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CONSTRUÇÃO E RECONSTRUÇÃO, DESCOBERTA E REDESCOBERTA.

No documento MOISÉS DAVID DAS NEVES (páginas 105-114)

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3.5 CONSTRUÇÃO E RECONSTRUÇÃO, DESCOBERTA E REDESCOBERTA.

Fundamentando-se no cognitivismo de Piaget, na abordagem sociocultural de Vygostky e no construtivismo de Driver, Krasilchik (2011) diz que o processo do ensino de biologia deve ser adaptado à maneira como o raciocínio se desenvolve, devendo enfatizar o aprendizado ativo e envolver os estudantes em “atividades de descoberta”. Marandino, Selles e Ferreira (2009), por sua vez, dizem que o professor deve evitar que nos alunos se consolide a imagem de ciência como processo de “descoberta ou redescoberta” de verdades estabelecidas, considerando que o conhecimento é um processo de construção.

São duas opiniões divergentes, a exemplo de outras que vi ao longo da revisão bibliográfica para esta dissertação, que parecem refletir um efeito colateral da consolidação do paradigma construtivista no ensino de ciências, um conflito que pode ser sintetizado na seguinte pergunta: o fato de o conhecimento ser construído exclui necessariamente a noção de descoberta?

Ao ser confrontado com esta observação, me senti instigado a buscar compreender um pouco mais a questão, já que a ABP é também uma abordagem construtivista e corresponde ao contexto pedagógico da minha investigação.

Cachapuz et al (2011) defendem o construtivismo como um “consenso emergente” na educação em ciências, resultado de investigações específicas com vistas a melhorar os fracos resultados obtidos com o paradigma da aprendizagem por transmissão/recepção.

Segundo Valadares (2011), o construtivismo ganhou força na década de 1990, sendo reconhecido pela Associação Americana para o Progresso da Ciência como uma mudança paradigmática na educação científica. Moreira (1997, p.19) destaca que hoje quase não se fala mais em estímulo, resposta, reforço positivo e outras expressões características do behaviorismo (comportamentalismo). Ele ressalta que “é provável que a prática docente ainda tenha muito do behaviorismo, mas o discurso já é cognitivista/construtivista/ significativo”.

Valadares (op. cit.) diz que com a aceitação generalizada do construtivismo e o reconhecimento de sua eficácia pedagógica, as principais críticas surgidas são de ordem epistemológica. A discussão é eminentemente filosófica.

De acordo com o autor, há diversas formas de construtivismo. Em um ponto extremo está o construtivismo radical de Ernst Von Glaserfeld (1917-2010), para quem a cognição serve à organização do mundo experiencial e não à descoberta da

realidade ontológica objetiva. Para Glaserfeld, a existência de um mundo real, independente da razão, é apenas viável.

Igualmente radical é o construtivismo social, que vai muito além de realçar a influência dos fatores sociais na produção do conhecimento, sendo marcado por um idealismo linguístico. Os construtivistas sociais chegam a afirmar que “o mundo é constituído pela nossa linguagem” (VALADARES, 2011, p.46).

É bem diferente da abordagem sociocultural de Vygotsky (ver p. 41), em que predomina a ideia de mediação entre sujeito e objeto, operada pelos símbolos da linguagem: não se pode ter acesso direto à realidade, mas a recortes do real.

Valadares (idem) acrescenta que, de modo geral, o cerne da questão é o confronto filosófico clássico entre empirismo X racionalismo, realismo X idealismo, ceticismo X dogmatismo51, debate que tem atravessado os séculos.

O construtivismo tem afirmado que o conhecimento não é transmitido nem descoberto. Driver et al (1999), por exemplo, defendem que o conhecimento científico é socialmente construído, validado e comunicado. Por isso, apresentam uma perspectiva de aprendizagem das ciências como processo de enculturação e não de descoberta.

A autora e seus colaboradores argumentam ainda que o estudo empírico do mundo natural, por si só, não resulta em conhecimento científico, porque este é, por natureza, discursivo, envolvendo trocas sociais. Daí entidades ontológicas como átomos, elétrons, genes e cromossomos dificilmente seriam descobertos através de observações individuais.

Por outro lado, eles afirmam que uma visão do conhecimento científico como socialmente construído não precisa ser necessariamente relativista, atitude dos que acreditam que não há como saber se o conhecimento é um reflexo “verdadeiro” do mundo. Consideram que uma posição razoável nesta polêmica é que o progresso científico, ainda que socialmente construído e validado, tem base empírica.

