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Introdução Geral

1. Contextualização do problema

A disciplina de Física e Química A, do ensino secundário português, tem registado elevado insucesso por parte dos alunos, algo publicamente posto em evidência através dos resultados por eles obtidos nos exames nacionais. Este facto configura um sério problema com o qual nos temos vindo, ano após ano, a confrontar, dada a nossa qualidade de docente da disciplina. Tal situação foi fazendo crescer em nós o interesse em vir a realizar investigação sistemática sobre práticas de avaliação interna e externa na disciplina, procurando pesquisar relações entre as mesmas e os resultados finais obtidos pelos alunos na disciplina. Mais especificamente, pretendíamos conhecer algumas das condicionantes ao nível de práticas e instrumentos de avaliação aplicados ao longo do ano letivo e particularmente aqueles que possam estar relacionadas com o elevado insucesso que se tem verificado na disciplina, derivando assim conhecimento que permita propor alternativas de forma sustentada e induzir mudanças suscetíveis de, no futuro, conduzir a melhores resultados académicos. Para levar a cabo esta investigação, optámos por um estudo de caso, realizado numa escola secundária portuguesa com 3.º ciclo do Baixo Alentejo, que aqui designamos por escola X.

O panorama nacional dos últimos anos, no que diz respeito ao desempenho dos alunos na disciplina de Física e Química A, está representado na Tabela 1, onde apresentamos as médias das classificações obtidas pelos alunos internos que realizaram exame nacional de Física e Química A e as respetivas taxas de reprovação, na primeira fase, no período compreendido entre 2009 e 2014. Tendo em conta esses dados, disponíveis na página da Direção Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular, e também nos

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relatórios do Júri Nacional de Exames, pode observar-se, a título de exemplo, que nos anos de 2012 e 2013 os alunos internos obtiveram uma média que não foi além de 8,1 valores no exame nacional da disciplina, tendo como consequência taxas de reprovação de 24%. No período considerado na Tabela 1, apenas no ano de 2011 se registou uma média na classificação do exame nacional de Física e Química A superior a dez valores. Pensamos, pois, ser este um tema merecedor de atenção, de modo a tentar compreender o insucesso dos alunos nesta disciplina na relação com a avaliação das aprendizagens ao longo do ano letivo.

Tabela 1

Médias de classificações obtidas pelos alunos internos que realizaram exame nacional de Física e Química A e respetivas taxas de reprovação, na primeira fase, no período entre 2009 e 2014.

2009 2010 2011 2012 2013 2014

Média 8,7 8,5 10,5 8,1 8,1 9,2

Taxa de

reprovação 24 25 16 24 24 19

Estes dados motivaram-nos para a realização de um estudo empírico preliminar, realizado ainda antes do trabalho de investigação que conduziu a esta tese, tendo por enfoque as classificações obtidas pelos alunos de duas turmas da escola X, no âmbito da avaliação interna e externa na disciplina de Física e Química A.

Na referida escola, são tidos em conta na avaliação interna dois domínios fundamentais:

conhecimentos e competências, por um lado, e valores e atitudes, por outro. O primeiro

domínio é avaliado sobretudo através dos tradicionais testes de avaliação escritos e de trabalhos de grupo, principalmente na forma de relatórios de atividades laboratoriais. De referir que a escola X aderiu ao Projeto Testes Nacionais Intermédios (que tinha como finalidade principal preparar os alunos para os itens dos exames nacionais), com caráter sumativo, pelo que, para a referida análise, tivemos em conta, para além das

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classificações de exame e das classificações internas finais, as classificações nos testes nacionais intermédios, nos testes elaborados ao nível de escola, nos trabalhos de grupo e as classificações atribuídas aos alunos no domínio dos valores e das atitudes.

A Tabela 2 apresenta as médias dos resultados obtidos pelos alunos que realizaram o exame de Física e Química A na escola X, nos anos letivos de 2010/2011 e 2011/2012 (49 e 48 alunos, respetivamente). A Tabela foi elaborada com base nas pautas de classificação do referido exame e nas grelhas de aplicação dos critérios de avaliação interna estabelecidos para a disciplina de Física e Química A, na escola X. Os parâmetros considerados foram os seguintes:

CI – classificação interna final obtida pelos alunos no ano letivo em causa.

