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5 DISCRIONARIEDADE REGRADA NA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

5.4 Controle de convencionalidade na persecução penal

O controle de convencionalidade decorre do exercício de exame de compatibilidade vertical material das normas do direito interno com os tratados internacionais de direitos humanos ratificados e em vigor no Brasil. Constitui-se, na visão do STF, em uma “espécie de

‘eficácia paralisante’ que incide sobre os efeitos da legislação infraconstitucional convencionalmente antinômica, a causa da superioridade dos tratados de direitos humanos”416.

Esse exercício vem sendo empregado de forma prioritária pelo Poder Judiciário, cujo controle decorre da jurisprudência consolidada da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e remonta ao ano de 2006, no julgamento do caso Almonacid Arellano e Outros vs.

Chile, que inaugurou formalmente a doutrina do controle de convencionalidade no continente americano417.

Porém, adverte-se que essa compreensão não é acolhida integralmente pelo STF418, muito embora o CNJ tenha publicado a Recomendação n. 123/2022,

para observar tratados e convenções internacionais de direitos humanos em vigor no Brasil e a utilização da jurisprudência da Corte IDH, bem como a necessidade de controle de convencionalidade das leis internas e a priorização do julgamento dos processos em tramitação relativos à reparação material e imaterial das vítimas de violações a direitos humanos determinadas pela CIDH em condenações envolvendo o Estado brasileiro e que estejam pendentes de cumprimento integral.

Por sua vez, no caso Cabrera García e Montiel Flores vs. México (26 de novembro de 2010)419, firmou-se definidamente a obrigação de que juízes e tribunais devem aplicar a Convenção Americana, conforme a interpretação que dela fez a CIDH, ampliando os órgãos de competência para controle de convencionalidade de todos os órgãos do Estado vinculados à administração da Justiça, fazendo com que “o controle de convencionalidade passe a ser instituto

416 FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p. 62.

417 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 6.

418 FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p. 62.

419 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 9.

jurídico do Estado como um todo, e não apenas do Poder Judiciário, espraiando-se para outras instituições que participam da administração da Justiça lato sensu”420.

Esse entendimento é reforçado no julgamento do caso Trabalhadores Fazenda Brasil Verde vs. Brasil (20 de outubro de 2016), ao avançar na jurisprudência da Corte, entendendo que os Estados, vinculando todos os poderes e órgãos estatais, devem exercer de ofício um controle de convencionalidade entre suas normas internas e a Convenção Americana, dentro de suas competências e regras processuais correspondentes421.

O controle de convencionalidade pode ser exercido pelos órgãos no âmbito do sistema de justiça por meio difuso, sem expurgar do ordenamento jurídico a norma inconvencional, pelo qual o controle reconhece a invalidade (não aplicação da legislação interna ao caso concreto julgado)422 e permite a adoção de providências jurídicas para compatibilizar esse reconhecimento423, e o controle concentrado, pelo qual se expurga a validade da norma declarada inconvencional, com efeitos erga omnes.

Ao verificar a incompatibilidade da norma nacional com a Convenção, para se evitar uma responsabilização internacional do Estado, o juiz doméstico deve exercer a convencionalidade e não aplicar a norma interna424.

É possível que o Ministério Público, tendo em vista a compatibilidade de suas atribuições e a sua finalidade constitucional, atue na defesa e na proteção dos direitos humanos, ao possuir a atribuição para examinar e realizar um controle de convencionalidade de leis no Brasil. Atuação essa que não se limita a verificar o processo de formação das normas legais, mas também, na obrigação de natureza positiva dos Estados para garantir os direitos humanos, de modo a impor aos Estados o dever de assegurar que o aparelho estatal esteja apto e adequado

420 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 12.

421 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 13.

422 Salvo se a norma interna for mais favorável ao direito humano que em relação ao tratado ou convenção.

FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p. 75.

423 Utiliza-se, para o controle de convencionalidade difusa, o denominado bloco de convencionalidade, que não se restringe às Convenções, aos protocolos adicionais e aos Tratados, mas também abrange a jurisprudência da CIDH, nas interpretações feitas nas resoluções emitidas pela Corte, compreendidas as interpretações feitas na supervisão dos cumprimentos de sentenças, na instância de requerimento de interpretação da sentença e nas interpretações feitas nas opiniões consultivas. FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p. 78-79.

