• Nenhum resultado encontrado

1. CONTRIBUIÇÕES DAS PARCERIAS INFORMAIS PARA O DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL

1.5 Cultura da colaboração: trocas informais

Freire (1996, p. 19), chama a atenção para o aprendizado nos espaços informais que, geralmente, não está vinculado ao conhecimento de conteúdos, ou ao aspecto “ensinante” da educação. Ele se refere aos gestos que transmitem significados:

No fundo passa desapercebido a nós que foi aprendendo socialmente que mulheres e homens, historicamente, descobriram que é possível ensinar. Se estive claro para nós que foi aprendendo que percebemos ser possível ensinar teríamos entendido com facilidade a importância das experiências informais, nas ruas, nas praças, no trabalho, nas salas de aula das escolas, nos pátios dos recreios.

Esse aprendizado, segundo o autor, é algo comum que ocorre no decorrer da nossa história e nos forma. Isso se dá com o professor que aprende e ensina seus pares, através de trocas de saberes, em um ambiente informal, seja na sala de aula, nos corredores, sala dos professores ou no intervalo, com parada para o “cafezinho”, em encontros festivos, almoços, viagens e outras oportunidades informais. Fullan e Hargreaves (2000, p.67) salientam a informalidade na cultura da colaboração:

Podemos encontrar culturas de colaboração em todos os lugares, na vida da escola: nos gestos, nas brincadeiras e nos olhares que sinalizam simpatia e compreensão: no trabalho pesado e difícil e no interesse pessoal, evidenciados nos corredores ou fora das salas de aula; nos aniversários, nos dias de festa ou em outras comemorações simples; na aceitação e mescla de vidas pessoais com vidas profissionais; no elogio rasgado e aberto, no recolhimento, na gratidão e no compartilhar e discutir de ideias e recursos.

Vaillant e Marcelo (2012) citando a pesquisa de Flores (2005) apontam que tanto profissionais docentes iniciantes como os experientes citam que aprenderam a ensinar não na formação formal inicial ou na prática de ensino e cursos de formação, mas dão ênfase aos aprendizados ocorridos com os alunos e com os outros colegas docentes em ambientes informais. Os autores citam em sua pesquisa que outros pesquisadores afirmam que 90% do aprendizado em local de trabalho acontece de maneira informal.

Cross (2007), ressalta que através de uma aprendizagem informal, nas organizações, o colaborador produz mais. O aprendiz prefere as instruções de um colega de trabalho aos cursos oferecidos pela empresa. O trabalho em redes sociais “estende os muros” dos saberes. Em uma alegoria ele cita que o ensino informal é como “andar de bicicleta”, em que se pode parar para apreciar a natureza, pegar atalhos, desbravar caminhos desconhecidos, e viver experiências inéditas. Já o ensino formal, seria como “entrar em um ônibus” e ser levado pelo motorista ao destino previamente traçado.

Seja qual for o ambiente, formal ou informal, não é fácil trabalhar em grupo, principalmente quando aparecem os posicionamentos e objetivos contrários, em que estão presentes os aspectos individuais de personalidade e temperamento.

Tardif e Lessard (2005) analisando os papéis dos professores no ambiente escolar, citam que eles desenvolvem papéis individualizados nas suas respectivas classes, mas também desenvolvem os papéis públicos com a coletividade escolar. Dentro dessa coletividade, há aspectos formais, como reuniões pedagógicas, encontros, comissões, entre outras, e aspectos informais, em conversa nos corredores e sala dos professores, troca de ideias ou materiais e projetos pessoais de dois ou mais professores. Os limites entre esses aspectos não são tão fáceis de determinar e depende da história de cada um ou de cada grupo. Podemos inferir que

alguns convivem há muito tempo juntos e outros grupos se formam à medida que acontecem as transferências ou admissões. Surgem as convivências mais íntimas, por afinidade ou “tempo de casa” e com elas as amizades profundas, os conflitos de ideias, a colaboração informal e mútua.

