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Paternidade e dinâmicas parentais: coesão, regulação e relações de género

2. Paternidade, dinâmicas parentais e funcionamento familiar

2.2. Dinâmicas de interacção parental e familiar: eixos e dimensões

2.2.2. Paternidade e dinâmicas parentais: coesão, regulação e relações de género

Embora grande parte dos estudos tipológicos sobre o microcosmo familiar se centre no par conjugal, no entanto, alguns têm em conta as dinâmicas das relações parentais e o lugar da criança na família, ligando, assim, algumas das dimensões das dinâmicas parentais com os eixos de classificação do funcionamento familiar.

Bell e Bell (1982) utilizam o conceito de coesão para dar conta de como os conflitos entre o casal determinam modos de relacionamento com adolescentes e estes influenciam o seu desenvolvimento. Recorrendo a este conceito vão procurar identificar as diferentes formas como se estabelecem alianças e proximidades afectivas entre o casal e as crianças. Mas apresentam uma proposta de operacionalização deste conceito inovadora: o seu desdobramento em eixos ou pares de coesão. Justificam-na defendendo que os laços que unem o casal e os filhos e cada um dos membros do casal e os filhos podem ser distintos, formando pares bilaterais, ou seja, não só o relacionamento do casal pode ser autónomo do que este tem com os filhos, como também cada membro do casal pode ter um relacionamento autónomo com os filhos. Para os autores, a construção de eixos bilaterais é uma forma de resolução de conflitos no casal, mas também pode ser promovido pela criança. Identificam quatro tipos de família a partir destes eixos de coesão: balanced, scapegoating, coalition,

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equilibrado e, portanto, não existem eixos bilaterais de coesão. Nas famílias scapegoating, o casal evita os problemas conjugais focando a sua atenção e comunicação em torno dos problemas das crianças, construindo, assim, uma maior proximidade entre o casal do que entre este e as crianças. Logo, existem eixos bilaterais diferenciados no casal e entre este e as crianças. Nas famílias coalition, um dos membros do casal procura a criança para apoio emocional criando distâncias entre a criança e o outro membro do casal. Deste modo, há não só eixos bilaterais diferenciados no casal e entre este e os filhos, como também um eixo bilateral entre um dos membros do casal e as crianças. Nas famílias adolescent close, as crianças estão mais próximas de cada um dos pais do que o casal entre si. São, portanto, famílias em que coexistem eixos bilaterais diferentes no casal, entre este e os filhos e entre pai-filhos e mãe-filhos.

Farber (1962, citado em: Kellerhals, Troutot e Lazega 1984) indica três tipos de organização familiar, classificados a partir da orientação normativa predominante que é estabelecida na confrontação entre a união enquanto instituição e relação íntima nas interacções. O primeiro tipo é child oriented, no qual é dada prioridade à instituição, insiste-se na integração dos membros do grupo na sociedade, mais do que na vida familiar, e são privilegiadas as gratificações das crianças em relação às dos pais. Adicionalmente, é organizado por uma forte divisão do trabalho no casal, que estabelece a prioridade de integração estatutária para o homem e de gratificação da mulher através da maternidade. O segundo tipo é home oriented, e neste é dada prioridade à expressividade das relações interpessoais e à vida familiar, em detrimento da instituição e das relações com o exterior. Os direitos e as gratificações das crianças são privilegiados em prejuízo das dos pais e da sua liberdade. Para além disso, nesta família há uma fraca necessidade de uma divisão estrita de tarefas. O terceiro tipo é o parent oriented, caracterizado por um sistema de prioridades que coloca em primeiro lugar as gratificações emocionais do casal e em que a instituição não tem lugar. A integração social de cada membro do casal prevalece sobre a vida familiar e as obrigações em relação a si próprios e ao exterior imperam sobre a gratificação das crianças. Esta ordem de prioridades apela a uma organização igualitária dos papéis e implica uma grande diversidade de interesses sociais dos membros do grupo familiar.

