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4 RESPONSABILIDADE PENAL PELO PRODUTO DOS INTEGRANTES DA EMPRESA

4.2 Contextualização da problemática

Um sujeito pode ser coautor de um delito empresarial: por intervenção igual a dos outros sujeitos ou por divisão de funções. A coautoria é nada mais que uma consequência direta do sistema de divisão horizontal do trabalho, no qual os vários agentes integrantes da ação criminosa dividem uma multiplicidade de tarefas (multiplicidade de condutas), visando o mesmo objetivo delituoso (identidade de infração), sendo que cada uma das funções é fundamental à realização deste (relação de causalidade), inexistindo qualquer relação de acessoriedade (participação).218

A pluralidade de autores na prática de delitos sempre foi matéria importante para o Direito Penal, mas nunca esteve tão em pauta, destacando-se a dificuldade em aplicar os requisitos clássicos de responsabilização penal individual aos delitos oriundos da criminalidade organizada do tipo empresarial.219

Cenário no qual, em razão da divisão de trabalho, os elementos do tipo objetivo do delitivo também se repartam entre diferentes sujeitos, de tal forma, que nunca recaia exclusivamente sobre um único agente, quebrando com a tese tradicional da responsabilidade penal individual, na qual o sujeito deve praticar todos os elementos do injusto (objetivos e subjetivos) para poder ser imputado como seu responsável.220

As teorias clássicas da autoria, apesar de fundamentais nessa linha evolutiva, atualmente recebem inúmeras críticas no tocante a responsabilização penal dos integrantes da estrutura empresarial, isto porque, apresentam-se como insuficientes

218 PEÑARANDA, Enrique Ramos. Autoría y Participación en la Empresa. Cuestiones Actuales de

Derecho Penal Empresarial - Coord. José Ramon Serrano-Piedecasas & Eduardo Demetrio Crespo. Madrid: Editora Colex, 2008, p. 161-165.

Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

219 SÁNCHEZ, Bernard Feijoo. Imputación Objetiva en el Derecho Penal Económico. Buenos

Aires: Editorial Bdef, 2009, p. 01-15. Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla-La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano-Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

220 Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal

Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

e ineficazes ao controle da criminalidade organizada do tipo empresarial, em especial nas condutas cometidas através de divisões de tarefas.221

A aplicação dessas teorias, muitas vezes, levaria a responsabilidade penal dos trabalhadores que executam diretamente a prática delitiva, mesmo que em cumprimento de uma ordem superior. São “autores”, pois, muitas vezes, podem entender o caráter ilícito de sua conduta, porém, agem no cumprimento de sua função profissional.222

A grande questão seria avaliar a necessidade de que a responsabilidade deve ser elevada a direção da organização, aqueles que para muitos são os verdadeiros responsáveis em última instância pela prática de tais comportamentos.

É neste contexto que, no âmbito do Direito Penal Econômico, e principalmente na esfera da responsabilidade penal pelo produto, se percebe lesionado o sentimento de justiça e confiança, manifestado pela opinião pública, que gostariam de verem castigados pelo peso da lei os principais responsáveis (integrante da cúpula empresarial), como autores dos delitos e não como meras figuras secundárias, como os partícipes ou cúmplices.

Assim cada vez mais ganha relevo a problemática acerca dos critérios de imputação clássicos geralmente admitidos em matéria de autoria e participação, os quais geram consequências muito negativas no âmbito das atividades empresariais.223

Percebe-se que a impossibilidade técnica de apontar o componente do produto responsável pela lesão ao bem jurídico individual, em razão da divisão de tarefas nas empresas organizadas de forma mais ou menos hierárquicas, em virtude da sucessiva delegação de função, divisão e organização do trabalho, propicia uma

221 SÁNCHEZ, Bernard Feijoo. Imputación Objetiva en el Derecho Penal Económico. Buenos

Aires: Editorial Bdef, 2009, p. 01/15.

Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

222 Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal

Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

223 Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal

Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

separação muito significativa entre a colocação do produto no mercado de consumo e a responsabilidade pelas atividades empresariais, acarretando grandes reflexões no que tange aos limites da responsabilidade penal pelo produto dos níveis superiores e subordinados das estruturas empresariais 224.

Ao encontrar com problemas de participação complexa, como os que decorrem do Direito Penal da Empresa, a jurisprudência tem optado em lugar de determinar quem é o mais próximo do fato, para transferir a responsabilidade diretamente aos níveis mais alto da direção da empresa. Inclusive, situados na responsabilidade pela imediata alta direção na empresa, chama também a atenção que todos os diretivos respondam por igual, ainda que o delito não seja cometido em concreto no seu âmbito de responsabilidade, utilizando como argumento que esta limitação da responsabilidade cesse em situações excepcionais ou de crise (tradução livre) 225.

