• Nenhum resultado encontrado

2 PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

2.5 Gramática do Design Visual

2.5.3 Metafunção Interativa

Nesta seção abordamos a metafunção interativa, que trata da interação entre participantes representados e interativos e está no escopo de análise desta pesquisa. De acordo com a Gramática do Design Visual, as imagens podem apresentar dois tipos de participantes: os participantes representados (pessoas, lugares e coisas representadas na imagem) e os

participantes interativos (pessoas que se comunicam por meio das imagens: os produtores e

quem as visualiza). Na esteira de kress e van Leeuwen (2006 p.114), há três tipos de relações entre os participantes (i) relações entre os participantes representados (ii) relações entre participantes interativos e representados ( refere-se à atitude dos participantes interativos em relação aos participantes da imagem) (iii) relações entre os participantes interativos, que realizam ações entre eles por meio das imagens.

Nessa perspectiva, os participantes interativos, nos termos de Kress e van Leeuwen (2006), são pessoas reais que produzem os efeitos de sentido das imagens no contexto das instituições sociais e, em diferentes graus e formas, regulam o que pode ser dito, como pode ser dito e como deve ser interpretado por intermédio delas. “São os participantes do ato da comunicação, aqueles que falam, ouvem, escrevem, leem, produzem ou observam as imagens” (p.48). Eles não são representados nas imagens, como ocorre nas representações narrativas e conceituais. Já os participantes representados são aqueles que constituem o assunto da comunicação, ou seja, pessoas, lugares ou coisas (incluindo coisas abstratas),

representados na fala, escrita ou imagem, ou seja, os participantes sobre quem ou o que estamos falando, escrevendo ou produzindo imagens. Eles interagem com quem visualiza a imagem por meio de duas funções comunicativas diferentes e fundamentais, expressas por um

olhar de oferta ou demanda. Por exemplo, uma imagem que posiciona um participante

olhando diretamente nos olhos do consumidor estabelece um contato a nível imaginário, por meio de vetores e das linhas dos olhos do participante representado, que se conectam a esse consumidor (visualizador).

Assim, estabelece-se uma comunicação visual direta, constituindo-se um ato de imagem como quem diz “estou falando com você”. Dessa forma, os produtores usam esse tipo de imagem com olhar de demanda para estabelecer uma relação imaginária, acrescida de gestos e expressões faciais dos participantes representados:

Eles podem sorrir, nesse caso o espectador é convidado a entrar numa relação de afinidade com eles; eles podem encará-lo com frieza e desdém, caso em que o interlocutor é convidado a relacionar-se com eles, talvez, como um inferior se relaciona com um superior; eles podem brincar com o espectador, caso em que ele é solicitado a desejá-los (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006 p.118).18

Nessa medida, cada tipo de escolha solicita algo do espectador, ou para uma aproximação, ou para um distanciamento, dependendo dos objetivos da produção. As relações interacionais em imagens com olhar de oferta direciona o espectador de forma indireta, pois ele não é mais o objeto do olhar do participante representado. Nesse modelo, o participante representado é objeto de uma observação desapaixonada, em que não é estabelecido um contato.

Como descrito por Kress e van Leeuwen (2006), o olhar de demanda é uma demanda visual por informação, enquanto o olhar de oferta é uma oferta de informação ou declaração visual. A demanda por informação segue o padrão das polaridades estabelecidas em Halliday (2014), em que o ator social escolhe um nível de polaridade de respostas na interação (sim, não, talvez, etc.).

