• Nenhum resultado encontrado

7 APRECIAÇÕES SOBRE O ESTUDO E O TRABALHO DOS ALUNOS

7.3 A continuação de estudos

Balbinder (2001) encaminhou alguns dados referentes aos estudos universitários das personas con discapacidad na Espanha, os quais demonstram haver uma pequena porcentagem dessas pessoas entre as que possuem títulos universitários e, também, a existência de uma manifesta dificuldade do sistema educacional daquele país em atender aos surdos:

Un estúdio llevado a cabo por el Instituto Nacional de Estadística, de Espafía, afirma que apenas un 3,6% de los espafíoles con algún tipo de discapacidad - sobre un total de casi millón y medio de personas- posee título universitário. También se ha detectado que ciertas discapacidades complican más la integración de las personas que otras. Por ejemplo, se han censado 717 ciegos en el sistema universitário espafíol, pero solamente 50 sordos, lo cual parece responder más que nada, a la dificultad que su discapacidad le presenta en el momento de adquirir conocimientos.

Como não existe ainda no Brasil um sistema de informações que faça a identificação dos alunos com “necessidades educativas especiais” junto às universidades, quaisquer estatísticas apresentadas representam apenas valores pontuais. Em uma dessas pesquisas Mazzoni et al. (2001, p. 123) analisaram o quadro de alunos existentes na Universidade Estadual de Maringá, tendo sido identificada a existência, no ano letivo de 1999, de seis alunos com necessidades

educativas especiais, com limitações relacionadas à paralisia cerebral, deficiência visual e paraplegia, para um total de 8.961 alunos matriculados. Essa porcentagem é tão pequena que imediatamente conduz a indagações sobre a qualidade do ensino que esses alunos estão recebendo nos níveis anteriores ao ensino universitário. A mesma pesquisa pode também levar à indagação sobre qual é a atenção que está sendo dispensada ao ensino dos surdos, até então ausentes na universidade citada, também no Brasil.

Foi constatada a presença de um grande número de alunos com deficiência auditiva na escola analisada, em contraste com a ausência deles na universidade pública local. A simples presença deles, em um grande número, numa escola para educação de jovens e adultos já demonstra que sofreram as conseqüências de um sistema de ensino que não atende adequadamente às suas necessidades. Uma das razões para essa falha no sistema de ensino brasileiro pode estar associada às diferenças de aprendizagem existentes entre surdos oralizados e os não oralizados, conforme análise feita por Mello (2001).

Surdos oralizados e não oralizados geralmente apresentam diferentes raízes de concepção de mundo. Enquanto estes últimos estão mais próximos de uma "massificação" da cultura surda, que tem na língua de sinais a sua manifestação maior de cultura; os oralizados se aproximam mais das manifestações da cultura ouvinte, onde privilegia-se a habilidade da fala e eficácia em leitura labial. Por isso, nota-se que as características pedagógico-educacionais exigidas por ambos os grupos são diferenciadas.

Os professores dessa escola têm tido a oportunidade de acompanhar a trajetória de uma grande parte de seus ex-alunos e informaram que a maioria deles parararam seus estudos no nível do segundo grau, atual ensino médio, sendo bem poucos aqueles que alcançaram o nível universitário. Procurou-se saber, junto a esses professores, quais são as razões que fazem com que esses alunos não continuem os estudos.

Na opinião, de uma das entrevistadas, os alunos desistem de continuar estudando num nível mais adiantado por uma questão de conformismo, e isso ocorre com freqüência pelo fato de já terem um emprego.

Muitos terminam o segundo grau e se sujeitam aos trabalhos que o governo está oferecendo, empregos assim que estão facilitados pela associação que

encaminha, então eles não estão indo buscar o trabalho [...] está sendo fácil para eles.

Essa professora explicou que, no momento, por motivo da legislação (lei de cotas para pessoas portadoras de deficiência), os alunos dessa escola estão tendo muitas oportunidades de emprego, e por isso eles não precisam se esforçar para conseguir um emprego. A contradição entre as duas correntes citadas no início deste capítulo torna a aparecer no depoimento dessa mesma professora “Eu não sei até que ponto ele assume isso como direito dele ou como uma acomodação”

Foi relatado, através de uma das entrevistadas, com muitos anos de docência na educação especial, que entre os seus ex-alunos são raros aqueles que chegaram a cursar uma faculdade, e aqueles que o fizeram optaram por cursos que exigem menos dedicação aos estudos. “Eu conheço três, quatro que terminaram faculdade, assim bem pouco mesmo, em profissões [...] por exemplo, área pedagógica, que não tem tanta cobrança, então geralmente são estes os cursos que eles procuram.”