Uma das questões mais problemáticas na atual conjectura consiste em determinar a responsabilidade dos níveis superiores da estrutura empresarial, já que estes não praticam atos de execução, não dão ensejo a processos causais naturalísticos, mas que caso agissem poderiam impedir resultados danosos à bem jurídicos, dos quais juridicamente, a priori, não são responsáveis pela lesão de forma ao menos culposa.226

Atualmente percebe-se que a doutrina e jurisprudência mundial cada vez mais rejeitam o modelo de responsabilidade botton-up, uma vez que a responsabilidade penal não deve se restringir aos níveis inferiores. Deve-se também estendê-la aos níveis superiores, ao menos naqueles casos em que se comprove o dolo (ou culpa quando houver a previsão), e ficar demonstrado que o titular ou o diretivo da

224 Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal

Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

225 “Al encontrarse con problemas de participación compleja, como los que suelen acaecer en el

Derecho penal de la empresa, la jurisprudencia ha optado en lugar de determinar cuál es el autor más próximo al hecho, por trasladar la responsabilidad directamente hacía los niveles más altos de dirección de la empresa. Incluso, situados ya en la responsabilidad inmediata de la alta dirección de la empresa, llama también la atención el que todos los directivos respondan por igual, pese a que el delito no haya sido cometido en su concreto ámbito de responsabilidad, utilizando como argumento el que esta limitación de la responsabilidad cesa en situaciones excepcionales o de crisis”.ZAPATERO, Luis Arroyo. Derecho Penal Econômico y Constitución. Revista Penal, vol. 1, Barcelona: 1998, p. 24.

226 Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal

Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

empresa não fez o que era possível ou exigível para evitar sua execução 227. O principal foco de discussão tem recaído na responsabilidade penal sobre o produtor, quando, mesmo que não se tenha comprovado que tenha se comportado de forma reprovável, irá responder a título de dolo ou culpa por sua omissão em advertir eventuais consumidores do risco que surgiu da utilização do produto (ex post) e até mesmo em não retirar o produto impróprio do mercado 228.

A imputação tem como pressuposto a posição de garante dos níveis superiores, em decorrência de um dever de vigilância sobre fontes de perigo de caráter pessoal, material ou de proteção a determinados bens jurídicos. Trata de um dever especial de manter o baixo risco dos perigos que podem originar do âmbito de organização empresarial, ou seja, dos produtos colocados no mercado de consumo.

Dentro da posição favorável, a principal argumentação aponta o fato do domínio dos níveis superiores sobre a base hierárquica da empresa, já que com o poder de ordem e transmissão de informação o delito praticado pelo autor imediato poderá ser vinculado à empresa como um todo, qualificado como delito de grupo, o qual se imputa aos responsáveis pela direção da empresa. O que não significa que ele tenha atuado no interesse da empresa 229.

Por outro lado aponta-se a incoerência em aceitar uma posição geral de garante dos proprietários da empresa, afirmando a impossibilidade de deduzir um dever desta natureza das disposições prescritas no ordenamento vigente 230.

Essa ideia de contrapartida do modelo democrático de organização política, no qual os órgãos diretivos assumem a posição de garante com fundamento da liberdade fundamental de organizar-se da forma que melhor atenda seu interesse

227 SÁNCHEZ, Bernard Feijoo. Imputación Objetiva en el Derecho Penal Económico. Buenos

Aires: Editorial Bdef, 2009, p. 38.p. 08. PEÑARANDA, Enrique Ramos. Autoría y Participación en la Empresa. Cuestiones Actuales de Derecho Penal Empresarial - Coord. José Ramon Serrano- Piedecasas & Eduardo Demetrio Crespo. Madrid: Editora Colex, 2008, p. 164.

Conclusão obtida nos estudos das aulas ministradas no curso de Pós-Graduação em Direito Penal Econômico (Derecho Penal Económico y de la Empresa), realizado pela UCLM - Universidad Castilla- La Mancha – Toledo – Espanha, Coordenação de Eduardo Crespo Demetrio, José Ramón Serrano- Piedecasas Fernández, entre 10 a 28 de janeiro de 2010.

228 CRESPO, Eduardo Demetrio. Responsabilidad penal por omisión del empresário. Madrid:

Iustel, 2009, p. 43/46.

229 SÁNCHEZ, Bernard Feijoo. Imputación Objetiva en el Derecho Penal Económico. Buenos

Aires: Editorial Bdef, 2009, p. 33/38.

230 CRESPO, Eduardo Demetrio. Responsabilidad penal por omisión del empresário. Madrid:

Iustel, 2009, p. 47. HASSEMER, Winfried. CONDE, Muñoz. La Responsabilidad por El producto em derecho penal. Valencia: Tirant lo blanch, 1995.

desde que não cause processos causais danosos, quando colocada a termos numa teoria garantista do Direito Penal do Estado de Direito, nas melhores das hipóteses será controversa 231.

4.3 Modelo de baixo para cima (botton-up model) e outro de cima para baixo