51 Para o empirismo, todo conhecimento deriva, direta ou indiretamente, da experiência sensível, das

percepções; o racionalismo considera a razão como fundamento de todo o conhecimento e que esta é capaz de chegar à verdade sobre a natureza das coisas. O realismo é a concepção filosófica segundo a qual existe uma realidade exterior, determinada, autônoma, independente do conhecimento que se pode ter sobre ela; o idealismo, por sua vez, reduz o objeto do conhecimento ao sujeito conhecedor e, no sentido ontológico, equivale à redução da matéria ao pensamento ou ao espírito, ou seja, o mundo real não existe, é fruto da construção racional; o dogmatismo é toda doutrina ou atitude que admite a possibilidade, para a razão humana, de chegar a verdades absolutamente certas e seguras; para o ceticismo, o conhecimento do real é impossível à razão humana, portanto o homem deve renunciar a certeza e submeter toda afirmação a uma dúvida constante (JAPIASSÚ e MARCONDES, 2006).

Vejo nesta posição o interacionismo entre o sujeito e o objeto cognoscível. Meditando nesta perspectiva, uma pergunta me ocorre: não poderia haver construção e descoberta simultaneamente? De um lado o sujeito que constroi novos esquemas mentais, novos significados e interpretações, e de outro o objeto que, neste processo, é desvelado52? O que me leva a fazer essa indagação é o que se descortina para mim nas entrelinhas de alguns autores, conforme mostro a seguir.

Cachapuz et al (2011), por exemplo, apresentam como construtivista sua proposta da Aprendizagem como Investigação Orientada, mas se preocupam em desvinculá-la do construtivismo radical de Glaserfeld. O próprio termo investigação pressupõe uma abertura à compreensão de que existem os dois lados – a construção e a descoberta –, pois investigar é “fazer diligências para descobrir algo”, segundo o dicionário Houaiss (2009, p. 1105).

Porém, em função da repercussão do discurso construtivista, é compreensível pensar que construção exclui descoberta. Silva e Zanon (2000, p. 121), por exemplo, ressaltam que a prevalência da visão de que a ciência “está na realidade à espera de ser descoberta” é um reflexo do empirismo-indutivismo dominante nos contextos escolares, “em detrimento da valorização da capacidade criadora do sujeito que se transforma ao transformar/criar o real colocado em discussão”. A opinião é consistente e coerente com as críticas ao modo como a ciência é apresentada em sala de aula na maioria das vezes. O ponto que quero destacar é que criação e descoberta são colocadas em extremos opostos. E criação aqui é entendida como processo de construção criativa.

Já Hodson (1994, p. 9) parece não enxergar tal conflito, escapando a esse dualismo quando diz que “um novo achado é o produto de uma atividade social complexa, que se origina no ato individual de descoberta ou criação” (grifo meu).

Referindo-se à disputa acalorada entre “subjetivismo exagerado num canto e objetivismo excessivo no outro”, Demo (2011a, p. 48) diz que se pode duvidar que Piaget tenha buscado uma posição extremista ao lançar as bases do construtivismo cognitivo. De fato, nos escritos do epistemologista suíço predomina a noção de interacionismo entre sujeito e objeto.

52 O desvelamento corresponde à aletheia, a retirada do véu, o descobrimento daquilo que estava

oculto, a verdade para Platão. Na metafísica de Heidegger, o ser da coisa se desvela, manifesta-se nas condições mesmas de seu aparecer, de seu fenômeno, sendo a verdade a manifestação do ente, quando ele deixa de ser ocultado pelas preocupações da vida (JAPIASSÚ e MARCONDES, 2006).

Na opinião de Demo (2011a), o mérito de Piaget, apresentado por ele como o pai do construtivismo53, foi divisar que a aprendizagem é, na essência, fenômeno construtivo e não dá saltos lineares, pois incorpora os estágios anteriores.

Diante disso e “para evitar mal entendidos”, Demo (2011a, p. 48) prefere usar o termo “reconstrução”. O autor justifica que a mente humana, em vez de simplesmente armazenar dados e informações, os processa, reconstroi, redimensiona, revelando a capacidade de interpretação própria. Uma frase usada com frequência por ele, referindo-se ao trabalho de pesquisa bibliográfica, é que “lemos os autores para nos tornarmos autores” (DEMO, 2011b, p. 96).

Por conta da atividade de processar e reprocessar as informações é que a aprendizagem se torna significativa, naturalmente criativa e crítica, não repete na situação B o que havia na situação A. Pelo contrário, agrega qualidades que não estavam presentes antes. Aprendemos do que já tínhamos aprendido, partimos do que já existe, por isso é reconstrução (DEMO, 2001a).