E – classificação obtida pelos alunos no exame (1.ª fase) da disciplina de Física e

Química A (código 715)

TN – classificação obtida pelos alunos no teste nacional intermédio da disciplina de

Física e Química A (11.º ano de escolaridade)

TE – média das classificações obtidas pelos alunos em todos os testes escritos

realizados a nível de escola durante os anos letivos em causa

TG – média das classificações obtidas pelos alunos em todos os trabalhos de grupo

realizados durante os anos letivos em causa

VA – média das classificações obtidas pelos alunos em todos os parâmetros relativos a

valores e atitudes durante esses anos letivos

Tabela 2

Médias das classificações obtidas pela totalidade dos alunos inscritos na disciplina de Física e Química A e que realizaram exame nacional – 1ª fase, nos anos letivos 2010/2011 e 2011/2012, na escola X.

Classificação Interna (CI) Exame (E) Teste Nacional (TN) Testes de escola (TE) Trabalhos de grupo (TG) Valores e Atitudes (VA) Média 2010/2011 12,1 8,3 9,2 10,9 15,4 13,9 Média 2011/2012 10,7 5,9 5,0 9,2 13,4 13,9

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Observando os dados apresentados na Tabela 2, pode verificar-se a existência de uma diferença nítida entre a classificação interna (CI) e a classificação de exame (E), sendo a primeira claramente mais elevada, nos dois anos letivos em análise. Constata-se, por outro lado, que as médias das classificações nos trabalhos de grupo (TG) e no domínio dos valores e atitudes (VA) se apresentavam, ambas, bastante afastadas da média registada nos exames (E), atingindo valores bastante superiores a essa média e também superiores às classificações internas (CI), nos dois anos letivos.

De notar ainda que nos testes realizados ao nível de escola (TE) foram registadas médias superiores à média de exame (E) nos dois anos letivos analisados, mas no caso dos testes nacionais (TN) verificou-se que os alunos da escola X, no ano letivo 2011/2012, obtiveram uma média inferior à da classificação de exame (E). A diferença da média dos testes de escola relativamente à da classificação de exame (E) é maior do que a diferença entre a média dos testes nacionais intermédios e a da classificação de exame (E), em ambos os anos letivos analisados, algo que pode ser explicável tendo em atenção que as características dos testes nacionais intermédios serão sempre mais próximas das do exame (uma vez que é a mesma instituição que os elabora e com o objetivo de preparar os alunos para o tipo de itens de exame). De registar ainda um afastamento mais elevado relativamente à classificação de exame, no caso dos testes de escola (TE), no ano letivo de 2011/2012.

Poderá assim perguntar-se que itens dos testes de avaliação realizados ao nível da escola – se é que diferentes – permitem que os alunos tenham uma média mais elevada nestes do que nos testes nacionais intermédios ou no exame. Também nos parece pertinente analisar até que ponto uma menor abrangência de conteúdos programáticos nos testes de avaliação a nível de escola poderá contribuir para um maior sucesso nestes do que nos testes nacionais intermédios ou nos exames nacionais.

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Pela observação da Tabela 2, também verificamos um pior desempenho dos alunos da escola X, no ano letivo 2011/2012, em todos os parâmetros analisados, exceto em valores e atitudes (VA). Parece haver assim coerência em todos os parâmetros que privilegiam a avaliação no domínio cognitivo, quer considerando a avaliação interna quer externa. No entanto, este pior desempenho não poderá ser atribuído apenas aos alunos da escola em causa, uma vez que também a nível nacional se verificou um pior desempenho no ano letivo 2011/2012, com uma diminuição de 2,4 valores1 na média nacional do exame relativamente a 2010/11. Assim, também um maior “grau de dificuldade” do enunciado da prova de 2012 relativamente ao da prova de 2011 poderá ser tido em conta na análise desta diminuição da média nacional e da dos alunos da escola X, uma situação que deveria igualmente merecer reflexão por parte dos responsáveis pela elaboração das provas.

Para esta análise, procedemos também à procura de eventuais correlações entre as variáveis consideradas (as mesmas da Tabela 2), recorrendo para isso ao coeficiente de correlação de Pearson. Na Tabela 3 encontram-se registados os valores encontrados das diferenças entre as médias e as correlações entre classificações obtidas no exame nacional (E) e em diferentes elementos de avaliação utilizados na disciplina de Física e Química A.

