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4   REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 21

4.3   Consulta e Participação 39

4.3.1   Consulta 40

O termo 'consulta' será, aqui, utilizado para designar, de forma geral, o processo de abordagem da comunidade por parte das instituições públicas, no sentido de envolver a população em assuntos de interesse público, sejam eles de âmbito micro-local (bairro), local (território do município), regional, estadual ou federal.

Esse 'envolvimento' pode ocorrer de diversas formas, por vários motivos e em graus distintos, o que gera confusão com a terminologia utilizada por diversos autores quando esses descrevem os 'graus de participação' que podem ocorrer em processos participativos (ARNSTEIN, 1969; DIAZ BORDENAVE, 1994; GEILFUS, 1997; SOUZA,2006), sendo que, um deles, designado como 'Consulta', é o estágio em que pode ocorrer alguma troca de idéias (opiniões, sugestões, críticas), conforme apresentado no item 4.2.2.a.

Em um sentido mais amplo, no entanto, a consulta é o processo que promove uma oportunidade para identificar uma variedade de visões e de questões que podem ser consideradas pelos governantes quando esses desenvolvem planos e políticas.

A ACT Government (2001)13 produziu um manual oferecendo diretrizes e orientações para serem utilizadas em processos de consulta à comunidade. São idéias e sugestões que ajudam a elaborar um processo de consulta adequado a cada projeto, como:

Por que consultar?

As respostas podem ser variadas:

• quando existe mais de uma alternativa de solução da questão a ser tratada; • quando se deseja uma solução participativa;

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• quando o governo tem necessidade de mais informações sobre a questão do que tem disponível;

• quando o governo deseja avaliar o impacto de uma decisão possível.

São inúmeros os benefícios que o governo pode alcançar ao fazer a consulta antes de tomar a decisão:

• demonstra transparência e responsabilidade;

• conhece as necessidades da comunidade e garante grande representatividade na decisão tomada;

• constrói um relacionamento cooperativo e responsável com a comunidade, na solução dos problemas;

• 'explora' uma gama de soluções apresentadas pelos participantes; • aprende mais sobre a questão tratada;

• promove a oportunidade da comunidade exercer seus direitos ao garantir que o governo forneça informações a respeito dos programas e dos serviços locais;

• mostra capacidade em oferecer programas e serviços para grupos específicos, como portadores de necessidades especiais, idosos, jovens, mulheres;

• garante custo eficaz, programas e serviços apropriados, com clara identidade com as necessidades da comunidade;

• propicia o entendimento dos objetivos do governo ao permitir que diferentes grupos conheçam pontos de vista diferentes;

• permite ao governo conhecer toda a gama de impactos que pode ocasionar a ação proposta.

Para início de um processo de consulta é fundamental saber: quem é a comunidade a ser consultada?

A comunidade, em geral, inclui todos os habitantes. No entanto, para o objetivo da consulta, a tendência é pensar no grupo de indivíduos que se identificam com interesses culturais, sociais, ambientais, religiosos, ou grupos com interesses específicos que se organizam em setores de negócios ou comunitários.

A comunidade pode, ainda, se agrupar em faixas demográficas (mulheres, jovens, idosos) ou por localização geográfica (rua, bairro, região).

A identificação dessa 'comunidade' é uma fase importante do processo e será tratada em alguns métodos de consulta elencados no item 4.3.

Como já foi citado anteriormente, a legislação brasileira, a partir de Constituição, faz menção a diversas situações em que é obrigatória a participação popular. Portanto, exige-se um processo de consulta.

Porém, independentemente da obrigatoriedade legal, a consulta é recomendada quando:

• a questão afeta um grupo significativo;

• a proposta afetará significativamente o direito dos membros da comunidade; • a questão afetará diretamente e significativamente o meio ambiente;

• um número significativo de pessoas, ou um grupo em particular, tem posição firme sobre o assunto;

• as mudanças provavelmente afetarão diretamente a qualidade de vida das pessoas;

• o governo tem informações insuficientes para tomar decisões sobre a questão, mesmo que afete um pequeno número de pessoas.

Antes de decidir a estratégia de consulta é importante verificar o que se espera do processo. Se o objetivo é levar informações, dar notícias ou apresentar projetos já concebidos, então o processo não é de consulta.

Uma consulta efetiva ocorre, segundo ACT Government (2001), quando existe uma troca de visões, de informações e de competências entre a comunidade e o governo. Isso envolve a construção de um relacionamento com a comunidade baseada na honestidade e na apreciação de diferentes posições.

Para que um processo de consulta obtenha sucesso é necessário: • definir os objetivos e os parâmetros da consulta claramente;

• envolver os 'participantes-chave', as lideranças, os grupos interessados; • coordenar o tempo de consulta;

• definir um orçamento;

• escolher um método adequado, que envolva os participantes; • usar técnicas e estratégias que maximizem a participação;

• dar retorno dos resultados da consulta e decisão resultante para os participantes e outros grupos com interesses legítimos;

• analisar o resultado da consulta e o processo.