Num estudo sobre as estratégias educativas das famílias suíças com filhos adolescentes, Kellerhals e Montandon (1991) analisam as relações entre as diferentes estratégias educativas e parcerias parentais e as dinâmicas de interacção familiar. Perante a tese de que a família companheirista está fortemente associada à sentimentalização das relações entre as gerações e à preocupação com o desenvolvimento e educação da criança,

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colocam a questão se não deveriam ser identificadas as variantes de relações expressivas com a criança segundo as diferentes modalidades de relações familiares. Vão, assim, analisar os objectivos e as finalidades dos pais, as suas técnicas pedagógicas, os papéis educativos e a coordenação com os agentes de educação. Reteremos deste estudo os modos como são divididos os papéis e as práticas parentais no casal e como se relacionam com estilos de interacção familiar. A hipótese seguida é que a maneira como a criança é educada depende do modo de coesão mais fusional ou mais autónomo: a família fusional terá necessidade de uma criança mais conformista, herdeira das suas tradições, leal ao grupo e consciente das suas imposições; a família autónoma necessitará de uma criança também ela mais autónoma, inovadora e mais parceira do que herdeira. As práticas parentais em que se tece a relação com a criança são definidas como uma estrutura de papéis educativos, operante em três domínios de interacção que interligam os conceitos de coesão e de regulação: a regulação do

comportamento, a comunicação e a cooperação com as actividades da criança. Em cada um

destes domínios de interacção, os pais trazem à criança quer recursos expressivos ligados aos aspectos mais emocionais (encorajamentos, consolo, expressões de afecto), quer instrumentais, mais ligados à racionalidade (informações, apoios financeiros, critérios de escolha). A estrutura de papéis é, então, definida pela implicação diferenciada dos cônjuges em cada uma destas esferas de interacção - definida como o investimento e a participação nas interacções referidas - e pelo grau de especificidade dos seus contributos, mais instrumentais ou expressivos. Os papéis educativos consistem em três tipos de tarefas: a manutenção (prestação de cuidados, ir ao médico, apoio escolar); a normatividade (explicar os princípios morais, dar permissões ou punições, comentar comportamentos); e o apoio emocional (consolar, encorajar, valorizar a criança). Os autores analisam como estas tarefas são divididas entre os progenitores nos vários domínios de interacção, assim como se existem alianças bilaterais, ou eixos de coesão diferenciados no seu desempenho, através de um índice de diferenciação e outro de implicação. Verificam que o pai intervém mais na regulação normativa e menos nas tarefas do quotidiano e que, neste âmbito, a diferenciação no casal é mais forte nas famílias paralelo e mais fraca nas famílias associação, sendo que nas famílias

bastião e companheiristas a diferenciação é intermédia. Por outro lado, a diferenciação é

também mais associada aos níveis de escolaridade mais baixos. Quanto à implicação, aferem que o pai não tem atribuída nenhuma tarefa educativa específica e que estas ou são desempenhadas pela mãe ou pelo casal em conjunto. A implicação do pai é forte nas famílias

associação, fraca nas paralelas, intermédia nos outros tipos de família e aumenta em função

