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O Estado Novo só se inicia, formalmente, em 1933, com a aprovação da nova Constituição, mas, em termos de corpo doutrinário e enquadramento legal, o novo regime político começa a ser preparado logo após o golpe militar de 28 de Maio de 1926. O governo da ditadura militar investe fortemente na política patrimonial como forma de afirmação nacional, num mundo diplomaticamente hostil, para o qual a dívida externa dos regimes monárquicos, não solucionada durante o período da I República, mantinha viva uma imagem de fraqueza e debilidade. Assim, o sector patrimonial mereceu, desde logo, a atenção dos legisladores que, seguindo na linha do que havia sido a política legislativa da I República3 introduzirão,

paulatinamente, alterações no quadro legislativo, transformando o património num dos instrumentos mais eficazes da propaganda nacionalista. Ao nível das bibliotecas e arquivos as primeiras alterações, em 1927, referem como intuito principal a redução de despesas e a racionalização de recursos, mas as restrições, que afectaram directamente o dinamismo técnico e editorial da BNL, revelam, desde logo, o propósito de controlo político de uma direcção institucional incómodo ao poder estabelecido. Na realidade, quer o director da Biblioteca, Jaime Cortesão, quer o chefe dos serviços técnicos, Raul Proença, faziam parte do grupo Seara Nova.4

Em 1931, o Decreto 19.925 de 27 de Junho revela um espírito fortemente centralista, através da ampliação das atribuições da Inspecção das Bibliotecas e Arquivos e determinação do lugar de inspector e sub-inspector como vitalícios, bem como ainda a extinção das Bibliotecas Populares e Móveis, que respondia ao ideal de instrução pública da I República. Em outros sectores patrimoniais o percurso é idêntico. Prova-o, por exemplo, o Decreto n.º 16791, de 30 de Abril de 1929, que cria a DGEMN, mas, sobretudo, o Decreto n.º 200985, de 7 de Março de 1932, que centraliza no Conselho Superior de Belas Artes, dirigido por quadros superiores, escrupulosamente, seleccionados e enquadrados pelo regime, as diversas funções técnicas e administrativas que se encontravam dispersas. Ao mesmo tempo, o diploma cria as Comissões Municipais de Arte e Arqueologia onde os seus membros, directa ou indirectamente, são nomeados pelo Estado, consumando-se assim, a nível nacional, uma rede corporativa.5 Para as

bibliotecas e arquivos esta acção corporativa já tinha sido projectada desde 1927,

3O Decreto n.º 15216, de 14 de Março de 1928, não só elogia a política patrimonial anterior, como segue de perto a Lei n.º 1700, de 18 de Dezembro de 1924. Ver Sérgio Lira, “Linhas de força da legislação portuguesa relativa a museus para os meados do século XX: Os museus e o discurso político” (comunicação apresentada no 5º Colóquio Galego de Museus, Melide, Galiza, 20-22 Novembro, 1997),

http://www2.ufp.pt/~slira/artigos/comunicacaovcoloquiogalegodemuseus.htm (acesso em 15 Jun. 2009).

4Fernanda Ribeiro, “A Inspecção das Bibliotecas e Arquivos e a ideologia do Estado Novo,” 8-13, http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/5136.pdf (acesso em 25 Jun. 2010). Originalmente publicado em Estados

autoritários e totalitários e suas representações: Propaganda, ideologia, historiografia e memória, coord. Luís Reis

Torgal e Heloísa Paulo (Coimbra: Imprensa da Universidade, 2008), 223-38.

5Ver Lira, “Linhas de força da legislação portuguesa,” sob “As peças legislativas apresentadas por ordem cronológica,” “Executando um plano.”

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nomeadamente com o Decreto 13.724 de 27 de Maio, que dota a Inspecção de uma rede de arquivos e delegados distritais e reforça também a autoridade das chefias, aumentando as suas atribuições. Assim, apesar de inicialmente se manterem os traços fundamentais da legislação do período anterior, o novo regime, paulatinamente, reforça o princípio segundo o qual o património passa a estar sob a alçada do Estado, criando um corpo teórico e legislativo de centralização que estava totalmente delineado já em meados da década de trinta, aquando da instalação formal do Estado Novo.

