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R ELAÇÕES DE SOCIABILIDADE

3.2. Sociabilidades em Portugal

3.2.2. Convívios protagonizados

Como se viu no início, a sociabilidade das famílias com filhos não foi apenas indagada em bruto, mas sim com especificação de diversas actividades onde se dão relações de sociabilidade.

Quando analisados os perfis internos de cada actividade de sociabilidade segundo os protagonistas dessas ocorrências (Quadros 3.2 & 3.3), além de re-constatarmos o referido panorama combinatório de parentesco e amicalidade, verificamos igualmente que a importância de cada um deles variará de forma expressiva consoante o tipo específico de convívio, ou seja, segundo o tipo de actividade levada a cabo. Esta análise mais em detalhe faz ressaltar, dentro de cada actividade de convívio, os grupos específicos de pessoas com quem mais os elementos das famílias analisadas entabulam sociabilidades, bem como as combinatórias que matizam um qualquer quadro linear de diferenciação.

Praticar desporto, o convívio menos familiar de todos, é-o pela importante percentagem de ocorrências com os amigos(as), namorados(as) e colegas dos filhos(as) – cerca de 64 %. Avultam aqui também a categoria „outros‟ com quase 13 % (podemos supor que estes outros são, especificamente, parceiros exclusivamente de desporto), bem como a de amigos(as) do casal, com 12 %. Todas as outras categorias de pessoas, com a excepção da dos colegas do casal (com 5 %), não alcançam nunca sequer 1 % por categoria.

Igualmente marcada pela importância da percentagem de ocorrências com os amigos dos filhos (73 %) é o convívio „ir ao cinema‟. Estes são seguidas a grande distância pelos

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Até este dado deve ser lido com cuidado, já que, como veremos mais abaixo, se do total das actividades de convívio excluíssemos as últimas férias de verão e o último natal, as categorias familiares seriam minoritárias mesmo para o total dos convívios, sendo inversamente maioritárias as categorias não-familiares.

amigos do casal (11,5 %) e, uma categoria já de parentesco, pelos outros familiares não especificados (que, agregando quer os da mulher, quer os do homem, perfazem 6,7%).

A ida a exposições e museus é outra das actividades em que os amigos dos filhos se destacam (52 %), logo seguidos dos amigos do casal (19 %), bem como outros não especificados (14 %). Os familiares não especificados do casal (quase 6,3 %) são a única outra categoria, e a única familiar, que atinge algum relevo.

Quadro 3.2

Tipos de convívios por pessoas exteriores ao agregado doméstico Pessoas exteriores

ao agregado nuclear Desporto Cinema Exposições

Actividades Políticas

Espectáculos

Desportivos Café Passear Restaurante

Toda a Família 5,52 11,97 13,11 15,02 19,46 26,73 39,37 48,91 Progenitores (sub-total) 2,35 2,34 3,71 3,92 3,31 10,35 15,86 22,52 Mãe da Mulher 0,96 0,78 1,64 1,96 0,44 4,32 6,27 8,07 Pai da Mulher 0,96 0,91 1,00 1,96 1,48 2,29 2,61 5,43 Pai do Homem 0,24 0,16 0,68 0,00 1,26 1,48 2,74 3,57 Mãe do Homem 0,19 0,49 0,39 0,00 0,13 2,26 4,24 5,45

Filhos e Filhas (sub-total) 0,19 0,33 0,47 0,00 1,22 1,04 0,75 1,87

Filhos 0,19 0,07 0,35 0,00 1,11 0,50 0,54 1,60

Filhas 0,00 0,26 0,12 0,00 0,11 0,54 0,21 0,27

Fratria e seus cônjuges (sub-total) 0,38 1,88 2,31 5,22 4,73 6,24 8,26 8,74

Fratria da Mulher 0,38 1,52 1,67 1,63 2,70 4,89 6,53 6,44

Fratria do Homem 0,00 0,36 0,64 3,59 2,03 1,35 1,73 2,30

Tios e Tias (sub-total) 0,76 0,72 0,35 3,92 1,00 0,87 1,35 0,90

Tios/Tias da Mulher 0,19 0,36 0,35 1,96 0,78 0,47 0,76 0,55

Tios/Tias do Homem 0,57 0,36 0,00 1,96 0,22 0,40 0,59 0,35

Outros Familiares (sub-total) 1,84 6,70 6,27 1,96 9,20 8,23 13,15 14,88 Outros Familiares da Mulher 0,88 4,37 4,14 0,00 5,78 5,47 7,64 8,53 Outros Familiares do Homem 0,96 2,33 2,13 1,96 3,42 2,76 5,51 6,35 Outras Pessoas (sub-total) 94,48 88,03 86,89 84,98 80,54 73,27 60,63 51,09

