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Critérios para a Determinação do Tipo de Tributo para cada Nível de Governo

Capítulo III ‐ A Situação de Angola e a Construção de Bases para a Descentralização

3.8 Atribuição de Receitas e do Poder de Tributar

3.8.2 Critérios para a Determinação do Tipo de Tributo para cada Nível de Governo

incidência, cabe‐nos agora pôr em evidência as teorias sobre a determinação do tipo de tributo que melhor se adequa a um determinado nível jurisdicional. Devido às cautelas e desvantagens colocadas à descentralização fiscal, a teoria económica tem procurado encontrar critérios ou parâmetros claros e objectivos que ajudem a encontrar um bom sistema de financiamento fiscal local. Porém, cabe dizer que estamos cientes de que não se trata de uma panaceia, devido ao facto de reconhecermos que cada país é único, contribuindo positiva ou negativamente uma serie de vantagens e constrangimentos peculiares à história de cada país ou jurisdição. A primeira tentativa de encontrar critérios claros e objectivos de determinação da receita fiscal e

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dos respectivos poderes, coube a Musgrave tendo em conta a natureza e as características dos diferentes impostos:

i) Os impostos, cujas bases de incidência sejam de baixa mobilidade inter‐jurisdicional, devem ser atribuídos preferencialmente aos níveis inferiores e intermédios de decisão. O exemplo paradigmático é o da tributação da propriedade imóvel ou da tributação da terra;

ii) Os impostos pessoais com alíquotas progressivas devem ser atribuídos às jurisdições onde uma base de incidência global possa ser definida de forma mais eficiente;

iii) A tributação progressiva deve caber ao nível central de decisão. Isto é aliás consentâneo com a tese já vista, de acordo com a qual a função redistributiva deve caber ao Estado central. Na verdade, os impostos progressivos sobre o rendimento são impostos de maior eficácia redistributiva;

iv) Os impostos que sirvam propósitos de estabilização macroeconómica devem também ser cometidos ao nível central de decisão, enquanto as receitas fiscais nos níveis inferiores devem ser ciclicamente estáveis. Assim sendo, impostos cuja receita depende em grande medida das flutuações da economia, os impostos pessoais sobre o rendimento, impostos sobre os lucros e impostos gerais sobre o consumo, devem ser arrecadados pelo nível central;

v) Os impostos, cuja base de incidência seja repartida de forma muito desigual no território nacional, devem caber ao nível central de decisão ou pelo menos a níveis intermédios. É o que sucede por exemplo com a receita dos impostos sobre recursos naturais;

vi) Os impostos ou outros tributos contribuições, taxas, etc, assentes num princípio de equivalência ou benefício são adequados para financiar todos os níveis, em função da verificação e extensão do benefício.

Um modelo de determinação alternativo foi proposto, alguns anos depois, por Shah e Broadway, com base nos seguintes critérios de alocação de impostos:

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i) O critério da eficiência económica na determinação dos poderes fiscais manda que os impostos sobre factores móveis e bens comercializáveis e que intervém com o funcionamento eficiente do mercado comum interno, devem ser alocados ao nível central de decisão. Com efeito, a atribuição de impostos sobre factores móveis aos níveis inferiores de decisão pode conduzir a políticas de desperdício, como forma de atracção de recursos a essas circunscrições;

ii) O critério da equidade nacional sugere que impostos sobre o rendimento com eficácia redistributiva sejam cometidos ao nível central de decisão. Isto limita, a possibilidade de os governos locais poderem seguir políticas redistributivas perversas, através da receita e também da despesa, atraindo residentes de elevados rendimentos e repelindo residentes de baixos rendimentos. Ainda assim, sempre poderá aceitar‐se a utilização de sobretaxas ou impostos suplementares de taxa fixa, etc., incidindo apenas sobre os rendimentos dos residentes;

iii) O critério da exequibilidade administrativa, através da diminuição dos custos administrativos e de cumprimento, sugere que os impostos sejam atribuídos à jurisdição que tenha maior capacidade para monitorizar e avaliar economicamente as respectivas bases de incidência. Este critério indica então que a propriedade, a terra, por exemplo, são bons candidatos a uma responsabilidade pelos níveis locais, pois que estes têm melhores condições para avaliar o respectivo valor de mercado;

iv) O critério da necessidade financeira ou adequação da receita sugere que, como forma de garantir a responsabilização, os meios de obtenção de receita, ou seja, a capacidade de obter receita a partir dos recursos próprios, deva coincidir, tanto quanto possível, com as necessidades de despesa.

Este último critério constitui uma novidade em relação às regras propostas por Musgrave. Ainda que se aceite a existência de recursos fiscais próprios, mormente pela aplicação dos critérios anteriores, este último aconselha que a receita desses impostos só seja percebida, na medida em que seja necessária. É o corolário do princípio em que o financiamento segue a função. Entretanto, a realidade demonstra que a totalidade das receitas fiscais obtidas pelos países, ainda assim, não é suficiente para fazer face às suas exigências de despesa. O que determina, como se verá, o recurso á outras fontes de financiamento. Tendo por base estes critérios, Shah introduz uma separação entre o exercício dos poderes tributários, determinação dos elementos essenciais do imposto, a arrecadação e a administração da receita.

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Numa medição da aplicabilidade destas teorias, é interessante verificarmos que do ponto de vista dos países analisados sobressai o caso da China, que depois de experiências de excessiva descentralização que originaram problemas deficitários ao Governo central, centralizou impostos como o IVA, Imposto sobre os Rendimentos da Empresa e o Imposto sobre o Rendimento Pessoal. O IVA constitui um imposto que serve os propósitos de estabilização macroeconómica, os últimos constituem impostos sobre os factores móveis, e o Imposto sobre o Rendimento Pessoal agrega também a característica de imposto sobre o rendimento com eficácia redistributiva, tal como definem tanto Musgrave como Shah e Broadway. De facto, todos os países analisados, nomeadamente, Portugal, Moçambique e a China, centralizam os impostos referidos partilhando as bases de incidência de forma mais ou menos generosa como os níveis subnacionais e mantendo como impostos locais, essencialmente, os impostos sobre imóveis.