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À medida em que os novos servidores começam a ter mais conhecimento sobre o trabalho, os valores e a cultura da organização (CHATMAN, 1991), provavelmente surgem diferenças entre o que era esperado e o que foi efetivamente vivenciado. E cada indivíduo tem suas expectativas e atribui um significado próprio a estas divergências (LOUIS, 1980). Se com o passar do tempo o indivíduo perceber que a instituição não está cumprindo com suas obrigações e que a situação não é como a inicialmente prevista, isso pode resultar em deduções negativas sobre a instituição e levá-lo a ficar desapontado, ou até mesmo sentir-se enganado (WANOUS, 1973).

Tal comportamento encontra suporte em pesquisas anteriores sobre o atendimento das expectativas iniciais (SUTTON E GRIFFIN, 2004) e as violações de um contrato psicológico (MORRISON e ROBINSON, 1997; ROUSSEAU, 1989). Isso sugere que os compromissos não cumpridos levarão a reações negativas com o trabalho, ao longo do tempo, e irão atenuar eventuais sentimentos positivos. Por outro lado, o cumprimento dos compromissos pode levar o indivíduo a ficar "vacinado" contra os elementos desagradáveis do trabalho, facilitando a adaptação e gerando reações favoráveis e duradouras em relação ao trabalho (WANOUS, 1973, 1977).

Assim, embora os indivíduos geralmente experimentem um certo nível de descontentamento à medida em que se estabelecem e conhecem os elementos ruins de seu trabalho (CHATMAN, 1991; VAN MAANEN, 1975), é esperado que à medida em que o indivíduo perceba que os compromissos são cumpridos pela organização, mais forte seja a reação positiva em relação ao trabalho, menor seja a desilusão com o trabalho e menor o declínio, com o tempo, do grau de satisfação (WANOUS, 1977; BOSWELL et al., 2009).

O não atendimento das expectativas (ou a violação do contrato psicológico) pode ter consequências tanto para os indivíduos quanto para as organizações, incluindo insatisfação com o trabalho e redução do comprometimento dos funcionários (ROUSSEAU, 1989). Por isso, o gerenciamento do contrato psicológico é essencial para o sucesso da organização (ROEHLING, 1996).

O não atendimento das expectativas iniciais deve afetar em graus diferentes as dimensões do comprometimento (MEYER, BOBOCEL E ALLEN, 1991), sendo mais intenso nas dimensões normativa e, principalmente, afetiva e em menor extensão na instrumental (CUNHA et al., 2007).

O estudo do contrato psicológico ganha importância para a compreensão das relações entre as instituições e seus empregados, principalmente nos comportamentos destes (ROUSSEAU, 1996). Quando um indivíduo percebe a violação do contrato psicológico, ele reage de acordo com seu sentimento e isso pode resultar na transformação da natureza do contrato, de relacional em transacional, por exemplo, "de tal modo que a lealdade e 'entrega' são substituídas pelo desprendimento e pelo 'mero' cumprimento das obrigações contratuais" (CUNHA et al., 2007, p. 219).

Assim, a partir do conceito de que a satisfação e o comprometimento, em suas três dimensões, são variáveis de resultado, ou seja, são critérios pelos quais é possível medir o sucesso de uma determinada prática ou os efeitos do atendimento ou não das expectativas iniciais dos empregados (SUTTON E GRIFFIN, 2004), por exemplo, propõem-se as seguintes hipóteses:

H1: O cumprimento do contrato psicológico pela RFB, na percepção dos servidores, é positivamente relacionado com o grau de satisfação com o trabalho destes servidores.

H2a: O cumprimento do contrato psicológico pela RFB, na percepção dos servidores é positivamente relacionado com o grau de comprometimento organizacional destes servidores.

H2b: A percepção de cumprimento do contrato psicológico pela RFB influencia mais fortemente a dimensão afetiva do comprometimento organizacional, em relação às dimensões normativa e instrumental.

