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7 APRECIAÇÕES SOBRE O ESTUDO E O TRABALHO DOS ALUNOS

7.7 O trabalho desenvolvido pelos alunos

Estando a escola analisada dentro da modalidade do ensino para jovens e adultos, a maioria dos alunos poderia já estar desenvolvendo alguma atividade laborai, por ser este um dos interesses que se espera que as pessoas desenvolvam, à medida que vão se tornando pessoas adultas. Por não terem ainda a escolaridade mínima desejável pelo mercado de trabalho esses alunos estão na etapa que Hegarty (1994, p. 56) denomina de transição:

El final de la escuela obligatoria marca una etapa importante en la transición entre la escuela y la vida adulta. La infanda queda ya atrás, y la preparación para el futuro asume mayor urgência. La preparación de los jóvenes con discapacidades debería tender a ayudarles a conseguir un trabajo lucrativo y a vivir tan plena e independientemente como les sea posible. En términos generales, esta preparación debería abarcar los cuatro aspectos indicados más arriba: trabajo, independencia, vida social y vida doméstica.

A preparação para o trabalho não é a única preocupação que se deve ter nesta fase, mas é aquela que mais contribui para a independência e o estabelecimento de novos vínculos sociais para a pessoa. Essa preparação não se faz só com a participação da escola, outros setores da sociedade estão envolvidos, conforme descreve Marchesi e Martin (1995, p. 23):

São as instituições sociais, as associações de pais, as empresas, os trabalhadores, etc. que devem tornar possível a continuidade da integração - educacional em uma integração social e profissional. Esta responsabilidade, que tem que ser apoiada e facilitada pelos poderes públicos, deve ser compartilhada por toda a sociedade. Somente desta forma a educação integradora adquire um significado mais completo e não desemboca em um beco sem saída.

As opções de atividade laborai são sempre influenciadas pela tecnologia em uso e no caso das pessoas portadoras de deficiência pode se observar aspectos positivos no atual estágio. Torres et al. fazem essa análise enfocando como as novas ajudas técnicas, neutralizando ou reduzindo as incapacidades que as pessoas apresentam, podem permitir o desenvolvimento das capacidades:

Por outro lado é a própria evolução das tecnologias que caracterizam a sociedade da informação (a informática e a telecomunicação) que está propiciando as ajudas técnicas que permitem compensar as diferenças: mecanismos de síntese de voz; reconhecimento da fala; leitura digital de textos impressos e opções quanto à exibição da saída; controle eletrônico de casas, cadeiras de rodas e automóveis; etc. Observa-se assim que, para as pessoas portadoras de deficiência que possuem bom nível de instrução, aumentaram as possibilidades de participação no mercado de trabalho, seja nos postos de trabalho mais convencionais, aqueles que exigem que o trabalhador chegue até ele ou nas atividades criadas pelo teletrabalho.

[...]

Dentro deste contexto de evolução tecnológica, ao qual as ajudas técnicas estão diretamente relacionadas, é válido observar que as eventuais incapacidades que sentem algumas pessoas, para a execução de determinadas tarefas, correspondem ao fato de não existir, ou não lhes estar disponível no momento, uma ajuda técnica adequada. O potencial de trabalho destas pessoas ainda aguarda para ser desenvolvido e aproveitado. (TORRES et al. 21)

Outro autor que destaca a contribuição das novas tecnologias da informação e comunicação é Hegarty, quem adverte para a importância da incorporação desses conhecimentos pelos alunos (1994, p. 56):

Las nuevas tecnologias de la información ofrecen importantes posibilidades a ese respecto, y es importante que en la formación se tenga en cuenta este elemento al estudiar las posibilidades de trabajo y los conocimientos prácticos a impartir.

As novas tecnologias de informação e comunicação, entre as quais estão inseridas as ajudas técnicas informáticas, podem também contribuir na solução de problemas que ainda permanecem polêmicos na educação das pessoas portadoras de deficiência, como é o caso da educação das pessoas surdas, onde a opção pelo ensino com o oralismo ou com LIBRAS ainda está sendo analisada. Destaca-se a importância desta opção, em termos de oportunidades para o trabalho, com as palavras de Mello (2001), uma autora que se dedica ao tema, sendo ela própria surda:

Não podemos tomar parte da língua de sinais por colocar a capacidade lingüística do surdo em desacordo com a cultura dominante. Sendo que esta cultura dominante urge de ser incorporada sob pena de não dispor de um crescimento profissional maior, o surdo que não domina esta cultura permanece em segundo plano, em serviços secundários e de baixa renda, tornando-se necessário uma nova concepção que atenda à necessidade primordial de tornar a vida do surdo mais produtiva tanto quanto estender seu raio de alcance no seio da sociedade.

21 TORRES, E. F., MAZZONI, A. A. , SILVA FILHO J. L. F. e ALVES, J. B. M. O Trabalho e sua relação com as Pessoas Portadoras de

Sobre qualquer outra análise, dentro da cultura brasileira, sobressai a importância do trabalho para o próprio bem estar das pessoas. Lajoie (1999) exprime esse pensamento afirmando que trabalhar faz parte das leis da natureza.