Amigos e Amigas 12,08 11,48 18,82 33,99 39,34 38,34 24,94 32,09

Colegas 4,99 0,73 2,62 37,25 5,23 8,15 1,38 7,35

Amigos dos Filhos(as) 63,81 72,88 51,66 5,88 30,75 21,56 31,75 10,47

Vizinhos(as) 0,64 0,78 0,00 0,00 1,57 2,05 1,03 0,00

Outros 12,97 2,15 13,78 7,84 3,66 3,16 1,54 1,18

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

N 523 511 286 51 451 717 617 381

Quadro 3.3

Tipos de convívios por pessoas exteriores ao agregado doméstico (cont.) Pessoas exteriores ao agregado nuclear Actividades Religiosas Férias Dormir em casa de alguém Comer em casa de alguém Natal Total Média Totais Parciais Total 11 Média 11 Toda a Família 54,11 74,09 75,64 83,69 96,44 62,47 43,4 38,92 35,8 Progenitores (sub-total) 28,94 30,65 35,88 45,77 48,95 32,27 18,95 Mãe da Mulher 14,62 12,85 15,02 18,46 17,42 11,62 7,56 Pai da Mulher 5,50 6,99 7,77 11,72 11,32 7,71 4,65 Pai do Homem 2,34 3,72 5,30 6,49 7,89 5,22 2,75 Mãe do Homem 6,48 7,09 7,79 9,10 12,32 7,72 3,99

Filhos e Filhas (sub-total) 3,11 1,76 0,62 0,79 1,93 1,46 1,00

Filhos 1,50 0,77 0,00 0,55 0,89 0,70 0,55

Filhas 1,61 0,99 0,62 0,24 1,04 0,76 0,45

Fratria e seus cônjuges (sub-total) 8,20 15,88 14,80 15,14 18,88 11,62 7,17

Fratria da Mulher 5,50 10,55 10,35 10,65 12,79 7,80 5,06

Fratria do Homem 2,70 5,33 4,45 4,49 6,09 3,82 2,11

Tios e Tias (sub-total) 1,53 4,11 4,61 0,94 3,08 2,07 0,94

Tios/Tias da Mulher 0,71 2,38 2,38 0,57 1,91 1,27 0,55

Tios/Tias do Homem 0,82 1,73 2,23 0,37 1,17 0,80 0,39

Outros Familiares (sub-total) 12,33 21,69 19,73 21,05 23,60 15,05 10,86 Outros Familiares da Mulher 7,65 12,50 11,53 12,48 14,47 9,00 6,45 Outros Familiares do Homem 4,68 9,19 8,20 8,57 9,13 6,05 4,41 Outras Pessoas (sub-total) 45,89 25,91 24,36 16,31 3,56 37,53 56,6 61,07 66,2

Amigos e Amigas 10,68 16,16 2,68 13,27 2,40 13,79 22,21

Colegas 1,63 0,40 0,52 0,57 0,06 2,12 3,91

Amigos dos Filhos(as) 25,25 6,94 18,84 1,64 0,21 18,30 29,66

Vizinhos(as) 3,16 0,30 0,00 0,00 0,16 0,75 1,08

Outros 5,17 2,12 2,33 0,86 0,75 2,58 4,21

Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

Nas actividades políticas e sindicais, que devem ser lidas com extremo cuidado, já que cobrem somente 51 dos casos da amostra (sendo de longe a actividade de sociabilidade com menor frequência), não são já os amigos dos filhos a categoria com maior significado (mas mesmo assim alcançando quase 6 %), mas antes os colegas do casal (37 % – a única ocorrência, aliás, onde esta categoria é a mais importante), logo seguidos dos amigos também do casal (34 %). Aqui encontramos igualmente uns quase 8 % de outros.

Nas idas a espectáculos desportivos a amicalidade, do casal (39 %) ou dos filhos (31 %), volta a predominar, com uma plêiade de outras situações muito minoritárias onde, além de alguns colegas (5 %) e outros não especificados (4 %), as categorias agregadas de outros familiares (9 %) e de irmãos e seus cônjuges (quase 5 %) ressaltam.