H3a: O cumprimento do contrato psicológico pelos servidores, na percepção deles, é positivamente relacionado com o grau de satisfação destes servidores.

H3b: O cumprimento do contrato psicológico pelos servidores, na percepção deles, é positivamente relacionado com as três dimensões do comprometimento organizacional destes servidores.

É no momento da entrada na organização que as questões de aprendizagem e de ajuste à organização são predominantes e mais preocupantes para os novos funcionários (KLEIN E WEAVER, 2000; VAN MAANEN E SCHEIN, 1979). Por isso, uma socialização efetiva

pode gerar efeitos positivos duradouros nos graus de satisfação com o trabalho e comprometimento destes empregados (MORRISON, 1993; SAKS E ASHFORTH, 1996).

Por outro lado, a ausência de um processo de socialização pode causar um sentimento de frustração nos novos funcionários, que se sentiriam desconectados da instituição e, consequentemente, não reagiriam de forma positiva para o trabalho. Isso provocaria um forte declínio no grau de satisfação em virtude de dificuldades em assimilar a nova função (BOSWELL et al., 2009).

O conhecimento e os conteúdos relacionados ao seu papel na organização são cruciais para o ajustamento de um indivíduo e influenciam diretamente suas reações e resultados posteriores (BAUER et al., 2007, TAORMINA, 2004; KAMMEYER-MUELLER e WANBERG, 2003).

A compreensão das normas, dos valores organizacionais e das funções e prioridades de trabalho deve ajudar um recém-chegado a dar significado e a lidar com aspectos imprevistos e menos atraentes do trabalho. Como consequência, será mais fácil aceitar e adaptar-se à nova situação, o que sugere uma reação mais positiva em relação ao trabalho. Por outro lado, sem esse conhecimento e compreensão, os recém-chegados são menos preparados para lidar com as situações em que são "confrontados com a realidade de seus papéis organizacionais" (BOSWELL et al., 2009; MAJOR et al., 1995).

No momento da chegada é natural que um novo funcionário esteja ansioso e tenso, por conta do desconhecimento de seu papel. Neste momento em que quase tudo é novo e diferente, a preocupação do empregador em disponibilizar as informações necessárias, via processo de socialização, tende a aumentar o nível de satisfação e comprometimento do funcionário (ALLEN E MEYER, 1990).

Em correspondência, dentre as três dimensões propostas no modelo adotado nesta dissertação, é esperado que as dimensões da tarefa e do grupo de trabalho, por responderem as questões mais urgentes dos novos servidores (FELDMAN, 1981; HAUETER, MACAN E WINTER, 2003), apresentem relação mais forte, do que a dimensão organizacional, com os graus de satisfação e comprometimento (HAUETER, MACAN E WINTER, 2003).

Especificamente quanto ao comprometimento organizacional, estudos anteriores apontam que as dimensões afetiva e normativa (CLUGSTON, 2000, MEYER et al., 2002) são mais afetadas pelo processo de socialização.

Assim, para medir os efeitos do processo de socialização organizacional (FELDMAN, 1981) sobre os graus de satisfação e de comprometimento dos novos servidores propõe-se as seguintes hipóteses:

H4: O grau de satisfação com o trabalho é positivamente relacionado com a medida de socialização dos novos servidores, em especial nas dimensões tarefa e grupo de trabalho.

H5: O grau de comprometimento organizacional é positivamente relacionado com a medida de socialização dos novos servidores.

As razões que estimulam uma pessoa a decidir desenvolver sua carreira no setor público são diversas. Neste sentido, experiências profissionais anteriores influenciam o processo de tomada desta decisão, aí incluídos fatores situacionais como, por exemplo, estresse, remuneração e oportunidade de crescimento (GRIFFETH, HOM E GAERTNER, 2000). Também entram na equação fatores disposicionais, como a personalidade e as características demográficas (sexo e idade, por exemplo). Boswell, Boudreau e Tichy (2005) indicam que a existência de outras possibilidades de emprego, igualmente atrativas, pode reduzir o grau de satisfação com o emprego atual.