Segundo o autor, é difícil a argumentação ser construtiva, porque isto implica extrema originalidade. Para ele, o primeiro gesto do conhecimento é desconstrutivo (questionador), com a ressalva de que todo questionamento só é coerente se for ao mesmo tempo autoquestionamento. O segundo ato é reconstrutivo (propositivo) e traz uma condição: precisa permanecer sempre aberto, discutível (DEMO, 2011b).

Entendendo o conhecimento como “dinâmica disruptiva e rebelde”, sempre em processo de desconstrução e reconstrução, o autor considera natural que validades sejam relativas e verdades sejam aproximativas: “não vemos as coisas como são, mas como somos” (DEMO, idem, p. 66). A afirmação é baseada no que Maturana54 chamou de autopoiese, fenômeno de autorreferência em que nossa mente entende os significados a partir de si, tendo a si como sujeito.

Por isso, Demo (2011b, p. 111) acrescenta que “não temos da realidade externa cópia reproduzida, mas construção mental à nossa imagem” – o grifo é meu, visando destacar que mesmo o autor declarando sua preferência pelo termo reconstrução, vez por outra volta a usar construção. Ou seja, as limitações dos termos que usamos para definir conceitos ora incomodam mais, ora incomodam menos. Da mesma forma, incomodam mais a uns do que a outros.

53 Vale lembrar que o construtivismo no Brasil já foi muito associado com Emília Ferrero, pela difusão

em toda a América Latina de sua metodologia para a alfabetização infantil. Ela repensou o processo de aquisição da escrita e da leitura, verificando que as atividades de interpretação e de produção da escrita começam antes da escolarização. Por isso, considera a cartilha obsoleta, porque a criança já traz um sistema próprio de concepções quando chega à escola. Argentina radicada no México, ela foi orientanda de doutorado e colaboradora de Piaget na universidade de Genebra (GADOTTI, 2006).

No texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (BRASIL, 1998), por exemplo, foi feita a opção pelo termo “reconstrução do conhecimento” (ver p.88). Outros autores (KOMATSU et al, 2003; CACHAPUZ et al, 2011) preferem usar (re)construção, com o prefixo destacado entre parênteses, visando deixar claro a compreensão ampla do seu significado (ver p. 40 e 94).

Semelhante raciocínio vale para os conceitos de descoberta/redescoberta. É preciso saber em que sentido estão sendo usados: se definem situações diferentes ou a mesma coisa apenas com outras palavras. No caso de construção/ reconstrução está claro que se referem ao mesmo fato, apenas ressaltando mais um aspecto (nós construímos) ou outro (não construímos a partir do nada). Constatei que processo semelhante acontece com os termos descoberta/redescoberta. Mas há também outro uso para redescoberta, como mostrarei na sequência.

A descoberta foi defendida por Bruner como o meio principal de aprendizado. Neste contexto, é entendida como a percepção de similaridades e relações diante da exploração de conteúdos alternativos (ver p. 35). Driver et al (1999) dizem que tradicionalmente a aprendizagem por descoberta tem sido vinculada à construção do conhecimento como processo individual, ignorando-se o aspecto da produção social. David Ausubel, por sua vez, diz que o aluno aprende tanto por recepção (conteúdo repassado pronto em aulas expositivas) quanto por descoberta. Em ambos os casos, a aprendizagem pode ser significativa, dependendo de ativar subsunçores. Ele usa o termo descoberta para as relações conceituais que o aluno faz sozinho ou em grupo durante a elaboração do conhecimento (MOREIRA, 2006).

Apesar de incluir a aprendizagem por descoberta, a teoria ausubeliana é apresentada por Moreira (1997) e Valadares (2011) como construtivista, evidenciando que descobrir e construir não são atividades excludentes.

De acordo com Valadares (idem), o que está implícito é que o processo de atribuir significados é claramente uma construção cognitiva do sujeito, de cunho pessoal e idiossincrático ou compartilhado pelo processo social. Porém, os links e mapas conceituais construídos podem mostrar diferentes nuances do objeto de estudo ou conduzir a novas descobertas.

De acordo com Cardoso (2003), como a descoberta que o estudante faz muitos outros já fizeram, esta é na verdade uma redescoberta. Assim sendo, a exemplo de construção/reconstrução, alguns preferem usar descoberta, como Hodson (1994), enquanto outros se sentem mais à vontade com o termo redescoberta, como Cardoso (idem), que optou por destacar inclusive o prefixo (re).