424 FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p. 75.

para prevenir, investigar e sancionar toda violação a direitos humanos reconhecidos pelo bloco de convencionalidade425.

O Ministério Público pode aferir o controle de convencionalidade de leis, por iniciativa própria ou por provocação, firmando posicionamento institucional sobre determinada matéria, permitindo ao Poder Judiciário, detentor da última palavra, verificar se há compatibilidade entre a lei interna e o tratado internacional em determinado caso concreto, ou seja, adequando o direito doméstico aos estândares internacionais relacionados às matérias penais.

É missão constitucional da instituição, não apenas verificar a convencionalidade material das normas do direito interno, mas também apurar a convencionalidade procedimental das leis internas relativas às previsões constantes em tratados de direitos humanos ratificados e em vigor no Estado, o que se tem denominado de devido processo convencional.

Sobre o devido processo convencional, Douglas Fischer e Frederico Valdez ensinam:

a ideia de fairness impulsionada pelo sistema supranacional de proteção dos direitos humanos em tema de processo penal supera a mera exigência de regularidade formal no desenvolvimento dos atos e das etapas do procedimento judicial. Expressa um senso de correção e justiça que envolve todo o desenrolar procedimental. Esse ideal de fairness processual é o que melhor representa a projeção do devido processo convencional, tendo em conta o caráter reconhecidamente ampliativo dos influxos processuais advindos da Convenção Interamericana, na linha integrativa da jurisprudência-fonte de San José da Costa Rica, assentada na ideia-força de assegurar a boa administração da justiça, e por consequência, sem as balizas conferidas pelo direito positivado em amplo, mas demarcado catálogo constitucional426.

Há que se distinguir a aferição e o controle de convencionalidade pelo Ministério Público, embora exista similitude entre eles, considerando que em ambos os casos pode ser realizado dentro do processo penal ou fora dele.

O Ministério Público não se limitará apenas a aferir a convencionalidade das leis, mas exercerá propriamente o controle de convencionalidade das leis, nas hipóteses do exercício de uma atividade ministerial típica, fundada em tratado de direitos humanos em vigor, se existir pressuposto e justificativa para a realização desse controle.

A aferição de convencionalidade é compreendida como

425 FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p. 81.

426 FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p. 91-92.

a análise sobre a compatibilidade das normas internas com os tratados internacionais de direitos humanos, sem invalidação para o caso concreto da norma sobre a qual recai a aferição, é dizer, sem que se retire da norma, por ato da própria instituição que realiza o exame de convencionalidade, a sua validade intrínseca427 (grifos do autor).

É possível aferir a convencionalidade por provocação, quando o Ministério Público age em decorrência da lei ou de impulso judicial, para exercer sua atuação fiscalizatória nas demandas judiciais propostas por terceiros. Assim, analisa a compatibilidade vertical material da legislação interna com as normas de direitos humanos.

A aferição de convencionalidade sponte sua pode ser exercida pelo Ministério Público, por exemplo, através da expedição de uma notificação recomendatória. Se há uma violação a direitos humanos previstos em tratados internacionais, em patente incompatibilidade, apurado em um instrumento investigatório, é possível expedir uma recomendação para se adequar e modificar o ato tido como inconvencional.

Já o controle de convencionalidade, "é o exercício pelo qual a norma interna inconvencional é reconhecida como propriamente inválida pelo órgão controlador, com poder para tanto, ensejando a instauração de medidas significativas da atuação institucional correspondente"428.

Esse controle para realização não depende de forma ou de algum procedimento próprio, mas demanda apenas uma adequação vertical material no âmbito de toda e qualquer atribuição institucional de órgãos do Estado, incluindo o Ministério Público429.

Algumas hipóteses de controle de convencionalidade ligadas à atuação do Ministério Público estão previstas nos a) procedimentos de defesa de interesses e direitos metaindividuais;

e b) nos procedimentos de persecução penal, como na promoção da ação penal pública, a regularidade dos procedimentos judiciais, o cumprimento de obrigações positivas pelo Estado e, ainda, o arquivamento de investigações criminais.

