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2. Paternidades de apoio

2.2. Os filhos precisam tanto do apoio da mãe como do apoio do pai: o apoio como

2.2.2. Construções do ‘apoio de pai’

A matriz de acção do «apoio» é fortemente orientada para a realização de um projecto de descendência, principal requisito colocado a um casamento que se quer também acalentado pela compreensão mútua e pela união no casal.

«Atrás de toda essa compreensão mútua do casal vem o apoio, vem tudo.»

António

A paternidade é, assim, inscrita num ideal de forte partilha, de consenso, de entreajuda e de complementaridades entre o casal, tanto expressivas como instrumentais, tanto individuais como de género. Indicando que está igualmente ancorada na representação do casal fusional. Mas, ao contrário da paternidade conjunta, trata-se agora de uma fusionalidade de tipo bastião: empenhada em tecer um «ninho» harmonioso de bem-estar afectivo e material, em que cada um dá a sua contribuição para o todo; e fechado sobre si mesmo,

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protector, portanto, dos riscos das influências externas, que podem colocar em perigo os relacionamentos conjugal e parental, assim como a integração familiar e social da criança (Aboim 2006; Kellerhals et al., 1982; Kellerhals e Widmer 2005; Wall 2005; Widmer, Kellerhals e Levy 2003). Contudo, trata-se de uma variante do estilo mais clássico das interacções bastião52, que indica a sua transformação pelo entrelaçamento com lógicas companheiristas. Estas amenizam as lógicas estatutárias e de diferenciação complementar de género, características do bastião, e acentuam as de flexibilidade, expressividade e privatização na definição de lugares e papéis na partilha parental, criando um bastião

modificado. Assim, a ideia de complementaridade diferenciada dos géneros na parentalidade,

que tende a pautar este tipo de interacções familiares, passa a acolher tanto diferenças identitárias e de lugares e esferas de acção, como também equivalências nalgumas práticas parentais.

Ora, um dos domínios em que o entrelaçamento com lógicas companheiristas é perceptível é o cuidar masculino, que é implicado e abrangente desde o nascimento da criança. Estes são homens que entram no mundo dos cuidados à criança logo após o seu nascimento, pois o cuidar é uma forma de apoiar os filhos e a parceira. Assim, mudar fraldas, dar e preparar biberões, papas e sopas, dar banhos, vestir, levantar de noite, adormecer e confortar, levar e buscar à creche ou ao médico, etc., são práticas que incluíram logo no seu quotidiano. Olhemos, então, para as experiências de Cláudio e António.

Cláudio começou a cuidar da sua filha logo que esta chegou a casa. Aliás, recorda que se sentia um pouco frustrado por não poder fazer mais, dadas as limitações que se colocam ao pai durante o período de amamentação da criança:

«Eu fazer, fazia. Mas, para dizer a verdade, nos primeiros meses o pai pouco pode fazer. Dar de comer não podemos, damos-lhe banho, mudamos fraldas…de noite estava no nosso quarto ao lado dela [a mãe]. Portanto, o bebé, quando é de poucos meses, baseia-se nisso.»

Quando a filha do casal tinha 1 ano, Teresa, que trabalhava num supermercado, foi colocada numa outra cidade a duas horas de distância. Então, passou a ser Cláudio a ocupar-se da criança, bem como das refeições familiares. Foi assim durante cerca de 3 anos. Cláudio recorda deste período sobretudo as dificuldades que sentiu em lidar sozinho com os comportamentos usuais de uma criança desta idade e como até aí não tinha noção de quão difícil pode ser cuidar de uma criança:

«Foi terrível. Eu lembro-me que, quando ia levá-la para a creche de manhã, que era todos os dias o mesmo cenário de não querer se vestir, era não! não! não!…, depois chegava a casa não

52 O estilo bastião mais comum será abordado no ponto seguinte quando apresentarmos as paternidades

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queria tomar banho, não queria comer, não queria dormir: era horrível. Foi diariamente assim. Então, foi aí que eu comecei a ver que o trabalho de ser mãe é extremamente difícil.»

