do Tribunal veio expressa no preâmbulo do tratado no qual se mencionou que, os quatro signatários iniciais agiram no interesse das Nações Unidas: “[...] acting in the interests of all the United Nations and by their representatives duly authorized [...]” 315, em nome da comunidade internacional, repetindo o preâmbulo da Declaração de Moscou (1943).

Segundo McGoldrick, para a constituição do Tribunal podem ser encontrados vários fundamentos plausíveis: pode-se dizer que o Tribunal foi constituído no interesse da comunidade internacional e no exercício legítimo de soberania legislativa dos aliados. Ou ainda, pode-se explicar a autoridade dos aliados para estabelecer o Tribunal com base na jurisdição universal que possuíam enquanto Estados, ou por um critério mais amplo de jurisdição universal, pelo qual agiam em nome da comunidade internacional como um todo, ou, finalmente, ainda como legisladores de fato do Estado rendido. 316

O próprio Tribunal, no julgamento, considerou a legalidade da sua constituição ao reconhecer que a Carta expressava o exercício da soberania legislativa dos Estados para os quais houve a rendição incondicional da Alemanha e o indiscutível direito desses países em legislar sobre os territórios ocupados, reconhecido pelo mundo civilizado. A Carta não se teria constituído em exercício arbitrário de poder por parte das nações vencedoras, mas a expressão do direito internacional vigente no tempo de sua criação e ela própria uma contribuição ao direito internacional. Os signatários teriam realizado coletivamente o que fariam

312 AVALON PROJECT. London Agreement of August 8th 1945. Disponível em:

<http://avalon.law.yale.edu/imt/imtchart.asp>. Acesso em: 09 set. 2009.

313 AVALON PROJECT. Judgment of the International Military Tribunal. Disponível em:

<http://avalon.law.yale.edu/imt/judgen.asp>. Acesso em: 09 set. 2009: “In accordance with Article 5, the following Governments of the United Nations have expressed their adherence to the Agreement: Greece, Denmark, Yugoslavia, the Netherlands, Czechoslovakia, Poland Belgium, Ethiopia, Australia, Honduras, Norway, Panama, Luxemburg, Haiti, New Zealand, India, Venezuela, Uruguay, and Paraguay.”

314 BEIGBEDER, Yves. Judging War Criminals: the politics of international justice. Foreword by

Theo van Boven. London: MacMillan Press, 1999, p. 32-33: “[…]. The permanent seat of the Tribunal was in Berlin, at the insistence of the Soviets, but the first and only international trial was held in Nuremberg. The trial lasted from 14 November 1945 to 1 October 1946.”

315 AVALON PROJECT. London Agreement of August 8th 1945. Disponível em:

<http://avalon.law.yale.edu/imt/imtchart.asp>. Acesso em: 09 set. 2009.

isoladamente e não havia dúvidas de que qualquer nação teria o direito de constituir tribunais especiais para administrar a justiça. 317

Beigbeder crítica a forma de instituição do Tribunal porque não se conformou aos ditames do direito internacional costumeiro. O Tribunal deveria ter sido criado através de tratado internacional, com a ampla adesão de Estados. Os Juízes foram indicados pelos Estados signatários, bem como o direito material e o direito processual foram previstos no próprio tratado constitutivo, diferindo grandemente do modelo de direito internacional da Corte Internacional de Justiça (CIJ). 318

Havia um consenso pela necessidade e celeridade de instalação do Tribunal diante dos graves crimes cometidos durante a guerra. Os aliados em particular, as Nações Unidas e, mais amplamente, a comunidade de Estados, todos tiveram consciência do caráter retributivo, político e teatral (show trial) do julgamento e que, apesar destes adjetivos pejorativos, também sabiam que o Tribunal representava um passo inédito na consolidação e desenvolvimento da justiça penal internacional. Nas palavras do Promotor Chefe Robert E. Jackson:

The danger, so far as the moral judgment of the world is concerned, which will beset these trials is that they come to be regarded as merely political trials in which the victor wreaks vengeance upon the vanquished. However unfortunate it may be, there seems no way of doing anything about the crimes against the peace and against humanity except that the victors judge the vanquished. […]

I therefore want to make clear to the American people that we have taken an important step forward in this instrument in fixing individual responsibility of war-mongering, among whatever peoples, as an international crime. We have taken another in recognizing an international accountability for persecutions, exterminations, and crimes against humanity when associated with attacks on the peace of the international order. 319

Köchler ressalta algumas características do Tribunal de Nuremberg que, em sua opinião, contradizem a declaração oficial de legalidade do Tribunal, tais como: jurisdição sobre criminosos de guerra apenas da nação vencida; procedimentos estabelecidos pela Carta com caráter político e arbitrário; ênfase no pronto julgamento e punição (artigo 1, Carta); composição dos membros do Tribunal apontados apenas pelos aliados; exclusão do direito de direito de apelação (artigo 26); intangibilidade do Tribunal e de seus membros a qualquer tipo de

317 AVALON PROJECT. Judgment of the International Military Tribunal, The Law of the Charter.

Disponível em: <http://avalon.law.yale.edu/imt/judlawch.asp>. Acesso em: 09 set. 2009.

318 BEIGBEDER, 1999, p. 39-41.

319 AVALON PROJECT. Statement by Justice Jackson on War Trials Agreement, August 12,

questionamento (artigo 3); não adoção de regras técnicas de prova (artigo 19). Considera o Tribunal como uma Corte política com a tarefa de punir exemplarmente e prevenir que ocorressem novas atrocidades. 320