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afectiva, é apanágio da mãe. A cooperação (amplitude de partilha de actividades com os filhos) é mais forte com a mãe, mas, também, é uma área de práticas paternas, principalmente nas famílias companheiristas. Está também relacionada com o sexo e idade da criança, uma vez que o pai partilha mais actividades com os rapazes e com as crianças mais velhas. Os autores vão ainda verificar em que medida os estereótipos ligados ao masculino e ao feminino fazem variar o modo como os pais contribuem para a educação da criança. Observam que o pólo masculino – que definem como constituído pela informação, clareza lógica e sentido crítico - é muito indiferenciado no casal. Em contrapartida, o pólo feminino – compreensão, cumplicidade e protecção - é dominado pela mãe. Concluem que o papel paterno é mais secundário do que específico e o materno mais englobante, considerando, assim, que a perda de especificidade masculina no domínio instrumental não foi compensada por um crescimento comparável dos seus contributos no domínio expressivo. Contudo, ao tentarem perceber quais os factores que desenham este quadro de práticas paternas verificam que o peso dos contributos do pai para a educação da criança está correlacionado com uma maior implicação do pai nas tarefas educativas, um maior número de tarefas feitas em casal e uma menor especificidade dos contributos femininos. Contrariamente, uma maior especificidade dos contributos e do trabalho educativo feminino corresponde a uma menor implicação do pai. A partir destes dados chegam à conclusão de que a diferenciação ou especificidade dos contributos paternos se deve tanto a um certo estilo de relações concretas entre o pai e a criança – por exemplo, grau fraco ou forte de implicação no quotidiano –, como também à definição tradicional das identidades femininas e masculinas em relação à socialização das crianças. Adicionalmente, há uma maior indiferenciação de contributos quando o homem tem uma escolaridade mais elevada e o tipo de coesão familiar também influencia a maior ou menor diferenciação de contributos parentais: nas famílias de tipo paralelo, os contributos são duplamente diferenciados, porque ambos os membros do casal contribuem com recursos diferentes e, ao mesmo tempo, a mãe tende a contribuir mais; nas famílias bastião, à excepção da cumplicidade, todos os contributos tendem a ser da mãe; nas companheiristas, os contributos tendem a ser menos diferenciados; e nas famílias associação é onde os contributos são mais indiferenciados.

Dienhart (1998), partindo de uma perspectiva construtivista e sistémica da família, analisou a reconstrução da paternidade no quadro da construção social da partilha parental. A autora entrevistou 18 casais com filhos entre os 2 e os 6 anos, em que o pai participava nas tarefas e responsabilidades quotidianas da vida familiar. Os seus principais objectivos foram captar os significados da paternidade tecidos no casal e as lógicas dos processos de

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negociação e de organização da partilha da parentalidade. Deste modo, procurou explorar os significados, as experiências e as realidades múltiplas da parentalidade, olhando-os como processos activos e interactivos entre homens e mulheres, em que a paternidade e o envolvimento14 paterno não estão isolados da maternidade e do envolvimento materno, mas influenciam-se mutuamente. Para a autora, a partilha parental é um processo de co-construção de significados e práticas que ocorre nas interacções familiares: «A co-construção é um processo interactivo de produção de significados entre pessoas. É um processo em que criam ideias partilhadas que podem conduzir a acções coordenadas.» (idem., 66). Explica as suas dinâmicas utilizando como metáfora a dança a pares. Diz, então, que a parentalidade, tal como a dança, tem alguns passos básicos e repetitivos, mas também a potencialidade de ser um palco de expressão individual e de partilha conjugal. É uma actividade em constante movimento, por isso, exige aos parceiros que coordenem os conhecimentos e as práticas, quer individuais, quer de parceria, no fluir da vida quotidiana, exigindo, igualmente, a capacidade de improvisação face à complexidade e imprevisibilidade de situações na vida. A inclusão do envolvimento do pai na partilha parental implica alterações e negociações nos modos como homens e mulheres percepcionam as suas experiências individuais de paternidade e de maternidade, assim como o pano de fundo cultural de expectativas sobre comportamentos e papéis paternos e maternos. Ao tecer modalidades de partilha no casal, cada parceiro usa os repertórios individuais e de parceria a que está habituado e vai-lhes juntando novos elementos, em função das circunstâncias e das influências que recebe e exerce sobre o outro, em movimentos de liderança e de seguimento que tanto podem exprimir hierarquias e especializações como indiferenciação. Estas dinâmicas podem levar a que cada parceiro facilite ou limite as formas de envolvimento parental do outro, uma vez que a prontidão para partilhar, liderar ou seguir e o conteúdo do repertório de cada um estão ao mesmo tempo separados e ligados ao parceiro. Neste contexto, embora os homens tenham a consciência de que a moldura cultural lhes garante a opção de quão envolvidos querem estar, podem sentir-se divididos entre assumir um papel activo e autónomo expandindo o contributo da paternidade na partilha parental, e deixarem que seja a mulher a determinar como e quando se envolvem na partilha; já as mulheres, podem sentir-se divididas entre cederem aos parceiros um espaço igual ao seu nos cuidados aos filhos e perderem prerrogativas neste domínio, o que leva algumas a sentirem-se culpadas por cuidarem menos dos filhos e delegarem no pai.

