• Nenhum resultado encontrado

2 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

4.1 Contextualização das análises

Nesta seção, contextualizo os processos semióticos que envolvem esta pesquisa, em um âmbito geral, para melhor compreensão das análises.

As análises dos modos semióticos presentes nos anúncios partem da LSF, sistema linguístico-semiótico modelado pelas funções a que serve, cujas formas e processos cumprem a função comunicativa dos bancos digitais na plataforma do Facebook. Na percepção da linguagem como construto social, os anúncios são percebidos como um ato comunicativo multimodal (imagem, escrita, design, cores etc.), nos quais todos os signos presentes se combinam para determinar o propósito comunicativo.

Cabe ressaltar que, para a análise dos anúncios, é importante considerar os processos semióticos de recontextualização, que marcam as mudanças decorrentes da mudança do material semiótico de um contexto para o outro (seleção, organização, destaque, relações sociais (BEZEMER; KRESS, 2008, p.85). Por essa razão, no contexto de situação, de onde parte a análise dos anúncios, devemos considerar a presença de três contextos distintos: o contexto em que ocorre a prática social dos bancos digitais, recontextualizado no ambiente do

Facebook ( 2º contexto), que, por sua vez, é recontextualizado nesta dissertação (3º contexto).

Assim, devemos ter em mente a mudança dos modos semióticos, a mudança das relações comunicativas e a composição textual de um contexto para o outro.

Posto isso, o processo de ressemiotização ocorre em todos os anúncios que compõem o corpus dessa pesquisa da seguinte forma: o contexto de situação/cultura é organizado socialmente, tendo como participantes os bancos digitais Inter e Agibank e os clientes que realizam transações financeiras com eles. Nesse contexto, atuam modos semióticos como

layout, cores, gestos, fala, escrita etc., usados na realização dessas transações, seja por meio

dos aplicativos de celular, e-mail, telefonemas, atendimento pessoal, entre outros.

Objetivando melhorar os negócios e atrair mais clientes para esse contexto, o

marketing dos bancos investe na divulgação por meio da mídia social. Para isso

recontextualiza/ressemiotiza a prática comercial no contexto da publicidade e veiculação da marca pelo Facebook. Ao migrar para esse contexto, o produtor publicitário faz uma seleção dos aspectos mais relevantes que serão recontextualizados em cada anúncio, representando todos os aspectos da prática sociossemiótica (HALLIDAY, 2014) de forma positiva e atrativa, de modo parcial, como toda representação. Problemas são excluídos e aspectos positivos são

evidenciados. Os publicitários tomam decisões retóricas, selecionam e organizam os modos semióticos adequados aos propósitos veiculados nos anúncios (escrita, design, layout, imagens, cores), destacando os serviços que serão o tema de cada anúncio (variável campo). Por essa razão, nesta pesquisa, a análise das variáveis de registro é feita de modo individualizado porque os temas selecionados para cada anúncio são diferentes, o que muda a forma de abordagem de acordo com o assunto, produzindo diferentes intersemioses na mensagem como texto, embora o registro da linguagem de todos os anúncios seja similar no ambiente do Facebook, por seu caráter retórico e persuasivo na busca de clientes.

No contexto representado na mídia digital, a relação interpessoal é adequada para a prospecção de clientes e fortalecimento da logomarca, o que difere do 1º contexto, cujo foco do trabalho é o bom funcionamento da máquina administrativa no todo, o que inclui o

marketing. Há uma mudança de participantes, em vez de banco para clientes, passa a ser do

departamento de marketing dos bancos para os usuários do Facebook, para fins de divulgação e prospecção de mais clientes. Assim, a prática discursiva dos bancos em ambiente social passa a ser encenada na plataforma digital, outro ambiente também social.

Como o espectador do Facebook está livre para fazer reclamações em público, a administração dos bancos deve primar pela probidade e qualidade no trabalho para evitar

marketing negativo na rede e consequente perda de clientes. Esse aspecto da participação do

espectador no gênero criado e veiculado na mídia digital traz nova dinamicidade para o estudo dos gêneros digitais. Surgem questões de cunho tecnológico sobre o tipo de gênero produzido nas telas e como são abordadas suas affordances e a integração do social com o tecnológico. Há a possibilidade dos conteúdos serem editados, sendo, portanto, renovados. No ambiente do

Facebook, a relação de autoridade e autoria, poder e conhecimento são redefinidos no design

da plataforma. Os modos que atuam nas telas são frequentemente novos gêneros em conjuntos multimodais de vários tipos (DOMINGO; JEWITT; KRESS (2014, p.5). A presença de links redireciona os espectadores a sites, páginas e conteúdos direcionados a mais informações sobre os temas de cada anúncio. Tanto o produtor publicitário como os clientes passam a ter autoridade e autonomia, em um viés de mão dupla, deixa de ser uma recepção passiva do que é veiculado no anúncio. Podemos perceber que os clientes dos bancos tornam-se mais ativos fazendo cobranças no sentido de melhoria dos serviços. No anúncio 1, por exemplo, na seção de comentários do Facebook, a cliente relata atraso de três meses no envio de seu cartão de crédito. Isso naturalmente força os bancos a oferecerem soluções em público, pois vários clientes prospectados visualizam a situação na plataforma e disso depende para que deem

credibilidade aos bancos. Essas ações contribuem para que o Facebook seja reconhecido como uma praça pública.