El trabajo es esencial para la dignidad de los humanos, por que permite a cada uno ser responsable de su vida, de proveer sus necesidades primarias y a las de los nifíos que ha traído al mundo. Es verdad que la solidaridad debe proveer a aquellos que no pueden hacerlo por ellos mismos, como los nifíos y los ancianos. Pero, no permitir a aquellos que están en la edad de poder hacerlo, es contradecir las leyes de la naturaleza. Un poeta dei Québec, Félix Leclerc cantó: “La mejor forma de matar un hombre, es pagarle por no hacer nada”.

Uma das professoras, especializada na educação de surdos, associa o desempenho profissional também a fatores comportamentais que considera serem freqüentes em seus alunos surdos, como esse: “O surdo não tem este limite, que tem que fazer tal horário, [que] tal pessoa vai comandar....”. Esses fatores podem estar associados ao que Mello (2001) chama de desacordo com a cultura dominante.

Conforme os depoimentos das professoras entrevistadas, registrados ao longo desta pesquisa, a questão das oportunidades de trabalho estarem associadas a serviços secundários e de baixa renda é uma característica que afeta, não apenas aos surdos, mas também aos alunos com outras deficiências. Ao longo dos depoimentos vão aparecendo as atividades laborais que os alunos costumam exercer: “Tem alguns que trabalham como digitador”; “outros que estão na COCAMAR, na fiação de algodão”; “trabalham no xerox”; “conseguiu emprego de empacotador [em supermercado]” e “cuida dos carros lá fora” .

Comparativamente a esses alunos que conseguiram empregos em empresas para exercer atividades que exigem pouca, ou nenhuma qualificação, pode-se dizer que os alunos com deficiência mental, que neste estudo de caso trabalham junto às suas próprias famílias, estão desenvolvendo atividades mais criativas e que exigem mais conhecimento técnico. Os depoimentos coletados indicam que os alunos, com deficiência mental, têm trabalhado junto aos seus pais, e desempenham a contento atividades auxiliares ou técnicas: “Os casos que eu conheço trabalham com a fam ília.”

e “Tem outro que também aprendeu a profissão do pai ... ele conserta máquina de lavar e tal, então aonde o pai vai ele vai junto. Sabe todo o mecanismo, faz tudo.”

Foi solicitado que os professores analisassem a razão das oportunidades de trabalho-desses-alunos— estarem, associadas-quase-sem pre-a-em pregos -de baixa remuneração e encontrou-se diversas explicações para tanto. Um dos fatores poderia, segundo as entrevistadas, estar associado à própria escola, que embora não tenha como objetivo ser profissionalizante, poderia contribuir mais na formação desses alunos:

Infelizmente a gente não está dando condição para ele, para o trabalho. A gente coloca ele no mercado de trabalho sem apoio, ... não acadêmico, mas o profissional mesmo: hábitos, respeito, emprego de horários, respeito de direitos, de deveres. Então a gente está colocando eles assim, sem eles terem essa base, esse alicerce é muito superficial. Quando você arruma um emprego, você pode chegar para ele e dizer para fazer isso, isso e isso, [mas] então não foi incorporado nele estas obrigações, só naquela horinha que a gente fala.

Uma outra explicação poderia estar no fato das famílias adotarem atitudes conformistas, como se não tivessem expectativas de algo melhor para o futuro profissional de seus filhos:

A família da pessoa com necessidade especial não exige [...] as famílias acabam aceitando qualquer emprego [....] acabam ficando no subemprego, ganhando muito pouco [...] as famílias não pensam que um dia eles vão ter que se aposentar.

Neste grupo, quatro categorias merecem ser analisadas com uma atenção especial, que são as referentes: à falta de continuidade dos estudos, permanecendo a maioria dos alunos apenas com o diploma do nível médio; baixo nível de contribuição das famílias no âmbito educativo, situação esta que resulta em prejuízos ao processo de aprendizagem, conforme o modelo proposto por Debesse y Mialaret (1974); uma grande parte desses alunos desempenham atividades laborais em tarefas que requerem pouca, ou nenhuma, qualificação gerando, desta maneira, um alto grau de

conformismo. Finalmente, e como conseqüência das situações anteriormente expressadas, foi constatada a escassa participação desses alunos nos concursos vestibulares, sendo mínima a porcentagem de aprovação.

Convém ressalvar que esses alunos estão tendo oportunidades de emprego porque estão sendo beneficiados pela aplicação da Lei de Cotas, que no momento está sendo fiscalizada pelo Ministério do Trabalho, sendo, porém, a maioria desses empregos para funções que exigem pouco nível de qualificação, confirmando-se, dessa maneira, os receios de Silva (2001), apresentados no início desse capítulo, em relação à aplicação dessa Lei.