Mas encara também esta experiência como algo fundamental para o pai que se tornou. Com efeito, ainda que anteriormente já fosse um participante activo nos cuidados à filha, não tinha a noção da importância do que fazia. Durante este período, ao mesmo tempo que nele cresceu a consciência da importância da mãe nos cuidados à criança, também cresceu a da sua importância.

«Era capaz de me ocupar da minha filha tão bem como a minha mulher.»

Cláudio

Até porque adquiriu competências parentais acrescidas e criou laços de proximidade com a filha, que sabe serem pouco comuns.

Já António, quando o seu primeiro filho nasceu, tinha já a experiência de cuidar de bebés que adquiriu na sua juventude, quando cuidou do seu primo dos 3 meses aos 5 anos. Por outro lado, era forte a sua vontade de participar no quotidiano dos cuidados ao filho. Então, sempre insistiu em ser uma parte activa e desenvolta nos cuidados ao filho e o mesmo aconteceu com a sua segunda filha.

«Qualquer momento que a gente tivesse, era só para o miúdo, era só para ele, principalmente eu.» (…) Nunca tive problemas em fazer e sempre me desenrasquei, nunca senti dificuldades, desde o dar o banho, mudar a fralda, fazer as papas, fazer as sopas, fazer o biberão de noite…. Eu vejo o apoio que é preciso….»

Com efeito, na paternidade de apoio, à semelhança da paternidade conjunta, são construídas equivalências entre as práticas maternas e paternas no cuidar, pela auto- suficiência masculina. Mas aqui o cuidar é o principal domínio parental onde estas são estabelecidas (veremos, mais adiante, que estão também presentes em algumas esferas do fazer doméstico). É também contrabalançado com a predisposição para crer de que o cuidar é um domínio de competências e identidades femininas naturalizadas.

«A mulher tem um sexto sentido perante a criança. Se ela é que a cria nela… é lógico.»

António

O que expressa a sua convicção de que a mãe tem sempre um papel mais abrangente do que o pai neste domínio. Contudo, na paternidade de apoio esta predisposição é contrabalançada por outra: a da importância do pai para a criança, que leva o homem a achar que os laços com os filhos devem começar a ser nutridos desde o nascimento.

«O filho precisa tanto do apoio da mãe como precisa do apoio do pai (…). Uma criança recém- nascida, se o pai estiver junto, ela reconhece tanto o pai como a mãe, ouve os dois sons. E talvez amanhã, ou daí a x meses, a criança não fuja mais para o colo da mãe do que para o colo do pai. E acho que esse é o apoio do pai.»

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António

Parece radicar nesta ideia a procura de equivalências no cuidar masculino pela afirmação da auto-suficiência do pai. Tal como na paternidade conjunta, aqui o cuidar flui de uma ligação expressiva, significativa enquanto partilha de experiências e dos seus significados, que une o pai à criança e o casal entre si pela partilha parental. Porém, aqui, há uma insistência na importância do pai para a criança, do valor desta relação, o que leva a que o cuidar se torne um elemento da construção da autonomia do homem na relação com os filhos, traço que distingue este estilo de paternidade da conjunta - em que a conjugalização da relação pai-filhos menoriza a importância de tal autonomia 53. É todavia uma autonomia

familializada, ao ser orientada por uma norma familialista de expressão e realização do

homem na parentalidade, que une as ideias de família como unidade de funcionamento em que todos devem participar, como refúgio relacional e de solidariedades instrumentais e expressivas, como relacionamento entre indivíduos, com diferentes identidades, competências e interpretações das experiências, que devem ser ajustadas, negociadas e acolhidas.

«A família é o bem-estar do próprio, da criança e do todo entre si, da própria vida em família.» Cláudio

Refere-se, portanto, a uma individualização do relacionamento entre pai e filhos que se tece pelo contributo único do homem para a integração familiar e social da criança e para a manutenção da qualidade do clima emocional das relações internas do grupo familiar. Indica, então, que nos interstícios das lógicas de fusionalidade conjugal e de familialismo familiar, tem lugar uma autonomia paterna na relação pai-filhos que visa alimentá-las. Contrasta, assim, com a autonomia paterna que é orientada por uma norma individualista de afirmação e expressão pessoal no ser pai, manifestada num relacionamento com a criança exclusivo e independente dos laços entre o casal – o que é evidenciado por vários autores como uma das principais características da paternidade contemporânea54 (Beck, Ulrich e Beck-Gernsheim, Elisabeth 1995; Dermott 2008; Doucet 2006; Neyrand 2004b; Smart e Neale 1999). Ainda assim, indica que existem outros tipos de autonomia na relação pai-filhos, o que indica que a individualização desta relação pode basear-se em diferentes formas de individuação do homem na família.