Em suma, as imagens podem apresentar participantes representados, dispostos em um tipo de olhar: seja para o participante interativo, seja para outro participante representado dentro da imagem. Nesse caso, Kress e van Leeuwen (2006[1996]) ponderam que o participante representado seja humano e, se for objeto, tenha características humanas. Assim

18 No original: “They may smile, in which case the viewer is asked to enter into a relation of social affinity with them; they may stare at the viewer with cold disdain, in which case the viewer is asked to relate to them, perhaps, as an inferior relates to a superior; they may seductively pout at the viewer, in which case the viewer is asked to desire them” (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006, p. 118).

como na proposição verbal, na proposição visual – em que uma imagem oferta ou demanda alguma coisa –, um ator social pode aceitar ou rejeitar uma oferta ou um comando. Essas interações são chamadas atos de imagem (KRESS; VAN LEEWEN, 2006[1996]) e podem estabelecer um olhar de oferta ou de demanda, que marca maior ou menor interação com o leitor.

É importante ressaltar que toda imagem é produzida para fazer circular um discurso, o qual é criado num contexto de produção, ficando o produtor ausente do contexto de recepção, no qual o público a que se destina observa tal imagem. Em vista disso, a relação entre esses dois participantes interativos (produtor e audiência) realizar-se-á por meio da imagem. Por essa via, o produtor expressa componentes ideológicos e uma intencionalidade prévia sobre o público-alvo.

Portanto, participantes interativos e representados são incluídos em cada ato semiótico, visando interagir e envolver. A lógica da imagem, apontada por Kress e van Leeuwen (2006), permite que eles sejam capazes de evocar uma reação emocional imediata, de uma maneira que a linguagem escrita não é capaz.

O impacto emocional que as imagens evocam está relacionado à maneira com que esses participantes criam relacionamentos interpessoais com os interlocutores. Nessa medida, o produtor de uma imagem utiliza técnicas para envolver a audiência. Além do tipo de olhar, há outras estratégias, como o estabelecimento da distância ou afinidade social, bem como do

ponto de vista ou perspectiva.

A distância ou afinidade social, para Kress e van Leeuwen (2006[1996]), refere-se ao distanciamento, sendo em forma de close-up, plano médio e plano aberto, traçando na imagem uma relação imaginária de maior ou menor distância social entre o participante representado na imagem e o interativo, dependendo do enquadramento: quanto menor a distância entre eles, maior o grau de proximidade com esse interlocutor.

Dependendo do ângulo em que as pessoas são retratadas nas imagens, elas podem expressar uma relação imaginária de amizade ou estranheza. Por exemplo, as imagens permitem-nos chegar imaginariamente mais perto de figuras públicas como se elas fossem nossos amigos e vizinhos ou podemos olhar para pessoas semelhantes a nós mesmos como estranhos. Por essa razão, as interações sociais são determinadas, literal e figurativamente, pela distância que mantemos uns dos outros, pois carregamos barreiras invisíveis, permitindo a ultrapassagem somente de certas pessoas (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006[1996]).

Os autores definem que uma imagem, com enquadramento close-up (de perto), mostra cabeça e ombros do participante representado, enquanto uma foto enquadrada em close-up

extremo (bem de pertinho) mostra bem menos que isso. Na imagem enquadrada no plano médio, o participante representado aparece fotografado até o joelho. Já no plano aberto, a distância é mais ampla, com o participante sendo representado com o corpo inteiro, incluindo todo o cenário que se encontra a sua volta.

Além disso, a distância social pode ser aplicada à representação de objetos e do ambiente. Um objeto mostrado a uma distância próxima faz com que a audiência se sinta engajada com ele, usando o produto ou realizando algo. Se o enquadramento tem uma distância média, o objeto é mostrado inteiramente, sem espaço à sua volta, colocando o público de frente para o que está sendo exibido, sendo o mais comum na publicidade. À longa distância, cria-se uma barreira invisível entre o público e o objeto, colocando-o fora de nosso alcance, como se fosse exibido em uma vitrine, apenas para contemplação.

Além da escolha entre olhar de demanda ou oferta e o tamanho do enquadramento (perto, médio ou amplo), o publicitário deve selecionar o ângulo ou ponto de vista em que a imagem será apresentada. Para Kress e van Leeuwen (2006[1996]), isso implica a possibilidade de expressar atitudes subjetivas para os participantes representados, as quais, frequentemente, são determinadas socialmente, porém codificadas como subjetivas, individuais e únicas. Assim, pontos de vista socialmente determinados podem ser naturalizados. Os autores classificam dois tipos de imagens nas culturas ocidentais: subjetivas e objetivas.

