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3 DESAFIOS E POTENCIALIDADES DA PRODUÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA SITUAÇÃO DE ESTUDO “SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL”

6) A continuidade no processo de integração – Profe! Chegou a passar para eles o

vídeo aquele do RJ? E o da Acata? (Maria)

Sim, aham. Depois que eu passei aí eu fiz questionamentos. O que vocês enxergam de semelhança no vídeo da Acata e no RJ? E quais as diferenças? Aí eles, ah tem diferenças, aí eles falaram bastante o quanto o lixo chega na Acata misturado, e que trabalham sem proteção nenhuma. Discutimos a geração de resíduos, que lá claro é bem maior que aqui (Beatriz). Isso é importante, pois não podemos ignorar o problema local, embora seja em menor quantidade temos o problema, e temos também uma associação que poderia ser bem melhor “aproveitada” se cada um fizer seu papel em casa (Maria).

Depois, a partir da discussão sobre a geração de resíduos, pedi para eles pesquisarem o que é uma compostagem e como a gente organiza uma composteira, e aí a gente já começou a falar sobre transformações químicas, já trabalhei como acontecem as transformações químicas no lixo (Beatriz).12

Percebi que o desenvolvimento do conteúdo modifica conforme ocorrem as interações. A professora utilizou uma abordagem de trabalho integrado para discutir os conteúdos disciplinares. Ela demonstrou, tanto no planejamento quanto na ação, o desejo de envolver os estudantes nos processos de ensino e de aprendizagem. Outro fator que destaco a partir desse diálogo é que os vídeos trabalhados foram utilizados para problematizar os estudantes e possibilitar a eles uma visão mais crítica sobre o problema do descarte do lixo sem prévia separação. A professora, após apresentar os vídeos, fez a discussão e buscou aprofundar conceitos disciplinares. Foi possível perceber no diálogo que os estudantes, ao assistirem o vídeo produzido pelos colegas, discutiram aspectos que para eles pareciam ser novidade, como a questão do quanto o lixo chega misturado na Acata. Certamente em seu cotidiano não tinham o hábito de refletir sobre o destino dado a cada material descartado no lixo, e principalmente sobre a origem da produção dos produtos que estão comprando.

Essas intervenções tornam-se importantes, pois propiciam aos estudantes refletir sobre o meio social que estão inseridos e como a atual sociedade está atrelada ao consumo. A educação ambiental precisa ser tratada “como um processo político de apropriação crítica e reflexiva de conhecimentos que tem como objetivo a construção de uma sociedade sustentável do ponto de vista ambiental e social” (Tozoni-Reis, 2007, p. 179).

O Ministério do Meio Ambiente em 2009 publicou a obra intitulada “Os diferentes Matizes da Educação Ambiental no Brasil 1997-2007”. O intuito foi de resgatar alguns tópicos da EA no país e propiciar reflexões sobre a sua importância e urgência para transformar as formas de relação e consumo humano, com base em processos de sustentação da vida, no nosso planeta (BRASIL, 2009).

12 Fragmento de diálogo decorrente de reunião de planejamento da área de ciências da Natureza e suas

As interlocuções favorecem não só a aprendizagem dos conteúdos, mas propiciam envolver os estudantes de tal maneira que eles passam a refletir sobre as questões de sua rotina, e a partir dessas reflexões busquem contribuir nas mudanças necessárias, de ordem social, cultural e de saúde. É importante destacar que não se trata de discutir os problemas ambientais como responsabilidade individual e sim como coletividade, como comprometimento de todos os cidadãos pela luta de uma sociedade sustentável. Embora pareça utópico falar em sustentabilidade, em um mundo extremamente capitalista e consumista é fundamental fazer frente aos problemas ambientais atuais com uma educação que não só sensibilize, mas constitua sujeitos capazes de interferir na realidade. De acordo com Reigota (2009) trabalhar com EA requer priorizar o compromisso político de construção de uma sociedade sustentável, portanto democrática e justa.

Na concepção de Boff (2011), o que está ao alcance da escola é desenvolver uma educação em que professores e estudantes sejam autores e atores nos processos de ensino e de aprendizagem. Pensar na problemática ambiental remete à reflexão sobre as repercussões que um ambiente desequilibrado pode trazer para a saúde de todas as populações do ecossistema e permite a construção de autonomia na tomada de decisões para transformar a realidade social das populações.