Creio que, do ponto de vista de quem está se deparando com o fato pela primeira vez, este não deixa de ser um achado, marcado pela satisfação, o prazer e a alegria. O mesmo vale para um pesquisador em início de carreira ou experiente. Ao se deparar com algo novo aos seus olhos, corre para os bancos de pesquisa a fim de verificar se de fato fez uma descoberta ou uma redescoberta.

Há porém, no ensino de ciências, outra acepção para o termo redescoberta. Refere-se à metodologia tradicional de experimentação escolar, em que o aluno recebe todas as instruções para constatar uma teoria na prática. O ambiente não é diretamente investigativo, pois o experimento é executado pelo aluno, mas planejado pelo professor ou pelas obras didáticas, incluindo os resultados (AMARAL, 1997).

Em outras palavras, é a famosa receita de bolo. Corresponde ao nível 1 dos quatro níveis apresentados por Krasilchik (2011) para a forma como um experimento pode ser abordado com os alunos.

Se há descoberta, no sentido de se encontrar algo novo do nosso ponto de vista, baseado na autorreferência, o que é que este processo nos revela do mundo?

Segundo Demo (2011b), podem e devem ser questionados os exageros construcionistas por parte dos que, criticando o positivismo, apostam que a realidade não existe e é apenas uma construção da nossa mente. Ele acredita que o mundo real independe da nossa observação e construção cognitiva para existir, embora não se deva ignorar que a pretensão de devassa total e final parece impraticável.

Lawson (2000) também aborda o assunto e afirma que a crença de que a humanidade adquire conhecimento seguindo o padrão de argumento se / então /

portanto implica aceitar que a verdade absoluta sobre toda e qualquer ideia é

inatingível, incluindo o fato de que o mundo externo existe. Isso porque o padrão depende da geração e comprovação de hipóteses e é consenso que estas podem ser apoiadas ou refutadas, mas nunca defitivamente provadas ou falsificadas.

Por outro lado, ressalta que a aprendizagem em todos os estágios, desde o sensório-motor, na mais tenra infância, exige que se assuma a existência de um mundo externo independente e cognoscível. Caso se faça a suposição contrária, negando o que oconhecimento sensório-motor estar dizendo, a consequência pode ser infeliz (pense num carro vindo em sua direção, sugere o autor). É somente pelo confronto com o objeto e seus comportamentos (fenômenos) que podemos testar nossas representações, ideias e teorias (LAWSON, idem).

Sobre isso, Valadares (2011) destaca que sem objetos e acontecimentos sobre os quais incida a construção do conhecimento, este não existiria.

não são diretamente "dadas" no contexto das experiências de aprendizagem atuais, mas obtidas a partir das experiências armazenadas na memória de longo prazo ou construídas a partir da interação com novos estímulos sensoriais.

Lawson (2000, p. 592) afirma que desacreditar na existência de um mundo real não leva a lugar nenhum. Mas pergunta aonde um cientista pode chegar acreditando na existência de um mundo externo e cognoscível? O próprio autor responde: em um pouco da realidade absoluta, dentro dos limites aceitos, mas certamente mais próximo de desenvolver representações mentais viáveis do mundo. Ele acrescenta que isso tem sido suficiente para o progresso científico, ainda que obtido “aos trancos e barrancos e com algum retrocesso”55.

Demo (2011b) diz que a tendência é se imaginar uma confluência entre ontologia (como seria a realidade) e epistemologia (como explicá-la), mas todo esforço para atingi-la é reducionista, permanecendo a forte impressão de que nossa visão é limitada, mesmo escudada em método cientifico.

O reducionisno é da mente, não da realidade. Por isso toda pesquisa que descobre também encobre a realidade, revela o que conseguimos captar, mas sempre deixa algo oculto – aliás, é isto que move a ciência. O tom reducionista não seria necessariamente um defeito do método, mas sua condição natural (ibidem).

Considerando esta “realidade” implacável a respeito da nossa mente, o que podemos descobrir então da realidade do mundo? Demo (idem) fala em termos de aproximação das possíveis formas invariantes ou leis que regem o universo.

Ou seja, tudo está em constante mudança, como acredita a dialética; mas ainda assim haveria algo imutável, absoluto, invariante, como pensa a metafísica.

Se as leis da natureza são de fato verdadeiras ou apenas fruto da criação humana, é outra grande discussão ligada ao dualismo construção ou descoberta do conhecimento, de acordo com Santos (2012). Ele destaca que a possibilidade de as leis existirem independentemente das teorias humanas implica que alguma entidade as criou, conduz a uma ideia intrínseca de um ser criador.

