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Croquis da Villa Savoye realizados durante conferência na Argentina em 1929 Fonte: Le Corbusier (2004)

Antecedentes de uma modernidade anunciada

6. Croquis da Villa Savoye realizados durante conferência na Argentina em 1929 Fonte: Le Corbusier (2004)

seu equivalente com as expressões: grande sal-

le, parloir, salle d’assemblée, ou simplesmente, la

salle. Na habitação senhorial da Idade Média, de- signava uma vasta sala comum, onde se fazia de tudo um pouco. Ali eram realizadas as refeições, jogos, reuniões, conversações e até mesmo dormia- -se. O salão é a última designação francesa da peça já utilizada na habitação do século XIX, destinada à recepção das visitas e à sociedade mundana.17

•  Sala de Jantar

A salle à mager será destinada às refeições da família e dos convidados. Para a determinação das dimensões da sala de refeições, é ressaltada a im- portância de aspectos como a largura e o compri- mento da mesa, devido à necessidade de circulação ao seu redor. Guadet lembra que o aquecimento

não deverá incomodar os comensais e que as pare- des deverão ser refratárias à penetração dos vapores e odores, aconselhando, na habitação rica, serem empregados os mosaicos e mármores e, na habita- ção simples, se recorrer à pintura ou aos vernizes.18

•  Escritório/Biblioteca

O gabinete de trabalho é uma peça para receber amigos, clientes, fornecedores e mesmo desconhe- cidos. É preciso que ele se ligue diretamente com a antecâmara para que os estranhos penetrem o menos possível na residência. Por outro lado, pode ser que se queira atender o visitante num salão. É preciso então que a antecâmara dê acesso ao ga-

17 Maria Cristina Wolff de Carvalho. Op. Cit., 2000, p. 262. 18 Idem, p. 263.

binete de trabalho e a um salão, e que estas duas peças estejam próximas e se comuniquem.19

A biblioteca, por sua vez, será acima de tudo uma sala de trabalho comum para a família. Ela deverá possuir o maior numero possível de paredes claras e ter espaço para uma grande mesa de traba- lho. Para Guadet, esse é o programa da biblioteca:

[...] a menos que se trate de uma desses ama- dores de livros que possuem o equivalente a uma biblioteca pública. É então um programa excepcio- nal, que não pode entrar na categoria da habita- ção ordinária.20

•  Cozinha

Seu lugar na habitação é difícil de escolher: ela deve estar muito próxima da sala de refeições, sem lhe ser contígua. Deve estar separada por peças de acesso fácil e não por corredores longos e tortuosos, como se vê em muitos exemplos. Para atender aos fornecedores, ela deve ser acessível diretamente pela escada de serviço. Também deve ter comunicação fácil com a antecâmara e, enfim, estar isolada para que seus odores não se espa- lhem pelos apartamentos.21

Ainda segundo Maria Cristina, Guadet descreve três partidos de cozinhas, a depender da locali- zação no rés-do-chão, no subsolo ou, ainda, nos sótãos. As primeiras constituem o tipo mais apre- ciado pelo autor, pelas vantagens que oferecem na comunicação com as peças que lhe devem ser contíguas. Aquelas no subsolo, apontadas como as mais frequentes, complicam o fluxo de serviços, ar- gumenta, ainda que este inconveniente seja repa- rado com o monta-cargas.

19 Idem, Ibidem.

20 Julien Guadet. Op. Cit., 1909, p. 56. Apud Maria Cristina Wolff de Carvalho. Op. Cit., 2000, p. 263.

Recomenda-se que, neste caso, elas tenhas jane- las, e não respiros, assegurando a perfeita aera- ção do ambiente. Guadet destaca que a cozinha no subsolo é uma espécie de cozinha localizada em um rés-do-chão inferior. Finalmente, comenta a excepcionalidade das cozinhas situadas nos sótãos ou no andar superior, as quais, apesar de recomendável pela aeração perfeita, são incon- venientes, entre outros motivos, pela dificuldade que apresentam para o acesso de fornecedores.22

Diante das orientações de Guadet, nota-se que esta distribuição das peças que conformariam a casa moderna foram bem recebidas pelo raciona- lismo europeu, que posteriormente se encarregaria de divulgá-las mundo afora com pequenas modifi- cações. A separação e a independência das funções na organização espacial da casa moderna talvez tenha sido sua mais influente contribuição para a arquitetura residencial do século XX.

Se para Guadet as origens dessa revolução re- montam ao século XVIII, para Segre a questão da autoria desses projetos, ponto fundamental do pre- sente trabalho, só estaria resolvida e difundida a partir da segunda metade do século XIX.

Contudo, mais importante aqui do que precisar o início desse novo método de conceber o espaço doméstico, é destacar quando essas ideias apor- tam no Brasil e começam, de fato, a fazer parte do cotidiano de uma sociedade em transformação, como aquela encontrada no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Mesmo diante dos avanços do comércio nas ci- dades, muitas pessoas mantinham ou dependiam de antigos hábitos rurais ligados à subsistência. Segundo Maria Cecília Naclério Homem, por volta

de 1860, quase metade da população ainda vivia na

22 CARVALHO, Maria Cristina Wolff. Op. Cit., 2000, p. 264.

área rural, sendo possível que pessoas que moravam na área urbana também se dedicassem às atividades agrícolas.23

Sérgio Buarque de Holanda afirma que, em nos-

so país, o século XIX caracterizou-se pela oscilação entre o mundo agrário, patriarcal e paternalista, e o mundo urbano, copiado das nações social e tecnolo- gicamente mais avançadas, entre a autossuficiência e o desenvolvimento comercial.24

Com a Abolição da Escravatura em 1888 e a crescente abertura para os profissionais liberais imigrantes, o país enfrenta uma grande mudança nos modos de vida da população, que passa a in- corporar novos costumes relacionados ao regime do trabalho livre. A escravidão que teve papel fun- damental na sociedade brasileira desde os tempos coloniais é, mesmo depois de abolida, culturalmen- te mantida através de antigos vínculos de depen- dência fortemente arraigados e hábitos cômodos da vida patriarcal. Segundo Lucio Costa:

23 Maria Cecília Naclério Homem. O palacete paulistano e ou- tras formas urbanas de morar da elite cafeeira: 1867-1918. São Paulo: Martins Fontes, 1996, p. 63.

24 Sérgio Buarque de Holanda, 1948 apud Maria Cecília Na- clério Homem. Op. Cit., 1996, p. 16.

7. A presença do escravo no ambiente doméstico no