Porém, um fator determinante para a decisão de mudar de emprego é a insatisfação com este emprego - anterior ao cargo público atual, no caso desta pesquisa (BOSWELL et al., 2009; HARRISON, NEWMAN E ROTH, 2006). No estudo dos efeitos de certos fatos sobre o comportamento humano não se pode esquecer que as pessoas trazem uma "bagagem" de experiências anteriores e algumas delas podem interferir nas suas percepções e nas suas expectativas, moldando suas reações (BOSWELL et al., 2009).

Desta forma, por exemplo, a insatisfação com o emprego anterior pode ter sido decisiva na mudança de emprego e ter criado grandes expectativas quanto ao novo trabalho (BOSWELL, BOUDREAU E TICHY, 2005; WANOUS, 1977). Estas reações são decorrentes da comparação entre as duas situações e sugere as seguintes hipóteses:

H6: o grau de satisfação com o emprego anterior é relacionado negativamente com o grau de expectativas iniciais, nas dimensões desenvolvimento, desempenho, lealdade e estabilidade.

H7: O grau de satisfação com o emprego anterior é negativamente associado ao grau de satisfação com o emprego atual.

Quanto à satisfação, em que pese haver teorias que defendem que é o comprometimento que fomenta a satisfação (BATEMAN E STRASSER, 1984), neste estudo ela será considerada como antecedente do comprometimento (BROWN E PETERSON, 1993), de forma consentânea às pesquisas que apontam que as pessoas mais satisfeitas tendem a apresentar níveis maiores de comprometimento normativo e, em especial, afetivo (CUNHA et al., 2007; ALLEN E MEYER, 1996; REGO et al., 2004).

H8a: o grau de satisfação com o trabalho é relacionado positivamente com o grau de comprometimento organizacional, nas suas dimensões normativa e afetiva.

H8b: o grau de satisfação com o trabalho é mais fortemente relacionado com o grau de comprometimento afetivo do que com o grau de comprometimento normativo.

4 METODOLOGIA

Este capítulo detalha o caminho seguido na pesquisa, o universo e a amostra estudados, as formas por meio das quais os dados foram coletados, bem como a metodologia que auxiliou este processo.

A pesquisa foi realizada no âmbito da Receita Federal do Brasil e observou as peculiaridades do órgão, dentro do possível. Entretanto, sua aplicação não fica restrita à RFB, podendo ser aproveitada por outras instituições de natureza semelhante.

Segundo Yin (2010), o método do estudo de caso é o mais adequado quando as questões "como" e "por que" são propostas para estudar um fenômeno contemporâneo, inserido em um contexto real e sobre o qual o investigador tem pouco controle. Assim, considerando o até aqui exposto, o presente trabalho enquadra-se perfeitamente nesta definição.

Uma questão a ser considerada diz respeito ao grande número de respondentes e ao fato de que eles encontram-se dispersados por todo o território nacional, o que aponta o questionário como o meio de coleta mais indicado (VERGARA, 2009).

Desta forma, para a coleta de dados no campo, especificamente quanto aos constructos-chave da pesquisa, foram desenvolvidos questionários auto-administrados, contendo exclusivamente questões fechadas para cujas respostas foi utilizada uma escala de classificação tipo likert, de 5 pontos. Algumas outras questões (abertas e fechadas) também foram elaboradas para identificação de dados demográficos dos respondentes.

Cada parte dos instrumentos de coleta (descritos na seção 4.2) contém questões relativas a um constructo específico, sendo que estas questões foram distribuídas de forma alternada, considerando as dimensões que compõem o constructo. Desta forma, por exemplo, as 20 questões que buscam identificar o grau das expectativas iniciais dos servidores estão distribuídas alternadamente, considerando as 5 dimensões propostas por Rousseau (2000).

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