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continuar a ser vistos como uma mera oferta ao mercado de trabalho que responde às

necessidades empresariais e às estatísticas

governamentais. Foi essa visão (e outras tantas)

que levou ao embrutecimento intelectual e

à deseducação bastante instruída. É aqui,

nesta recusa, que educar se transfigura num

empreendimento ético onde a educação do ethos

se sobrepõe à educação mercantil. A educação é

mais do que o alcance do crescimento económico,

seja ele regional, nacional ou europeu.

A educação é antes de mais uma escolha onde o

homem vai se definindo”

(Rodrigues, 2011, p. 203).

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CASO DOIS

Raquel Morais

um artista e também professor na Escola Árvore, Max Fernandes, de fazer um projecto assumidamente artístico, auto-sustentável, apoiado pela Junta de Freguesia de Pevidém e Câmara Municipal de Guimarães, que aliasse a escola (professores e alunos), os voluntários (ex-empregados da indústria têxtil e moradores na freguesia) e artistas ou designers convidados. “Tecer Outras Coisas” está localizado onde “era o espaço de formação usado na Coelima até à sua falência em 1992”, segundo Max Fernandes2. Para além

do material produzido, dos eventos e catálogos, “Tecer Outras Coisas” tem um blog3 que funciona como repositório de experiências e notícias.

É um projecto apaixonante para o seu criador e para os seus intervenientes. Todos estão lá por moto-próprio e com uma enorme vontade de aprender- ensinar o que sabem. Os alunos participam neste projecto dentro do estágio curricular (ou Formação em Contexto de Trabalho, denominada de FCT) a tempo inteiro, durante quatro semanas, oito horas por dia. Vivem e convivem diariamente com os voluntários, professores e artistas. Aos alunos é pedido que dialoguem, interajam e construam projectos ligados ao design de moda ou ao design gráfico em conjunto com os voluntários e artistas. Os alunos, numa primeira fase, definem que metodologia e conceito irão implementar de forma a chegar a um objectivo previamente traçado. Os voluntários também ajudam a definir objectivos, estratégias e metodologias, dentro da sua área de conhecimento, ou apenas dando a sua opinião e revendo as necessidades encontradas. Os voluntários são parte activa e assumem um duplo papel: por vezes de experienciados técnicos, habituados a uma actividade maquinal e repetitiva; ou em contraponto, intervenientes na acção, criadores de novas soluções e determinantes no fio condutor do projecto.

Aqui o papel tradicional do professor adquire outra dimensão. Ele torna- se um “guia” nas pesquisas, alguém que acompanha o projecto dos alunos e voluntários, o que orienta e que o leva a tomar decisões baseadas na responsabilidade individual e na ética. O professor é um orientador, o que faz perguntas mas não dá necessariamente as respostas. Há relações que se constroem e transformam, não por imposição da sua autoridade, mas sim por descobertas e vontade de percorrer um caminho comum, o do aluno com o professor. Para o professor alteram-se igualmente as questões de conhecimento e domínio da “sua” matéria pois deixa de ser a do campo exclusivo da sua especialidade para alcançar territórios longínquos. Sem um objecto ou objectivo definido, sem a meta a atingir, os voluntários e alunos tem que decidir, fazer escolhas e conceptualizar uma ideia, todos juntos. Os papéis profissionais que cada um habitualmente desempenha também se alteram e intercalam: alunos e voluntários tornam-se por vezes professores, quando partilham experiências e saberes uns com os outros, passando a informação que sabem, numa partilha e reacção constantes. A alteração dos papéis faz parte do processo, num diálogo nem sempre fácil – como resolver

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PROJECTO “TECER OUTRAS COISAS”

Risco

&

Stroke

determinado problema se não é meu ou se não é do meu “domínio” técnico? Há que perceber, pesquisar e tornar-se “no outro” para compreender. Há que arriscar e experimentar.

A escola e o ensino do design têm que acompanhar as alterações resultantes das exigências crescentes de uma sociedade em mudança, uma sociedade da informação e em rede. O trabalho em equipa não é propriamente a novidade, mas sim o trabalho multidisciplinar que “envolve conhecimento multidisciplinar avançado, que pressupõe colaboração interdisciplinar e uma mudança fundamental no ensino do design” (Friedman, 2012, p.150). Se as práticas profissionais se alteram a escola deverá tentar acompanhar, deverá preparar os alunos para esse campo do desconhecido, da imersão noutros domínios do conhecimento, da experimentação e do contacto com as populações locais pois “este conhecimento não é simplesmente um nível mais elevado de ensino e prática profissionais (...) É uma forma qualitativamente diferente de prática profissional” (ibidem).

Desde a definição dos projectos às tarefas mais elementares e diárias, tudo é executado em grupo, decisões e criações. “A não formalidade é uma fragilidade”, segundo Max Fernandes, aludindo às potencialidades ou fragilidades que este projecto possa ter. No entanto, penso que esta fragilidade pode ser transformada facilmente em uma qualidade pois abre a criação ao imprevisto, ao casual, ao tácito e até, por vezes, ao erro. A não formalidade sugere experimentar e tirar partido de uma força conjunta do

grupo, como um todo. Está desta forma criado um enorme campo aberto de possibilidades feito de indeterminações. A rigidez das estruturas normalmente leva a uma quebra quase inevitável e a uma imutabilidade. A flexibilidade e tolerância que este projecto encerra abrem um imenso campo criativo de exploração, de partilha, e sobretudo, algo pronto à transformação e à renovação. Não sendo algo rígido, controlado por uma entidade, um criador, um chefe ou autor, a presença do colectivo é permanente, fomenta uma energia dinâmica saudável, sem liderança ou subalternos, sem hierarquias numa vontade comum de criar, fazer, aprender, aprender-fazendo. Promove uma relação afectiva entre os intervenientes sem compromissos formais, propicia um ambiente de vontade comum, de troca de experiências no domínio profissional mas não só, histórias de vida são contadas, dramatizadas e

“Hoje, quando a governação se globaliza e

se afasta dos governos «democráticos» para

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