Diante desta possibilidade, só existem duas opções. Na versão “descobrir”, é como se houvesse uma caixa fechada com um conjunto de leis que regem o universo. E nós, os seres fora da caixa, tentamos chegar o mais perto possível. Mesmo que não consigamos, sabemos que elas estão lá. Já na versão “construir”, tal caixa não existe, nem leis pré-existentes. Tudo que fazemos é representar o universo da melhor maneira que podemos (ibidem).

55 Tradução minha para “but that progress is by no means without fits and starts and some

Santos (idem) diz que particularmente prefere a segunda opção, mas que há quem acredite que a humanidade pode abrir esta caixa, como o físico americano Steven Weinberg. No livro Sonhos de uma teoria final, ele diz que estamos chegando cada vez mais perto das verdadeiras leis da natureza.

Demo (2011b, p. 17) também cita outros autores que pensam assim, mas diz que a “ameaça” de Anil Ananthaswamy56 parece mais real: “por volta de 96% do universo não pode ser explicado com as atuais teorias. Todos os nossos esforços para entender o mundo material iluminam apenas pequena fração do cosmos”.

Como se posicionar diante de tantas opiniões divergentes?

Valadares (2011) apresenta o construtivismo humano, que Novak formulou a

partir da teoria de Ausubel, como uma proposta moderada e superadora de tensões. O construtivismo humano se assenta nos seguintes princípios:

- O conhecimento científico constroi-se através de uma interação complexa entre sujeito e objeto, onde nem um nem outro tem uma hegemonia epistemológica.

- Os seres humanos são criadores de significados.

- Os significados acerca da experiência humana vão-se modificando através de um pensamento afetivamente “contaminado” e ações.

- O objetivo da educação é a construção de significados compartilhados. - Os significados compartilhados podem ser facilitados pela intervenção ativa de professores bem preparados.

- A produção intelectual ao mais alto nível é uma construção de significados e uma forma altamente original e criativa de aprendizagem significativa, que deverá servir de ideal à aprendizagem de qualquer indivíduo, que deve procurar caminhar no sentido de uma aprendizagem significativa autônoma e criativa (VALADARES, 2011, p, 49).

Valadares (idem) acrescenta que o construtivismo humano respeita o pressuposto de Piaget de que subjacente a uma teoria de aprendizagem consistente existe sempre uma epistemologia adequada.

Um ponto de vista consistente estaria na filosofia de Kant (1724-1804), que fez a crítica da razão pura (o confiar demais na razão leva ao dogmatismo), ao mesmo tempo que criticou o empirismo (o medo dos erros dogmáticos da razão reduz tudo à experiência). Kant chegou à essa proposta – o criticismo – depois de ter passado pelos extremos do dogmatismo e do ceticismo (VALADARES, 2011; JAPIASSÚ e MARCONDES, 2006).

56 Editor de física da New Scientific em Londres, Anil Anantashaswamy percorreu vários lugares da

Terra para escrever o livro “The edge of physics: a journey to earth´s extremes to unlock the secrets of the universe”, publicado em Nova York, em 2010.

Para Valadares (2011, p. 54), a função da ciência é conhecer os fenômenos e coisas como estes se revelam aos nossos sentidos e à nossa mente: “nunca podemos ter acesso objetivo à verdade das coisas em si, independentes, mas podemos acessar a verdade das coisas como elas se nos apresentam”.

Colocar o pêndulo na posição de equilíbrio é o que me atrai. Sabemos que conhecemos muitas coisas da realidade que nos cerca – detalhes cada vez mais específicos e impressionantes dos nossos corpos, leis da física que desafiam qualquer noção de tempo e espaço, galáxias paralelas... Sabemos também que não conhecemos toda a amplitude das coisas que conhecemos. E desconhecemos qualquer noção da infinitude das coisas que desconhecemos57.

Por acreditar na possibilidade de a construção cognitiva não excluir o ato da descoberta, encerro este capítulo com um texto de Paulo, o grande filósofo bíblico:

Agora, pois, vemos apenas um reflexo obscuro, como em espelho58; mas, então, veremos face a face. Agora conheço em parte; então, conhecerei plenamente, da mesma forma como sou plenamente conhecido.

(I Carta aos Coríntios, cap. 13:12. Bíblia - Nova Versão Internacional)

Paulo estava se referindo à possibilidade de conhecermos a verdade absoluta, apresentada como Deus. Assumindo a hipótese de um Deus que criou o céu, a terra, o mar e tudo o que neles há, se não podemos conhecê-lo plenamente agora, por analogia também não podemos conhecer todas as coisas criadas, pelo

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