Na análise do discurso dos bancos digitais, os anúncios são retirados da mídia social , ocorrendo, assim, uma nova recontextualização de ambiente, que transporta o discurso dos bancos para o contexto da dissertação (3º contexto). Nele, a relação interpessoal e público- alvo do gênero são alunos, professores, pesquisadores e interessados.

No contexto da dissertação, ocorre o processo de transdução do trabalho semiótico, da mesma forma que o publicitário transforma os modos semióticos da prática discursiva das instituições bancárias para a prática do marketing no Facebook. Isso porque, ao encenar o contexto real de situação no Facebook, o publicitário utiliza outros modos semióticos para representar sua prática comercial (escolha das fotos para representar seus serviços, o que vai dizer e como na plataforma digital, artefatos semióticos, cores, design etc). As cenas reais da prática comercial dos bancos são representadas pela postagem em imagens estáticas, cenas congeladas nas imagens, permanecendo, no entanto, a dinamicidade da relação interpessoal que a plataforma virtual oferece, na qual os espectadores podem comentar, curtir ou compartilhar. O conteúdo é distribuído de forma modular: um módulo para a postagem, um módulo para preencher o que o Facebook pede (diga algo sobre essa foto) e um módulo para os comentários na rede, onde o espectador torna-se um codesigner.

Assim, no contexto da dissertação, o processo de transducão (tradução) ocorre pela migração do contexto do Facebook para o contexto da dissertação, com a mudança de modos semióticos. No processo semiótico, os anúncios da mídia social são captados pela tecla print do computador, colados no programa paint, recortados e inseridos na dissertação. Nesse contexto, os anúncios tomam nova forma. A escolha dos anúncios postados na plataforma, bem como o que os publicitários discursaram a respeito deles, transformam-se em anúncios estáticos, congelados no print e colados nas páginas da dissertação. As opções de clicar em comentar, curtir ou compartilhar, de rolar a página e de clicar no post perdem a função original. Nesse novo ambiente semiótico, os anúncios tomam uma aparência comum, como a dos anúncios impressos em revistas e jornais, causando a impressão de que não são anúncios digitais, revestidos da complexidade que os envolve como gêneros digitais. Contudo, precisamos mudar de ambiente para analisar o gênero digital na esfera acadêmica. E falar de gênero digital envolve o fato de que a tecnologia interfere na reorganização das práticas sociais e dos gêneros textuais/discursivos, gerando dinamicidade e movimento no ambiente digital, reconfigurando modos semióticos, assumindo novas funções e relações etc. Por essa razão, a plataforma do Facebook é uma forma complexa de mediação.

Todos esses fenômenos móveis que ocorrem na plataforma digital são tratados no contexto da dissertação como uma representação estática. Por essa razão, neste trabalho, analisa-se o contexto 2 (Facebook), por intermédio da ressemiotização no contexto 3 (dissertação), acessando o contexto 1, que constitui a prática social e discursiva dos bancos digitais. Em outras palavras, analisa-se a prática comercial dos bancos, por meio de suas representações nos anúncios no meio digital, acessando os discursos desses dois contextos de situação e sua relação com o contexto de cultura. Nesse viés, os modos semióticos são reconstruídos em cada interação para se encaixar nas mudanças contextuais e seus propósitos.

A plataforma do Facebook molda os processos semióticos realizados nela, na criação do gênero como forma textual das relações sociais e do discurso. Além dos processos sociais e culturais, a plataforma conjuga processos tecnológicos. O arranjo social da prática dos bancos digitais é amplificado pelo potencial da plataforma de facilitar a produção de textos com maior agregação de modos semióticos. Podemos perceber que a imagem e as cores ganham maior relevância em todos os anúncios.

Outro fator importante a ser abordado e que perpassa a análise de todos os anúncios é a perspectiva mais ampla que Kress e van Leeuwen (2001) delineiam para a questão do

significado em uma abordagem multimodal. Para além da tradição linguística, que define a

linguagem como um sistema de dupla articulação (forma e significado), os autores, seguindo os estratos da linguagem de Halliday, expandem a questão do significado para outros estratos não ordenados hierarquicamente: discurso, design, produção e distribuição. Como trajetória do trabalho semiótico, a análise do corpus desta pesquisa inclui esses significados, embora eles não sejam o foco.