No respeitante a idas a cafés e pastelarias essa amicalidade é também a situação mais frequente, com, mais uma vez, os amigos do casal (38 %) e dos filhos (22 %) a serem as categorias mais importantes. Se, neste caso, os colegas do casal ainda perfazem pouco mais de 8 % das ocorrências, as categorias familiares começam a avolumar-se, nomeadamente se agregadas, com os familiares não especificados (cerca de 8 %), os irmãos e cônjuges (pouco mais de 6 %) e os progenitores do casal (pouco mais de 10 % em conjunto) a fazerem-se notar.

Sair, dar uma volta e passear apresenta um perfil semelhante com as idas ao café/pastelaria, com a diferença que neste casos perdem importância (para pouco mais de 1 %) os colegas do casal. De resto, continuam a ser os amigos dos filhos (32 %) e do casal (25 %) – ainda que em ordem inversa do caso anterior – as categorias mais importantes. Igualmente, os familiares não especificados (13 %), os irmãos (8 %) e os progenitores agregados (16 %) são as categorias do parentesco que mais relevo alcançam.

As idas a restaurantes são já uma actividade relativamente bipartida entre sociabilidade com parentes e sociabilidades não familiares. Dentro destas últimas, são os amigos do casal a terem maior importância (32 %), seguidos a bastante distância quer pelos amigos dos filhos (10 %), quer pelos colegas do casal (7 %). As sociabilidades familiares avolumam-se, portanto, ainda que nenhuma categoria isolada atinja sequer os 10 %. Por categorias agregadas verificamos que são os progenitores do casal (23 %), os irmãos e seus cônjuges (9 %), os outros familiares não especificados (15 %) quem mais sociabilidades têm. Os filhos não residentes (2 %) e os tios de ambos os membros do casal (1 %) ficam-se pela quase irrelevância estatística.

Igualmente bipartida entre sociabilidades familiares e não-familiares, quando respectivamente agregadas, são as actividades religiosas, embora já com prevalência das

ocorrências familiares (ao contrário das idas a restaurantes, onde a amicalidade é mais dominante). Mesmo face a esta prevalência, repare-se que a categoria isolada com maior peso é a dos amigos dos filhos (25 %), logo seguida, entre as categorias de não-familiares, pelos amigos do casal (11 %), sendo os restantes 10 % constituídos por todas as outras categorias de não-parentes agregadas. No respeitante a familiares, verificamos que a categoria isolada mais significativa é a da mãe da mulher (15 %) – de resto a categoria que tende sempre a ser das mais importantes nas actividades onde o peso das sociabilidades com os parentes predomina. Em termos de categorias familiares mais agregadas, são os progenitores do casal (29 %) e os outros familiares não especificados (12 %) que têm relevo, seguidos pelos irmãos do casal e seus cônjuges (8 %), e os estatisticamente mais insignificantes filhos não residentes (3 %) e tios (1,5 %).

As férias, aferidas pelas últimas férias de verão, são já uma sociabilidade clara e maioritariamente familiar (74 % dos casos). Mas são-no numa situação de dispersão pelas várias categorias de parentes existentes, já que, tomando em consideração apenas a categoria isolada com maior peso, esta é uma não-familiar (os amigos do casal, com 16 %). Olhando para essas categorias mais agregadas de parentes globalmente dominantes nesta sociabilidade, verificamos que são os progenitores do casal (quase 31 %), os irmãos do casal (quase 16 %) e os outros familiares não especificados (quase 22 %) quem mais peso tem.

Da mesma maneira, dormir em casa de alguém ou lá passar alguns dias é uma actividade maioritariamente familiar (quase 76 %) com um perfil de protagonistas semelhante ao das férias. Também aqui a categoria isolada mais significativa não é uma de parentesco, mas sim a dos amigos dos filhos (perto de 19 %). Mas também aqui são os progenitores (36 %), os irmãos (15 %), e os outros familiares indiferenciados (20 %) as categorias agregadas mais relevantes.