São sinal concreto desse facto as exposições temporárias que, sobretudo a partir da década de trinta, constituem o meio institucional privilegiado de propaganda ideológica onde se passa a mensagem de um país unido, apesar da sua extensão que se alarga a diferentes continentes, potencialmente rico e poderoso, precisamente porque detém um império, com valores patrióticos e morais que lhe garantem estabilidade e fornecem a identidade nacional. Tomemos, como exemplo, a Exposição Colonial Portuguesa que transformou o Palácio de Cristal, no Porto, num império colonial em miniatura, onde se deu destaque à secção de História Colonial, desde 1415, e aos vários empreendimentos coloniais dos últimos quarenta anos. Nestas exposições interessava valorizar a relação passado/presente, numa tentativa de fusão do passado considerado glorioso com o presente que se queria promissor. Interessou, desde o início, propagandear a acção de António de Oliveira Salazar, enquanto ministro das Finanças no período da ditadura militar que, com a introdução de uma política de contenção, permitiu a recuperação económica e o equilíbrio financeiro do País, promovendo, simultaneamente, o respeito pelos antepassados ilustres, a veneração de um passado de feitos nobres onde, naturalmente, se inscrevia a época dos descobrimentos. Assim, a valorização da história passada e a defesa da cultura material que a comprovava, encaixavam de forma perfeita na sedimentação dos valores inalienáveis e indiscutíveis que sustentavam o presente, pois nas palavras do chefe de Estado de então: “não discutimos Deus; não discutimos a Pátria; não discutimos a Autoridade; não discutimos a Família; não discutimos o Trabalho.”6 A Exposição Histórica da

Ocupação, realizada em 1937, em Lisboa no Palácio das Exposições, situado no Parque Eduardo VII, mereceu inclusivamente a publicação de legislação7 onde se determinou que as

diversas instituições, desde arquivos, bibliotecas, museus e outros departamentos do Estado, prestassem todo o apoio à reunião do material necessário à realização da exposição. Tratava-se de mostrar não só o grande império, obra dos portugueses, mas, especialmente, o seu poder civilizador, a sua acção benemérita com vista ao desenvolvimento dessas regiões longínquas que constituíam a nova Nação indivisível, com direitos históricos na ocupação, orgulhosa do seu

6António de Oliveira Salazar, Discursos e notas políticas, vol. 2, 2ª ed. (Coimbra: Coimbra editora, 1959), 130. 7Decreto-Lei n.º 27269 publicado a 24 de Novembro de 1936. Ver Sérgio Lira, “Exposições temporárias no Portugal do Estado Novo: Alguns exemplos de usos políticos e ideológicos” (comunicação apresentada ao 18º COLÓQUIO APOM/99 ‘Museologia Portuguesa: Balanço do Século,’ Museu de Farmácia, Lisboa, 25-26 Novembro, 1999), sob “Introdução,” http://www2.ufp.pt/~slira/artigos/coloquioapomnov99.htm (acesso em 15 Jun. 2009).

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passado com oito séculos e convicta do seu futuro que, nesta conjuntura, só poderia ser auspicioso. Nesta perspectiva, os arquivos são peças de destaque, nomeadamente os arquivos que comprovam a construção desse império, conceito sobre o qual assentou o nacionalismo português e se criou a identidade da Nação baseada na unidade territorial, conforme afirma Salazar: “ (…) defendo, do alto de fortalezas erguidas em séculos de esforços, um vasto património – a unidade política e moral da pátria e a integridade de um império colonial.”8

É neste contexto que, logo após a revolução militar, o novo poder político se interessa pelo destino dos arquivos e se apercebe da quantidade e relevância da documentação existente, nomeadamente no Arquivo-Geral das Colónias. Assim, dada a situação de dispersão e precariedade deste Arquivo, apoiam, desde logo, em 1926, a sua instalação no palácio da Ega,9

criando o emblemático AHC, pelo Decreto-Lei nº 19 869, de Junho de 1931.

A decisão da ocupação parcial do Palácio da Ega e consequentes obras de melhoramento e adaptação à sua nova função, em 1926, constitui, pois, o primeiro passo para a formação do AHC. O segundo momento importante teve lugar em 1927, com a transferência dos arquivos do Ministério das Colónias que se encontravam em péssimas condições de conservação no Arsenal da Marinha e na Cordoaria Nacional. Por último, um dos momentos mais decisivos foi o início da deslocação dos volumes e documentos avulso, patentes na IX Secção do AMU da BNL para o novo Arquivo.10