Do ponto de vista da construção do género nas interacções, tanto o cuidar auto- suficiente no masculino, como esta visão da paternidade como relação próxima e única

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Como veremos esta autonomia existe também noutras esferas de interacção.

54 Veremos a sua manifestação nas paternidades autónomas igualitárias e apropriativas que apresentaremos mais adiante.

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familializada indicam que na paternidade de apoio os homens também atravessam as barreiras das fronteiras tradicionais da diferenciação de género (Gerson e Peiss 2004), ao transporem os limites de definições da masculinidade restritivas ao cuidar e à partilha do trabalho parental, bem como à intensidade relacional que enfatiza a incorporação da expressão das emoções na paternidade (Doucet 2006; Dulac 2003). É claro nos discursos dos pais o trabalho de distanciamento identitário face a estes modelos:

«Há uns ou outros que pensam um pouco como eu, apesar de haver alguns mais retrógrados em relação a fazer coisas em casa, mas todos falam da maneira como eu…, daquilo que eu faço em casa.»

Cláudio «Sou bastante diferente de alguns … não têm assim uma ligação muito, muito grande, um afecto muito grande entre pai e filhos, como eu.»

António

Tal como na paternidade conjunta, é o ideal de proximidade paterna e de partilha parental que aqui orienta estas travessias e lhes dá sentido, embora a recodificação dos espaços paternos nos domínios tradicionalmente femininos seja bastante menos abrangente. Acresce à paternidade de apoio a noção de uma complementaridade parental feita de diferenças entre os géneros e, portanto, uma menor adesão a valores igualitários, ainda que estas sejam flexíveis face às necessidades familiares e acolham algumas equivalências nas práticas. Por outro lado, poder-se-á dizer que são diferenças recodificadas, não só pela inserção do pai no domínio do cuidar, mas também pela centralidade que o valor da relação com os filhos tem na composição do papel paterno. É interessante como a valorização da relação entre pai e filhos não é diminuída perante a crença num «instinto maternal» que corrobora as diferenças da relação mãe-filhos e a importância da mãe como cuidadora. Na verdade, o que parece estar em causa é, em grande parte, um processo de construção de um lugar mais completo e abrangente para o homem na parentalidade, que, embora esteja ancorado na diferenciação de género, acolhe o familialismo como motivo para a recomposição dos seus significados. Deste modo, as «masculinidades paternas» (Hayhood e Mac an Ghaill 2003) produzidas nas interacções são complexas, porque são simultaneamente

intimistas, familialistas e estatutárias. O seu fundamento intimista e familialista tende a

referenciar-se à composição da individualização do vigor e da qualidade dos laços entre pai e filhos, como condimento simultâneo da paternidade e da complementaridade que une o casal nas interacções; o estatutário, à ligação com arquétipos antigos dos edifícios culturais da masculinidade, como a ética do provedor ou a racionalidade disciplinar e educativa, esperadas de um pai. Contudo, o entrosamento destas referências normativas recodifica esta faceta

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estatutária, impregnando-a de ideais relacionais expressivos, o que, como iremos ver, se espelha nas interacções e actividades do pai com a criança e na «regulação» da cooperação parental. Olhemos, então, para o primeiro destes domínios.