1 Em 2010/2011, a média nacional da 1ª fase, considerando apenas os alunos internos, foi de 10,5 e considerando todos os alunos que realizaram exame 9,9 valores (Relatório 2011 do Júri Nacional de Exames). Em 2011/12, a média nacional da 1ª fase, considerando apenas os alunos internos, foi de 8,1 e, considerando todos os alunos que realizaram exame, 7,5 valores (Relatório 2012 do Júri Nacional de Exames).

8 Tabela 3

Diferenças entre as médias, correlações entre classificações obtidas no exame nacional (E) e em diferentes elementos de avaliação utilizados na disciplina de Física e Química A, nos anos letivos 2010/2011 e 2011/2012, pelos alunos na escola X.

CI - E TN - E TE - E TG - E VA - E Diferença de médias 2010/2011 3,8 0,9 2,6 7,1 5,6 Correlação 2010/2011 0,9 0,7 0,9 0,4 0,5 Sig 2010/2011 0,000 0,000 0,000 0,004 0,000 Diferença de médias 2011/2012 4,8 0,9 3,3 7,5 8,0 Correlação 2011/2012 0,7 0,7 0,8 0,1 0,5 Sig 2011/2012 0,000 0,000 0,000 0,340 0,000

Como se pode verificar, foram registadas correlações bastante significativas (p <0,01) entre as classificações obtidas pelos alunos no exame nacional (E) e todas as outras classificações consideradas nesta análise (CI, TN, TE, VA), exceto trabalhos de grupo (TG) para o ano letivo 2011/2012. Verifica-se que foi maior a correlação entre os testes elaborados ao nível de escola (TE) e os exames (E) do que a verificada entre os testes nacionais (TN) e o exame (E), o que a verificar-se a nível nacional podia colocar em causa a eficácia dos testes nacionais intermédios como modo de preparação dos alunos para o exame nacional. Estes dados, relativos à escola X, permitem supor que a classificação dos testes elaborados a nível de escola e a classificação interna poderiam ser melhor preditores da classificação de exame do que a classificação nos testes nacionais intermédios.

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Constata-se, ainda, que a variável trabalhos de grupo (TG) foi a que evidenciou uma menor correlação com o exame (E), nos dois anos letivos considerados. Pensamos que seria pertinente uma reflexão sobre a forma como este instrumento de avaliação (TG) 2 é aplicado na escola onde efetuámos o estudo, ou seja, tentar perceber o que ele avalia de facto e como é avaliado, uma vez que se trata de um elemento que também tem por objeto de avaliação essencialmente o domínio cognitivo, pelo que seria de esperar uma correlação mais elevada com a classificação dos exames (E). Também se verificou uma baixa correlação entre a variável valores e atitudes (VA) e o exame (E), o que pode ser explicado por serem instrumentos de avaliação de domínios distintos. Importa salientar que os dados aqui apresentados resultaram de um estudo preliminar com uma amostra reduzida, que não atingiu uma centena de alunos.

Ainda a propósito dos resultados registados na disciplina de Física e Química A, mas a nível nacional, o relatório preliminar dos exames nacionais de 2013, divulgado pelo então GAVE (Gabinete de Avaliação Educacional), atual IAVE (Instituto de Avaliação Educativa), refere que persistem os resultados “cronicamente mais baixos, sempre próximos dos 80 pontos, com exceção do único registo positivo desta série, 105 pontos, observado em 2011” (p.12), correspondendo a 8,0 e a 10,5 valores respetivamente. Este relatório refere ainda duas variações interanuais que ultrapassam os 14 pontos, nos quatro anos consecutivos entre 2010 e 2013, precisamente em 2010-2011 (subiu) e em 2011-2012 (desceu). De referir a dificuldade em comparar resultados de anos diferentes, uma vez que, apesar de ser mantida uma estrutura muito semelhante, faltam mecanismos de avaliação padronizados que permitam uma comparação longitudinal das provas (Bennett, Tognolini e Pickering, 2012).

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Lembramos que TG corresponde à média das classificações dos trabalhos realizados em grupo e é neste sentido que entendemos como instrumento de avaliação.

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O problema dos baixos resultados obtidos pelos alunos da escola X, no exame nacional de Física e Química A, já evidenciado na Tabela 2, não é pois um caso exclusivo da escola sede deste estudo, como se constata pela média das classificações obtidas a nível nacional no exame da disciplina (em especial em 2012 e 2013, com média de 8,1 valores para alunos internos, os valores mais baixos obtidos nos últimos seis anos).