O caráter interdisciplinar proporcionado pela educação ambiental é dado a partir dessa perspectiva que a proposta apresenta de uma conexão com as mais diversas áreas do ensino. No diálogo, Beatriz explica o procedimento que adotou e, a partir das inquietações dos estudantes, foi ampliando o conhecimento para chegar ao conteúdo disciplinar, na perspectiva apontada por Boff e Kollas (2014):

O ensino deve conferir melhor condição para o estudante compreender e desenvolver consciência plena de seu contexto, de suas responsabilidades e seus direitos, juntamente com o aprendizado disciplinar, torna-se necessário propiciar aprendizados formativos para a vida, que considerem o conjunto das necessidades básicas (alimentação, saúde, saneamento básico) e que promovam melhoria na qualidade de vida (p. 292).

Para o estudante ter consciência de suas necessidades e responsabilidades sociais é necessário esse olhar crítico sobre os impactos ambientais juntamente com o aprendizado dos conteúdos disciplinares bem como para a qualidade de vida do planeta. O conteúdo da educação ambiental procura possibilitar ao aluno e à aluna as ligações entre a ciência, as questões imediatas e as questões mais gerais, nem sempre próximas geográfica e culturalmente (REIGOTA, 2009, p. 64).

No fragmento do diálogo (4), é possível evidenciar as preocupações de Bárbara Beatriz sobre os pilares da EA pois, buscam desenvolver suas aulas com base nas concepções teóricas que fundamentam a EA. A EA é proposta com vistas a,

dar conta da transformação necessária à transição para uma sociedade mais sustentável, em que prevalecerão padrões de produção e consumo adequados, sem miséria, guerras e discriminações, com homens e mulheres juntos na construção dessa utopia possível, mais a universalização da produção e do acesso à informação, a aproximação sinérgica dos saberes acadêmicos e tradicionais, a recuperação da degradação provocada pelas atividades humanas e a saúde ampliada para todos (inclusive, e principalmente,a mental) (BRASIL, 2009, p. 9).

Constituir um campo que aproxime os conhecimentos das diferentes disciplinas em que explore os significados emergentes da abordagem interdisciplinar da EA, trouxe vários desafios para o fazer docente, ao mesmo tempo, propiciou envolvimento e reflexões de questões teóricas propostas há várias décadas, mas que sua solidificação prática ainda é incipiente, como, os princípios propostos e divulgados pela Unesco na Carta de Belgrado na década de 1970. Nesse documento foram instituídos os objetivos da EA:

1) Levar indivíduos e grupos sociais a ter mais sensibilidade e tomar consciência dos problemas ambientais;

2) Propiciar compreensão da relação complexa entre a humanidade e a natureza, para que se tenha responsabilidade crítica;

3) Engajar pessoas e grupos sociais para uma ampla e ativa participação em prol de proteção e melhorias da problemática ambiental;

4) Buscar mudanças de atitudes frente aos problemas ambientais;

5) Capacitar as pessoas e grupos sociais para avaliar os programas e medidas propostas para a EA frente a fatores econômicos, sociais, políticos, ecológicos e educacionais;

6) Estimular as pessoas para desenvolverem seu senso de responsabilidade frente as problemáticas ambientais.

Sobre esses objetivos Reigota (2009) argumenta que apesar de serem históricos e importantes eles precisam ser contextualizados.

Mudanças políticas, sociais, culturais e educacionais radicais ocorreram nessas últimas décadas. As questões ecológicas passaram a ser um componente fundamental em todos eles. Noções de meio ambiente possibilitaram a instituição da temática em vários níveis: internacional, nacional, estadual e local (REIGOTA, 2009, p. 58).

As questões propostas são complexas e o ensino deve propiciar um sentido articulado, da relação ser humano – natureza, por isso, que as interações dialógicas entre as diferentes professoras foram essenciais para organizar e desenvolver as aulas visando promover a EA na concepção da SE.

A partir da apresentação e discussão dos fragmentos de diálogos trazidos neste item, especialmente os fragmentos (4, 5 e 6), aliados à vivência que tive nas reuniões, é que destaco o próximo diálogo no qual as professoras discutem como estavam trabalhando os conceitos de lixo, se deveriam classificar em “lixo seco” e “lixo úmido”; se o termo que deveriam utilizar ao se referir aos materiais recicláveis seria resíduo. O diálogo expandiu-se conforme fragmento exposto na sequência.