Mais familiar ainda (84 %) é comer (almoçar ou jantar) em casa de alguém. A pessoa com quem mais as famílias inquiridas entabulam esta sociabilidade é a mãe da mulher (cerca de 18,5 %). Por categorias agregadas são os progenitores do casal (46 %), os seus irmãos e cônjuges (15 %) e outros familiares não especificados do casal (21 %) os que mais peso têm. A única categoria não-familiar a apresentar algum relevo é a dos amigos do casal (13 %), demonstrando, por um lado, a existência de sociabilidades alimentares residenciais com amigos, mas, por outro lado, como estas são essencialmente familiares, sendo que as não familiares decorrem mais em contexto de restaurantes e afins, ou seja, fora de “casa”.

A sociabilidade familiar por excelência, aliás codificada e ritualizada culturalmente como tal, é o natal. Aqui quase todas as ocorrências de sociabilidade são-no com parentes

(96,5 %), mais uma vez avultando isoladamente a mãe da mulher (17,5 %). O conjunto dos progenitores do casal (49 %), dos irmãos (19 %) e restantes familiares não especificados (24 %) perfazem o grosso das ocorrências. As sociabilidades natalícias não familiares ficam-se por uns marginais 3,5 %.

Quer tudo isto dizer que existem sociabilidades preponderantemente amicais (veremos aliás que muitas preponderantemente amicais dos filhos), e outras preponderantemente familiares (ou, pelo menos, significativamente familiares). É necessário perceber, no entanto, quais são os pólos predominantes, familiar ou amical, numa visão global sobre as sociabilidades, bem como quais os processos que podem estar mais associados a um ou outro pólo de sociabilidade.

Se somadas todos os convívios, cerca de 62 % destes são-no com familiares, contra cerca de 38 % com não-familiares (constituídos essencialmente por amigos, do casal ou dos filhos) – o que parece contrariar qualquer predominância das relações de amicalidade na sociabilidade. Contudo, tal prevalência é somente aparente, já que se retirarmos à soma total as actividades não-quotidianas das últimas férias de verão ou do último natal (consoada e dia de natal) – particularmente esta última pelo número elevado de casos em que ocorre (N=1350), o panorama global da sociabilidade revela-se fortemente amical. Neste último caso, os valores totais invertem-se, com somente 39 % do total dos convívios a serem familiares e os restantes 61 % a serem não-familiares e preponderantemente amicais.

Igualmente, não somando as ocorrências de todos os convívios (para não enviesar o resultado pelo peso desproporcional das actividades não quotidianas), mas antes fazendo a média dos valores percentuais de convívios com parentes ou não parentes em cada actividade de convívio,139 verificamos que para o total dessas actividades cerca de 57 % são-no com não-familiares – tal é ainda mais vincado se não contarmos, mais uma vez, nessa média com as férias de verão e o natal, alcançando as actividades com não-familiares 66 % do total.140

De uma forma geral, pode-se dizer que quanto mais as actividades de convívio são no exterior da residência de alguém, quanto menos implicam a comida, quanto menos implicam ritualidades religiosas e/ou familiares bem estabelecidas, bem como quanto mais frequentes quotidianamente (por oposição à ocorrência única, anual e sazonal, das férias de verão ou do natal), mais declaradamente são convívios com amigos. Invertendo todas essas condições (o

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Coluna de “Média Totais Parciais” do Quadro 3.3. 140

interior residencial, a alimentação, a ritualidade festiva ou celebratória, a sazonalidade veraneante ou natalícia), mais as ocorrências de sociabilidade serão com familiares e parentes. Em suma, são sociabilidades esmagadoramente não-familiares e essencialmente amicais: praticar desporto (94 %), ir ao cinema (88 %), ir a exposições e museus (87 %), participar em actividades políticas e sindicais (85 %), ir a espectáculos desportivos (81 %), ir ao café/pastelaria (73 %), sair, dar uma volta e passear (61 %). Inversamente, são actividades claramente familiares levadas a cabo essencialmente com parentes: as últimas férias grandes (74 %), ficar a dormir em casa de alguém ou lá passar alguns dias (76 %), almoçar ou jantar em casa de alguém (84 %) e o natal141 (97 %). Ir ao restaurante, como actividade algo mista em termos das condições de estruturação das sociabilidades que aqui observamos, já que mistura uma actividade exterior com uma envolvendo alimentação, apresenta-se como um convívio relativamente distribuído entre familiares (49 %) e não familiares (51 %). Igualmente, participar em actividades religiosas – uma sociabilidade praticamente dividida entre familiares (54 %) e não-familiares (46 %), pela dupla estruturação na sua base (o exterior e a ritualidade), se apresenta como uma actividade repartida quase por igual entre a família e a não-família.