Pesquisa específica sobre a atividade docente, desenvolvida por Souza (1996) junto a professores de escola pública estadual em Campinas-SP, constatou que a opção por cursos universitários que conduzem ao magistério está relacionada à situação socioeconômica dos alunos. Os depoimentos dos professores que participaram dessa pesquisa levaram a pesquisadora a concluir que esses cursos foram escolhidos pelo fato de poderem ser freqüentados à noite, serem os mais baratos e também os mais fáceis e menos competitivos nos vestibulares.

Se a pesquisa feita em Campinas for considerada como representativa do que ocorre em várias outras regiões do país, é possível concluir que a opção de curso universitário, feita pelos alunos aos quais se alude nesta pesquisa, obedece, principalmente, aos fatores de natureza socioeconômica. Os mesmos fatores podem também ser considerados como determinantes para que muitos desses alunos não tenham avançado em seus estudos. Intentou-se compreender um pouco esses fatores com a contribuição das professoras entrevistadas.

A falta de condições para pagar um cursinho foi uma das explicações citada por vários docentes, presente neste relato: “A dificuldade é a falta de condição de pagar um cursinho que os prepare melhor para participar do concurso do vestibular” e também neste : “[O vestibular] é uma competição, então muitos não têm esta condição financeira, ou às vezes acabam se acomodando de repente com o trabalho e ... não se dispõem a pagar um cursinho”.

A problemática do cursinho aparece também em outras facetas, associada a uma preparação inadequada ”Eu acho que ele tenta um vestibular e não consegue entrar [...] e vai desestimulando” e também à “invisibilidade” perante aos professores a que um aluno afetado por deficiência está sujeito, em uma sala de cursinho preparatório para o vestibular. “Para os surdos é meio complicado... porque a gente já teve caso de alunos que foi para o cursinho e era apenas um número, não um aluno ...e ele fica lá e não está entendendo nada do que está acontecendo ali na frente.”

Foi investigada se a possibilidade de obter bolsas de estudo para alguns alunos, junto aos cursinhos, tinha sido considerada por essa escola. As entrevistadas esclareceram que várias bolsas já foram concedidas, mas a maior dificuldade desses alunos consiste em ter o acesso às informações, seja durante as aulas seja através do material apostilado característico dos cursinhos:

Nós conseguimos algumas bolsas para deficiente visual, naquele cursinho universitário e no colégio Nobel também, e o grande problema é a questão do material, porque eles não se dispõem a produzir o material. O colégio Nobel, até o ano passado, eles mandavam em disquete para a gente e a gente imprimia este material, e era bastante complicado porque eles utilizam um programa para a apostila que não é compatível com a impressão. Tinha que fazer toda esta transformação e era necessário um funcionário específico para fazer esta produção do material para um colégio particular, e para nós, a prioridade da Central de Produção era o ensino público e, depois, o particular. Então a gente não tinha esta disponibilidade de estar produzindo, o cursinho universitário eles nem ... eu acho assim, os professores passaram um ano trabalhando com os alunos e não perceberam que tinha cego na sala.

O medo de não encontrar apoio para os estudos no nível universitário é uma preocupação que aflige também a vários estudantes, conforme seus professores: “Eles sabem que chegando na universidade, ou mesmo nos cursinhos, eles não vão ter alguém fazendo o trabalho que a gente faz. [...] têm receio de estar lá na universidade e

acontecer dele não estar entendendo nada“. Uma professora relatou a preocupação de seus alunos da seguinte maneira:

Eu acho assim que eles sentem até onde eles querem [continuar], sabe? Por exemplo, um DV, ele tem muito medo de chegar até naquilo e de não poder conseguir ... por exemplo [ele] passa, e não consegue dar continuidade por falta de assistência. Eles acham que não tem apoio para frente, então a primeira coisa que eles perguntam é ‘Se a gente passar ou entrar na faculdade eles vão dar apoio igual vocês dão?’, então eles têm aquela ... eles se sentem assim ... desprotegidos, com insegurança.

O problema da droga adicção foi lembrado por uma das professoras como sendo um dos motivos para a interrupção dos estudos: ”Tem casos de meninos que acabam desviando o caminho sabe? [...] se envolvendo em drogas... desviaram o caminho né? ... e não continuaram os estudos por falta de interesse.”

Apesar das dificuldades, acima relacionadas, que esses alunos enfrentam para continuar os estudos encontrou-se, entre as professoras, uma que relatou que, dentre os seus alunos, todos comentam ter vontade de fazer o vestibular e continuar os estudos: “O objetivo deles é concluir o 2o grau e ir fazer vestibular.“