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Para a autora, o termo envolvimento recobre práticas e responsabilidades parentais, necessárias à criança e à produção da vida familiar e que são negociadas no casal. Afasta-se, assim, do conceito de envolvimento desenvolvido por Lamb (1987) e Palkovitz (1997), sobre o qual nos debruçaremos no ponto 3.

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As dinâmicas de co-construção da partilha parental estão associadas à ideia de equipa, que surge como o pilar normativo e valorativo da sua estrutura de organização e expressa-se em vários domínios: na articulação trabalho família, nas interacções quotidianas, nos mecanismos de parceria que mantêm a funcionar a partilha e nos padrões de co-construção da parentalidade partilhada ao longo do tempo.

No plano da articulação trabalho-família é expressa em cinco estilos de partilha: pai

em casa, mãe em casa, parcerias permutáveis, parcerias com especializações e parcerias de igualdade negociada. Vejamos as situações em que ambos trabalham fora de casa: nas parcerias permutáveis, o pai e a mãe estão igualmente envolvidos nas rotinas diárias da

criança, nas tarefas domésticas, na gestão da vida familiar e na carreira profissional. Adicionalmente, consideram-se equivalentes quanto à capacidade de levar a cabo qualquer tarefa e resolver qualquer problema. Nas parcerias com especializações, o casal não espera partilhar tudo, por isso, há esferas que cada um reserva para si e não abre à partilha igualitária ou indiferenciada (ser a mãe a ocupar-se dos cuidados de saúde das crianças e ser o pai a disciplinar, por exemplo), o casal tem diferentes disponibilidades para a vida familiar e cada um faz as tarefas que mais lhe agradam. Nas parcerias de igualdade negociada, há acordos específicos quanto ao que cada um faz e quando, que são monitorizados. A implementação da paridade na partilha é protagonizada pela mulher e o homem faz um esforço por cumprir, embora tenda a existir um desfasamento entre o compromisso com ideal de partilha igualitária e o que faz na realidade.

No plano das interacções quotidianas, a ideia de equipa pode implicar várias lógicas de cooperação: valorizar as diferenças de cada um quanto aos modos de fazer e às competências; libertar o outro, substituindo-o quando este está sobrecarregado; fazer turnos, assumindo todas as responsabilidades parentais em períodos alternados; dar espaço ao outro, colocando de lado a vontade de liderar quando o outro está a tratar do assunto; e delegação do homem de parte das tarefas na mulher. Estas são estabelecidas através de quatro mecanismos de parceria: os

acordos sobre a organização da vida familiar, a especialização, a permutabilidade e a negociação. Os acordos podem ser implícitos ou explícitos e referem-se às decisões sobre

quem faz o quê, a estratégias face a imprevistos e à necessidade de ajustamentos e respostas a problemas ou eventos da vida profissional e familiar. A especialização refere-se ao modo como a percepção das preferências, competências e recursos individuais cria uma visão de complementaridade que participa na coordenação da partilha parental. Implica que cada membro do casal tenda a especializar-se em áreas em que se sente mais competente ou à vontade, o que não significa necessariamente uma divisão mais tradicional em que o homem

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se centre nas brincadeiras, nos lazeres ou no acompanhamento das actividades desportivas dos filhos e a mulher nos cuidados. A permutabilidade significa que ambos têm a capacidade de resolver e lidar com qualquer situação quando estão sozinhos com os filhos, mas à sua maneira e, portanto, sem ter de replicar o modo de fazer do outro. Deste modo, a autora associa a permutabilidade a uma indistinção entre pai e mãe, que ocorre tanto nas funções como nos modos de fazer. O grau de permutabilidade varia de acordo com o tempo que cada progenitor passa sozinho com os filhos, o que pode significar que alguns homens só a exerçam em situações excepcionais. A negociação refere-se a um trabalho continuado de interpretação de como cada membro do casal vê determinada situação, baseando-se em concepções sobre: como cuidar e educar os filhos; as expectativas sociais quanto ao que fazer, pensar e sentir enquanto pais; e do conjunto de competências necessárias para lidar com as tarefas quotidianas e relacionar-se com os filhos. Implica um ajustamento continuado de iniciativas individuais à partilha de crenças, valores e ideais sobre a vida familiar.