As interacções e actividades do pai com a criança são o principal contexto de manifestação das orientações para a presença, a disponibilidade e a proximidade afectiva. Tal como na paternidade conjunta, estão fortemente enlaçadas nas rotinas de produção do quotidiano familiar, mostrando que esta é também uma paternidade tecida pelo sentimento de comunhão com a criança e a parceira na partilha das actividades da vida em família. Contudo, há uma diferenciação nos eixos de coesão, na medida em que nas interacções coexistem interdependências e alianças bilaterais entre os progenitores e a criança, embora as alianças mãe-filhos sejam mais autónomas e abrangentes do que as pai-filhos. Ambas são encaradas como elementos de uma complementaridade parental que combina finalidades e práticas sintonizadas com contributos únicos ou especializados. Deste modo, nas interacções e actividades do pai com a criança existem simultaneamente espaços exclusivos para o relacionamento pai-filhos e espaços para a partilha familiar.

O cuidar no masculino é um desses contextos de interacção onde o «apoio» é conjugado nesta coexistência de interdependências e autonomias nos eixos de coesão, dado que é um terreno da realização da presença e da disponibilidade para fazer para a criança, que cria laços de cumplicidade e de intimidade tanto paternos como conjugais. Por outro lado, é tomado, desde cedo, como palco de orientação da criança, que é um dos pilares do papel paterno para estes homens. Assim, à medida que a criança vai crescendo, o «apoio» traduz-se num modo de o pai ajudar e participar nesse processo, estando o mais possível ao seu lado para a amparar e vigiar nesse caminho, o que pode incluir várias práticas: ensinar a criança a comer, a tomar banho e a vestir-se sozinha, a comportar-se, a aprender o certo e o errado e a lidar com todo o tipo de problemas, independentemente de a sua parceira também o fazer e de ambos procurarem estar em sintonia no que fazem. Como diz António:

«Molda-se o barro à vontade do homem. O homem vai moldando os filhos… pronto … o casal também, à vontade deles. O que puderem fazer sozinhos fazem, eu vou vigiando. Se precisarem de ajuda, lá estou eu e lá estarei. É o apoio.»

Com efeito, ao contrário do que acontece na paternidade conjunta, para estes homens estar presente enquanto a mãe cuida e educa não significa fazê-lo também, pois ser pai implica contribuir ao seu modo e ter o seu próprio espaço, ainda que este contributo possa decorrer sob a orientação da mãe e ser encarado como um esforço conjunto para o todo familiar. Nesta medida, estes pais fazem questão de participar o mais possível no quotidiano

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dos filhos, para lhes dar o «apoio de pai». Um exemplo desta afirmação da presença do fazer paterno é-nos dado por António. Nos últimos anos tem tido horários de trabalhos atípicos que lhe deixam as manhãs livres e o fazem chegar tarde a casa. Assim, faz questão de aproveitar as manhãs ficar com a filha em vez de a ir pôr ao A.T.L.:

«Agora, a mais nova, dou-lhe o apoio que é lógico, fico toda a manhã sempre com ela. Apesar de pagar para ela estar no ATL da escola, só fica uma vez por semana, que é à segunda-feira quando eu trabalho todo o dia. De resto, nunca vai para o ATL, fico sempre com ela.»

O «apoio» que estes pais procuram dar aos filhos é reportado a contextos de interacção variados que englobam tanto os momentos de partilha familiar – aliás, um dos seus elementos é, precisamente, proporcionar à criança momentos de comunhão e bem-estar familiar – como aqueles em que estão sozinhos com eles. A interacção e a partilha familiar de actividades com os filhos dá-se, quer no contexto das rotinas de produção material do quotidiano, quer nos momentos lúdicos e de lazer. Assim, por exemplo, mesmo a preparação de uma refeição é descrita como um palco para a partilha familiar: adultos e crianças juntam-se na cozinha, o pai, ao mesmo tempo que dá uma ajuda à sua parceira, está atento à criança que faz os trabalhos escolares; ou quando estão na sala e miúdos e graúdos brincam em conjunto; ou, ainda, quando vão todos simplesmente dar um passeio ou visitar familiares ao fim-de-semana.

«De vez em quando lá vem, estamos ali e: “Ó pai dá-me aqui uma ajuda para fazer aqui esta ficha”. (…) O jogar aos bonecos, por exemplo, brincamos todos.»