É preciso considerar também que os que conduzem a consulta não devem ter interesse nos resultados. Os facilitadores/mediadores das oficinas devem estar treinados para a

função, e o local deve permitir a máxima participação, considerando-se a locomoção, a acessibilidade e a disponibilidade de espaço para as tarefas programadas.

Segundo Carson e Gelber (2001), a tentativa de melhorar a comunicação e a participação da comunidade nos processos de planejamento esbarra em uma série de obstáculos, que estão em vários níveis. Primeiramente, aqueles que decidem qual serviço pode ser oferecido não são os mesmos que usualmente oferecem o serviço. Essa é uma questão inerente ao processo de governo, e apresenta um desafio àqueles interessados na participação comunitária. O envolvimento da comunidade interfere no processo de decisão, e é também efetivo em termos de impacto nos serviços oferecidos.

Outros obstáculos inerentes ao processo de planejamento participativo são: a presença de conflitos entre os participantes, a incerteza sobre os resultados, a dificuldade de definir responsabilidades e a polêmica natural sobre o manejo sustentável do solo.

Combinado com essas dificuldades, está a insatisfação com os métodos convencionais, os encontros ou as audiências públicas de onde os participantes saem com a sensação de que não foram ouvidos; a suspeita de que tempo e recursos valiosos foram despendidos menos efetivamente do que poderiam ter sido; com a dúvida se a melhora é possível.

Por outro lado, existe a relutância por parte dos órgãos governamentais com relação ao processo de consulta, alegando não haver tempo ou recursos para sua implementação; que as pessoas que participam não são representativas; que as pessoas não estão interessadas em participar; que isso encoraja reclamações; que as pessoas não entendem as questões discutidas e que desconhecem as técnicas de consulta.

O relatório produzido por Carson e Gelber (2001) anuncia que muitas dessas dificuldades podem ser superadas através da utilização das técnicas adequadas de consulta pública, algumas delas apresentadas no item 4.3.

É importante lembrar que a consulta à comunidade não pode, nem deve, substituir o processo de decisão dos representantes públicos eleitos. Ponto central da democracia representativa é a idéia de que o poder para tomar decisões é ligado a um processo previsto e finalmente testado pela opinião pública nas eleições (CARSON; GELBER, 2001).

“Entretanto, a consulta à comunidade pode auxiliar os eleitos a entender e incorporar as referências e conceitos públicos nos processos de decisão. O processo de consulta não substitui o processo democrático das eleições, mas é parte integrante dele” (RENN, 1993, p. 199-200).

Para que a consulta seja eficiente, Carson e Gelber (2001) relacionam 10 princípios que devem ser seguidos:

• Hora oportuna: a participação não pode ocorrer tardiamente em relação à questão, tornando-se simbólica ou, meramente, confirmando decisões já tomadas. Ela deve ocorrer quando os cidadãos têm a chance de influenciar o resultado.

• Inclusão: os participantes devem ser selecionados de maneira que não permita a manipulação e devem incluir amostra representativa da população, tanto indivíduos como grupos. Um processo de seleção aleatória é a melhor forma de se conseguir isso.

• Foco comunitário: pergunte aos participantes o que eles consideram apropriado no papel de cidadão e não o que eles querem pessoalmente ou qual seu interesse próprio.

• Caráter interativo e deliberativo: evite reduzir as questões ao simples “isso ou aquilo”. Permita e incentive considerações, assim as pessoas se sentirão engajadas.

• Efetividade: embora a tomada de decisão possa se esforçar por obter consenso, o resultado não precisa ter concordância completa. Deixe claro como as decisões serão tomadas. Esteja certo que todos os participantes entenderam o impacto de seu envolvimente e tenham tempo de se informar sobre o assunto.

• Valorização: é importante que haja possibilidade de alguma recomendação que saia da consulta seja adotada. Se não for, deve haver uma explicação pública. Acreditar no processo é importante para ambos os lados - os detentores do poder e os participantes. • Facilidade: é importante que todos os participantes controlem os planos e os conteúdos

para que dê mais credibilidade ao processo. Um facilitador independente, de visão geral e flexível, despido de interesse, é essencial para garantir isso.

• Aberto, justo e objeto de avaliação: o método de consulta deve ser apropriado ao grupo- alvo. Os critérios para avaliação do processo devem ser feitos com antecedência e incluir fatores além da adoção das recomendações. O retorno à comunidade é essencial.

• Custo eficaz: é difícil mensurar a satisfação da comunidade ou poupar litígios que podem surgir na falta da consulta. Algumas questões requererão ampla consulta, outras, mais objetivas. Os custos variarão e se adaptarão, mas o processo selecionado deve ter recurso suficiente, ser apropriadamente 'remunerado'.

• Flexibilidade: existe uma variedade de mecanismos de consulta. Escolha um que melhor favoreça as circunstâncias e teste-os todo o tempo. As diferentes comunidades e as diferentes questões irão produzir melhores respostas com formas diferentes de consulta. Junte métodos de pesquisa qualitativos e quantitativos.