Por último, a autora identifica três processos de co-construção da parentalidade ao longo do tempo: passos descoordenados, passos emparelhados e passos consonantes. No primeiro, o casal começa com uma divisão de género tradicional e vai mudando, ou em resposta às circunstâncias ou porque um dos parceiros deseja fazer as coisas de outra maneira (normalmente a mulher), pelo que experimentam outras formas de interacção: a mulher dá passos que convidam o homem a aprender outras formas de ser parceiro e pai, mas, este jogo de liderança feminina e seguimento masculino pode criar o sentimento de que não estão em sintonia e que um pode tropeçar ou colidir com o outro. No segundo, ambos exploram possibilidades alternativas para a maternidade e para a paternidade e nenhum vê o outro a liderar, pois cada um assume turnos de liderança e de seguimento. Ambos participam na definição do que devem fazer como pais e encontram modos de complementar as suas diferenças, uma vez que respeitam o modo de cada um se envolver na parentalidade. No terceiro, o casal está em consonância de um modo improvisado, cada um espera que o outro tenha um repertório completo e que expresse a sua vontade e capacidade parental completamente, tanto quando estão juntos com os filhos, como quando estão sozinhos com eles. Para estes casais, as responsabilidades da parentalidade são vistas como um palco onde cada um pode actuar e destacar a sua individualidade e ambos se relacionam com ele quer estejam ou não a actuar. Deste modo, cada um pode mudar a qualquer momento o seu repertório, mas isto não significa que o outro responda com mudanças na sua forma de actuar. A autora conclui que a reconstrução da paternidade no casal não é feita apenas pelos homens, mas também pelas mulheres, e dá-se por um processo interactivo entre a construção

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da paternidade e ser pai e a da maternidade e ser mãe. Trata-se de um processo de contínua negociação, adaptação e reorganização de hábitos e concepções culturais antigas, a novas possibilidades e circunstâncias, em que, ao mesmo tempo que o homem muda a forma de ser pai, a mulher muda também a forma de ser mãe.

No âmbito da investigação das dinâmicas de regulação parental, alguns autores sublinham a competição afectiva, simbólica, prática e identitária no casal em relação aos filhos, indo ao encontro da hipótese de que a criança se tornou um objecto de jogos de poder

gendrificados no casal, avançada por autores como Beck e Beck-Gernsheim (1995) e

Castelain-Meunier (2002a). Aliás, como vimos, esta realidade era já descrita na família

coalition definida por Bell e Bell (1982), em que um dos progenitores procura a criança para

apoio emocional, criando distâncias entre esta e o outro progenitor e conflitos no casal. Contudo, tal como mostram os estudos de Kellerhals e equipa referidos, a negociação do poder decisional, material e simbólico na hierarquização e na definição de papéis não está necessariamente inscrita no conflito familiar, mas, sobretudo, em lógicas específicas de coesão e regulação das interacções, associadas à construção social do género e dos poderes e recursos que lhe estão associados. O mesmo indica o estudo de Dienhart, ao mostrar que as lógicas de liderança e de seguimento, mesmo estando inscritas em hierarquias, tendem a formar especializações na partilha parental, que se baseiam nos modos como o casal gere a diferenciação e a igualdade de género, assim como as preferências e as competências individuais. Ora, as abordagens da divisão do poder parental são úteis para perceber quer as dinâmicas de «liderança» e de «resistência» feminina e masculina, quer de «apropriação masculina» (Modak e Palazzo 2002) - que, como veremos, é uma forma específica de «liderança masculina» - que encontrámos na cooperação parental. O que indicam alguns estudos é que a cooperação parental está inscrita em processos históricos de consolidação, de reconfiguração ou de enfraquecimento da dominação masculina, tal como a concebe Bourdieu (1999), (Arendell 1997; Castelain-Meunier 1997; 2002a; Dermott 2003; Neyrand 2004a;