A atuação do Ministério Público na seara criminal possui como fim a) patrocinar o respeito pelos direitos humanos de réus e investigados; e b) proteger os direitos humanos por meio da tutela penal.

427 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 25-26.

428 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 26.

429 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 81.

As normas processuais penais devem ser aplicadas de acordo com os tratados, convenções e regras de direito internacional, conforme preceitua o art. 1º, I, do CPP/1941, fazendo-se, assim, presente e necessário o controle de convencionalidade em toda a persecução penal. Seu início se dá por meio do controle dos atos de investigações criminais, passando pela fiscalização dos procedimentos de investigação e eventual controle de arquivamento, até chegar à promoção da ação penal pública e sua correspondente tramitação.

Para se exercer o controle de convencionalidade com eficiência, o Ministério Público deve compreender a integralidade dos tratados internacionais os quais o Brasil integra, além do acervo jurisprudencial da CIDH430, visto que ambos compõem a ordem jurídica brasileira e possuem uma força normativa superior à legislação interna quando se trata de matéria de persecução penal431.

O controle de convencionalidade no âmbito da persecução penal desempenha um papel de caráter dúplice, pois influencia tanto o direito penal quanto o processo penal internamente.

Já no âmbito do direito penal, há uma característica punitiva, na medida em que há determinações para que os Estados criminalizem as condutas violadoras de direitos humanos de maneira proporcional e adequada.

A ação penal pública é um dos instrumentos voltados à proteção dos direitos humanos, porém, o Ministério Público não é uma instituição que simplesmente formaliza uma acusação, mas que possui legitimidade para propor o início da ação penal, uma vez presentes as condições fático-normativas, agindo de acordo com o caso concreto e sob as balizas do controle de convencionalidade.

Diante desse quadro, ao exercer a ação penal, há que se aplicar o respeito às normas de direitos humanos configuradoras de garantias de réus e de investigados em face de práticas consideradas ofensivas à sua dignidade e condição humana, assim como se deve afastar normas de direito interno que impliquem em prejuízos dos interesses difusos da sociedade e da dignidade humana das vítimas da criminalidade.

A concretização da tutela judicial das vítimas é tema recorrente no âmbito dos Tribunais de Estrasburgo e de San José, através do processo penal como instrumento de tutela das vítimas, por meio de uma visão imparcial, muitas vezes compreendido sob o único prisma

430 Exemplo é o caso Myrna Mack Chang vs. Guatemala (2003), que levou a Corte IDH a condenar o excesso de formalismo e a condescendência dos sistemas de sistemas de justiça com as ações processuais, retardando o propósito de realização de justiça.

431 MAZZUOLI, Valerio de Oliveira; FARIA, Marcelle Rodrigues da Costa; OLIVEIRA, Kledson Dionysio de.

Controle de Convencionalidade pelo Ministério Público. Rio de Janeiro: Forense, 2021, p. 109.

dos direitos do acusado. O processo deve ser idôneo, adequado e eficiente no esclarecimento de crimes e na punição dos responsáveis, como forma de salvaguardar direitos das vítimas por intermédio do mecanismo penal432.

O controle de convencionalidade na persecução penal não se limita a garantir a regularidade do desenvolvimento da inicial acusatória, mas também a regularidade de todas as fases da persecução penal. Abrange, pois, todas as providências de atuação funcional do Ministério Público, em busca de uma ação penal que atenda à efetiva proteção aos direitos das vítimas e a garantia objetiva dos direitos humanos, respeitando as regras do devido processo convencional e legal.

Uma outra forma de controle de convencionalidade no iter do processo penal é verificar-se a observância, pelos órgãos da justiça brasileira, quanto à razoável duração do processo.

A Convenção Americana assegura a todos os cidadãos o direito à razoável duração do processo433, tema discutido junto a CIDH que prevê essa garantia a demandar análise da complexidade da causa; da atividade processual do interessado e da conduta do tribunal, conforme exposto no julgamento do caso Tibi vs. Equador, de 2004.

As CIDHs reconhecem como obrigações processuais penais de tutela penal, como valor da efetividade do processo penal, a qualidade e o tempo de resposta jurisdicional, de forma que deva existir uma estrutura processual suficientemente capacitada para se efetivar um juízo penal em tempo razoável, incluindo mecanismos judiciais de técnicas e dispositivos legais aptos a impedir o retardamento procedimental por conta do comportamento das partes434.