António

Os momentos para partilhar actividades a sós com os filhos são encarados como fundamentais para o relacionamento afectivo com eles e para a sua orientação pelos dois membros do casal, que alternam entre si estes momentos a sós com a criança. Mostram, assim, como a autonomia relacional do pai com a criança é familializada por esta prática de dar o lugar ao outro no casal, prática essa que visa nutrir os laços que unem cada um deles à criança para fortalecer os que os unem a todos. Podem incluir práticas como o tomar alternadamente banho com a criança, mesmo quando esta já não é pequena, ou o dormir sozinho com a criança na cama do casal, como nos foi contado por António:

«A minha filha, volta e meia dá-lhe… hoje tem 7 anos, e ela ontem, deve ter dito à mãe: “Hoje vou dormir com o pai”. Quando eu cheguei a casa à noite e fui para a cama, lá estava a minha filha na cama, e a minha mulher na cama dela.»

Ou ainda actividades de lazer que, por norma são conjuntas, mas guardando sempre um espaço para as interacções a sós com a criança:

«Em dados momentos estamos todos juntos, mas os meus filhos também vão passear comigo e outras vezes vão passear com a minha mulher.»

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A proximidade íntima com a criança e a orientação paterna estão sempre lado a lado e é a primeira que tece o terreno à segunda. O fazer para a criança e junto com ela é acompanhado, desde cedo, pela construção de uma confiança mútua baseada numa comunicação aberta e cúmplice, o que incentiva as confidências, de tal modo estas não são apenas reservadas à mãe como sucede na paternidade conjunta. Aqui, nem a maior presença da mãe no quotidiano da criança, nem o pressuposto de que é a mãe quem gere as emoções na família, afastam o pai do mundo íntimo da criança, até porque uma das facetas do «apoio» é precisamente a procura de que a criança verbalize os seus estados emocionais e os seus problemas para a proteger.

Contudo, a própria criança, principalmente quando começa a entrar na adolescência, pode colocar barreiras a esta proximidade, ao estabelecer limites à partilha de actividades a sós com o pai. No momento da entrevista, Cláudio confidenciou-nos, com pesar, que a filha se estava a afastar dele e que procurava mais a companhia da mãe:

«A filha agora está mais, está mais virada para o acompanhamento da mãe, apesar de muita insistência de, olhe, por vezes, quero fazer isto quero fazer aquilo, já não, já não liga muito àquilo que eu digo. Mas se for mais a mãe já o faz.»

Não encarava este afastamento como um enfraquecimento dos fortes laços que os unem, mas sentia que estava a perder alguma da autonomia relacional que sempre procurou e que esta perda estava a limitar a sua intervenção e participação na orientação da filha.

«Eu não posso dizer que ela não esteja aproximada de mim, que ela não esteja junto a mim, são mais as circunstâncias da idade que ela tem. (…) Poderia ter sempre uma maior participação na educação poderia ser sempre mais além.»

Procurou alternativas e passou a centrar-se nas conversas com a filha. Ora, este episódio da vida de Cláudio alerta-nos para o facto de a criança ser também um actor fulcral na construção da implicação paterna, o que é ilustrado pelo modo como, ora pode procurar afastar o pai criando barreiras à acção paterna no relacionamento entre ambos, ora pode procurar aproximá-lo pela linguagem dos afectos. Como explicam Marshall e Lambert (2006), a criança é uma peça fundamental na construção das identidades parentais, porque é ela quem sinaliza se o que se faz e é, como pai (ou mãe), é significativo na sua vida, ou seja, é dela que vem o reconhecimento da importância paterna, que, como referimos, é tão caro para estes pais. Por outro lado, indica também o peso que pode ter o sexo da criança na limitação da proximidade paterna com crianças adolescentes, sobretudo quando as dinâmicas familiares se alimentam do pressuposto de diferenças existenciais e experienciais entre os géneros. Por isso, Cláudio afirma:

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«Se tivesse um rapaz provavelmente agora ele estava mais pegado a mim que propriamente à mãe.»

Para estes homens ser o guia e o protector da criança articula a linguagem dos afectos com a reivindicação do estatuto de autoridade moral do pai, no casal e perante a criança. É uma autoridade branda e negociadora, baseada no princípio de que a criança deve não só ser