As colaborações entre os pares concentram-se em cumprimento de tarefas estabelecidas pela instituição e em espaços comuns de encontros, como corredores ou salas dos professores:

Os limites entre os aspectos formais e informais , evidentemente, nem sempre são claros e óbvios, pois a vida concreta de um estabelecimento repousa tanto em relações codificadas quanto sobre amizades, conflitos pessoais, colaborações pontuais, intercâmbios imprevistos, etc. Além disso, as relações entre os pares comportam ainda uma importante dimensão histórica: em algumas escolas os professores estão atuando há muitíssimo tempo e partilham com seus colegas, como vimos nas seções anteriores, um universo arquifamiliar. (TARDIF e LESSARD, 2005, p. 183)

O que pode ocorrer é a rivalidade entre professores, o que acarreta que alguns prefiram a ajuda da direção do que desses colegas. A colaboração ocorre geralmente entre professores do mesmo nível, isso em termos de planejamento curricular, permanecendo a autonomia e a liberdade profissional. Geralmente a forma de colaboração entre os professores não implica na presença de mais de um professor em sala de aula.

Os professores estão sempre nessa dualidade em conversas com alunos e com seus pares. Como os autores chamam a classe de “célula”, podemos pensar que as células saudáveis fazem parte e compõem um organismo sadio e funcional. Esse organismo compreende todos os sujeitos participantes do processo educacional:

Os professores não interagem apenas com os alunos, mas também com seus colegas, os professores especializados, os pedagogos, os diretores da escola, os profissionais, os pais, etc. Aí também o processo coletivo de trabalho reproduz fortemente a lógica da estrutura celular, pois a célula classe fica amplamente subtraída aos demais atores e agentes escolares. Aqui dominam os temas dialéticos do isolamento e da colaboração, do individualismo docente em relação ao coletivo de trabalho no estabelecimento, da sociedade do corpo docente ante aquilo que parece serem ingerências externas, etc. (TARDIF e LESSARD, 2005, p. 281).

Contudo, muitas vezes esse mesmo professor que lidera essa “célula classe” se sente isolado por não conseguir compartilhar suas aflições e problemas, erros e acertos, progressos e fracassos, nem ao menos nos horários estabelecidos pela instituição para conversas e planejamento, pois o tempo é reduzido para tratar de particularidades e individualidades de cada classe e professor específico.

Em pesquisa sobre a aprendizagem dos professores em colaboração com seus colegas, Forte e Flores (2009), apresentam a concepção de Little (1990) sobre as relações colegiais e seus graus de integração, intensidade e interdependência, que vão desde “trocas esporádicas e informais”, “ajuda e apoio mútuo”, “partilha rotineira e inconsequente de materiais e de métodos ou troca aberta de ideias e opiniões” e por fim, o “trabalho conjunto”. As três primeiras ela classifica de “formas fracas de colegialidade” e não interferem diretamente em suas concepções sobre as práticas. Dá maior ênfase ao trabalho conjunto:

[...] trabalho de grupo para os encontros que assentam na responsabilidade partilhada pelo trabalho de ensinar (interdependência), nas concepções colectivas de autonomia, no apoio à iniciativa e à liderança dos professores em matéria de prática profissional e nas afiliações de grupo que se baseiam no trabalho profissional (LITTLE, 1990, p. 519 apud FORTES e FLORES, 2009, 770-771).

Fortes e Flores (2009), salientam que conforme Little (1990), o trabalho conjunto implica em maior interdependência e trocas com responsabilidade sobre a prática, na autonomia e desenvolvimento profissional.

Little (1990, p. 510) assinala que: “[...] qualquer interação que rompe o isolamento dos professores vai contribuir de alguma forma para o conhecimento, habilidade, julgamento ou compromisso de que os indivíduos trazem para seu trabalho”. Acreditamos que a expressão “qualquer interação” engloba os três aspectos citados da colegialidade abordados pela autora e podem, sim, levar às mudanças e à questionamentos sobre as práticas docentes, mesmo que essas trocas ocorram de maneira esporádica, informal, em trocas de ideias e opiniões.