No julgamento do caso Ximenos Lopes vs. Brasil, a CIDH impôs aos órgãos integrantes do sistema de justiça criminal brasileiro, em particular o Ministério Público e o Poder Judiciário, a obrigação de interpretar os arts. 8º (I) e 25 (1) da Convenção Americana para salvaguardar os direitos dos familiares e das vítimas de crimes que representem ofensa a direitos humanos, os quais são titulares da garantia de que o processo seja encerrado em um prazo razoável, como também de instrumentos efetivos de proteção judicial contra atos violadores a direitos fundamentais. Por fim, no caso Diniz Bento da Silva vs. Brasil, também foi reconhecida pela

432 FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p.

105-108.

433 Convenção Americana. Art. 8º (1) e 25 (1).

434 FISCHER, Douglas; PEREIRA, Frederico Valdez. As obrigações processuais penais positivas – segundo as Cortes Europeia e Interamericana de Direitos Humanos. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2022, p.

129-136.

Comissão IDH a ofensa aos arts. 1º (1), 8º (1) e 25 (1), em razão da demora durante as investigações, a impedir a propositura da ação penal e a punição dos responsáveis pelo homicídio de Diniz Bento da Silva, em patente violação aos direitos humanos.

O tema gira ainda em torno de situações práticas, a exemplo das hipóteses de revogação de medida cautelar de prisão. O arquivamento das investigações criminais também deve se submeter à observância das obrigações positivas do Estado em matéria penal, que deve cumprir as exigências convencionais, ou seja, efetivar todos os meios e possiblidades de se aprofundar as investigações.

A tarefa dessa espécie de controle foi reforçada a partir da alteração da Lei n.

13.964/2019, ao alinhar o processo penal com um modelo constitucional, conferindo ao Ministério Público o total controle do arquivamento das investigações criminais, em respeito à sua titularidade constitucional para a propositura da ação penal.

O controle de convencionalidade realizado pelo Ministério Público no âmbito das investigações criminais pode recair sobre a tipificação da conduta objeto de investigação, ou ainda, quanto à legalidade dos procedimentos de investigação desenvolvidas pela autoridade policial ou por outras autoridades, incluindo o próprio Ministério Público.

Como exemplo, o controle de convencionalidade sobre o art. 331 do Código Penal (crime de desacato) em razão de algumas manifestações internacionais, dentre elas, (i) do art.

13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (liberdade de pensamento e de expressão), (ii) do Relatório n. 22/1994 da Comissão IDH relativo ao caso Horacio Verbitsky vs. Argentina e (iii) da sentença da Corte IDH exarada no caso Palamara lribarne vs. Chile, de 22 de novembro de 2005.

Diante disso, entende-se que

a criminalização do desacato está na contramão do humanismo, porque ressalta a preponderância do Estado – personificado em seus agentes – sobre o indivíduo [...] e que a existência de tal normativo em nosso ordenamento jurídico é anacrônica, pois traduz desigualdade entre funcionários e particulares, o que é inaceitável no Estado Democrático de Direito.

Por essa razão,

punir o uso de linguagem e atitudes ofensivas contra agentes estatais é medida capaz de fazer com que as pessoas se abstenham de usufruir do direito à liberdade de expressão, por temor de sanções penais, sendo esta uma das razões pelas quais a CIDH [Comissão IDH] estabeleceu a recomendação de que os

países aderentes ao Pacto de São Paulo (sic) abolissem suas respectivas leis de desacato435.

Porém, o Superior Tribunal de Justiça uniformizou a matéria e derrubou a decisão da 5ª Turma436, não reconhecendo o julgamento das decisões da Corte IDH, com base na tese da soberania.

Verifica-se, portanto, que os membros do Ministério Público podem observar os standarts de proteção fixados em tratados, convenções e atos normativos internacionais sobre direitos humanos, com vigência no ordenamento jurídico brasileiro, para o exercício do controle de convencionalidade dos atos normativos internos como uma forma de implementação de política criminal moderna, para solidificar a atuação institucional compatível com sua missão constitucional em defesa da democracia.