Passemos agora a uma breve explicação do funcionamento desses estratos para a publicidade dos bancos digitais. Na visão do discurso como conhecimento socialmente construído de algum aspecto da realidade, o marketing dos bancos, a partir dos temas escolhidos para veicular em cada anúncio, desenvolve uma série de discursos a partir dos modos semióticos que escolhem. Esses discursos são destacados na análise individual dos anúncios, destinados à publicidade de diferentes serviços.

O design é um estrato do significado situado entre o conteúdo e a expressão, e inclui formular o discurso ou combinação de discursos na inter-relação particular com os espectadores do Facebook e na forma específica de combinar os modos semióticos. O modo particular de interação da publicidade consiste na divulgação e prospecção dos vários serviços que os bancos digitais oferecem. A escolha do design (projeto) para todos os anúncios segue uma linha tradicional, convencional, prescritiva/persuasiva do gênero publicitário neste

contexto de cultura/situação, em que se desenvolvem formas de expressão do discurso publicitário para interação no Facebook. O design permanece separado da produção material do produto semiótico ou da real articulação do material do evento semiótico. Por essa razão, o produtor publicitário pode utilizar o design dos anúncios para materializar seus discursos em diferentes realidades, como blogs, sites, revistas digitais, impressas etc. O banco Inter, por exemplo, em um site de tecnologia e finanças (figura 20), mantém o design da cor laranja, que é muito representativa na construção de seus discursos e logomarca, o formato retangular antecede todos os textos verbais, mais longos e abaixo das imagens, visando chamar atenção para o conteúdo detalhado e as vantagens de seus serviços. Dessa forma, mantém o mesmo

design, mas muda o meio de divulgação, que passa a ser um site da web, de forma diferente

do que acontece na plataforma do Facebook, de acordo com as affordances próprias de cada tecnologia digital em que é veiculado o projeto publicitário do banco. O design dos anúncios fica padronizado pela imposição do formato da plataforma. Assim, design é a prática onde modos, mídias, formatos, propósitos retóricos, interesses do designer e características do público-alvo são alinhados. A partir da perspectiva do designer, o design, como processo intermediário, dá forma aos interesses, propósitos e intenções do rhetor (geralmente o

designer/ publicitário), em relação aos recursos semióticos disponíveis e aptos para

realizar/materializar esses propósitos.

Figura 20 - Design aplicado em site de tecnologia

.

A produção consiste na etapa da organização da expressão, da articulação/produção material, que depende das habilidades de o produtor publicitário utilizar os modos, bem como as mídias semióticas. Nesse caso, a mídia é a plataforma do Facebook.

Os anúncios se apresentam definidos na etapa de finalização da produção e vão para a etapa de distribuição no Facebook, que faz circular os anúncios em vários contextos e dispositivos. O estrato da distribuição, conforme Kress e van Leeuwen (2001, p.7) parece ser não semiótico, ou seja, parece que não interfere nos significados dos anúncios postados. Contudo, interfere, pois o Facebook não só distribui (uma parte da produção é feita na plataforma: o que o produtor diz sobre o que postou) como também mantém a comunicação com os interlocutores na rede pela produção constante e sucessiva de novos conteúdos produzidos pelas demandas dos comentários. É uma mídia que produz e distribui, e a distribuição também é feita pelos compartilhamentos. A partir das demandas de conteúdos solicitados pelos interlocutores nos comentários, o sentido da comunicação vai sendo ampliado e modificado, conforme as necessidades que surgem, como dar uma nova informação, resolver um problema do cliente etc.

Cada um dos estratos (discurso, design, produção e distribuição) requer diferentes habilidades. No caso da publicidade, essas habilidades são geralmente exercidas pelas agências de publicidade, embora os recursos tecnológicos estejam viabilizando, cada vez mais, que pessoas comuns produzam e distribuam diversos gêneros. Em termos de mídia digital, como o Facebook, as funções de produção e distribuição são tecnicamente integradas, formando uma extensão de muito maior alcance.

Além dos significados advindos do discurso, do design, da produção e distribuição, a complexidade dos signos é analisada pelas funções que os compõem. Nessa perspectiva, a imagem, as cores, a escrita etc., são modos semióticos, cujos sentidos podem ser depreendidos pelas ferramentas descritivas das metafunções ideacional, interpessoal e textual, presentes no contexto de situação, em um entrelaçamento com as variáveis de registro campo, relação e modo.