O interesse e preocupação com os fundos do Arquivo-Geral das Colónias, por parte dos responsáveis pela administração ultramarina portuguesa são anteriores ao novo regime. Inicialmente, é a SGL quem irá nomear uma Comissão para realização de um relatório sobre a situação do Arquivo, instalado na Cordoaria Nacional. Dessa Comissão fazia parte José Emílio dos Santos e Silva, que foi incumbido de procurar um local adequado e de determinar os custos para instalar o Arquivo do Ministério. Porém, foi Pires Avelanoso, responsável pela documentação do Ministério das Colónias, diplomado com o curso geral colonial e o curso de bibliotecário-arquivista,11 quem induziu Santos Silva à escolha do Palácio da Ega. Santos Silva confirma-o: “ (…) depois de trocar impressões sobre o assunto com o chefe do Arquivo e Biblioteca…o único local mais adequado e adaptável, seria uma parte do Palácio da Ega,” nomeadamente “a ala principal do palácio com frente para o Pátio do Saldanha, que actualmente arruinada e ao abandono,” não serve os propósitos de um hospital pois não reúne as “condições

8Salazar, Discursos e notas políticas, xxiii.

9Este edifício, primeiro intitulado Quinta da Junqueira ou Quinta das Caldas, virá a ser conhecido por Quinta de D. Joana de Albuquerque, pois fez parte do seu dote aquando do seu casamento com Aires de Saldanha, passando então a ser conhecido por Palácio do Pátio do Saldanha e, mais tarde, por Palácio da Ega, quando um dos descendentes, Manuel de Saldanha de Albuquerque, nomeado Governador e Capitão General de Ilha da Madeira desde 1755, se torna vice-rei da Índia em 1758, recebendo então o título de conde da Ega, mesmo antes de partir para o Oriente. Ver Alberto Iria, “A organização dos serviços do Arquivo Histórico Colonial,” Boletim do Arquivo Histórico Colonial 1 (1950): 20-21, 25, 41.

10Isaú Santos, Macau e o Oriente no Arquivo Histórico Ultramarino, vol. 1 (Lisboa: Instituto Cultural de Macau, 1997), 12.

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de isolamento e higiene de acordo com as exigências dos hospitais modernos.”12 Na realidade,

este palácio quinhentista estava em avançado estado de deterioração quando, em 1919, passou para a posse do Conselho de Administração do Hospital e Sanatório Coloniais, integrado no MC.13Esta foi, aliás, a segunda experiência de ocupação do imóvel para instalação hospitalar, o

que muito contribuiu para a sua degradação.14 Explica-se, provavelmente, essa utilização pelas

óptimas condições de estabilidade ambiental no piso térreo, bem como a visível resistência do edifício ao terramoto de 1755. Conhecido como o pátio do Saldanha, este edifício constituía a antiga residência dos Saldanhas, família de ascendência castelhana15 da qual se distinguiram

várias personalidades, nomeadamente na defesa e governação de territórios portugueses de além-mar.16

Neste contexto, o ministro das Colónias, general Ernesto Maria Vieira da Rocha, por portaria de 26 de Maio de 1926, dois dias antes do golpe de estado, determina a nomeação de uma comissão, dirigida por Pires Avelanoso e secretariada por Manuel Luciano de Vilanova e Vasconcelos, 2.º oficial da Repartição Central do Ministério das Colónias, acrescida de José Emílio dos Santos e Silva, chefe da Repartição de Cabo Verde e Guiné e José Joaquim de Sousa, chefe da Secção de Obras Públicas, Portos e Caminhos-de-Ferro, para administrar e fiscalizar as obras necessárias à instalação do Arquivo-Geral das Colónias, nas salas vagas do Palácio da Ega, à Junqueira.17

Pires Avelanoso, o mentor do empreendimento que como arquivista-bibliotecário estava bem ciente da importância da salvaguarda desta documentação, considerou impossível a arrumação e catalogação da documentação do Ministério, enquanto esta permanecesse espalhada por diferentes locais.18 Assim, começou por aconselhar a ocupação da parte

disponível do Palácio da Ega, o que exigiu a total recuperação do rés-do-chão e 1.º andar, ficando-se dessa forma com o espaço suficiente, não só para a documentação instalada na Cordoaria, mas também para “alguns livros e documentos de alto valor histórico em risco de perda que poderiam vir das províncias ultramarinas.”19 Contudo, a sua ideia era reunir toda a

documentação das colónias, “tanto antiga como moderna (…) disseminada e desaproveitada por vários recantos dos Ministérios da Marinha e Colónias e da Biblioteca Nacional.”20 Convicto,

como arquivista-bibliotecário, da importância de reunir todos os arquivos coloniais “num só e

12Informação de Santos Silva, “Arquivo do Ministério,” 10 de Março de 1926, AHU, AAHU, pasta 1492, Ministério das Colónias, Comissão Administrativa das Obras do Arquivo-Geral das Colónias 1926-1929.

13Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 40-42.

14O imóvel serve de Hospital Militar no começo da chamada guerra peninsular, recebendo os feridos das tropas anglo-lusas. Ver Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 32.

15Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 19. 16Santos, Macau e o Oriente, 12.

17Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 42. 18Ibid.,” 41.

19Informação de António José Pires, “Acêrca da mudança do Arquivo Histórico do Ministério para a parte disponível do Palácio da Ega,” 15 de Março de 1926, AHU, AAHU, pasta 1492.

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mesmo local,” negociará, entre os ministérios metropolitanos e as diferentes colónias, as verbas necessárias à adaptação de um edifício em ruínas, promoverá a libertação da parte das instalações, ocupada pelo Hospital Colonial, e conseguirá que a documentação da IX Secção da Biblioteca Nacional passe para o AHC.21 Estas conquistas não foram fáceis e exigiram muito

empenhamento por parte Pires Avelanoso, sobretudo a passagem da documentação da BNL para o novo Arquivo. É certo que a Biblioteca não contava com o apoio do regime, tendo sido considerada detentora de privilégios insustentáveis, determinando o governo a passagem para o novo Arquivo, quer da documentação, quer dos funcionários que dela tratavam, mas, a este respeito, a BNL contou com o apoio da Inspecção das Bibliotecas e Arquivos.22

O carácter empreendedor de Pires Avelanoso, correspondeu aos propósitos do regime, que acabará por o nomear director honorário do novo estabelecimento de Estado,23 entre 1931 e

1938, data da sua morte.24Ele próprio estava convicto de este ter sido “um dos maiores serviços

que se podem fazer às colónias, e, conseguintemente ao País,”25 mas o que o motivou são

profundas convicções profissionais. Efectivamente, enquanto bibliotecário-arquivista, Pires Avelanoso recebeu uma formação que integrava uma forte componente de preservação patrimonial e foi enquadrado pelas deliberações da Inspecção das Bibliotecas e Arquivos que, na I República, é pautada por políticas de salvaguarda do património, consubstanciadas no esforço de identificação, organização e incorporação de fundos históricos.

Pires Avelanoso pretendia inaugurar as novas instalações em 1929, aquando da Exposição de Sevilha, de forma a atrair os eruditos estrangeiros que aí se deslocassem. Tal não chegou a concretizar-se mas à medida que as obras de recuperação do Palácio da Ega eram executadas e a documentação arrumada, assiste-se a sucessivas visitas ao local, por parte de altas personalidades de Estado e a comunicação social da época propagandeia o acontecimento.26 Em 1930, o então presidente da República, Marechal António Carmona,

21Informações de António José Pires, “Sobre a conveniência de serem terminadas as obras de reparação do Palácio da Ega, por conta do Ministério do Comercio e Comunicações,” 21 de Novembro de 1928; Informação de António José Pires, “Acerca da mudança de algumas instalações do Hospital Colonial actualmente situadas no edifício Arquivo-Geral do Ministério,” 3 de Novembro de 1928; Informação da Comissão Administrativa das Obras do Arquivo-Geral das Colónias, “Mudança para outro local das instalações do Hospital Colonial que actualmente funcionam no rés-do-chão do Palácio da Ega,” 17 de Outubro de 1928; Informação de António José Pires, “Sobre a resposta do Sr. Director do Hospital Colonial ao ofício desta Direcção-Geral de 8 do corrente,” 10 de Outubro de 1928; Ofício n.º 45, de António José Pires para o Alto-Comissário da República na Colónia de Angola, 20 de Janeiro de 1929; Ofício n.º 62, de António José Pires para o Ministro das Colónias, 12 de Junho de 1929; Carta de António José Pires para o MC, 13 de Julho de 1929, AHU, AAHU, pasta 1492.

22Cópia ofício n.º 268, de Júlio Dantas, inspector da Inspecção das Bibliotecas e Arquivos Nacionais, para o Ministro da Instrução Pública, 16 de Junho de 1931, AHU, AAHU, pasta 1296, Incorporações de Documentos, Depósito Geral de Adidos, Torre do Tombo, Biblioteca Nacional de Lisboa.

23Alberto Iria, “Introdução,” Boletim do Arquivo Histórico Colonial 1 (1950): 5. 24Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 55.

