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Cuidados de linguagem, definição e denominação dos fatores de acidente

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.3 Análise das árvores de causas elaboradas por 4 empresas de Botucatu

4.3.2 Cuidados de linguagem, definição e denominação dos fatores de acidente

Uma das dificuldades constantemente apontadas em relação ao uso do método ADC é a necessidade de domínio da linguagem por parte da equipe de investigação (INRS, 1993; SNCF, s/d; Binder, 1997; Binder e Almeida, 1997b). A adoção de cuidados recomendados visa facilitar a organização de fatores e a montagem da árvore e uniformizar o uso dessa técnica, diminuindo o número de diferenças evidenciadas em análises e árvores realizadas por diferentes pessoas e/ou equipes.

Em todas as 75 árvores analisadas, verificou-se desrespeito à recomendação de nomear cada fato com frase construída com a estrutura sujeito – verbo – complemento (S-V-C), se necessário. O prejuízo advindo dessa prática pode ser de importância menor, uma vez que a denominação escolhida permita identificação precisa do fator e de sua participação na árvore, o que, infelizmente, não foi o que ocorreu nas árvores elaboradas nas empresas estudadas. Nelas, foram associadas outras falhas, como dois nomes para um mesmo fator, um só nome para dois ou mais fatores, nomes que não permitiam a identificação de um fato ou evento especificado, além de outras falhas. Como conseqüência, diversos esquemas deixaram de ser auto- explicativos, perdendo uma de suas principais características, qual seja, a de poderem ser usados como ferramenta auxiliar na comunicação entre os setores envolvidos e como auxílio à exploração dos esquemas com vistas à prevenção.

Para melhor visualização, destacam-se, abaixo, outros problemas evidenciados no tocante a cuidados de linguagem, definição e denominação de fatores participantes de acidentes e incluídos nas respectivas árvores:

a) Em 65 (86,6%) árvores, havia registro de nomes dados a fatores do acidente que não eram passíveis de observação e que foram classificados como: interpretações propriamente ditas, juízos de valor, referências a faltas/ausências ou negações. Em relação aos juízos de valor e interpretações, em nenhum dos casos havia referência, seja à consulta ao acidentado que permitisse considerar a participação no AT de algum fator

individual relacionado à opinião citada, seja à técnica ou cuidado de análise que permitisse ao pesquisador identificar como o investigador chegara àquela opinião. Em 21 casos, esse tipo de problema ocorreu apenas uma vez e, nos demais, de 2 a 5 vezes.

b) Em 38 (50,6%) árvores, houve registro de nomes genéricos, que não permitiam identificar um fato ou fator de acidente. Em 25 esquemas, isso ocorreu apenas 1 vez e, nos demais, de 2 a 4 vezes.

c) Em 20 (26,6%) árvores, foram registrados nomes que correspondiam a mais de um fato, ou seja, que deveriam ter sido desmembrados em mais de um fator. Em 14 dessas árvores, isso ocorreu apenas 1 vez e, nas demais, isso ocorreu de duas a 4 vezes.

d) Em 7 (9,3%) árvores, o mesmo fator recebeu denominações distintas, sendo incluído mais de uma vez no esquema do acidente. Em 5 casos, esse problema ocorreu apenas 1 vez e, nos outros dois, duas vezes.

O detalhamento da análise dos 4 subgrupos de fatores, agrupados como não passíveis de observação, revelou que, em 18 árvores, houve inclusão de fator cujo nome foi classificado como juízo de valor, ou seja, “descuido”, “falta de atenção” ou denominação semelhante. Em 16 (88,8% ou 16/18) desses acidentes, isso ocorreu apenas uma vez. Em 42 (56%) esquemas, houve registro de fatores classificados como interpretações propriamente ditas, acontecendo apenas uma vez em 25 deles. Em 35 (46,6%) acidentes foram registrados fatos classificados como faltas ou ausências, sendo verificado apenas uma vez em 25 deles. Por sua vez, as negações apareceram em 39 (52%) árvores, dando-se apenas 1 vez em 21 delas e, nas demais, de duas a cinco vezes.

Nas situações citadas, desrespeita-se recomendação expressa dos autores do método, qual seja, a de que, numa análise de acidente, na fase de elaboração da árvore, devem-se descrever os fatores ou fatos presentes na situação, de tal modo que, na fase de análise ou exploração da mesma, as interpretações tenham suas origens claramente especificadas no esquema elaborado. Os exemplos a seguir

ilustram essa regra: ao invés de considerar como fator de acidente “O Sr. X é novato (ou inexperiente)”, dever-se-iam incluir fatores como “O Sr. X trabalha no setor há 3 dias”, “O Sr X está em seu primeiro emprego”, “A formação do Sr X consiste em observar o trabalho de colegas” ou outras que descrevessem os fatores, permitindo a interpretação de que a condição de inexperiência do Sr. X poderia ter participado, ou participou, na origem do acidente em questão.

A utilização de fatores considerados como resultantes de opiniões “a priori”, interpretações, juízos de valor ou semelhantes, já na descrição do acidente, é apontada na literatura como um dos problemas presentes em investigações de acidentes e constitui aspecto contra o qual se dá grande destaque na formação de pessoal, no uso do método ADC e em alguns textos que abordam a investigação de acidentes. Na literatura, quando essas referências incluem uso de expressões como descuido, negligência, falta de atenção, exposição desnecessária ao perigo ou outras semelhantes ou, ainda, quando a descrição enfatiza comportamentos ou ações do acidentado ou de seus colegas como “causa” do acidente, têm sido consideradas como exemplos de atribuição de causa, culpa e responsabilidade pelo acidente ao próprio acidentado ou a seus colegas (Wigglesworth 1978; Binder 1997; Binder e col. 1997; CCOHS.1998).

A somação dos erros apontados contribui para o aparecimento daquilo que, segundo informação verbal de Binder , em curso de formação desenvolvido no INRS, denomina-se “’arvore de culpados”, como se pode ver nas figuras 3 e 4, que mostram esquemas elaborados por integrantes da equipe técnica da empresa D.

A identificação desses problemas permite afirmar que os responsáveis pelo uso do método, na empresa D, não o dominam e incorrem em falhas que podem ser consideradas graves, uma vez que implicam em desrespeito a princípios fundamentais do método. Em relação aos esquemas elaborados nas empresas A e B, foi possível identificar a presença de grande número de problemas semelhantes aos apontados, enquanto que, na empresa C, eles estiveram presentes em pequena quantidade.

Figura 4. Exemplo de “árvore de culpados” elaborada em empresa de Botucatu, SP., 1997.

Acidente ao apagar incêndio em transportador de chapas Figura 3. Exemplo de “árvore de culpados” elaborada

em empresa de Botucatu, SP., 1997. Funcionário sofreu corte na mão Puxava a fita de aço com a mão Enroscada embaixo do pacote

Não chamou a empilhadeira para erguer o pacote

Não respeitou as normas de segurança

Achou desnecessário Não usava

equipamento de segurança

Acidente ao amarrar pacote de chapas

Queimou o antebraço esquerdo Foi atingido pelo fogo Apagava o fogo no transporte

Não apagou o fogo corretamente Não utilizou água para exterminar o o fogo Interpretação errônea Descuidou-se Utilizou o pó da chapa para apagar o fogo Não deu importância ao tamanho do fogo Não utilizou luvas para sua

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