Em imagens subjetivas, o público-alvo pode ver o que há para ser visto somente através de um ponto de vista particular, enquanto as imagens objetivas revelam tudo que há para ser decifrado ou o que a imagem julgou ser sobre os participantes representados. Imagens objetivas não levam em consideração quem as observa e tendem a ocorrer em diagramas e mapas técnicos. Em contraposição, o ponto de vista da imagem subjetiva foi selecionado para o público-alvo e é imposto não só aos participantes representados, como também aos interativos, no sentido de serem sujeitados a algo ou alguém. Assim, a escolha de um ângulo frontal imprime maior envolvimento com o público, enquanto um ângulo oblíquo causa um distanciamento, sugere um comportamento. O ângulo na linha dos olhos representa igualdade entre os participantes e não há diferença de poder envolvidas, enquanto um ângulo alto faz o sujeito parecer pequeno e insignificante, pois tende a diminuir o indivíduo, reduzindo-o ao nível do chão. Já um participante representado, colocado em um ângulo baixo, faz a audiência parecer imponente e incrível (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006[1996]).

Em vista disso, seguindo de perto Kress e van Leewen, 2006[1996], um participante representado pode nos fazer sentir inferiores, superiores ou iguais, dependendo do ângulo que

ocupa na imagem. Isso se aplica também a imagens de produtos para publicidade, colocados em ângulo alto para ter poder simbólico sobre nós, ou fotografados abaixo da nossa linha de visão para torná-los acessíveis e nos oferecer poder de compra. Em textos verbais, o poder é demonstrado em frases publicitárias moduladas como: “você precisa”, “você não pode”, em que compreende a falta de reciprocidade. No caso de imagens, o poder de um produtor é transferido para os participantes representados como, por exemplo, a modelo que anuncia um produto. Apresento, na sequência, a síntese dos significados interativos.

Quadro 3 - Significados interativos das imagens

Significados Interativos Contato Demanda Oferta Distância Social Íntima/pessoal Social Impessoal Atitude Subjetiva Objetiva Envolvimento Distanciamento Poder no público Nível de igualdade Poder no participante representado Ação orientada Conhecimento orientado

Figura 19- Exemplo de significados interativos

Fonte: arquivo pessoal. Dez/2019.

Na figura 19, o fotógrafo (sign maker) direcionou a criança para que ela olhasse para a câmera (olhar de demanda) e interagisse com os participantes interativos da imagem. Além do olhar, o sorriso e os gestos, como significado semiótico, envolvem quem vê a imagem. O enquadramento médio (médium shot) cria um relacionamento social com os participantes interativos, e a atitude subjetiva cria uma relação de poder para a criança, que olha para o público de um ângulo superior, de forma que ela seduza a audiência. O plano de fundo desfocado também a destaca, além de outros efeitos de modalidade (brilho, sombras, luz, profundidade etc.) muito relevantes para a fotografia, tendo em vista que o objetivo do fotógrafo é criar imagens que envolvam as pessoas e que elas apreciem. Adicionando os significados representacionais, com a presença de um processo narrativo, que encena um abraço, o fotógrafo deixa sua produção mais envolvente ainda.

Ressalta-se que, para Kress e van Leeuwen (2006, p.42), qualquer modo semiótico deve ser capaz de projetar as relações entre o produtor de um signo complexo e o recebedor

ou reprodutor daquele signo. Assim, qualquer modo deve ser capaz de representar uma relação social particular entre o produtor, o público-alvo e o objeto representado19.

A modalidade, conceituada como “teoria social do real” (KRESS E VAN LEEUWEN, 2006, p.154) é relevante na construção dos anúncios veiculados no Facebook porque discute sua veracidade perante o público, sendo, portanto, um aspecto importante na interatividade.