25Informação de António José Pires ao Ministro das Colónias, de 13 de Julho de 1929,AHU, AAHU, pasta 1492. 26Ver Diário de Lisboa, “O Arquivo do Ministério das Colónias, magnificamente instalado no antigo Palácio da Ega,” 27 de Agosto, 1928; Diário de Lisboa, “Arquivo Colonial Português,” 8 de Agosto, 1929, cit. por Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 44; Costa Brochado, “Arquivo Colonial Português,” Jornal das colónias, 20 de Agosto, 1929; Mário Domingues, “Uma visita ao magnífico Arquivo Colonial Português,” Jornal da Europa, 2ª série, 30 de Novembro, 1929; J. Lemos, “O arquivo e biblioteca das colónias no Palácio da Ega,” Novidades, 17 de

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visitou o ainda Arquivo-Geral das Colónias, acompanhado pelo presidente do Ministério, o general Domingues de Oliveira. Esperava-o uma numerosa comitiva: além dos directores-gerais dos Serviços Centrais do Ministério estavam ainda presentes António Ferrão, subinspetor das Bibliotecas e Arquivos Nacionais e funcionários superiores do Arquivo e da Biblioteca Nacional, comprovando-se, assim, o papel da estrutura profissional que enquadrou Pires Avelanoso, também presente. Na altura, estavam já restauradas e montadas cerca de dez divisões, nomeadamente três grandes salões para a instalação do recheio do Arquivo propriamente dito, um outro com a biblioteca, que incorporou os livros da antiga biblioteca do Ministério das Colónias,27 e outras seis salas mais pequenas, para a secretaria, o gabinete de reservados onde estava também instalado o director e mais quatro áreas de depósito. A comunicação social também não faltou ao evento, auxiliando na divulgação do novo empreendimento.28 Num jornal diário lê-se: “ (o Palácio Ega) ascende assim à categoria dum

templo da letra redonda e manuscrita, auxiliando o homem na sua tarefa de aprender no que foi o caminho do que há que ser.”29

Foi este o enquadramento em que decorreu a criação e instalação definitiva do AHC, dependente do MC, no Palácio da Ega. O empreendimento, só possível com um grande investimento por parte do Ministério que incluiu a contribuição de diversas colónias,30 reflectiu

a importância atribuída a este património, enquanto instrumento de afirmação do poder político e de exaltação nacional.

Em 1932, realiza-se uma nova visita do ministro das Colónias, coincidente com a

Semana das Colónias. Esta iniciativa, organizada pela SGL, tal como explica o seu director, Azevedo Souto, pretendeu ser “o culto pelo Portugal Maior e, concorrentemente, a comunhão dos espíritos em todo o nosso Império,”31 não se limitando, por isso, à realização de

conferências e exposições para especialistas. Pretendeu-se alertar para o “valor das possessões ultramarinas e do que elas representam para todos os portugueses”32 mas, especialmente,

interessar a “mocidade,” proporcionando estudos e palestras em diferentes estabelecimentos de ensino, numa exaltação do espírito colonizador, resumido nas palavras do ministro das Colónias

Setembro, 1930; O comércio do Porto, “O Arquivo Histórico Colonial,” 21 de Dezembro, 1933, cit. por Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 66.

27Esta biblioteca incluía uma importante secção de reservados, tendo-se encomendado o seu ex-libris em 1949. Ver Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 71, 74.

28Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 46-47.

29Diário de Lisboa,“Arquivo Colonial Português,” 8 de Agosto, 1929, cit. por Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 44.

30Iria, “A organização dos serviços do Arquivo,” 42, 44. Ver ainda A. J. Pires Avelanoso, “Palavras prévias,” Arquivo das colónias, n.º 26 (Jan. -Mar. 1929):2.

31Azevedo Souto, “A semana das colónias,” Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa 50, n.ºs 1-12 (Jan. - Dez. 1932):7.

32Armindo Monteiro, “Mensagem do Sr. Ministro das Colónias,” Boletim da Sociedade de Geografia de Lisboa 50, n.ºs 1-12 (Jan.-Dez. 1932): 12. Trata-se da transcrição do discurso de propaganda da Semana das Colónias, iniciativa organizada pela Sociedade de Geografia de Lisboa em 1932.

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na abertura do evento: “temos a colonização no sangue como um imperativo profundo da natureza.”33

Manuel Múrias, que sucedeu Pires Avelanoso na direcção da Instituição, foi quem proferiu o discurso inaugural desta última visita, realçando o papel do ministro na organização